quarta-feira, 8 de março de 2023

DENTISTA(ODONTÓLOGO, CIRURGIÃO DENTISTA) X MUNICÍPIOS. PISO NACIONAL DE SALÁRIO.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Segue interessante decisão, à luz da atual jurisprudência do STF e do TRF5R, a respeito da desnecessidade de os Municípios adotarem os pisos e cargas horárias com relação aos Odontólogos(Dentistas), fixados na Lei 3.999, de 1961, quando os contratarem sob relação jurídica estatutária, ficando obrigados a seguir as regras dessa Lei Ordinária Federal apenas na contratação pelo sistema da Consolidação das Leis Trabalhistas.


Obs.: Pesquisa de jurisprudência e parte da minuta elaborada pela Assessora Ana Carolina Freitas Souza.


PROCESSO Nº: 0801168-22.2023.4.05.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO
AGRAVANTE: MUNICIPIO DE PACAJUS - PREFEITURA MUNICIPAL
ADVOGADO: H S R e outro
AGRAVADO: CONSELHO REGIONAL DE ODONTOLOGIA DO CEARA
ADVOGADO: Allex Konne De Nogueira E Souza e outros
RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Francisco Alves dos Santos Júnior - 5ª Turma
JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal

   

DECISÃO

1. RELATÓRIO

1.1 - Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto pelo MUNICÍPIO DE PACAJUS em face da r. decisão interlocutória proferida pelo MM. Juízo da 10ª Vara da Seção Judiciária do Ceará, nos autos da Ação Civil Pública nº 0821052-21.2022.4.05.8100, que deferiu a tutela provisória de urgência para determinar que o Agravante: (a) procedesse à imediata suspensão da seleção pública regulada pelo Edital n° 001/2022, apenas com relação ao Cirurgião-Dentista, e (b) procedesse à retificação do Edital n. 001/2022 para promover a adequação do deste ao disposto na Lei n. 3.999/61 em relação ao cargo de Cirurgião-Dentista, observando-se para tanto a devida proporção entre a carga horária exigida e a respectiva remuneração (20 horas com remuneração mínima de R$ 3.636,00 ou 40 horas com remuneração mínima de R$ 7.272,00).

1.2 - Eis o teor da ementa da r. decisão agravada:

"EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. MUNICIPAL. LEGITIMIDADE DOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS. CIRURGIÃO-DENTISTA. PISO SALARIAL. APLICABILIDADE DA LEI Nº 3.999/61 DEFERIMENTO DO PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA.

- Trata-se de Ação Civil Pública, com pedido de tutela de urgência, ajuizada pelo CONSELHO REGIONAL DE ODONTOLOGIA DO CEARÁ - CRO/CE em face do MUNICÍPIO DE PACAJUS-CE, objetivando a retificação do Edital do Concurso Público n° 001/2022 para fins de retificar a remuneração prevista para o cargo de cirurgião-dentista em obediência ao disposto na Lei 3.999/61.

- O Conselho Regional de Odontologia tem legitimidade para propor a presente ação civil pública, uma vez que se enquadra no rol dos legitimados para propositura da ação civil pública taxativamente descrito no artigo 5º da Lei n. 7.347/85. (REsp 1881188/CE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/05/2021, DJe 24/05/2021 )

- A Constituição da República Federativa do Brasil enuncia, em seu artigo 22, inciso XVI, que compete privativamente a União legislar sobre 'organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões.'

- A CRFB/1988, em seu artigo 37, inciso I, preceitua que 'os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei'.

- Nesse passo, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 1.127.495/CE em 27.11.2019, reiterou entendimento consolidado do Plenário da Corte de que a União, ao legislar sobre condições de trabalho, inclusive teto remuneratório e carga horária, exerce, legitimamente, as atribuições que lhe foram conferidas, em caráter privativo, pela Carta Política, sem que isso represente transgressão à prerrogativa básica da autonomia dos demais entes federados.

- A Lei Federal n. 3.999, de 15 de dezembro de 1961, que rege a profissão de médicos e cirurgiões-dentistas, fixa o piso salarial a ser observado aos cirurgiões-dentistas em quantia igual a três vezes o salário-mínimo para carga horária de 20 (vinte) horas semanais, conforme artigos 5º e 8º c/c artigo 22, in verbis: (...).

- Extrai-se da legislação e da jurisprudência que as disposições da Lei n. 3.999/1961 relativas à carga horária e ao piso profissional devem ser observadas tanto em relação aos trabalhadores celetistas quanto àqueles regidos pelo direito público.

- Destaca que já decidido, por unanimidade, pelo STF, na ocasião do julgamento efetuado no bojo da ADPF 325, com trânsito em julgado inclusive e, tal precedente vinculante, portanto, de observância obrigatória para as demais instâncias do Poder Judiciário, tendo em vista o julgamento em sede de controle concentrado de constitucionalidade e o disposto no art. 927, I, do CPC, sendo dotado também de eficácia erga omnes, que a Corte Constitucional reconheceu a compatibilidade da referida lei federal com a Constituição Federal de 1988.

