sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

UM CASO CONCRETO DE APLICAÇÃO DA DECADÊNCIA DO ART. 54 DA LEI 9.784, DE 1999

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior

A FAZENDA PÚBLICA pode rever ato administrativo, no qual tenha concedido benefício indevido para Servidores e/ou para Administrados, todavia tem o prazo legal de 5(cinco) anos para fazê-lo. 

Na sentença que segue, um caso concreto em que a UNIÃO perdeu esse prazo. 

Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0824027-03.2019.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

AUTOR: S S DA S 
ADVOGADO: S  B
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

 

 Sentença tio B, registrada eletronicamente.


EMENTA: - DIREITO ADMINISTRATIVO. MILITAR. AERONÁUTICA. TAIFEIRO. REVISÃO DE PROVENTOS PELA ADMINISTRAÇÃO. DECADÊNCIA.

- A Administração Pública tem o poder-dever de rever seus próprios atos, conforme a Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal, desde que o faça no prazo legal de 5(cinco) anos(art. 54 da Lei nº 9.784, de 1999).

- Reconhecimento da decadência  do direito de a UNIÃO exercer o seu poder-dever revisional dos proventos  do  Autor.

- Condenação da UNIÃO a restabelecer os proventos do Autor, pagando as respectivas diferenças da noticiada redução, bem como em verba honorária.

- Concessão da tutela provisória de urgência de antecipação. 

- Procedência.


Vistos, etc.

1. Relatório

Trata-se de Ação de Nulidade de Ato Administrativo com Pedido de Antecipação de Tutela ajuizada por J S DA S em face da UNIÃO, pretendendo liminarmente o restabelecimento dos proventos com base no soldo de Segundo Tenente. Inicialmente, requereu a concessão dos benefícios da justiça gratuita e a tramitação prioritária do feito. Alegou que: a) seria militar da inatividade da Aeronáutica, integrante do Quadro de Taifeiros da Aeronáutica, tendo ingressado na reserva remunerada em 1995, conforme a Portaria DIRAP Nº 042/1RC, de 04.01.1995; b) por ter ido para reserva em período anterior a dezembro de 2000, beneficiou-se da legislação vigente à época, que outorgava o direito de - ao ingressar na reserva - ter os proventos calculados no soldo do posto/graduação imediatamente superior, de acordo com o art. 34 da Medida Provisória nº 2.215-10, de 31 de agosto de 2001; c) com a promulgação da Lei nº 12.158, de 28 de dezembro de 2009, regulamentada pelo Decreto nº 7.188, de 27 de maio de 2010, foi assegurado o acesso do Autor, por ser integrante do Quadro de Taifeiros da Aeronáutica, às graduações a que fazia jus; d) no caso do Autor, foram dados os benefícios da graduação de SUBOFICIAL com os proventos baseados do posto de SEGUNDO TENENTE, conforme PORTARIA DIRAP Nº 7197/3HI1, DE 08.10.2010, publicada no Boletim do Comando da Aeronáutica nº 193, de 15/10/2010 e o Título de Proventos na Inatividade nº 2648/10, datado em 01.07.2010; e) ocorre que, a partir de uma nova interpretação (sem qualquer alteração legislativa), a Administração Militar passou a entender que não deveria ter aplicado de forma concomitante a Lei 12.158/2009 com o art. 34 da Medida Provisória nº 2.215-10; f) com isso, o Autor foi surpreendido com a publicação da Portaria DIRAP Nº 3851/IP4-3, de 15 de junho de 2019, publicada no Boletim do Comando da Aeronáutica nº 105, de 18.06.2019, com fins de "Revisão de proventos de Graduados do Quadro de Taifeiros em decorrência das graduações alcançadas, na forma do disposto na Lei nº 12.158/2009."; g) assim, em outubro/2019 os proventos do Autor teriam sofrido drástica redução, passando para o soldo de SUBOFICIAL; h) a anulação praticada pela administração militar seria ilegal, carecendo de imediata intervenção do Poder Judiciário. Teceu outros documentos. Juntou procuração e documentos.

O despacho de identificador 4058300.12860780, determinou a intimação do Autor para apresentar as últimas 2(duas) declarações integrais do Imposto de Renda, para o devido exame da sua real situação econômico-financeira para fins de concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.

Em decisão proferida sob Id. 4058300.13411078, foi indeferido o pedido para concessão dos benefícios da Justiça Gratuita e se determinou que o Autor recolhesse as custas iniciais sob pena de cancelamento da distribuição e consequente indeferimento da inicial e extinção do processo sem julgamento do mérito.

O Autor, em petição acostada sob Id. 4058300.13758395, requereu a juntada do comprovante de pagamento das custas judiciais.

Decisão proferida e anexada sob Id. 4058300.14459518, pela qual foi deferido a tramitação prioritária do feito e indeferido naquele momento o pedido de tutela provisória de urgência para apreciação após a contestação. Determinou-se a citação da Ré.

