quinta-feira, 12 de novembro de 2015

NÃO INCIDE JUROS DE MORA NO PERÍODO DE ESPERA PARA CONSOLIDAÇÃO DA DÍVIDA A SER PARCELADA. LEI 11.941, DE 2009.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.

Segue uma sentença na qual se discute interessante matéria, pertinente à incidência ou não de juros de mora quando a demora não pode ser debitada ao Contribuinte, mas sim à própria Fazenda Nacional. 
Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0803454-51.2013.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTOR: T D S/A
ADVOGADO: E F DE S(e outros) 
RÉ: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL



 
Sentença registrada eletronicamente
Sentença tipo B


EMENTA: TRIBUTÁRIO. PARCELAMENTO DO REFIS. LEI N.º 11.941/09. JUROS DE MORA NO PERÍODO DA ADESÃO À CONSOLIDAÇÃO DA DÍVIDA. IMPOSSIBILIDADE. 

-Os juros de mora nas dívidas tributárias só incidem, por óbvio, quando o Contribuinte está em mora. 
-Não se caracteriza como mora do Contribuinte o período em que este adere a um parcelamento legal até a data em que o Órgão próprio da Fazenda Nacional consolida a dívida e define o valor das parcelas. No mencionado período, quem ficou em mora foi a Fazenda Nacional, que demorou a concretizar a consolidação por falhas na sua infraestrutura. O princípio da moralidade administrativa não admite reverter essa falha da Fazenda Nacional para os ombros do Contribuinte.

-Procedência.




Vistos, etc.

