terça-feira, 29 de janeiro de 2013

MANDADO DE SEGURANÇA: AUSÊNCIA DE PROVA. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL.



 





Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Na sentença que segue, discute-se o problema da falta de comprovação, em mandado de segurança, do ato inquinado de ilegal e/ou abusivo. 
O Advogado, neste tipo de ação judicial, tem que ter toda cautela na colheta e apresentação da prova, pois a Lei que trata do assunto não admite dilação probatória na tramitação do processo. Caso o Advogado não consiga, antes da impetração do mandado de segurança, as provas na repartição pública ou em qualquer lugar onde elas se encontrem, deve informar esse fato ao Juiz e requerer que este as requisite, pois se não tomar essas providências o Juiz examinará apenas as provas que forem acostadas com a petição inicial. E, caso as provas que instruem a petição inicial não forem suficientes, como no presente caso, o Juiz não pode, sequer,  apreciar o mérito da demanda.  

A minuta do Relatório e a pesquisa foram feitas pela Assessora Rossana Marques. 
 

                                                                     PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 0020782-61.2012.4.05.8300  Classe: 126 - MANDADO DE SEGURANÇA
IMPETRANTE: M. A. A. DE P.
Adv.: F. A. C. V. S, OAB/PE nº
IMPETRADO: SUPERINTENDENTE REGIONAL DA POLÍCIA FEDERAL EM PERNAMBUCO

Registro nº ...........................................
Certifico que ........ registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2013

Sentença tipo C

EMENTA: - PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA.

- Ausente a prova da existência do ato inquinado de ilegal e abusivo, não prospera o mandado de segurança.

- Indeferimento da petição inicial, negação da segurança e Extinção do processo sem resolução do mérito.

Vistos etc.

M. A. A. DE P., qualificado na Petição Inicial, impetrou, em 10.12.2012, o presente mandado de segurança, com pedido de liminar, contra ato denominado ilegal  que teria sido praticado pela SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DA POLÍCIA FEDERAL EM PERNAMBUCO, por meio do DELEGADO CHEFE DA DELEGACIA DE CONTROLE DE ARMAS E PRODUTOS QUÍMICOS – DELEAQ, da SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DA POLÍCIA FEDERAL EM PERNAMBUCO, o qual teria indeferido requerimento do Impetrante de autorização de Porte Federal de Arma de Fogo. Sustentou, inicialmente, a tempestividade deste Mandado de Segurança, pois, conforme poderia se observar dos autos, a decisão que teria inferido o mencionado requerimento seria datada de 09 de setembro de 2012, todavia, o Impetrante apenas teria tomado ciência da referida decisão no dia 19/09/2012, razão pela qual seria tempestiva a presente impetração; que teria ingressado com mencionado requerimento em 05 de outubro de 2011, observando todos os requisitos exigidos pela Lei nº 10.826/2003 e da Instrução Normativa nº 23/2005; que, de acordo com a referida IN nº 23/2005, apenas ficaria a critério da discricionariedade da Autoridade Policial “OUTRAS” profissões diversas das exemplificadas nos incisos do art. 2º do art. 18 da IN nº 23/2005; que as profissões contidas no rol do art. 18 da IN nº 23/2005, por si só, seriam consideradas atividade profissional de risco, ou seja, a referida norma vincularia o agente público, e não permitiria que o mesmo atuasse de forma discricionária; que, somente o fato de o Impetrante ser coordenador (gerente) de empresa de segurança privada, desde que preenchesse os demais requisitos exigidos pelo mencionado art. 18 da IN nº 23/2005, teria direito líquido e certo de ter autorizado o Porte Federal de Arma de Fogo; que, todavia, o Delegado Chefe da Delegacia de Controle de Armas e Produtos Químicos teria indeferido o citado requerimento sob a alegação de que  caberia analisar a oportunidade e a conveniência no momento de considerar ser ou não a atividade do Impetrante de risco. Teceu outros comentários, e requereu a concessão da medida liminar a fim de ser garantido ao Impetrante o direito de obter autorização para o Porte Federal de Arma de Fogo; a intimação da autoridade apontada coatora para prestar informações; a concessão definitiva da segurança. Atribuiu valor à causa e juntou instrumento de procuração e cópias de documentos, fls. 10/94.  
Certificada a exatidão do recolhimento das custas processuais, fl. 95.
Proferida r. decisão determinando que fossem requisitadas as informações à Autoridade apontada coatora e, após, que os autos fossem conclusos para apreciação do pedido de liminar, fl. 95-vº.
Certidão atestando o decurso do prazo sem que a autoridade apontada coatora houvesse apresentado suas informações, fl. 99.