Citada, a UNIÃO apresentou contestação (Id.4058300.15010448). Alegou em síntese, não prosperar a alegação de decadência da Administração de ter revisto o ato questionado na presente demanda tendo em vista que teria iniciado a revisão dos atos administrativos em junho de 2015, por meio da Portaria COMGEP nº 1.471-T/AJU, de 25 de junho de 2015, por meio da qual teria cientificado todos os interessados. Aduziu que a revisão questionada neste feito decorreu do poder de autotutela da Administração, que lhe obriga a afastar a vigência de atos administrativos viciados tão logo constatado defeito de tal monta, haja vista o princípio constitucional da legalidade.  Pugnou pela improcedência do pedido.

O Autor, apesar de devidamente intimado por Ato Ordinatório a manifestar-se sobre a contestação, deixou transcorrer o prazo e não apresentou réplica.

Vieram os autos conclusos.

 É o breve relatório.

Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação

Julgo este feito antecipadamente, de acordo com o estado do processo (art. 355, CPC), por entender desnecessária qualquer dilação probatória.

2.1. Do Mérito

Objetiva a Parte Autora provimento judicial para que seja cancelado o ato administrativo Federal, consubstanciado na PORTARIA DIRAP Nº 3851/IP4-3, de 15 de junho de 2019, e que seja restabelecido os seus proventos ao soldo de Segundo Tenente.

Pelos documentos acostados aos autos, PORTARIA DIRAP nº 7.197/3HI1, de 08 de outubro de 2010 (Id. 4058300.12852458), consta que foi assegurado ao Autor, a contar de 1º de julho de 2010, o acesso à graduação de Suboficial, nos termos do art. 1º, parágrafo único, combinado com o art. 5º, inciso V, do Decreto nº 7.188 de 27.05.2010, produzindo efeitos financeiros a contar de 1º de julho de 2010.

O título de proventos com os dados financeiros a partir de 1/07/2010 está anexado sob Id. 4058300.12852489 e as fichas financeira a partir de 2010 até o ano de 2018 estão anexadas sob Id. 4058300.12852506, atestam que de julho de 2010 até dezembro de 2018, o Autor recebera os seus proventos de acordo com a PORTARIA DIRAP nº 7.197/3HI1, de 08 de outubro de 2010 que lhe assegurou o acesso à graduação de Suboficial.

Não foram anexadas aos autos as fichas financeiras do ano de 2019, que atestem a alegação do Autor de que teria havido a redução em seu salário. Entretanto, foi anexada sob Id. 4058300.12852542 a Portaria, DIRAP nº 3.851/IP4-3, de 15 de junho de 2019, que determinou a revisão do valor dos proventos do Autor, fixados na Portaria DIRAP nº 7197/3HI1, de 08 de outubro de 2010.

 Portanto, o Autor recebeu seus proventos por quase 9 anos (de 2010 até 2019), sem que Administração tenha exercido no tempo hábil o direito de anulação, qual seja, no prazo de 5(cinco) anos, conforme regra do art. 54 da Lei nº 9.784, de 1999.

Realmente, conforme assentado na jurisprudência, a Administração Pública tem o poder-dever de rever seus próprios atos, e nesse sentido é a Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal:

"Súmula n.º 473 - A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial."

Mas, desde que a Administração o faça no prazo legal, acima indicado.

Teria ocorrido o prazo decadencial de cinco anos para a revisão em tela, nos termos do art. 54 da Lei 9.784/1999, conforme alega o Autor em sua exordial?

Creio que sim.

Vejamos.

Eis o texto do art 54 da Lei nº 9.784/1999:

"Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. 

§ 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento. 

§ 2o Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.". 

A UNIÃO FEDERAL - UNIÃO, alegou, em sua contestação, que não teria ocorrido a decadência tendo em vista que teria iniciado a revisão dos atos administrativos em junho de 2015, por meio da Portaria COMGEP nº 1.471-T/AJU, de 25 de junho de 2015, publicada no Boletim do Comando da Aeronáutica nº 121, de 01 de julho de 2015, por meio da qual teria cientificado todos os interessados antes de passados 5 anos do primeiro pagamento em parcela maior da qual seria devida, que no caso em tela teria ocorrido em 1º de agosto de 2010.

Ora, reza o art. 207 do Código Civil, que a fluência do prazo de decadência não se suspende, nem se interrompe, exceto expressa previsão legal.

Não há Lei estabelecendo a suspensão ou a interrupção do prazo de prescrição para o caso concreto

Então, Portaria instaurando procedimentos para, genericamente, apurar a legalidade/ilegalidade de atos administrativos em determinado setor da Administração Pública, como a Portaria noticiada pela ora Requerida, não tem força suspensiva ou interruptiva da fluência do prazo de decadência em debate.

Aliás, a respeito do assunto, reza o § 2º, acima transcrito, do art.54 da Lei nº 9.784, de 1999.

"§ 2o Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.". 

Sendo assim, não há como admitir que a mencionada Portaria COMGEP nº 1.471-T/AJU, de 25 de junho de 2015, seja considerada como efetivo exercício do direito de autotutela da Administração, porque consiste em mero ato preparatório para instauração do processo de anulação de ato administrativo.