- Desse modo, presente se encontra a probabilidade do direito defendido pelo Conselho.

- Resta consubstanciada na hipótese o perigo da demora, uma vez que o certame questionado encontra-se em estágio avançado de realização.

- Pontua-se que a determinação de retificação do edital gera consigo impacto direto no orçamento originariamente previsto para o quantitativo de vagas ofertadas, bem assim pela eventual diminuição da carga horária semanal e possível necessidade do aumento do número de profissional ou respectivo aumento da remuneração prevista proporcionalmente à carga horária exigida (40h), tais questões devem ser apreciadas discricionariamente pelos respectivos gestores municipais, adaptando da forma como entender melhor para as contas municipais e atendimento da população.

- Assim, em análise perfunctória dos autos, própria desta fase processual, vislumbra-se preenchidos os requisitos autorizadores para concessão da tutela de urgência, eis que os fundamentos fáticos e jurídicos narrados na inicial apresentam-se como prova inequívoca da verossimilhança das alegações.

- Deferimento do pedido de tutela provisória de urgência."

1.3 - Em suas razões recursais, o Agravante aduziu, em síntese, que:

"(i) não constaria da petição inicial qualquer pedido de suspensão ou paralisação do certame;

(ii) o deferimento da tutela de urgência antecipada ocasionaria indiretamente reflexos nas despesas com profissionais que já ocupam o cargo de Dentista ou Cirurgião-Dentista, sem dotação orçamentária prevista para tanto (sem estudo de impacto orçamentário);

(iii) o vencimento base e a jornada de trabalho dos cargos públicos de Cirurgião-Dentista, teriam sido consolidados através da Lei Municipal nº 1.031/2022, conforme quadro geral de servidores efetivos visto no seu Anexo I;

(iv) além do vencimento base, haveria também previsão de Adicional de Insalubridade para os Cirurgiões Dentistas dos PSF's, determinado após a edição da Lei Municipal nº 1.001/2022, que estabeleceu o valor de 20% (vinte por cento) sobre o salário-base;

(v) o quadro efetivo seria regido pela Lei Complementar Municipal nº 01/2009, que instituira o Estatuto dos Servidores Públicos da Administração Direta do Município de Pacajus e o concurso público vindouro não selecionaria funcionário público-celetista;

(vi) os servidores ocupantes de cargo público efetivo seriam estatutários, estando sujeitos a um regime jurídico administrativo totalmente diferenciado dos celetistas, imposto unilateralmente pelo Estado, não se podendo acolher o mesmo paradigma adotado para os demais trabalhadores (celetistas), ou seja, não seria possível impor ao Município-Agravante o piso salarial estabelecido na Lei Federal arguida, pois a fixação dos vencimentos do servidor público seria matéria de natureza administrativa que afeta à própria autonomia do ente municipal.

(vii) aos Servidores Municipais não se aplicariam as disposições contidas na Lei nº 3.999/1961, em razão deles serem regidos pelo regime legal estatutário e não pela CLT;

(viii) caso o Município quisesse majorar os vencimentos de seus servidores públicos, deveria encaminhar Projeto de Lei à Câmara Municipal nesse sentido, haja vista que, segundo o artigo 37, X da CF a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o §4º do art. 39 somente poderiam ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices, assim como o Município deveria juntar justificativa da criação de cargos públicos e apresentar o estudo de impacto orçamentário, em respeito ao art. 16, incisos I e II da Lei de Responsabilidade Fiscal (LCP nº 101/2000);

(ix) a iniciativa legislativa de aumentos salariais, caberia ao Chefe do Poder Executivo Municipal, como previsto no artigo 81, II, da Lei Orgânica de Pacajus;

(x) seria impossível o reajustamento de remuneração de servidor público sob o fundamento de violação ao princípio da isonomia, pois tal tese fere a
jurisprudência consolidada do STF, pacificada na Súmula Vinculante nº 37;

(xi) de acordo com o disposto na Carta Magna de 1988, o salário-mínimo, em hipótese nenhuma, poderia ser usado como índice indexador, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;

(xii) seria vedada, por força do disposto no art. 1º, §3º, da Lei 8437/92, a concessão de liminar satisfativa contra a Fazenda Pública, pela qual se esgote o objeto da ação, com a antecipação do provimento judicial perseguido."

1.4 - À luz desses argumentos, o Agravante requereu fosse o presente recurso recebido e, em seguida, fosse-lhe concedido efeito suspensivo, eximindo-se o Município de Pacajus-CE de aplicar os vencimentos e a jornada de trabalho previstos na Lei Federal nº 3.999/1961 ao cargo público de Cirurgião-Dentista e permitindo-se a regular continuidade do Concurso Público de Pacajus 2022/20234.

É o relatório.

