segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

HABEAS CORPUS PARA LIBERAÇÃO DE VALOR PREVIDENCIÁRIO. NÃO CABIMENTO.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior

No presente caso, há um surpreendente pedido de concessão de habeas corpus para liberação de valor previdenciário. 

Vejam como ficou a solução do caso. 

Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0800334-19.2021.4.05.8300 - TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE(HABEAS CORPUS).
REQUERENTE: M A DA S
ADVOGADO: Helber Claudio Da Silva
REQUERIDO: BANCO CREFISA S.A. e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)


Sentença tipo C

EMENTA:-
HABEAS CORPUS PARA LEVANTAMENTO DE VALORES REFERENTES A BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. VIA INADEQUADA. EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.

 

Vistos, etc.

1-Relatório

Trata-se de Habeas Corpus impetrado por M A DA S em desfavor do INSS e do BANCO CREFISA S/A, no qual pretende, em síntese, a concessão da ordem de habeas corpus a fim de ser determinado às autoridades apontadas coatoras que procedam ao pagamento de valores do benefício previdenciário de Auxílio-Doença, titularizado por  José Vicente Filho, o qual foi indicado, na Inicial, com terceiro interessado. Requereu, ademais, a concessão da medida liminar, a fim de ser expedida ordem judicial ou Alvará para o levantamento de todos os valores creditados em favor do interditando, na pessoa de sua Curadora. Juntou documentos e instrumento de procuração.

Regularmente intimada para falar sobre a possível litispendência desta ação com o feito distribuído anteriormente (07/01/2021) para a 1ª Vara Federal/PE, sob o número 0800154-03.2021.4.05.8300T, a Parte Impetrante informou que as ações possuiriam objetivos distintos e, com a exclusão de uma das partes do feito apontado prevento, também teriam partes distintas.

2-Fundamentação

2.1- Inicialmente, constato que não se verifica qualquer das situações de prevenção estabelecidas no art. 286 do CPC.

Portanto, deve a Secretaria do Juízo retirar essa informação dos autos.

2.2- Inexiste litispendência entre este Habeas Corpus e o Habeas Data que tramita perante a 1ª Vara Federal/PE, pois, enquanto neste HC a Parte pugna pelo levantamento de valores de benefício previdenciário,  no Habeas Data pugna-se pela inserção no banco de dados da Autarquia do nome da representante legal/Curadora do titular do benefício previdenciário.

2.3- Do Habeas Corpus para levantamento de valores relativos a benefício previdenciário

O pedido de Habeas Corpus é cabível quando alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua Liberdade de Ir e Vir (art. 647 do CPP), e disso não trata os presentes autos.

Portanto, sem maiores delongas, o pedido de Habeas Corpus não é a via adequada para a obtenção do resultado almejado pela Parte Impetrante, no caso, o levantamento de valores de benefício previdenciário.

A jurisprudência mais recente do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de não se admitir habeas corpus nem mesmo em substituição de recurso criminal, verbis:

"1. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se à nova jurisprudência da Corte Suprema, também passou a restringir as hipóteses de cabimento do habeas corpus, não admitindo que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso ou ação cabível, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade do paciente, seja cogente a concessão, de ofício, da ordem de".[1](Destaquei).

No campo cível, mencionado E. Tribunal, pela mesma 5ª Turma, também não tem admitido o uso dessa media de urgência criminal, verbis:

"1. Conforme orientação desta Corte Superior, "a tese de nulidade do procedimento fiscal não pode ser dirimida no bojo da ação penal, na
qual a Fazenda Pública não é parte ou exerce o contraditório,
porquanto o Juízo criminal não possui competência para anular o lançamento tributário, passível de revisão apenas por meio de recurso administrativo, ação cível ou mandado de segurança(RHCn.61.764/RJ, Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 02/5/2016, grifou-se)
2.  Se a alegação de nulidade no procedimento não chegou a ser dirimida em ação anulatória na seara cível, é inviável a pretensão de desconstituição do crédito tributário no juízo criminal, sobretudo na via mandamental.
3. Verificando-se que houve clara exposição do liame existente entre as supostas condutas do recorrente e os fatos delitivo sem apuração, de forma suficiente a dar início à persecução penal na via judicial e garantir o pleno exercício da defesa ao acusado, inviável o acolhimento da pretensão de inépcia da denúncia.

4. Recurso improvido, cassando-se a liminar deferida."[2]

Registro que o saudoso Pontes de Miranda, em um livro denominado "Habeas Corpus", cujo exemplar não encontrei na minha biblioteca particular, faz menção a um habeas corpus impetrado para liberação de um corpo humano(falecido) de um necrotério, tendo o respectivo Juízo concedido, liminarmente, o salvo conduto, situação essa perfeitamente cabível, porque, embora falecido, era um corpo humano que estava sendo sonegado à respectiva família, ou seja, o seu natural "ir e vir" para os rituais fúnebres estava sendo desumanamente restringido.

Não é o caso destes autos, em que se busca pagamento de valor previdenciário, via depósito ou expedição de alvará, para o que existe ação própria no campo cível. 

Não se pode usar, abusivamente, do habeas corpus, importante remédio judicial- criminal de garantia da liberdade de ir e vir do ser humano.

Desse modo, impõe-se a extinção do feito sem a resolução do mérito, haja vista a inadequação da via eleita, facultando-se, à Parte Impetrante, o manejo da ação cível pertinente, para a finalidade pretendida na Inicial.

3-Dispositivo

3.1 - determino que a Secretaria dê baixa na anotação de prevenção deste feito com  outro PJe, por inexistir tal prevenção;

3.2- de ofício, afasto a litispendência entes esta ação e a que se processa na 1ª Vara Federal sob o nº 0800154-03.2021.4.05.8300T;

3.3- concedo à Parte Impetrante o benefício da gratuidade da justiça;

3.4- dou o processo por extinto, sem resolução do mérito, por inadequação da via processual eleita (CPC, art. 485, VI, § 3º).

Sem honorários advocatícios (Lei nº 12.016/2009, art. 25).

Sem custas, ex lege.

Após o trânsito em julgado, dê-se baixa no sistema eletrônico.

R.I.

Recife, 22.02.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal da 2ª Vara da JFPE


____________________________________

[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 5ª Turma. HC 607564/PR. 2020/0212357-1. Relator Ministro Reynal Soares da Fonseca, julgamento em 24.11.2020, in DJe de 27.11.2020.

[2] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 5ª Turma. RHC 113899/AC. Recurso Ordinário em Habeas Corpus. 2019/0164897-7. Relator Ribeiro Dantas, julgamento em 6/10/2020, in DJe 15/10/2020

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