Depreende-se que o Autor vem recebendo os seus proventos, de boa-fé, com base em Portaria do Comando da Aeronáutica, há quase 9 anos, sem qualquer impugnação por parte da Administração Pública.

Então, quando a Administração Pública baixou Portaria, DIRAP Nº 3.851/IP4-3, em 15 de junho de 2019, modificando o valor dos proventos do Autor, fixados na Portaria  DIRAP nº 7.197/3HI1, de 08 de outubro de 2010, portanto, quase 9(nove) anos depois, já não poderia fazê-lo, porque esse seu poder-dever já se encontrava fulminado pela decadência quinquenal legal,  acima apontada.

3. Dispositivo                                                

Posto isso:

3.1. julgo procedentes os pedidos desta ação, com acolhimento da exceção de decadência quinquenal, levantada pela Parte Autora, pronuncio a decadência do direito de a UNIÃO FEDERAL - UNIÃO exercer o seu poder-dever de editar Portaria modificando o ato de concessão de aposentadoria do Autor, Portaria cancelando a Portaria DIRAP nº 7.197/3HI1, de 08 de outubro de 2010, pelo que cancelo a Portaria DIRAP Nº 3.851/IP4-3, de 15 de junho de 2019, pela qual mencionada modificação foi concretizada, restabeleço aquela Portaria DIRAP nº 7.197/3HI1, 08 de outubro de 2010, e condeno a ora Requerida a restabelecer os proventos de aposentadoria (reforma remunerada) do Autor nos valores e parâmetros pagos até o mês anterior em que foi alterado os seus proventos com base na Portaria DIRAP nº 3.851/IPA-3 de 15.06.2019, sem prejuízo de eventuais reajustes/aumentos concedidos em datas posteriores, bem como a pagar as diferenças vencidas, retroativamente à data que sofreu redução por conta da mencionada Portaria DIRAP Nº 3.851/IP4-3, de 15.06.2019, ora cancelada, com correção monetária e juros de mora  na forma indicada no Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal - CJF, no qual já se encontra incorporado o entendimento do Plenário do Supremo Tribunal Federal no acórdão relativo ao RE 870.945/SE[1], estendendo-se mencionada atualização até a data da expedição do(s) requisitório(s), conforme julgado do Plenário do Supremo Tribunal Federal [2].

 3.2. Preenchidos os requisitos autorizadores da concessão da liminar, probabilidade jurídica do direito do Autor e o perigo da demora, exigidos pelo art. 300 do atual Código de Processo Civil, defiro a tutela provisória de urgência de antecipação requerida e determino que a UNIÃO FEDERAL - UNIÃO se abstenha de promover desconto/redução nos proventos percebidos pelo Autor, cancelando o ato administrativo Federal consubstanciado na PORTARIA DIRAP Nº 3.851/IP4-3, de 15 de junho de 2019 e que restabeleça os proventos do Autor de acordo com os critérios aplicados até junho de 2019, sem prejuízo de eventuais reajustes/aumentos concedidos posteriormente a essa data e o faça no prazo  máximo de 30(trinta) dias, sob pena de pagamento de multa  mensal, no valor de R$ 3.000,00(três  mil reais) a favor do Autor,  sem prejuízo da responsabilização pessoal do Servidor e/ou Dirigente que der azo ao pagamento dessa multa, no campo administrativo, civil e criminal.

3.3. Outrossim, com base nos §§ 2º ao 5º do art. 85 do CPC, condeno a UNIÃO a pagar ao(s) Patrono(s) do Autor verba honorária, que arbitro no mínimo legal, observada a gradação do invocado § 3º do art. 85 do CPC, sobre o valor total das diferenças acima indicadas, bem como sobre as 12(doze) primeiras parcelas das diferenças em questão que voltarão a ser pagas nos proventos do Autor(§ 9º do art. 85 do CPC).

Sentença não sujeita ao duplo grau de jurisdição, porque o valor total não corresponderá ao valor de 1.000 (hum mil) salários mínimos (art. 496, §3º, inciso I do CPC).

Registre-se. Intime-se.

Recife, 04.12.2020

Francisco Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal da 2a Vara da JFPE


                                (arf)



[1]  O Plenário do STF, no julgamento do RE 870.947/SE, sob repercussão geral, tema 810, concluiu que, mesmo depois da Lei 11.960, de 2009, continua válido o índice de correção monetária IPCA-E.

Brasil Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário -  RE nº  870947/SE, Repercussão Geral. Tema 810. Relator Ministro Luiz Fux. Julgado em 20.09.2017. Ainda não publicado.

Disponível em:

http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=870947&classe=RE-RG&codigoClasse=0&origem=JUR&recurso=0&tipoJulgamento=M

[2] Brasil Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário-RE 579.431/RS. Relator Ministro Marco Aurélio, Publicado no Diário Judicial Eletrônico - Dje de 19.04.2017[Repercussão Geral, Tema 96, Mérito].

 Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2598262

 Acesso em 10.10.2017.




terça-feira, 1 de dezembro de 2020

O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE NO PARCELAMENTO ESPECIAL DA LEI Nº 13.496, DE 24.10.2017

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Na sentença abaixo, discute-se a necessidade de rígida observância do princípio da legalidade,  no campo tributário. 

Boa leitura.  

Obs.: sentença pesquisada e minutada  pela Assessora Luciana Simões Correa de Albuquerque



 PROCESSO Nº: 0810166-13.2020.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL

IMPETRANTE: M DE F C - SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA
ADVOGADO: M De F C J 
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: PROCURADOR GERAL CHEFE DA PROCURADORIA GERAL DA FAZENDA NACIONAL - PGFN EM RECIFE - PE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)


SENTENÇA TIPO A, REGISTRADA ELETRONICAMENTE


EMENTA:- TRIBUTÁRIO. PARCELAMENTO DE DÉBITOS. PROGRAMA ESPECIAL DE REGULARIZAÇÃO TRIBUTÁRIA - PERT. LEI Nº 13.496/17. CRÉDITOS DE PREJUÍZO FISCAL E DE BASE DE CÁLCULO NEGATIVA DE CSLL

-Portaria da PGFN não pode criar limites temporais, quanto às parcelas de prejuízos fiscais que podem ser deduzidas, não fixados na Lei de regência.

            -Concessão da segurança. Vistos, etc.


Vistos, etc.

1. Breve Relatório

Versam os presentes autos sobre Mandado de Segurança impetrado por M DE  C SOCIEDADE INDIVIDUAL DE ADVOCACIA em face do Ilmo Sr. ILMO. SR. PROCURADOR GERAL CHEFE DA PROCURADORIA GERAL DA FAZENDA NACIONAL -PGFN em RECIFE -PE, vinculado à União Federal (Fazenda Nacional).  Aduziu, em síntese, que: seria pessoa jurídica de direito privado que atuaria como escritório de advocacia e que terminara  por aderir ao Parcelamento Especial instituído pela Lei n.º13.496, de 24.10.2017, visando suspender a exigibilidade de créditos tributários constituídos contra a sua pessoa; apesar de ter CONFESSADO A DÍVIDA TRIBUTÁRIA, não poderia ser compelida a efetuar o pagamento de tributos baseados em normas INCONSTITUCIONAIS e/ou ILEGAIS; a impetrante seria pessoa jurídica de direito privado e que, quando exercia suas atividades teria sido um grande escritório de advocacia com sede na Cidade do Recife e inúmeras filiais espalhadas pelo país; em virtude de uma grave crise financeira, teria contraído um elevado passivo tributário devidamente constituído e inscrito em dívida ativa no âmbito federal e municipal, o que comprometera o exercício das suas atividades; no ano-calendário de 2015, a Impetrante teria apresentado sua Declaração do Imposto de Renda Pessoa Jurídica - DIPJ na condição de INATIVA, uma vez que naquele ano não teria auferido qualquer receita operacional naquele exercício (Doc. 04);  visando honrar com os seus compromissos, a Impetrante teria terminado incluindo todo o seu passivo tributário no âmbito federal no Programa Especial de Regularização Tributária (PERT), instituído pela Lei n.º 13.496, de 24.10.2017, fruto da conversão da Medida Provisória n.º 783, de 31.05.2017; como o passivo tributário previdenciário constituído contra a Impetrante seria inscrito em dívida ativa e no valor inferior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais), teria incluído as suas dívidas no parcelamento previsto no art. 3º, inciso II, alínea "b", parágrafo único, tombado sob o n.º 191000172331081756 (Doc. 05); diferentemente do que acontecera com os parcelamentos no âmbito da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional - PGFN, os débitos controlados pela Receita Federal do Brasil - RFB poderiam ser compensados com prejuízo fiscal acumulado do Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, desde que apurados em 2015 e declarados até 29/julho/2016, conforme se depreende da leitura do disposto no art. 2º, §§2º e 5º da Lei n.º 12.496/2017, nos termos ali transcritos; o legislador teria achado por bem NÃO limitar a utilização do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa da CSLL para quitação de débitos com a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional - PGFN;  visando regulamentar a matéria no tocante à compensação de créditos de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa com débitos inscritos em dívida ativa, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional - PGFN teria editado a Portaria/PGFN n.º 690, de 29.06.2017;  para surpresa da Impetrante, a PGFN teria editado a Portaria/PGFN n.º 1.207, de 28.12.2017, limitando a utilização do prejuízo acumulado da forma ali especificada; como a Impetrante teria apresentado sua Declaração do Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ relativa ao ano-calendário de 2015, exercício de 2016, como estando INATIVA, teria ficado impossibilitada de utilizar os seus prejuízos fiscais e a base de cálculo negativa da CSLL; para agravar ainda mais a situação, o autoridade coatora teria determinado que a utilização dos créditos só poderia ser realizada se informados no Portal da PGFN no período de 02/janeiro/2018 a 31/janeiro/2018, conforme previsto no art. 2º, inciso I da referida Portaria; diante disso, a Impetrante teria ficado  impossibilitada de utilizar o seu prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, o que faria com que liquidasse integral e antecipadamente o seu parcelamento, conforme se comprova pelo extrato em anexo (Doc. 06); ao fazer uma análise sobre a matéria, a Impetrante teria constatado que fora lesada pela Fazenda, uma vez que, caso tivesse sido permitido a utilização do seu prejuízo acumulado e da sua base de cálculo negativa da CSLL, o seu PERT já teria sido integralmente extinto; depois de abatido o valor do pedágio, a Impetrante poderia ter abatido o valor do seu prejuízo acumulado e da base de cálculo negativa da CSLL relativa ao ano-calendário de 2015 (Doc. 07), nos termos ali transcritos; a Impetrante teria ficado impossibilitada de compensar o seu prejuízo fiscal e a sua base de cálculo negativa da CSLL em virtude do disposto no art. 1º, inciso I da Portaria/PGFN n.º 1.207, de 28.12.2017, o que teria trazido prejuízos incalculáveis, posto que se fosse possível a realização da compensação, o PERT já teria sido integralmente extinto;  o Código Tributário Nacional teria determinado que caberia à lei regulamentar os procedimentos de compensação, e assim o fez o art. 3º, inciso II, alínea "b", parágrafo único, inciso II da Lei n.º 13.496/2017 ao possibilitar a compensação dos prejuízos fiscais e da base de cálculo negativa da CSLL com débitos do saldo remanescente do PERT; não caberia a uma Portaria restringir direitos concedidos por Lei, prejudicando substancialmente o patrimônio da Impetrante; não poderia continuar sendo compelida a efetuar o pagamento das prestações mensais do PERT objeto da presente ação até que a autoridade coatora procedesse com o recálculo do saldo remanescente, após a implementação da compensação do referido saldo com o prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa seja no ano de 2015 (R$ 15.123.733,18) ou de 2016 (R$ 15.715.567,03), com o saldo do PERT;  só lhe  teria restado impetrar o presente writ visando assegurar o seu direito líquido e certo de ter retificado o saldo remanescente do parcelamento após o pagamento do pedágio, para fins de compensar o referido saldo com créditos de prejuízos fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL e, consequentemente, que lhe seja assegurado o direito de compensar as prestações pagas indevidamente, atualizadas pela Taxa SELIC, com outros tributos administrados pela Receita Federal do Brasil - RFB, nos termos do art. 170-A do Código Tributário Nacional - CTN c/c art. 74 da Lei n.º 9.430, de 27.12.1996. Teceu outros comentários e pugnou pela:

