quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

ENTIDADE HOSPITALAR BENEFICENTE. IMUNIDADE DA CONTRIBUIÇÃO PIS-PASEP. REQUISITOS FIXADOS APENAS EM LEI COMPLEMENTAR. SUPREMA CORTE. TESE EM REPERCUSSÃO GERAL.

Por Francisco Alves dos Santos Jr. 

Segue decisão, na qual se discute importante assunto constitucional-tributário: a imunidade das Entidades de Assistência Social e Beneficentes, indicando-se o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal a respeito do assunto. 

Boa leitura. 

Observação: 
Luciana Simões Correa de Albuquerque foi a Assessora que pesquisou e minutou mencionada decisão. 


PROCESSO Nº: 0812455-21.2017.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: HOSPITAL DO T
ADVOGADO: Alana Coelho Pedrosa e outro
RÉU: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)



 D E C I S Ã O



HOSPITAL DO T., qualificado na Inicial, ajuizou esta AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA, CUMULADA COM PEDIDO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA em face da UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL).


Fundamenta seu pleito, essencialmente, na declaração de inconstitucionalidade reconhecida com efeito erga omnes e ex tunc, nos autos do Recurso Extraordinário n.º 636.941, no qual teria sido discutida a ilegalidade da cobrança da contribuição do PIS incidente sobre a folha de salário de  entidades filantrópicas beneficentes de assistência social, em face da imunidade/isenção concedidas pelo art. 195 da Constituição da República. Requereu, ao final, fosse deferida, em caráter antecedente, a tutela de urgência antecipada, inaudita altera parte, no sentido de determinar à União que se abstenha de exigir do Autor o recolhimento do PIS e de levar a efeito qualquer ato executório que vise a cobrança do referido tributo, bem como lhe forneça as imprescindíveis certidões negativas de débito (ou positiva com efeito de negativa), até decisão transitada em julgado nos presente autos, tendo em vista todos os fatos declinado, consoante os termos, documento e fundamento expostos na Inicial.


Foi determinada a citação da parte Ré, bem como sua intimação para manifestação (Id. 4058300.3824221).


Certidão exarada pela Secretaria deste Juízo na qual se mencionou a juntada de documentos apresentados pela parte autora (Id. 4058300.3856727).   

A União apresentou Contestação (Id. 4058300.3956846). Preliminarmente, impugnou os benefícios da Justiça Gratuita, uma vez que seria necessária a comprovação de hipossuficiência. No mérito, defendeu que: o atendimento das prescrições legais seria uma situação de fato, razão pela qual a mera apresentação de declarações e certificados não se mostraria suficiente a esse desiderato, antes exigindo a efetiva demonstração do atendimento ano a ano dos requisitos definidos pelo legislador ordinário para a concessão da imunidade; a parte autora teria anexado vários documentos visando comprovar sua condição, contudo, faltariam documentos exigidos que atendessem aos requisitos exigidos pela legislação; o primeiro deles seria o certificado de regularidade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS; conforme identificador nº 4058300.3812731 seria possível observar que o referido certificado estaria vencido desde de 28/04/2017, não atendendo, portanto, a um dos requisitos exigidos em lei;  apesar da apresentação de balanços patrimoniais, seria preciso comprovar as exigências  no artigo 29, II, da lei 12.101/2009, ou seja, seria imperiosa a aplicação de "suas rendas, seus recursos e eventual superávit integralmente no território nacional, na manutenção e desenvolvimento de seus objetivos institucionais"; a autora não teria demonstrado, de forma explícita essa exigência; em seu balanço patrimonial, vultosos valores estariam sendo investidos em bancos e aplicações financeiras.  Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, pela decretação de improcedência dos pedidos (Id. 4058300.3956846).