É o relatório. Passo a decidir.

Fundamentação

1.  Primeiramente, devo analisar se o provimento jurisdicional pleiteado coaduna-se com a via estreita do mandado de segurança, remedium juris para proteção de direito líquido e certo, decorrente de fato ilegal ou abusivo, comprovado de plano, não se admitindo dilação probatória.

A respeito dos documentos que devem instruir a Inicial no Mandado de Segurança, Nelson Nery Júnior[1] ensina, verbis:

“A prova do mandado de segurança é prima facie e pré-constituída e deve vir com a exordial a prova inequívoca do alegado cerceamento de defesa.”

Segundo Hely Lopes Meirelles, nos termos da legislação pertinente, direito líquido e certo, no mandado de segurança, é aquele comprovado de plano. Assim, é que não há que se falar em instrução probatória no mandado de segurança, de modo que as provas capazes de demonstrar a liquidez e certeza do direito alegado podem ser de todas as modalidades por lei admitidas, desde que acompanhem a Inicial.[2]

Ainda conforme ensinamento de Hely Lopes Meirelles, distingue-se o Mandado de Segurança das demais ações civis pela sumariedade de seu procedimento e pela especificidade de seu objeto, eis que visa, precipuamente, à invalidação de atos de autoridade ou à supressão de efeitos de omissões administrativas capazes de lesar direito individual ou coletivo, líquido e certo.[3]

Celso Antônio Bandeira de Mello assim conceitua direito líquido e certo2:

“Considera-se ‘líquido e certo’ o direito, ‘independentemente de sua complexidade’, quando os fatos a que se deva aplicá-lo sejam demonstráveis ‘de plano’: é dizer, quando independam de instrução probatória, sendo comprováveis por documentação acostada quando da impetração da segurança ou, então, requisitada pelo juiz a instâncias do impetrante, se o documento necessário estiver em poder de autoridade que recuse fornecê-lo (art. 5º, parágrafo único da Lei nº 1.533/51).”

O direito líquido e certo resulta, pois, de fato comprovado de plano.

Há a exceção prevista no § 1º do art. 6º da Lei nº  12.016, de 2009, que já existia na Lei que anteriormente regulamentava o mandado de segurança, segundo a qual, caso a Autoridade negue-se, na via administrativa, a fornecer ao Administrado a prova do ato ou respectiva certidão, pode e deve o Impetrante informar isso para o Juiz e então este, preliminarmente, determina a quem de direito que apresente mencionada prova, sob pena de busca e apreensão. Mas essa situação não se faz presente neste mandado de segurança, pois não foi indicada na petição inicial.

2. Neste mandado de segurança, o Impetrante insurge-se contra ato, que adjetiva de ilegal,  que teria sido praticado pelo Ilmº Sr.  DELEGADO CHEFE DA DELEGACIA DE CONTROLE DE ARMAS E PRODUTOS QUÍMICOS – DELEAQ, no dia 09 de setembro de 2012, ato que teria consistido no indeferimento de requerimento do Impetrante de concessão de Autorização de Porte Federal da Arma de Fogo.

No entanto, como será demonstrado, o Impetrante não acostou aos autos o mencionado ato administrativo.

Com efeito, o Impetrante juntou apenas um Parecer, datado de 09.08.2012, assinado por mencionada Autoridade, sugerindo que o requerimento do Impetrante fosse indeferido e encaminhado à Autoridade competente para a concessão de Porte de Arma de Fogo Federal, conforme cópia de fls. 28/31.

Sem a comprovação do ato administrativo, adjetivado pelo Impetrante de ilegal e abusivo, não há como a seu respeito tomar qualquer decisão.