2. FUNDAMENTAÇÃO

O recurso em análise merece ser conhecido porquanto observa o princípio da singularidade (recurso próprio para a insurgência), é tempestivo, foi devidamente instruído e dispensa preparo, pelo que merece ser recebido.

De acordo com o art. 1.019, I, do CPC, o relator poderá atribuir efeito suspensivo ao agravo de instrumento ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, se ela puder causar dano grave de difícil ou impossível reparação e ficar demonstrada a probabilidade do provimento do recurso.

No caso, o mérito recursal reside na necessidade ou não de adequação do Edital n° 001/2022 à Lei nº 3.999/61, que fixa o piso salarial e a jornada de trabalho para as profissões de médico e cirurgião dentista, estabelecendo o valor de três salários mínimos para uma jornada de vinte horas semanais.

Inicialmente, consigno que o art. 5º da Lei nº 3.999/1691, que fixa o piso salarial de médicos, cirurgiões dentistas e respectivos auxiliares, foi objeto da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 325/DF, julgada em 21/03/2022, oportunidade em que os Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) julgaram parcialmente procedente o pedido nela formulado, para reconhecer a compatibilidade daquele dispositivo legal com o texto constitucional e, com apoio na técnica da interpretação conforme, determinar o congelamento do valor dos pisos salariais, devendo o quantum ser calculado com base no valor do salário mínimo vigente na data da publicação da ata da sessão do julgamento.

Eis a ementa do julgado:

"Arguição de descumprimento de preceito fundamental. Piso salarial dos médicos, cirurgiões dentistas e respectivos auxiliares (Lei nº 3.999/61). Salário profissional fixado em múltiplos do salário-mínimo nacional. Alegada transgressão à norma que veda a vinculação do salário-mínimo "para qualquer finalidade" (CF, art. 7º, iv, fine). Inocorrência. Cláusula constitucional que tem o sentido de proibir o uso indevido do salário-mínimo como indexador econômico. Precedentes. Jornada especial de trabalho. Competência da União para legislar sobre direito do trabalho (CF, art. 22, I). Precedentes. 1. Distinções entre o tratamento normativo conferido pelo texto constitucional às figuras jurídicas do salário-mínimo (CF, art. 7, IV) e do piso salarial (CF, art. 7, IV). 2. A cláusula constitucional que veda a vinculação do salário mínimo "para qualquer finalidade" (CF, art. 7, IV, fine) tem o sentido proibir a sua indevida utilização como indexador econômico, de modo a preservar o poder aquisitivo inerente ao salário mínimo contra os riscos decorrentes de sua exposição às repercussões inflacionárias negativas na economia nacional resultantes da indexação de salários e preços. 3. Além disso, a norma protetiva inserida no quadro do sistema constitucional de garantias salariais (CF, art. 7, IV, fine) protege os trabalhadores em geral contra o surgimento de conjunturas político- -econômicas que constituam obstáculo ou tornem difícil a implementação efetiva de planos governamentais de progressiva valorização do salário- -mínimo, motivadas pela aversão aos impactos econômicos indesejados que, por efeito da indexação salarial, atingiriam as contas públicas, especialmente as despesas com o pagamento de servidores e empregados públicos. 4. O texto constitucional (CF, art. 7º, IV, fine) não proíbe a utilização de múltiplos do salário-mínimo como mera referência paradigmática para definição do valor justo e proporcional do piso salarial destinado à remuneração de categorias profissionais especializadas (CF, art. 7º, V), impedindo, no entanto, reajustamentos automáticos futuros, destinados à adequação do salário inicialmente contratado aos novos valores vigentes para o salário-mínimo nacional. 5. Fixada interpretação conforme à Constituição, com adoção da técnica do congelamento da base de cálculo dos pisos salariais, a fim de que sejam calculados de acordo com o valor do salário-mínimo vigente na data da publicação da ata da sessão de julgamento. Precedentes (ADPF 53-MC-Ref, ADPF 149 e ADPF 171, todos da minha Relatoria). 6. Compatível com o princípio da autonomia da vontade coletiva (CF, art. 7º, XXVI) a estipulação, em lei nacional (CF, art. 22, I), de jornada especial a determinada categoria de trabalhadores, consideradas as peculiaridades e as condições a que estão sujeitos no desempenho de suas atividades profissionais. Precedentes. 7. Arguição de descumprimento conhecida. Pedido parcialmente procedente."

(ADPF 325, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 21/03/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-080  DIVULG 27-04-2022  PUBLIC 28-04-2022)

Assim, a Corte Suprema concluiu que as Unidades da Federação, inicialmente, podem fixar pisos salariais em Leis próprias, mas não podem vincular os respectivos reajustes futuros à variação do salário mínimo, nem à variação de índices alheios à legislação da própria Unidade da Federação.