O Hospital, ora autor, apresentou Réplica (Id. 4058300.4087182). Preliminarmente, pontuou que seria preciso observar não a sua situação passada, mas sim a atual situação, que não permitiria arcar com os ônus das despesas com o presente processo, no qual buscaria obstar as cobranças inconstitucionais levadas a efeito pela parte Ré; não restariam dúvidas de que o Autor, além de ser entidade beneficente de assistência social sem fins lucrativos, o que por si só já lhe garantiria o benefício da justiça gratuita,  estaria em grave situação financeira, de forma que não teria condições de arcar com despesas processuais, sem comprometer o seu funcionamento. No mérito, defendeu que não mereceriam prosperar as alegações da  União Federal porque os documentos acostados aos autos comprovariam de forma inconteste o atendimento aos requisitos legais; que a Ré não teria impugnado as provas apresentadas pelo Autor; os requisitos apontados pela União Federal, no caso os previstos nos inc. II e III, da Lei 12.101/2009, seriam requisitos reconhecidamente inconstitucionais;  o STF teria se manifestado no sentido de que os requisitos para gozo da imunidade, obrigatoriamente, teriam que estar previstos em lei complementar, aplicando-se o CTN; a Certidão de Regularidade do FGTS teria validade de, apenas, trinta dias, de modo que mês a mês ela teria que ser expedida, oportunidade, então, que o Autor acostaria aos autos a certidão atualizada, que demonstram a sua regularidade perante o FGTS; com relação à alegação de que existiriam vultosos valores investidos em bancos e aplicações financeiras, seria necessário esclarecer que tais investimentos seriam decorrentes de expressa previsão legal, em razão dos convênios firmados com o SUS, o Estado de Pernambuco e Município, bem como seriam oriundos de previsão contratual, contida nos contratos de gestão, firmados para gestão das unidades de saúde;  na contramão do que afirma a Contestação, no sentido de que os resgates de aplicações e valores transferidos para poupança não teriam sido aplicados em serviços de saúde, os valores apontados como resgates de aplicação ou poupança, seriam todos eles provenientes dos Convênios firmados com a União, Estado e Município ou contratos de gestão; todos o recursos provenientes de Convênio ou de contrato de repasse, enquanto não empregados em sua finalidade, deveriam ser, obrigatoriamente, aplicados em caderneta de poupança ou fundo de aplicação financeira de curto prazo, conforme expressa determinação da PORTARIA INTERMINISTERIAL Nº 127, DE 29 MAIO DE 2008 ali transcrito; seria necessário destacar que o simples fato do dinheiro estar aplicado, em instituições financeiras, ou o fato do Autor ter eventual superávit, não implicaria descumprimento do requisito apontado pela parte Ré, uma vez que todo lucro obtido seria diretamente investido na atividade-fim das unidades de saúde e no desenvolvimento de seus objetivos institucionais, conforme demonstrariam os balanços e auditorias externas, acostados aos autos e não teriam sido  impugnados pela parte Autora. Teceu outros comentários. Reiterou o pedido de antecipação dos efeitos da tutela e reiterou os termos da Inicial. Juntou documentos. 


Instada a se manifestar, a União aduziu que: a Autora teria apresentado novo certificado (id. Nº 4087197), desta vez, comprovando a regularidade com o FGTS, pelo que a União teria concordado com a juntada; não teria sido  comprovado o cumprimento do disposto nos incisos I e II, do art. 29, da lei 12.101/2009; uma vez comprovando o atendimento de todos os requisitos legais, não haveria óbice ao reconhecimento do pedido de imunidade em relação ao PIS, podendo inclusive acontecer no curso da demanda. Teceu outros comentários e pugnou pela intimação da parte autora para demonstrar, nos autos o atendimento, de forma cabal, de todos os requisitos previstos na Lei 12.101/2009 sob pena, de não o fazendo, ser o pedido julgado improcedente.


É o relatório, no essencial.


2. Fundamentação


2.1. Do benefício da justiça gratuita


A Súmula 481 do STJ dispõe que "faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais."