a) Concessão da segurança definitiva, confirmando os efeitos da MEDIDA LIMINAR, com vistas a assegurar o seu direito líquido e certo de: (a)- ter recalculado o saldo do Parcelamento Especial de Regularização Tributária (PERT), previsto no art. 3º da Lei n.º 13.496/2017 e tombado sob o nº 191000172331081756, objeto da presente ação, considerando que após o pagamento do pedágio e da redução das multas e juros, deve ser realizada a compensação do saldo devedor com créditos do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, prevista no art. 3º, inciso II, alínea "b", parágrafo único, inciso II da Lei n.º 13.496/2017;

(b) Compensações de todos os valores recolhidos a maior a título de prestações do Programa Especial de Regularização Tributária (PERT), atualizados pela Taxa SELIC, com outros tributos administrados pela Receita Federal do Brasil - RFB, nos termos do art. 170-A do Código Tributário Nacional - CTN c/c art. 74 da Lei n.º 9.430/96.

Foi determinada a notificação da autoridade apontada como coatora (Id. 4058300.14741850).

A União (Fazenda Nacional) manifestou seu interesse no feito (Id. 4058300.14824215).

A Impetrante pugnou pela juntada de precedentes favoráveis (Id. 4058300.14905158 e 4058300.15887780).

O Ministério Público Federal não se manifestou sobre o mérito da questão (Id. 4058300.15250954).

É o relatório , no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

Defende a Impetrante, em apertada síntese, que teria ficado impossibilitada de compensar o seu prejuízo fiscal e a sua base de cálculo negativa da CSLL em virtude do disposto no art. 1º, inciso I,  da Portaria/PGFN n.º 1.207, de 28.12.2017, que assevera, verbis:

"Art. 1° O sujeito passivo que, na data da adesão ao Programa Especial de Regularização Tributária (Pert), possuir dívida total, sem reduções, de valor igual ou inferior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais) e aderir a uma das modalidades previstas nos incisos II a IV do art. 3º Portaria PGFN nº 690, de 29 de junho de 2017, poderá utilizar, para amortização do saldo devedor:

I - os créditos próprios de prejuízo fiscal decorrentes da atividade geral ou da atividade rural e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), existentes até 31 de dezembro de 2015 e declarados até 29 de julho de 2016, que estejam disponíveis para utilização;".

No caso dos autos, a ilegalidade apontada pela impetrante consistiria na ingerência da Portaria PGFN 1207/2017, em seara que só poderia ser tratada por Lei, de forma que, por meio desse ato normativo administrativo, no que a Procurador Geral da Fazenda Nacional teria exorbitado de seu poder instrumental, inovando de modo indevido no direito.