1. Relatório

A T D S.A. ajuizou esta ação ordinária declaratória de cobrança indevida de juros c/c pedido de repetição de indébito em face da UNIÃO (FAZENDA NACIONAL). Requereu, inicialmente, a distribuição por dependência ao Processo nº 0802728-77.2013.4.05.8300 - Cautelar Inominada em trâmite nesta 2ª Vara.
O processo foi distribuído, por equívoco, à outra Vara Federal, havendo sido redistribuído a esta Vara mediante despacho datado de 21.10.2013.
Alegou a Autora, em síntese, que: em 20 de setembro do ano de 2013, teria sido proferida decisão, deferindo, liminarmente, a pleiteada medida cautelar e determinando que a UNIÃO, por seu órgão próprio, se abstivesse de excluir a ora Requerente do parcelamento da Lei nº 11.941, de 2009, caso esta propusesse ação judicial, buscando excluir do total do parcelamento itens financeiros, relativos a juros e multa, dentre outros, os quais não deveriam ter sido incluídos no noticiado parcelamento; que em conformidade com a dita decisão estaria propondo esta Ação Principal nos termos e prazos dos artigos 806 e 807 do Código de Processo Civil e que, assim, deveria ser mantida a medida cautelar, até o trânsito em julgado deste feito principal.
No tópico intitulado "Do Passivo tributário da Autora e Parcelamento Instituído pela Lei 11.941/09" a Autora aduziu que: seria empresa que atuaria no ramo de distribuição de combustíveis; que possuindo débitos no âmbito administrativo federal, oriundos de PIS, COFINS, CSLL e IRPJ, teria aderido, em 10.04.2000, ao Programa de Parcelamento Especial- REFIS, tendo sido excluída por inadimplência; que com a edição da Medida Provisória nº 303 de 29.06.2006, instituidora do PAEX, teria aderido a este programa de parcelamento tendo incluído a totalidade de seus débitos; que após sua exclusão do PAEX[1], por inadimplência por 06 meses consecutivos, e por ocasião da publicação da Lei nº 11.941, de 27.05.2009, instituidora de Parcelamento Federal, teria incluído seus débitos neste programa, e estaria inserida neste parcelamento até o presente momento; que o apelidado de "Refis da Crise", em razão de ter sido promulgado no auge da crise financeira de 2008, teria possibilitado o parcelamento em até 180 (cento e oitenta) meses dos débitos vencidos até 30.11.2008 administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), bem como dos débitos já em ou em vias de cobrança judicial através da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), inclusive o saldo remanescente dos débitos consolidados em antigos parcelamentos (v. g. REFIS, PAES, PAEX e parcelamento ordinário); que além do prazo de 180 (cento e oitenta) meses, o §3º do art. 1º da Lei nº 11.941/09 teria trazido a possibilidade de significativas reduções dos juros e das multas incidentes sobre o valor principal, variando de acordo com o número de parcelas optadas pelo devedor, além de reduzir em 100% (cem por cento) o "encargo legal do débito" e que para fazer jus a tais benefícios, o contribuinte deveria aderir ao parcelamento até o dia 30.11.2009, confessar todos os seus débitos, renunciar a eventuais impugnações e pagar uma parcela mínima mensal de R$ 100,00 (cem reais) enquanto a RFB e a PGFN consolidavam o valor total do débito, que ao final seria dividido pelo número de parcelas optadas pelo devedor. Transcreveu quadro sinótico com o resumo das benesses previstas na citada norma, para melhor visualização dos benefícios concedidos pela Lei nº 11.941/09. Continuou, dizendo: que teria aderido e cumprido rigorosamente todas as fases estabelecidas pela Lei nº 11.941/09, posteriormente regulamentada pela Portaria Conjunta PGFN/RFB N. 06, de 22.07.2009; que recebida a consolidação dos seus débitos, nos termos dos "Recibos de Consolidação" teria verificado que fora incluído nas suas parcelas mensais um valor de "Juros de Mora", incidente no período entre a data da adesão ao parcelamento e a data da efetiva consolidação realizada pela Parte Ré; que não estava em mora no período entre a adesão e a consolidação do parcelamento; que viria pagando as parcelas mínimas, conforme reconhecido nos Extratos dos pagamentos da Lei n. 11.941/2009, utilizados para amortização da Dívida antes da Conclusão da Consolidação; que não se justificaria a cobrança dos referidos "Juros" que inflacionam indevidamente a parcela mensal da Autora em R$ 130.902,97 (cento e trinta mil, novecentos e dois reais e noventa e sete centavos), assim como, o reflexo desse valor nas parcelas pagas após a consolidação e que igualmente, após a consolidação de cada parcela, a RFB aplicaria os juros SELIC integralmente sobre o valor do tributo, da multa, da própria SELIC e dos honorários, por ocasião de cada pagamento mensal a ser efetuado da parcela assim consolidada.  Transcreveu quadro sinótico com o resumo da modalidade "Parcelamento de Saldo Remanescente dos Programas REFIS, PAES, PAEX e Parcelamentos Ordinários - Art. 3º - Demais Débitos no Âmbito da PGFN", extraído do "Recibo de Consolidação"[2], para melhor vislumbrar a composição de cada parcela e consequentemente a aplicação da taxa Selic no cálculo. Alegou que a SELIC incidiria sobre a própria SELIC antes consolidada e sobre a multa; que tal fato implicaria na incidência de juros sobre juros, ou seja, implicaria na imposição de juros compostos o que oneraria desmedidamente o pagamento de tais prestações do parcelamento com o correr do tempo; que nos juros cobrados na composição da Prestação Básica estariam embutidos os juros sobre a Multa de Ofício, também veemente combatido; que a Taxa SELIC, objeto de diversos pronunciamentos judiciais, mormente do Superior Tribunal de Justiça, englobaria correção monetária e juros de mora e teria passado a ser aplicada a partir da extinção da indexação dos valores prescritos na legislação fiscal pelo artigo 30 da Lei nº 9.065/1995 e sua exigência se deu pelo artigo 13 da mesma lei; que a partir da entrada em vigor da mencionada Lei nº 9.065/95, vencido o crédito tributário, se revelaria aplicável a Taxa SELIC, a título de correção monetária e juros moratórios, o que agravaria mais o quadro exposto, pois o mesmo se apresentaria como de correção sobre correção e juros sobre juros; que não somente a taxa SELIC padeceria deste vício, mas também a Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP, prevista como aplicável aos parcelamentos de longo prazo do REFIS III (PAEX), instituído pela MP 303/2006, caso em que também se enquadraria a Autora, vez que também teria aderido àquele Parcelamento, conforme comprovariam os documentos[3]; que por serem totalmente indevidas tais cobranças, não teria restado alternativa senão vir perante o Judiciário rogar que tais valores cobrados a título de "juros de mora" entre a adesão e a consolidação ao Parcelamento da Lei nº 11.941/2009, fossem restituídos e excluídos das parcelas mensais vincendas da Autora. Teceu outros comentários. Fundamentou seu direito na Constituição Brasileira/88, em legislação e precedentes de tribunais.
R. decisão[4] que indeferiu o pedido liminar e determinou a citação da Fazenda Nacional.
A União (AGU/PGFN), por seu Procurador da Fazenda Nacional, apresentou contestação[5]. Em preliminar de mérito apontou a ocorrência da prescrição. No mérito, fundamentou sua defesa esclarecendo a essência do parcelamento tributário concedido pelo REFIS, da legitimidade da incidência dos juros durante o período de adesão até a determinação do valor consolidado do débito (cuja consolidação se refere à data do requerimento). Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos.
A parte Autora apresentou réplica[6] à contestação da União.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório.
Decido.

2. Fundamentação

O feito comporta julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 330, I, do CPC, por cuidar exclusivamente de matéria de direito, prescindindo de dilação probatória.

2.1 - Da prescrição
No concernente à arguição de prescrição, cumpre lembrar que conforme previsto no artigo 1º do Decreto nº 20.910/32, "todo e qualquer direito ou ação contra a fazenda pública, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem". O pedido de consolidação[7] do parcelamento foi realizado pela Ré em 14.10.2009, data em que se inicia o cômputo do prazo prescricional. Tendo em vista que a ação foi ajuizada em 21.10.2013, não houve prescrição, pelo que  a respectiva exceção não merece acolhida.