No presente caso, trata-se de entidade filantrópica sem fins lucrativos, havendo indícios de que se encontra em dificuldades financeiras, como sói acontecer com todas as Entidades semelhantes no Brasil da atualidade. 
Então, prima facie, resta caracterizada a hipossuficiência do Hospital Autor, devendo, por isso, ser deferido o benefício da assistência judiciária.
Obviamente, se a Parte Requerida, mais tarde, fizer provas em sentido contrário, esse benefício será cassado, com efeito ab initio.


2.2. Do Pedido de Tutela Provisória de Urgência de Antecipação


Nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, a concessão da tutela de urgência exige a presença dos elementos: a) que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano; b) ou o risco ao resultado útil do processo.


Trata-se de medida excepcional, utilizada apenas quando houver urgência na obtenção de determinados efeitos que somente seriam alcançados ao final do processo. A excepcionalidade decorre do fato de se tratar de medida concedida antes que se instaure o regular contraditório, de modo que a urgência afirmada permita conceder antecipadamente alguns efeitos fáticos da sentença de procedência, desde que haja meios de prova para, mediante cognição sumária, constatar-se a verossimilhança das alegações, bem como seja possível reverter o provimento antecipado (art. 300, §3º, do CPC).


Além disso, revela-se necessário que a medida seja juridicamente possível.


No caso em análise, pugna a parte autora pela declaração de imunidade quanto ao recolhimento da contribuição para o PIS, fundamentando-se, essencialmente, na tese firmada no Recurso Extraordinário n.º 636.941, com repercussão, com efeito erga omnes e ex tunc.


Defende a parte autora, em sede de Réplica, que não mereceriam prosperar as alegações da União Federal, alegando, em síntese, que: os documentos acostados aos autos comprovariam, de forma inconteste, o atendimento aos requisitos legais; a parte Ré sequer teria impugnado as provas apresentadas pelo Autor; os requisitos apontados pela União Federal, quais sejam os previstos nos inc. II e III, da Lei 12.101/2009, seriam requisitos reconhecidamente inconstitucionais, uma vez que previstos em lei ordinária, tendo o STF se manifestado no sentido de que as exigências para gozo da imunidade, obrigatoriamente, deveriam estar  preconizadas  em lei complementar, aplicando-se, portanto, o Código Tributário Nacional.


Pois bem.


O art. 150, VI, "c" da CF88 leciona:


"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

(...)

VI - instituir impostos sobre:

(...)

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei."


O art. 195, § 7º, da Constituição Federal de 1988, por sua vez, dispõe que:


"Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

§ 7º São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.".


O dispositivo constitucional citado trata de imunidade tributária, embora por atecnia do legislador do constituinte tenha se referido à isenção.


Desta feita, a imunidade cria verdadeira regra de incompetência tributária, que independe de qualquer outra norma que preveja a incidência de tributo.


O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 636.941/RS, com repercussão geral reconhecida, firmou entendimento no sentido de que a imunidade prevista no § 7º do art. 195 da Constituição Federal alcança a contribuição ao PIS devida pelas entidades beneficentes de assistência social.


No mesmo julgamento, o STF afirmou que a conceituação e o regime jurídico da expressão "instituições de assistência social", estampado no art. 150, VI, "c" da vigente Constituição de 1988, aplica-se por analogia à expressão "entidades beneficentes de assistência social", disposta no art. 195, § 7º da CF/88.