Pois bem.

Ao dispor sobre o Programa Especial de Regularização Tributária (PERT), a Lei nº 13.496/17, assim estabeleceu:

"Art. 2º No âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil, o sujeito passivo que aderir ao Pert poderá liquidar os débitos de que trata o art. 1º desta Lei mediante a opção por uma das seguintes modalidades:

I - pagamento em espécie de, no mínimo, 20% (vinte por cento) do valor da dívida consolidada, sem reduções, em até cinco parcelas mensais e sucessivas, vencíveis de agosto a dezembro de 2017, e a liquidação do restante com a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) ou de outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, com a possibilidade de pagamento em espécie de eventual saldo remanescente em até sessenta prestações adicionais, vencíveis a partir do mês seguinte ao do pagamento à vista;

II - pagamento da dívida consolidada em até cento e vinte prestações mensais e sucessivas, calculadas de modo a observar os seguintes percentuais mínimos, aplicados sobre o valor da dívida consolidada:

a) da primeira à décima segunda prestação - 0,4% (quatro décimos por cento);

b) da décima terceira à vigésima quarta prestação - 0,5% (cinco décimos por cento);

c) da vigésima quinta à trigésima sexta prestação - 0,6% (seis décimos por cento); e

d) da trigésima sétima prestação em diante - percentual correspondente ao saldo remanescente, em até oitenta e quatro prestações mensais e sucessivas;

III - pagamento em espécie de, no mínimo, 20% (vinte por cento) do valor da dívida consolidada, sem reduções, em até cinco parcelas mensais e sucessivas, vencíveis de agosto a dezembro de 2017, e o restante:

a) liquidado integralmente em janeiro de 2018, em parcela única, com redução de 90% (noventa por cento) dos juros de mora e 70% (setenta por cento) das multas de mora, de ofício ou isoladas;

b) parcelado em até cento e quarenta e cinco parcelas mensais e sucessivas, vencíveis a partir de janeiro de 2018, com redução de 80% (oitenta por cento) dos juros de mora e 50% (cinquenta por cento) das multas de mora, de ofício ou isoladas; ou

c) parcelado em até cento e setenta e cinco parcelas mensais e sucessivas, vencíveis a partir de janeiro de 2018, com redução de 50% (cinquenta por cento) dos juros de mora e 25% (vinte e cinco por cento) das multas de mora, de ofício ou isoladas, e cada parcela será calculada com base no valor correspondente a 1% (um por cento) da receita bruta da pessoa jurídica, referente ao mês imediatamente anterior ao do pagamento, e não poderá ser inferior a um cento e setenta e cinco avos do total da dívida consolidada; ou

IV - pagamento em espécie de, no mínimo, 24% (vinte e quatro por cento) da dívida consolidada em vinte e quatro prestações mensais e sucessivas e liquidação do restante com a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL ou de outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

§ 1º Na hipótese de adesão a uma das modalidades previstas no inciso III do caput deste artigo, ficam assegurados aos devedores com dívida total, sem reduções, igual ou inferior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais):

I - a redução do pagamento à vista e em espécie para, no mínimo, 5% (cinco por cento) do valor da dívida consolidada, sem reduções, em até cinco parcelas mensais e sucessivas, vencíveis de agosto a dezembro de 2017; e

II - após a aplicação das reduções de multas e juros, a possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL e de outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, com a liquidação do saldo remanescente, em espécie, pelo número de parcelas previstas para a modalidade."

A Lei é clara ao estabelecer que os débitos no âmbito da PGFN poderão ser amortizados com créditos de Prejuízo Fiscal e Base Negativa de CSLL sem qualquer limitação temporal de exercício social/fiscal.
 
 A esse respeito, pretende a Portaria nº. 1207/17:
 
            "Art. 1° O sujeito passivo que, na data da adesão ao Programa Especial de Regularização Tributária (Pert), possuir dívida total, sem reduções, de valor igual ou inferior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais) e aderir a  uma das modalidades previstas nos incisos II a IV do art. 3º da Portaria PGFN nº 690, de 29 de junho de 2017, poderá utilizar, para amortização do saldo devedor:
 
            I - os créditos próprios de prejuízo fiscal decorrentes da atividade geral ou da atividade rural e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), existentes até 31 de dezembro de 2015 e             declarados até 29 de julho de 2016, que estejam disponíveis para utilização; e" 

A limitação temporal estabelecida na Portaria, circunscrevendo a utilização de créditos de Prejuízo Fiscal e Base Negativa de CSLL no âmbito de parcelamento da PGFN até a data de 31.12.2015, afronta o princípio da legalidade estrita, já que limita indevidamente a faculdade prevista em lei, estabelecido no inciso I e respectivo § 6º do art. 150 da vigente Constituição da República.

É certo, por um lado, que a outorga de parcelamento é uma faculdade do credor, que estipula as condições e os requisitos para que possa ser permitido.
 