No acórdão da ADI 668/AL, o Plenário da Suprema Corte foi mais incisivo,verbis:

"PLENÁRIO
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 668 ALAGOAS
RELATOR : MIN. DIAS TOFFOLI
REQTE.(S) : GOVERNADOR DO ESTADO DE ALAGOAS
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE ALAGOAS
INTDO.(A/S) : ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE ALAGOAS
 

EMENTA
 

Ação direta de inconstitucionalidade. Inciso XII do art. 55 da Constituição do Estado de Alagoas. Vinculação de vencimentos de servidores estaduais a piso salarial profissional. Artigo 37, XIII, CF/88.
Autonomia dos estados. Liminar deferida pelo pleno desta Corte.
Procedência.
1. Enquanto a Lei Maior, no inciso XIII do art. 37, veda a vinculação de "quaisquer espécie remuneratórias para efeitos de remuneração de
pessoal do serviço público", a Constituição do Estado de Alagoas, diversamente, assegura aos servidores públicos estaduais "piso salarial profissional para as categorias com habilitação profissional específica", o que resulta em vinculação dos vencimentos de determinadas categorias de servidores públicos às variações do piso salarial profissional, importando em sistemática de aumento automático daqueles
vencimentos, sem qualquer interferência do chefe do Poder Executivo do Estado, ferindo-se, ainda, o próprio princípio federativo e a autonomia
dos estados para fixar os vencimentos de seus servidores (arts. 2º e 25 da Constituição Federal).
2. A jurisprudência da Corte é pacífica no que tange ao não cabimento de qualquer espécie de vinculação da remuneração de servidores públicos, repelindo, assim, a vinculação da remuneração de servidores do Estado a fatores alheios à sua vontade e ao seu controle; seja às variações de índices de correção editados pela União; seja aos pisos salariais profissionais. Precedentes.
3. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.

ACÓRDÃO

 Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, sob a presidência do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos e nos termos do voto
do Relator, em julgar procedente a ação direta para declarar a inconstitucionalidade do inciso XII do art. 55 da Constituição do Estado de Alagoas.
Brasília, 19 de fevereiro de 2014."[1]

Então. ficou bem claro que as Unidades da Federação, com relação aos seus Servidores Estatutários, não ficam obrigadas a adotar pisos salariais fixados em Leis diversas das suas próprias Leis.

Com relação a Odontólogos(Dentistas), caso em questão, as Unidades da Federação só serão obrigadas a adotar o respectivo piso salarial e carga horária da Lei 3.999, de 1961, se a contratação for pelo sistema da Consolidação das Leis Trabalhistas, porque nessa situação a Unidade da Federação estará agindo como se particular fosse.


Indico três julgados da Primeira Turma do STF, posteriores a mencionada ADI, onde entendimento idêntico foi adotado: RE 1361341 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 27/06/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-157  DIVULG 08-08-2022  PUBLIC 09-08-2022; ARE nº 1.209.895/PE-AgR, Primeira Turma, Redator para o acórdão o Ministro Roberto Barroso, DJe de 21/10/21; e RE 1329864 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 22/04/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-091  DIVULG 11-05-2022  PUBLIC 12-05-2022.

Há precedentes deste E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região na mesma linha de que a fixação dos vencimentos do servidor público estatutário é matéria de natureza administrativa que afeta a própria autonomia do ente federal.

Destaco:

"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSELHO PROFISSIONAL. DENTISTA. PISO SALARIAL. JORNADA DE TRABALHO. CONCURSO. MUNICÍPIO. CONTRATO TEMPORÁRIO. DESCUMPRIMENTO. LEI NO 3.999/61. IMPOSSIBILIDADE. RETIFICAÇÃO EDITAL. POSSIBILIDADE. APELO PROVIDO.

 1. Trata-se de apelação do Conselho Regional de Odontologia do Rio Grande do Norte contra sentença que julgou improcedente o pedido de retificação do edital de seleção no 001/2021, realizado pelo Município de Japi, com o escopo de ajustar os vencimentos do cargo de cirurgião dentista ao piso estatuído na Lei no 3.999/1961.

 2. O cerne da questão tratada nos autos consiste em saber se o Município está obrigado a adequar a remuneração dos dentistas ao piso salarial de três salários mínimos e jornada de trabalho de 20 horas semanais, nos termos dos arts. 5o e 8 o, "b" da Lei no 3.999/1961.

 3. Quanto à alegação de que seria inconstitucional vincular o piso salarial do odontologista ao valor do salário mínimo, o STF decidiu que tal vedação se aplica apenas a utilização do salário mínimo como indexador econômico, nos termos da ADPF no 325.

 4. O STF firmou o entendimento de que a definição do piso salarial e carga horária dos dentistas definidos pela Lei nº 3.999/61 não vincula os servidores estatutários da União, Estados e Municípios, sob pena de ofensa ao princípio da autonomia financeira e orçamentária dos entes federativos, visto que a definição ou modificação da remuneração do servidor público deve ser feita por lei específica, respeitados os limites orçamentários.

 5. A competência privativa da União para legislar sobre a organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões, consoante art. 22, XVI da Constituição, tem seu campo de incidência restrito às relações de trabalho regidas pelo regime celetista.