           Nesse sentido, o E. Superior Tribunal de Justiça, por sua Primeira Seção, pacificou o seu entendimento jurisprudencial,  in verbis:

“EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. REQUISITOS. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. CASSAÇÃO DA LIMINAR.
1. (...).
2. O Mandado de segurança - remédio de natureza constitucional - visa a proteção de direito líquido e certo, exigindo a constatação de plano do direito alegado, e por ter rito processual célere não comporta dilação probatória.
3. Dessarte, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de ser contemplado em norma legal, ser induvidoso (certo e incontestável).
1 MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de Segurança. 25. ed., atualizada por Arnoldo Wald e Gilmar Ferreira Mendes. Malheiros: São Paulo. 2003, p. 36 e 37.
4. Dependendo seu exercício de situações e fatos ainda indeterminados, o direito não enseja o uso da via da segurança, embora possa ser tutelado por outros meios judiciais.
5. Agravo regimental provido para cassar a liminar.” (STJ, Primeira Seção, AGRMS 9366/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 26/04/2004)

                No mesmo sentido, há precedentes do nosso E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, dentre os quais destaco apenas um por questão de economia processual(tinta, papel, tempo e espaço):

EMENTA: ADMINISTRATIVO. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO DE EXCOMBATENTE. FILHA MULHER E SOLTEIRA. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. IMPROPRIEDADE DA VIA MANDAMENTAL.
1 - A AÇÃO MANDAMENTAL PRESSUPÕE SEMPRE A EXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO, QUE É JUSTAMENTE AQUELE QUE SE APRESENTA MANIFESTO NO MOMENTO DA IMPETRAÇÃO.
2 - NO CASO PRESENTE, OBJETIVANDO A IMPETRANTE O RECEBIMENTO DA PENSÃO POR  MORTE DEIXADA POR SEU GENITOR E, INEXISTINDO PROVA CABAL, CERTA E PRECONSTITUÍDA DO FATO ALEGADO, RESTA INCABÍVEL A VIA MANDAMENTAL, VEZ QUE A MESMA NÃO SE PRESTA A DILAÇÃO PROBATÓRIA.
3 - APELAÇÃO IMPROVIDA.
(TRF 5ª Região, 2ª Turma, AMS 64174/PE, Rel. Des. Federal Petrúcio Ferreira, DJ de 07/05/1999, p. 609)

3. No relatório supra, vê-se que a Autoridade apontada como coatora, embora regularmente notificada, descumpriu sua obrigação legal e não apresentou tais informações.

 O silêncio dessa Autoridade não comporta o fenômeno processual da confissão, em face da indisponibilidade do bem em debate, qual seja, a segurança pública, indisponibilidade essa, aliás, prevista no inciso II do art. 320 do Código de Processo Civil, aqui aplicado subsidiariamente.   

Esse desrespeitoso silêncio dessa Autoridade importa, sim, em descumprimento de dever funcional, que pode desbordar para alguma infração na área criminal, devendo, por isso, a Chefia da Autoridade apontada como coatora ser cientificada, para os fins administrativos pertinentes, bem como o Ministério Público Federal, para os respectivos fins administrativos e criminais.   

                4. Assim, diante da situação acima descrita e das regras do art. 10 da Lei nº 12.016/2009[4], resta-me indeferir a petição inicial, sem resolução do mérito, negando a segurança pleiteada.

Conclusão:
POSTO ISSO, indefiro a Petição Inicial, NEGO a segurança pleiteada e extingo o processo sem resolução do mérito(CPC, arts. 267-I e 295-V c/c art. 10 da Lei nº 12.016/2009).
Sem custas, ex lege.
Sem honorários, ex vi art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009[5].
Após o encaminhamento das representações indicadas na fundamentação supra, à Chefia da Autoridade apontada como coatora e ao Ministério Público Federal, para os fins ali indicados, e depois do trânsito em julgado desta sentença, determino seja o feito arquivado, com baixa na Distribuição.
P. R. I.

Recife ,  29 de janeiro de 2013.

Francisco Alves dos Santos Júnior
       Juiz Federal da 2ª Vara-PE



[1] NELSON NERY JÚNIOR, Código de Processo Civil Comentado, Ed. 4ª, São Paulo: Revista dos Tribunais.1999, p. 2431. 
[2] Hely Lopes Meirelles. Mandado de Segurança. 19.ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 35.
[3] Hely Lopes Meirelles. Mandado de Segurança. 19.ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 29.
2 CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO, São Paulo, Editora Malheiros, 1999, p. 171. 
[4] Lei nº 12.016, de 2009:
Art. 10.  A inicial será desde logo indeferida, por decisão motivada, quando não for o caso de mandado de segurança ou lhe faltar algum dos requisitos legais ou quando decorrido o prazo legal para a impetração. 
[5] Art. 25. Não cabem, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. (G.N.)

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