 Verifica-se abaixo ementa do referido aresto:


TRIBUTÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. REPERCUSSÃO GERAL CONEXA. RE 566.622. IMUNIDADE AOS IMPOSTOS. ART. 150, VI, C, CF/88. IMUNIDADE ÀS CONTRIBUIÇÕES. ART. 195, § 7º, CF/88. O PIS É CONTRIBUIÇÃO PARA A SEGURIDADE SOCIAL (ART. 239 C/C ART. 195, I, CF/88). A CONCEITUAÇÃO E O REGIME JURÍDICO DA EXPRESSÃO "INSTITUIÇÕES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E EDUCAÇÃO" (ART. 150, VI, C, CF/88) APLICA-SE POR ANALOGIA À EXPRESSÃO "ENTIDADES BENEFICENTES DE ASSITÊNCIA SOCIAL" (ART. 195, § 7º, CF/88). AS LIMITAÇÕES CONSTITUCIONAIS AO PODER DE TRIBUTAR SÃO O CONJUNTO DE PRINCÍPIOS E IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS (ART. 146, II, CF/88). A EXPRESSÃO "ISENÇÃO" UTILIZADA NO ART. 195, § 7º, CF/88, TEM O CONTEÚDO DE VERDADEIRA IMUNIDADE. O ART. 195, § 7º, CF/88, REPORTA-SE À LEI Nº 8.212/91, EM SUA REDAÇÃO ORIGINAL (MI 616/SP, Rel. Min. Nélson Jobim, Pleno, DJ 25/10/2002). O ART. 1º, DA LEI Nº 9.738/98, FOI SUSPENSO PELA CORTE SUPREMA (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000). A SUPREMA CORTE INDICIA QUE SOMENTE SE EXIGE LEI COMPLEMENTAR PARA A DEFINIÇÃO DOS SEUS LIMITES OBJETIVOS (MATERIAIS), E NÃO PARA A FIXAÇÃO DAS NORMAS DE CONSTITUIÇÃO E DE FUNCIONAMENTO DAS ENTIDADES IMUNES (ASPECTOS FORMAIS OU SUBJETIVOS), OS QUAIS PODEM SER VEICULADOS POR LEI ORDINÁRIA (ART. 55, DA LEI Nº 8.212/91). AS ENTIDADES QUE PROMOVEM A ASSISTÊNCIA SOCIAL BENEFICENTE (ART. 195, § 7º, CF/88) SOMENTE FAZEM JUS À IMUNIDADE SE PREENCHEREM CUMULATIVAMENTE OS REQUISITOS DE QUE TRATA O ART. 55, DA LEI Nº 8.212/91, NA SUA REDAÇÃO ORIGINAL, E AQUELES PREVISTOS NOS ARTIGOS 9º E 14, DO CTN. AUSÊNCIA DE CAPACIDADE CONTRIBUTIVA OU APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE SOCIAL DE FORMA INVERSA (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000). INAPLICABILIDADE DO ART. 2º, II, DA LEI Nº 9.715/98, E DO ART. 13, IV, DA MP Nº 2.158-35/2001, ÀS ENTIDADES QUE PREENCHEM OS REQUISITOS DO ART. 55 DA LEI Nº 8.212/91, E LEGISLAÇÃO SUPERVENIENTE, A QUAL NÃO DECORRE DO VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE DESTES DISPOSITIVOS LEGAIS, MAS DA IMUNIDADE EM RELAÇÃO À CONTRIBUIÇÃO AO PIS COMO TÉCNICA DE INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO. EX POSITIS, CONHEÇO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO, MAS NEGO-LHE PROVIMENTO CONFERINDO EFICÁCIA ERGA OMNES E EX TUNC.
1. A imunidade aos impostos concedida às instituições de educação e de assistência social, em dispositivo comum, exsurgiu na CF/46, verbis: Art. 31, V, "b": À União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios é vedado (...) lançar imposto sobre (...) templos de qualquer culto, bens e serviços de partidos políticos, instituições de educação e de assistência social, desde que as suas rendas sejam aplicadas integralmente no país para os respectivos fins.
2. As CF/67 e CF/69 (Emenda Constitucional nº 1/69) reiteraram a imunidade no disposto no art. 19, III, "c", verbis: É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios (...) instituir imposto sobre (...) o patrimônio, a renda ou os serviços dos partidos políticos e de instituições de educação ou de assistência social, observados os requisitos da lei.
3. A CF/88 traçou arquétipo com contornos ainda mais claros, verbis: Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) VI. instituir impostos sobre: (...) c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;(...) § 4º. As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas; Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais: (...) § 7º. São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.