 6. Na espécie, a Edilidade promoveu seleção de dentistas para atender necessidade temporária de excepcional interesse público mediante contratação pelo prazo de 12 meses prorrogável até uma vez por igual período, segundo itens 13.3 e 13.8 do edital no 001/2021.

 7. O Município tem o dever de observar o piso salarial e a jornada de trabalho da categoria profissional nas admissões regidas pela CLT, como ocorre no caso dos autos.

 8. Apelação provida para para determinar que o apelado retifique o edital 001/2021 a fim de que se observem os ditames da Lei no 3.999/1961 quanto ao piso salarial e jornada de trabalho

 9. Sem honorários e custas por força do art. 18 da Lei n. 7.347/1985. "

(PROCESSO: 08102974220214058400, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL RODRIGO ANTONIO TENORIO CORREIA DA SILVA, 6ª TURMA, JULGAMENTO: 14/02/2023)

***

"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CIRURGIÃO DENTISTA. CONSELHO PROFISSIONAL. PROCESSO SELETIVO. PISO SALARIAL. APLICAÇÃO DAS DETERMINAÇÕES IMPOSTAS NA LEI Nº 3.999/61.

1. Cuida-se de apelação manejada pelo CONSELHO REGIONAL DE ODONTOLOGIA DA PARAÍBA - CRO-PB, em face de sentença que julgou improcedente o pedido, em ação civil pública por ele movida em desfavor do Município de Belém-PB, objetivando seja este compelido a retificar o Edital n.º 001/2021, que regulamenta o processo seletivo simplificado para preenchimento de vagas temporárias, para que seja observando o que dispõe a Lei n.º 3.999/61 no que tange à remuneração para cargos de cirurgião-dentista;

2. Entendeu o MM Juízo sentenciante que, no que se refere à remuneração dos servidores públicos municipais, o ente municipal se encontra sujeito às regras estatutárias estabelecidas pela Edilidade, conforme o disposto no art. 39 da Constituição, e que entender de modo contrário significaria violar a autonomia financeira e orçamentária dos municípios, obrigando-os a arcar com remunerações em desacordo com os seus limites fiscais, colocando em risco o sistema federativo;

3. A jurisprudência da colenda Segunda Turma desta Corte Regional é firme no sentido de que não se pode pretender alterar a remuneração prevista para o cargo em questão, adequando-a ao piso salarial da categoria, dado que a fixação ou alteração da remuneração dos servidores públicos apenas é admitida por lei específica, obedecendo, ainda, às regras de dotação orçamentária. Aliás, tudo indica que a fixação de piso salarial em três salários mínimos, por vinte horas de trabalhos semanais e 6 salários-mínimos para uma carga horária de 40 horas semanais, na forma estabelecida na Lei nº 3.999/61, não se coaduna com a regra do art. 7º, inciso IV, da Constituição da República, que veda "para qualquer fim" a vinculação ao salário mínimo.

4. Apelação improvida."

(PROCESSO: 08004043320214058204, APELAÇÃO CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA, 2ª TURMA, JULGAMENTO: 27/09/2022)."


Na r. decisão ora agravada do d. Juízo a quo constou o esclarecimento de que se trata de edital para contratação de Servidores Efetivos, verbis:

"O cerne da questão em exame se resume em verificar se o Município de Pacajus-Ce, ao dispor sobre a remuneração do cargo de dentista no Edital nº 01/2022 para provimentos de cargos públicos de provimento efetivo, está ou não vinculado à Lei Federal nº 3.999/61, que regula a remuneração dos profissionais da categoria dos cirurgiões dentistas.".


Dessa forma, vislumbro o requisito autorizador da concessão de efeito suspensivo à eficácia da r. decisão agravada consistente na probabilidade deste provimento do recurso, pois o edital em questão diz respeito à contratação de servidores estatutários, inclusive Odontólogos(Dentistas).

Igualmente, vislumbro o risco de dano caso seus efeitos continuem ativos, uma vez que a readequação do edital poderá ensejar danos ao orçamento do ente público e atrapalhar o andamento do certame com provas previstas para 23 de abril de 2023.

3. DISPOSITIVO

Ante o exposto, conheço do recurso de agravo de instrumento sob análise, e dou-lhe efeito suspensivo, ficando suspensos todos os efeitos da mencionada r. decisão do d. Juízo de primeiro grau, para todos os fins de direito.

Oficie-se ao r. Juízo a quo acerca desta decisão.

Às Partes, para os fins legais. 

Oportunamente, inclua-se o feito em pauta para julgamento. 

Expedientes necessários.

Recife, data da assinatura digital.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Desembargador Federal Relator

(acfs)

________________________________________

[1] Disponível em

https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=5530540

Acesso em 08.03.2023.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

DECISÃO MONOCRÁTICA DE MAGISTRADO DO TRF5R, NA QUAL NEGA, DE PLANO, PROVIMENTO A RECURSO DE APELAÇÃO DO INSS.