 Nada obstante, o conteúdo da norma regulamentar (ou seja, da Portaria) não pode modificar, suspender, alterar, suprimir ou revogar disposição legal ou tampouco inovar.

A limitação estabelecida por norma hierarquicamente inferior restringiu o alcance da própria lei ordinária, sob o mote de regulamentá-la.

Portanto, patente a ilegalidade da Portaria, uma vez que inovou ao estabelecer limitação temporal não prevista na Lei de regência do parcelamento.

Nesse sentido, confira-se o precedente que se segue, aplicável mutatis mutandis ao caso em análise:

"E M E N T A     TRIBUTÁRIO. PARCELAMENTO DE DÉBITOS. PROGRAMA ESPECIAL DE REGULARIZAÇÃO TRIBUTÁRIA - PERT. LEI Nº 13.496/17. CRÉDITOS DE PREJUÍZO FISCAL E DE BASE DE CÁLCULO NEGATIVA DE CSLL DE CONTROLADORA. UTILIZAÇÃO PARA PAGAMENTO DE DÉBITOS JUNTO À PGFN. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DA NORMA JURÍDICA.
1. A questão que ora se impõe cinge-se em saber se a impetrante pode utilizar créditos de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL de sua controladora, para o pagamento de débitos tributários incluídos no Programa Especial de Regularização Tributária - PERT, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional - PGFN. 2. A Medida Provisória nº 783/2017, convertida na Lei nº 13.496/2017, instituiu o Programa Especial de Regularização Tributária - PERT, que "abrange os débitos de natureza tributária e não tributária, vencidos até 30 de abril de 2017, inclusive aqueles objeto de parcelamentos anteriores rescindidos ou ativos, em discussão administrativa ou judicial, ou provenientes de lançamento de ofício efetuados após a publicação desta Medida Provisória" (art. 1º, § 2º). 3. O PERT tem como escopo a prevenção e a redução de litígios administrativos ou judiciais relacionados a créditos tributários e não tributários e o consequente aumento na arrecadação, bem assim a regularização de dívidas tributárias exigíveis, parceladas ou com exigibilidade suspensa, proporcionando às empresas condições de enfrentarem a crise econômica e possibilitando que voltem a gerar renda e empregos e a arrecadar seus tributos, conforme exposição de motivos da MP nº 783/2017. 4. Neste passo, o PERT permite a liquidação de débitos junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil ou à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, vencidos até 30 de abril de 2017, mediante modalidades que combinam um percentual de pagamento em espécie, parcelamentos com prestações lineares, progressivas ou calculadas sobre percentual da receita bruta, reduções nos acréscimos legais ou utilização de créditos de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL ou outros créditos relativos a tributos administrados pela RFB ou com o oferecimento de bens imóveis para dação em pagamento. 5. A Lei nº 13.496/2017 estabelece que, no âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil, o sujeito passivo que aderir ao PERT poderá liquidar os débitos de que trata o artigo 1º desta Lei  mediante a opção, dentre outras modalidades, do "pagamento em espécie de, no mínimo, 20% (vinte por cento) do valor da dívida consolidada, sem reduções, em até cinco parcelas mensais e sucessivas, vencíveis de agosto a dezembro de 2017, e a liquidação do restante com a utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) ou de outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, com a possibilidade de pagamento em espécie de eventual saldo remanescente em até sessenta prestações adicionais, vencíveis a partir do mês seguinte ao do pagamento à vista" (art. 2º, I). 6. Adiante, o legislador especifica a titularidade dos créditos de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL que podem ser utilizados no PERT, no âmbito da RFB (art. 2º, § 2º). 7. Por seu turno, referido diploma legal assegura, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, aos devedores com dívida total, sem reduções, igual ou inferior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais), que aderirem a uma das modalidades do PERT previstas no inciso II, do caput, do artigo 3º, "após a aplicação das reduções de multas e juros, a possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL e de outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, com a liquidação do saldo remanescente, em espécie, pelo número de parcelas previstas para a modalidade" (art. 3º, parágrafo único, II). 8. Neste ponto, vale recordar que a possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL, prevista apenas no âmbito da RFB, quando da edição da MP nº 783/2017, foi estendida para os débitos administrados pela PGFN com a conversão da mencionada medida provisória na Lei nº 13.496/2017. 9. Note-se que, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, o legislador não especificou a titularidade dos créditos de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL que podem ser utilizados no PERT, tampouco vedou expressamente que fossem de empresa controladora. 10. Entendo que, na interpretação da lei, deve-se observar além de sua letra fria, sem se deixar dominar pela preocupação de restringir, de modo a não se distanciar de suas finalidades. 11. Considerando-se a interpretação teleológica do dispositivo legal que versa sobre o cerne da questão sub examine, visando assegurar à norma máxima efetividade, bem como tendo em vista a expressa permissão no âmbito da RFB, impende reconhecer que a impetrante pode utilizar créditos de prejuízos fiscais e de base de cálculo negativa da CSLL de sua controladora (BCBF Participação S/A, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 19.276.528/0001-16), para quitação dos débitos tributários constantes das CDA's indicadas na exordial, desde que preenchidos os demais requisitos legais. 12. Insta salientar que a Portaria PGFN nº 1.207, de 28 de dezembro de 2017, além de ter sido editada tão somente após o prazo final para adesão ao PERT (14/11/2017), a pretexto de regulamentar os procedimentos de utilização de créditos para amortização do saldo devedor incluído no parcelamento instituído pela Lei nº 13.496/2017, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, ainda restringiu o uso de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL (art. 1º, I), extrapolando os limites de sua competência. 13. Portaria, como norma inferior, não tem o condão de impor restrições não previstas em lei, sob pena de ofensa ao princípio da estrita legalidade. 14. Apelação provida."[1]    
Há de se registrar, por fim, que restou certificado o decurso de prazo sem manifestação da DD Autoridade apontada como coatora, o que reforça a linha hermenêutica ora adotada ora adotada (Id. 4058300.15249683).