4. O art. 195, § 7º, CF/88, ainda que não inserido no capítulo do Sistema Tributário Nacional, mas explicitamente incluído topograficamente na temática da seguridade social, trata, inequivocamente, de matéria tributária. Porquanto ubi eadem ratio ibi idem jus, podendo estender-se às instituições de assistência stricto sensu, de educação, de saúde e de previdência social, máxime na medida em que restou superada a tese de que este artigo só se aplica às entidades que tenham por objetivo tão somente as disposições do art. 203 da CF/88 (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000).
5. A seguridade social prevista no art. 194, CF/88, compreende a previdência, a saúde e a assistência social, destacando-se que as duas últimas não estão vinculadas a qualquer tipo de contraprestação por parte dos seus usuários, a teor dos artigos 196 e 203, ambos da CF/88. Característica esta que distingue a previdência social das demais subespécies da seguridade social, consoante a jurisprudência desta Suprema Corte no sentido de que seu caráter é contributivo e de filiação obrigatória, com espeque no art. 201, todos da CF/88.
6. O PIS, espécie tributária singular, contemplada no art. 239, CF/88, não se subtrai da concomitante pertinência ao "gênero" (plural) do inciso I, art. 195, CF/88, verbis: Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) a) a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) b) a receita ou o faturamento; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) c) o lucro; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998) III - sobre a receita de concursos de prognósticos. IV - do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei a ele equiparar. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)...
7. O Sistema Tributário Nacional, encartado em capítulo próprio da Carta Federal, encampa a expressão "instituições de assistência social e educação" prescrita no art. 150, VI, "c", cuja conceituação e regime jurídico aplica-se, por analogia, à expressão "entidades beneficentes de assistência social" contida no art. 195, § 7º, à luz da interpretação histórica dos textos das CF/46, CF/67 e CF/69, e das premissas fixadas no verbete da Súmula n° 730. É que até o advento da CF/88 ainda não havia sido cunhado o conceito de "seguridade social", nos termos em que definidos pelo art. 203, inexistindo distinção clara entre previdência, assistência social e saúde, a partir dos critérios de generalidade e gratuidade.
8. As limitações constitucionais ao poder de tributar são o conjunto de princípios e demais regras disciplinadoras da definição e do exercício da competência tributária, bem como das imunidades. O art. 146, II, da CF/88, regula as limitações constitucionais ao poder de tributar reservadas à lei complementar, até então carente de formal edição.
9. A isenção prevista na Constituição Federal (art. 195, § 7º) tem o conteúdo de regra de supressão de competência tributária, encerrando verdadeira imunidade. As imunidades têm o teor de cláusulas pétreas, expressões de direitos fundamentais, na forma do art. 60, § 4º, da CF/88, tornando controversa a possibilidade de sua regulamentação através do poder constituinte derivado e/ou ainda mais, pelo legislador ordinário.
10. A expressão "isenção" equivocadamente utilizada pelo legislador constituinte decorre de circunstância histórica. O primeiro diploma legislativo a tratar da matéria foi a Lei nº 3.577/59, que isentou a taxa de contribuição de previdência dos Institutos e Caixas de Aposentadoria e Pensões às entidades de fins filantrópicos reconhecidas de utilidade pública, cujos membros de sua diretoria não percebessem remuneração. Destarte, como a imunidade às contribuições sociais somente foi inserida pelo § 7º, do art. 195, CF/88, a transposição acrítica do seu conteúdo, com o viés do legislador ordinário de isenção, gerou a controvérsia, hodiernamente superada pela jurisprudência da Suprema Corte no sentido de se tratar de imunidade.