Por Francisco Alves do Santos Júnior

Interessante decisão na qual se aplica regra inovadora do Código de Processo Civil de 2015, que permite o Magistrado do Tribunal negar, de plano, provimento a recurso de apelação. 

Veja na decisão a respectiva fundamentação. 

Boa Leitura.

Obs.: minuta feita pela Assessora ROSSANA Maria Cavalcanti Reis da Rocha MARQUES. 


PROCESSO Nº: 0806994-13.2022.4.05.8100 - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: R L M L
ADVOGADO: Victor Coelho Barbosa e outros
RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Francisco Alves dos Santos Júnior - 5ª Turma
JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal Jorge Luis Girao Barreto

DECISÃO

1.Relatório

1.1. Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS contra r. sentença proferida na ação de procedimento comum, tombada sob o nº 0806994-13.2022.4.05.8100, pelo MM. Juiz Federal da 2ª Vara-CE, Dr. Jorge Luís Girão Barreto, que rejeitou a exceção de decadência arguida pelo Réu, acolheu a prescrição quinquenal das parcelas anteriores ao quinquênio do ajuizamento da ação,  e julgou procedente o pedido formulado na petição inicial, condenando o INSS/Réu a revisar a aposentadoria da parte autora, mediante a aplicação da regra definitiva inserta no artigo 29, incisos I e II, da Lei nº 8.213, de 1991, incluindo-se no cálculo do benefício, todas as contribuições vertidas, mormente aquelas anteriores a julho de 1994, bem como condenou o INSS ao pagamento das diferenças decorrentes da revisão da RMI, respeitada a prescrição quinquenal, atualizadas monetariamente na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal e com juros de mora, a partir da citação, no percentual de meio por cento ao mês, afastada a incidência da Lei nº 11.960/2009. Finalmente, condenou o INSS ao pagamento de honorários advocatícios, fixados nos percentuais previstos no art. 85, §§2ºe 3º, do CPC, sobre o valor da condenação, observada a Súmula nº 111 do STJ.

1.2.Nas razões da apelação, o INSS alegou que o processo deveria ser suspenso ante recursos extraordinários que teriam sido interpostos pela Autarquia Previdenciária  contra acórdãos do STJ no julgamento do Tema Repetitivo 999, e aduziu que o C. STF teria reconhecido a repercussão geral da questão no RE 1276977 (Tema 1102).  Discorreu sobre as alterações implementadas pela Lei nº 9.876/1999 na Lei nº 8.213/1991, e aduziu que a aplicação da regra de transição estabelecida no art. 3º da Lei nº 9.876/1999 não seria prejudicial aos segurados em geral, e defendeu a constitucionalidade da sistemática de cálculos ali introduzida. Acrescentou que não caberia ao Poder Judiciário afastar dispositivo legal para garantir acréscimo em benefícios previdenciárias com fundamento na isonomia. Apresentou prequestionamento, e requereu, ao final, o provimento do recurso de apelação.

1.3.Apresentadas contrarrazões pela parte autora, na qual pugnou pelo improvimento do recurso de apelação.

É o relatório.

2. Fundamentação

2.1. Inicialmente, ante a conclusão pelo C. STF, em 1º/12/2022, do julgamento do Tema 1.102, sob a sistemática de repercussão geral, não há justificativa para a paralisação do presente feito.  Assim, não merece acolhida o pedido do Apelante de suspensão do andamento do feito.

2.2. Tratando-se no presente caso de pedido de revisão de benefício previdenciário e não de concessão, é possível estimar que o proveito econômico obtido resultará em valor manifestamente inferior ao limite legal para o reexame obrigatório estabelecido no art. 496, §3º, I, do CPC.

Assim, sendo a condenação do INSS fixada em valor inferior a 1.000 salários mínimos, não merece ser conhecida da remessa necessária.

2.3. Por seu turno, é de ser conhecido o recurso de apelação do INSS, pois observa o princípio da singularidade (recurso próprio para a insurgência), tempestividade, está devidamente instruído e com dispensa do preparo pelo recorrente/INSS (art. 4º, I, da Lei 9.289, de 1996).

2.4. No que se refere à incidência da prescrição quinquenal requerida pelo INSS, resta prejudicada essa parte da Apelação da Autarquia, haja vista que a r. sentença recorrida já reconheceu a incidência da "prescrição quinquenal das parcelas vencidas em data anterior aos cinco anos contados do ajuizamento desta ação." (id. 4058100.26172878).

Do mesmo modo é de ser dada por prejudicada a Apelação do INSS no que concerne à aplicação da Súmula 111/STJ na fixação dos honorários advocatícios de sucumbência, pois na r. sentença já se consignou a aplicação do referido preceito sumular ao caso dos autos, in verbis:

"40. Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados nos percentuais previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da condenação, com exceção das parcelas vincendas, nos termos da Súmula 111 do STJ"  (id. 4058100.26172878).