2.2 - Passo ao exame do mérito.
Cinge-se a demanda em definir se os encargos incidentes no período de consolidação do débito, no parcelamento do "REFIS da crise", devem sofrer a incidência de juros moratórios.
A Lei nº 11.941, de 2009, tendo em vista a gigantesca carga tributária no Brasil e a crise ocorrida no mundo capitalista no ano de 2008, adveio para possibilitar o pagamento dos tributos federais, com redução dessa carga, criando nova forma de parcelamento e permitindo a migração de parcelamentos já existentes para ou por ela criado.
Conforme expressa previsão legal, antes da consolidação do parcelamento, competia aos contribuintes o pagamento da prestação mensal no valor de R$ 100,00 (cem reais), a partir da efetivação da adesão, quantia que, no caso, foi paga por aproximadamente 22 (vinte e dois) meses, enquanto o Órgão próprio da Fazenda Nacional fazia os cálculos e definia o valor total a ser parcela e os valores de cada parcela.
Observo que a questão combatida pela parte Autora limita-se à da impossibilidade de cobrança de juros de mora (sobre o valor principal e sobre a multa de ofício), entre o início da adesão e a consolidação do parcelamento.
É verdade que o § 1º do art. 155-A do CTN dispõe que o parcelamento do crédito tributário, salvo disposição de lei em contrário,  não afasta a incidência de juros e multas[8].
Mas se extrai dos dispositivos desse Código que só incidem juros de mora quando, por óbvio, o Contribuinte fica em mora.
No presente caso, a referida Lei de Parcelamento excluiu quase todos os acréscimos da dívida tributária do Contribuinte e parcelou o que restou, com a finalidade extrafiscal de trazer para o mercado muitos Contribuintes que estavam sob a ameaça de sucumbir no campo empresarial, que pela excessiva carga tributária, quer pela crise econômico-financeira nos Países desenvolvidos, especialmente nos Estados Unidos da América - EUA, que se refletia aqui no Brasil.
A Autora então aderiu ao referido parcelamento e, por falhas na infraestrutura de Órgão calculador da Fazenda Nacional, ficar a esperar por longos meses a consolidação do parcelamento, para poder implementá-lo e, enquanto isso, por força de dispositivo da própria Lei, ficou a pagar uma parcela mensal simbólica de R$ 100,00.
Então feriria o princípio da moralidade administrativa dela cobrar juros de mora no período em que a Fazenda Nacional, por falha na sua infraestrutura, não consolidou a sua dívida e permitiu que a Autora ficasse pagando mencionada valor simbólico.
Logo, a Autora, no mencionado período, não estava em mora. Na verdade, quem ficou em mora foi a Fazenda Nacional, pelo Órgão que deveria concretizar a consolidação da dívida.

Dispositivo


Posto isso:

a) rejeito a exceção de prescrição, arguida pela UNIÃO;

b) julgo procedentes os pedidos e condeno a UNIÃO, por seu órgão próprio, a excluir do total da dívida parcelada da Autora os valores de juros de mora do período de tempo da adesão até a consolidação da dívida, vale dizer, e, se o parcelamento ainda estiver em andamento, que seja recalculado com abatimento do valor de tais juros de mora e, caso já se tenha findado, que o respectivo valor seja restituído à Autora ou então, de acordo com opção desta, ficara autorizada a compensar mencionado valor com outras dívidas tributárias, observadas as regras legais pertinentes, sendo que, em qualquer hipótese, mencionado valor há de ser atualizado pelos índices da tabela SELIC, dando-se o processo por extinto, com resolução do mérito(art. 269, I, CPC). 
Outrossim, condeno a UNIÃO no pagamento de honorários advocatícios, que, à luz o § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil, arbitro em R$ 7.000,00 (sete mil reais), atualizados(correção monetária e juros de mora)a partir do mês seguinte ao da publicação desta sentença, pelos índices do Conselho da Justiça Federal, bem como a ressarcir as custas despendidas pela Autora, atualizadas pelos índices da tabela SELIC, em face da sua natureza tributária.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Recife, 05 de novembro de 2015.

Francisco Alves dos Santos Jr.
  Juiz Federal, 2a Vara-PE.






(mef)


[1] Exclusão do PAEX NUM: 230878.
[2] Recibo de Consolidação NUM: 230878.
[3] Demonstrativos de pagamento e Saldos sintéticos do PAEX NUM: 230907 e 230909
[4] Decisão NUM: 235509.
[5] Contestação NUM: 286278.
[6] Réplica NUM: 312649.
[7] Recibo de Consolidação de parcelamento NUM: 230985.
[8] Art. 155-A. O parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)
§ 1o Salvo disposição de lei em contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a incidência de juros e multas. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)
[9] Art. 155-A. O parcelamento será concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica.
(...)
§ 1o Salvo disposição de lei em contrário, o parcelamento do crédito tributário não exclui a incidência de juros e multas.


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