11. A imunidade, sob a égide da CF/88, recebeu regulamentação específica em diversas leis ordinárias, a saber: Lei nº 9.532/97 (regulamentando a imunidade do art. 150, VI, "c", referente aos impostos); Leis nº 8.212/91, nº 9.732/98 e nº 12.101/09 (regulamentando a imunidade do art. 195, § 7º, referente às contribuições), cujo exato sentido vem sendo delineado pelo Supremo Tribunal Federal.
12. A lei a que se reporta o dispositivo constitucional contido no § 7º, do art. 195, CF/88, segundo o Supremo Tribunal Federal, é a Lei nº 8.212/91 (MI 616/SP, Rel. Min. Nélson Jobim, Pleno, DJ 25/10/2002).
13. A imunidade frente às contribuições para a seguridade social, prevista no § 7º, do art. 195, CF/88, está regulamentada pelo art. 55, da Lei nº 8.212/91, em sua redação original, uma vez que as mudanças pretendidas pelo art. 1º, da Lei nº 9.738/98, a este artigo foram suspensas (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000).
14. A imunidade tributária e seus requisitos de legitimação, os quais poderiam restringir o seu alcance, estavam estabelecidos no art. 14, do CTN, e foram recepcionados pelo novo texto constitucional de 1988. Por isso que razoável se permitisse que outras declarações relacionadas com os aspectos intrínsecos das instituições imunes viessem regulados por lei ordinária, tanto mais que o direito tributário utiliza-se dos conceitos e categorias elaborados pelo ordenamento jurídico privado, expresso pela legislação infraconstitucional.
15. A Suprema Corte, guardiã da Constituição Federal, indicia que somente se exige lei complementar para a definição dos seus limites objetivos (materiais), e não para a fixação das normas de constituição e de funcionamento das entidades imunes (aspectos formais ou subjetivos), os quais podem ser veiculados por lei ordinária, como sois ocorrer com o art. 55, da Lei nº 8.212/91, que pode estabelecer requisitos formais para o gozo da imunidade sem caracterizar ofensa ao art. 146, II, da Constituição Federal, ex vi dos incisos I e II, verbis: Art. 55. Fica isenta das contribuições de que tratam os arts. 22 e 23 desta Lei a entidade beneficente de assistência social que atenda aos seguintes requisitos cumulativamente: (Revogado pela Lei nº 12.101, de 2009) I - seja reconhecida como de utilidade pública federal e estadual ou do Distrito Federal ou municipal; (Revogado pela Lei nº 12.101, de 2009); II - seja portadora do Certificado e do Registro de Entidade de Fins Filantrópicos, fornecido pelo Conselho Nacional de Assistência Social, renovado a cada três anos; (Redação dada pela Lei nº 9.429, de 26.12.1996)....
16. Os limites objetivos ou materiais e a definição quanto aos aspectos subjetivos ou formais atende aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, não implicando significativa restrição do alcance do dispositivo interpretado, ou seja, o conceito de imunidade, e de redução das garantias dos contribuintes.
17. As entidades que promovem a assistência social beneficente, inclusive educacional ou de saúde, somente fazem jus à concessão do benefício imunizante se preencherem cumulativamente os requisitos de que trata o art. 55, da Lei nº 8.212/91, na sua redação original, e aqueles prescritos nos artigos 9º e 14, do CTN.
18. Instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos são entidades privadas criadas com o propósito de servir à coletividade, colaborando com o Estado nessas áreas cuja atuação do Poder Público é deficiente. Consectariamente, et pour cause, a constituição determina que elas sejam desoneradas de alguns tributos, em especial, os impostos e as contribuições.