Devo salientar não ter havido insurgência recursal da parte autora a respeito dos mencionados capítulos da r. sentença.

2.5. Acerca da revisão da renda mensal inicial buscada na ação de procedimento comum subjacente, a que se convencionou chamar "revisão da vida toda" ou "revisão da vida inteira", tendo em vista a pretensão de se considerar todo o período contributivo no cálculo do salário de benefício do segurado, e não apenas as contribuições posteriores a julho de 1994, como procedido pela Autarquia Previdenciária, o C. Supremo Tribunal Federal julgou o RE 1.276.977, com Repercussão Geral reconhecida (Tema 1.102), estabelecendo a seguinte tese:

"O segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da Lei 9.876, de 26.11.1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais, introduzidas pela EC 103/2019, tem o direito de optar pela regra definitiva, caso esta lhe seja mais favorável.[1] "

Destarte, encontrando-se a questão pacificada na jurisprudência pátria, não comporta maiores discussões (CPC, art. 927, III), razão pela qual incumbe a este relator, nos termos do art. 932, IV, b, do CPC, "negar provimento que for contrário a: b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos."  

Referidas disposições do Código de Processo Civil encontram-se reproduzidas no Regimento Interno desta Corte, in verbis:

"Art. 29. Ao relator incumbe:

(...)

IV - negar provimento a recurso que for contrário a:

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

(...)."

2.5.1. No caso em exame, a parte autora é titular do benefício previdenciário NB 187162428-0, com data de vigência a partir de 31/05/2018, e o INSS, consoante se infere da carta de concessão anexada aos autos (id. 4058100.25439365), considerou, no cálculo do respectivo salário de benefício, apenas as contribuições previdenciárias vertidas a partir de julho de 1994, razão pela qual aplica-se diretamente a tese cristalizada no julgamento do Tema 1.102/STF.

Com efeito, por se tratar de precedente de observância obrigatória e vinculante (art. 927, III, do CPC), prescinde do trânsito em julgado para a aplicação imediata da orientação nele firmada, consoante decidido pelo próprio C. STF, em feito análogo, in verbis:

"EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. LEGITIMIDADE. POLO PASSIVO. ASSISTÊNCIA À SAÚDE. REPERCUSSÃO GERAL. INSURGÊNCIA VEICULADA CONTRA A APLICAÇÃO DA SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO IMEDIATA DOS ENTENDIMENTOS FIRMADOS PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM REPERCUSSÃO GERAL.

1. A existência de precedente firmado pelo Plenário desta Corte autoriza o julgamento imediato de causas que versem sobre o mesmo tema, independente da publicação ou do trânsito em julgado do paradigma. Precedentes.

2. Agravo regimental a que se nega provimento[2].

Ante o exposto, a parte autora/recorrida tem direito ao recálculo da RMI de seu benefício previdenciário pela regra definitiva do art. 29, I ou II, da Lei nº 8.213/1991, considerando-se todos os salários-de-contribuição, inclusive os anteriores a 07/1994. Ademais, consoante consignado na r. sentença, caberá ao segurado optar pelo melhor benefício "(...) após a feitura dos cálculos tanto pela regra prevista no art. 3º, quanto pela do art. 29 da Lei nº 8.213/91."  (id. 4058100.26172878".

Com essas considerações, é de ser mantida a r. sentença, na íntegra.

3. Dispositivo

3.1. Indefiro o pedido de suspensão do feito;

3.2. Não conheço da remessa oficial;

3.3. Dou por prejudicada a apelação do INSS no que se refere à incidência da prescrição quinquenal sobre as diferenças devidas à parte autora, bem como no que tange à incidência da Súmula nº 111/STJ, que já fora determinada na r. sentença;  

3.4. Com fundamento no art. 932, IV, b, do CPC, combinado com o art. 29, IV, b, do Regimento Interno desta Corte, nego provimento à apelação do INSS;

3.5. Considerando o disposto no art. 85, §11 do CPC, majoro em 1% a verba honorária fixada na r. sentença, observados os limites máximos previstos nas faixas de incidência do art. 85, § 3º, do CPC.

À Subsecretaria desta Quinta Turma, para as providências de estilo.

Recife, data de validação da assinatura.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Desembargador Federal Relator.

(rmc)

 



 



[1]Disponível em https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verTeseTema.asp?numTema=1102 Acesso em 22.02.2023.

[2] BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Primeira Turma. ARE 930647 AgR, Relator Ministro Roberto Barroso, julgado em  5/03/2016, processo eletrônico, DJe-066, Divulg 08-04-2016, Public 11-04-2016.

 

 

 

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

REVISÃO PRA VIDA TODA. TEMA 1102 DO STF. AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANUTENÇÃO DE DECISÃO DE PRIMEIRO GRAU.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior

 Decisão de primeira instância, relativa à imediata aplicação do Tema 1102 do STF, que diz respeito à denominada "revisão da vida toda" no campo previdenciário, contra a qual se insurge o INSS, por meio deste agravo de instrumento, pedindo suspensão dos efeitos daquela decisão, porque, a seu ver, o julgado do STF só poderá ser aplicado depois do trânsito em julgado. 