19. A ratio da supressão da competência tributária funda-se na ausência de capacidade contributiva ou na aplicação do princípio da solidariedade de forma inversa, vale dizer: a ausência de tributação das contribuições sociais decorre da colaboração que estas entidades prestam ao Estado.
20. A Suprema Corte já decidiu que o artigo 195, § 7º, da Carta Magna, com relação às exigências a que devem atender as entidades beneficentes de assistência social para gozarem da imunidade aí prevista, determina apenas a existência de lei que as regule; o que implica dizer que a Carta Magna alude genericamente à "lei" para estabelecer princípio de reserva legal, expressão que compreende tanto a legislação ordinária, quanto a legislação complementar (ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000).
21. É questão prejudicial, pendente na Suprema Corte, a decisão definitiva de controvérsias acerca do conceito de entidade de assistência social para o fim da declaração da imunidade discutida, como as relativas à exigência ou não da gratuidade dos serviços prestados ou à compreensão ou não das instituições beneficentes de clientelas restritas.
22. In casu, descabe negar esse direito a pretexto de ausência de regulamentação legal, mormente em face do acórdão recorrido que concluiu pelo cumprimento dos requisitos por parte da recorrida à luz do art. 55, da Lei nº 8.212/91, condicionado ao seu enquadramento no conceito de assistência social delimitado pelo STF, mercê de suposta alegação de que as prescrições dos artigos 9º e 14 do Código Tributário Nacional não regulamentam o § 7º, do art. 195, CF/88.
23. É insindicável na Suprema Corte o atendimento dos requisitos estabelecidos em lei (art. 55, da Lei nº 8.212/91), uma vez que, para tanto, seria necessária a análise de legislação infraconstitucional, situação em que a afronta à Constituição seria apenas indireta, ou, ainda, o revolvimento de provas, atraindo a aplicação do verbete da Súmula nº 279. Precedente. AI 409.981-AgR/RS, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 13/08/2004. 24. A pessoa jurídica para fazer jus à imunidade do § 7º, do art. 195, CF/88, com relação às contribuições sociais, deve atender aos requisitos previstos nos artigos 9º e 14, do CTN, bem como no art. 55, da Lei nº 8.212/91, alterada pelas Lei nº 9.732/98 e Lei nº 12.101/2009, nos pontos onde não tiveram sua vigência suspensa liminarmente pelo STF nos autos da ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000.
25. As entidades beneficentes de assistência social, como consequência, não se submetem ao regime tributário disposto no art. 2º, II, da Lei nº 9.715/98, e no art. 13, IV, da MP nº 2.158-35/2001, aplicáveis somente àquelas outras entidades (instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos) que não preenchem os requisitos do art. 55 da Lei nº 8.212/91, ou da legislação superveniente sobre a matéria, posto não abarcadas pela imunidade constitucional.
26. A inaplicabilidade do art. 2º, II, da Lei nº 9.715/98, e do art. 13, IV, da MP nº 2.158-35/2001, às entidades que preenchem os requisitos do art. 55 da Lei nº 8.212/91, e legislação superveniente, não decorre do vício da inconstitucionalidade desses dispositivos legais, mas da imunidade em relação à contribuição ao PIS como técnica de interpretação conforme à Constituição.
27. Ex positis, conheço do recurso extraordinário, mas nego-lhe provimento conferindo à tese assentada repercussão geral e eficácia erga omnes e ex tunc. Precedentes. RE 93.770/RJ, Rel. Min. Soares Muñoz, 1ª Turma, DJ 03/04/1981. RE 428.815-AgR/AM, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma, DJ 24/06/2005. ADI 1.802-MC/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Pleno, DJ 13-02-2004. ADI 2.028 MC/DF, Rel. Moreira Alves, Pleno, DJ 16-06-2000.
(RE 636941, LUIZ FUX, STF.)


No julgamento acima aludido, a Suprema Corte decidiu que as entidades que promovem a assistência social beneficente, inclusive educacional ou de saúde, somente fazem jus à concessão do benefício imunizante do art. 195, § 7º da CF/88, se preencherem cumulativamente os requisitos de que trata o art. 55 da Lei nº 8.212/91, na sua redação original, e aqueles prescritos nos artigos 9º e 14 do Código Tributário Nacional. 


Ocorre que a Suprema Corte julgou o mérito do RE 566.622/RS, em 23.02.2017, fixando a seguinte tese de repercussão geral:
"Os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar".
Nesse contexto, os requisitos legais exigidos, na parte final do § 7º do art. 195 CF/88, para o gozo da imunidade, enquanto não editada nova lei complementar sobre a matéria, são somente aqueles do aludido art. 14 do CTN, in verbis:



"Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas:


        I - não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; (Redação dada pela Lcp nº 104, de 2001)

        II - aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais;

        III - manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

        § 1º Na falta de cumprimento do disposto neste artigo, ou no § 1º do artigo 9º, a autoridade competente pode suspender a aplicação do benefício.

        § 2º Os serviços a que se refere a alínea c do inciso IV do artigo 9º são exclusivamente, os diretamente relacionados com os objetivos institucionais das entidades de que trata este artigo, previstos nos respectivos estatutos ou atos constitutivos."



Com efeito, nas hipóteses em que a Constituição da República exige lei complementar para versar sobre certas matérias, isso é feito de modo expresso, como se observa no próprio art. 146, o qual, entretanto, poderia ser entendido como norma geral relativa ao Sistema Tributário Nacional.


De todo modo, como a Lei n. 12.101/2009 é ordinária, cabe acompanhar os efeitos dos referidos julgados do STF sobre essa matéria, eis que não aprovada como lei complementar.


Nessa toada, vê-se, que a União, em petição protocolada em 22/12/2017 (Id. 4058300.4539651), inicialmente, mencionou que, nos termos do julgado suprareferido estaria regular a documentação alusiva ao FGTS e, quanto ao mais, restringiu-se a defender que não restaria comprovado o cumprimento ao disposto nos incisos I e II, do art. 29, da lei 12.101/2009, razão pela qual a parte autora deveria ser intimada para comprová-los.


Ocorre que, como mencionado acima, tais requisitos foram afastados por força do mencionado julgado em repercussão geral da Suprema Corte, que obriga a Entidades como o Hospital, ora Autor, a observar apenas as exigências do art. 14 do Código Tributário Nacional, cuja Lei que o instituiu tem status de Lei Complemenar, razão pela qual falece razão à União quanto a este ponto.
E, diante desse quadro, tem-se que há evidência da probabilidade do direito do Autor.


Outrossim, no que diz respeito ao risco de dano irreparável, cabe destacar que o Hospital, ora autor, como entidade que presta serviços na área da saúde, necessita urgentemente da tutela sob pena de paralisar suas atividades.


Sendo assim, preenchidos os requisitos para a concessão da tutela de urgência, há de ser deferido o pleito nesse sentido.


3. Dispositivo


Diante de todo o contexto:


a)     concedo ao Hospital autor os benefícios da assistência judiciária;


b)     defiro o pleito antecipatório liminar requestado, e determino à UNIÃO que se abstenha de exigir do Autor o recolhimento da contribuição PIS-PASEP e de levar a efeito qualquer ato tendente à cobrança do referido tributo, bem como que forneça ao Hospital autor as imprescindíveis certidões negativas de débito (ou positiva com efeito de negativa), até ulterior deliberação deste Juízo ou de Juízo ad quem;


c)      Cumprido o acima determinado, digam as Partes se há provas a produzir, especificando-as e justificando o seu requerimento, no prazo de15( quinze) dias, contado em dobro em favor da UNIÃO e do Ministério Público (arts. 180, 183 e 186, CPC).
d) E, diante da importância social do Hospital ora Autor, tenho que se deva abrir vista ao Ministério Público Federal para, querendo, ofertar o seu d. parecer, no prazo acima indicado.


d)     Intimem-se.
Recife, 07.02.2018
Francisco Alves dos Santos Jr.
  Juiz Federal, 2a Vara-PE

(lsc)

Nenhum comentário:

Postar um comentário