Veja como ficou a decisão do Magistrado de Segunda instância. 

Boa leitura. 

 

PROCESSO Nº: 0800662-46.2023.4.05.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: W J S  

ADVOGADO: M C S Da S B RELATOR(A): Relator: Desembargador(a) Federal Francisco Alves dos Santos Júnior - 5ª Turma
JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal

 

Decisão

1 - Relatório

1.1 - Cuida-se de agravo de instrumento interposto pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra r. decisão do Juiz Federal da 21ª Vara da Seção Judiciária de Pernambuco, em Procedimento Comum Cível, na qual deferiu tutela antecipada no sentido de determinar a revisão do benefício do Agravado de acordo com o Tema 1.102 do STF.

1.2 - Insurge-se o Instituto Previdenciário alegando que o acórdão referente ao Tema 1.102, do STF, ainda não foi publicado, o que impede sua imediata aplicação tal como fez o Juiz de primeiro grau.

Reclama, portanto, observância ao art. 1.040, III, do CPC/2015, segundo o qual a retomada dos processos suspensos após a publicação do acórdão paradigma dos tribunais superiores.

1.3 - Postula atribuição de efeito suspensivo à r. decisão agravada, nos termos do art. 1.019, I, do CPC/2015.

Relatado. Fundamento e decido.

2. Fundamentação

2.1 - Recurso que merece ser conhecido, porque observa o princípio da singularidade (recurso próprio para a insurgência), é tempestivo e encontra-se devidamente instruído, com dispensa legal de preparo.

2.2 - No agravo de instrumento, como nos demais recursos, a atribuição de efeito suspensivo, com automática suspensão dos efeitos da r. decisão do Juízo a quo, só será possível, segundo o Parágrafo Único do art. 995 do CPC, quando a "...eficácia da decisão recorrida (...), se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso."

2.3 - A discussão cinge-se à impossibilidade de o Tema 1.102, do STF, ter sido aplicado ao caso apreciado em primeira instância em face da não publicação do acórdão respectivo.

 2.4 - As regras de direito processual que se referem à repercussão geral encontram-se previstas no art. 1.035, do CPC/2015, e, especificamente em relação à decisão extraída do julgamento do recurso em repercussão geral, extrai-se, verbis:

"Art. 1.035. (...)..

(...).

§ 11. A súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no diário oficial e valerá como acórdão."

No caso em apreço, conforme consulta ao sítio informatizado do STF, o Tribunal Pleno, em 1º/12/2022, julgou o mérito do tema em repercussão geral, cuja Ata de Julgamento foi publicada em 05/12/2022.

Eis o texto desse importante tema do STF:

"Tema 1102 - Possibilidade de revisão de benefício previdenciário mediante a aplicação da regra definitiva do artigo 29, incisos I e II, da Lei nº 8.213/91, quando mais favorável do que a regra de transição contida no artigo 3º da Lei nº 9.876/99, aos segurados que ingressaram no Regime Geral de Previdência Social antes da publicação da referida Lei nº 9.876/99, ocorrida em 26/11/99.

Há Repercussão?

Sim

Relator(a):

MIN. MARCO AURÉLIO

Leading Case:

RE 1276977"[1]

Como se vê, a Súmula do julgamento, devidamente publicada, possui validade como acórdão, o que assegura aplicação imediata.

Ainda, em relação ao art. 1.040, III, do CPC/2015,  suscitado pelo Agravante, ensina o processualista MARINONI, Luiz Guilhermeverbis:

"No que tange aos processos em primeiro grau de jurisdição, refere o art. 1.040, III, que caberá ao juiz o prosseguimento do processo, com a aplicação da tese consagrada pela Corte Superior." [2].

Reitera-se, portanto, a orientação do art. 1.035, §11, do CPC/2015, acerca da aplicação da tese firmada pela Corte Superior ao processo em curso.

 2.5 - Com estas considerações, constato que não se faz presente a situação do acima transcrito Parágrafo Único do art. 995 do Código de Processo Civil, pelo que tenho que não cabe acolhimento o pedido de recebimento deste recurso no efeito suspensivo.  

3. Dispositivo

Posto isso, conheço do agravo de instrumento e o recebo apenas no efeito devolutivo, mantendo a decisão ora agravada em sua integralidade.

Intime-se as Partes, na forma e para os fins legais.

Expedientes necessários.

Recife, data da assinatura.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Desembargador Federal Relator

_________________________________

[1] Disponível em https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=5945131&numeroProcesso=1276977&classeProcesso=RE&numeroTema=1102 Acesso em 07/02/2023.

[2] MARINONI, Luiz Guilherme, in Curso de Processo Civil: tutela dos direitos mediante procedimento comum, 8ª edição revista e atualizada. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022, p. 587.