3. Dispositivo

 À luz dessas considerações, concedo a segurança pleiteada, para garantir que seja recalculado o saldo do Parcelamento Especial de Regularização Tributária (PERT), noticiado nestes autos, para viabilizar a compensação do saldo devedor com créditos do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, observando-se o consignado na fundamentação supra.

Determino, ainda, que se proceda com as compensações de todos os valores recolhidos a maior a título de prestações do Programa Especial de Regularização Tributária (PERT), atualizados pela Taxa SELIC, com outros tributos administrados pela Receita Federal do Brasil - RFB, nos termos do art. 170-A do Código Tributário Nacional - CTN c/c art. 74 da Lei n.º 9.430/96.

Tudo sob as penas  do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009.

Custas na forma da Lei.

Sem honorários sucumbenciais (art. 25, da Lei n.º 12.016/2009).  

Sentença sujeita ao duplo grau obrigatório de jurisdição (art. 14, § 1º, Lei n. 12.016/2009).

Recife, 01.12.2020.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

(lsc)

_____

[1] Brasil. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. 3ª Turma. Apelação Cível - ApCiv nº 5003212-25.2018.4.03.6100.  Intimação via sistema DATA: 05/10/2020, sem indicação de veículo de publicação.

Disponível em https://www.cjf.jus.br/jurisprudencia/unificada/.

Acesso em 30.11.2020


  

segunda-feira, 30 de novembro de 2020

AÇÃO POPULAR. FALTA DE CAPACIDADE POSTULATÓRIA. BACHAREL EM DIREITO. EXTINÇÃO.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

No Brasil, aquele que não for advogado, inscrito na respectiva Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, não pode assinar petição inicial de ação popular, perante o Judiciário, ainda  que tenha legitimidade ativa ad causam, por lhe faltar a denominada capacidade postulatória. 

Na sentença que segue, esse assunto é debatido a luz de julgado da Suprema Corte. 

Boa  leitura.


Obs.: sentença pesquisada e minutada pela Assessora Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques



 PROCESSO Nº: 0818860-68.2020.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

AUTOR: J R L B 
ADVOGADO: J R L B 
RÉU: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECÇÃO DE PERNAMBUCO
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

Sentença tipo C.


EMENTA. AÇÃO POPULAR. PROCESSUAL CIVIL. PETIÇÃO INICIAL ESCRITA E ASSINADA POR BACHAREL EM DIREITO. AUSÊNCIA DE CAPACIDADE POSTULATÓRIA.

Extinção do processo, sem resolução do mérito, por falta de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular, qual seja a capacidade postulatória.


Vistos etc.

1-Relatório

J R L B, Bacharel em Direito e Estagiário do curso de Direito, com qualificação completa na Petição Inicial, ajuizou em 27/11/2020, esta AÇÃO POPULAR em face do CONSELHO SECCIONAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL EM PERNAMBUCO, na pessoa do seu Presidente, Dr. BRUNO DE ALBUQUERQUE BAPTISTA, na qual pretende, em síntese:

"(...)requer que lhe seja declarada o cabimento e a tempestividade do pedido de Ação Popular, requerida por verificada irregularidade e ilegalidade de representatividade do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco, ora representada pela associação privada de classe profissional denominada Ordem dos Advogados do Brasil Secção de Pernambuco-OAB/PE, decorrendo assim no presente pedido para cessar situações de atos lesivos praticados com abuso de poder, ilegitimidade por incompetência e ilegalidade por desvio de finalidade; com evidentes constrangimentos ilegais praticados pelo Réu ao impor exigências desmedidas ao Autor e os demais examinados para o livre exercício laboral no âmbito das competências da Advocacia privada de direito público; apelo que o autor reiteradamente classifica como exigências impeditivas, abusivas e excessivas, e agora de ilegais e ilegítimas;

Requerendo por iguais razoes a imediata notificação e denunciação ao Ministério Público Federal em Pernambuco das práticas irregulares cometidas pelo demandado, sob a orientação da suspensão das suas atividades, referendadas àquelas que lhes são impedidas o exercício, dentre elas destacadas o direito de realizar o Exame da Ordem e o direito de decidir os pedidos de inscrição nos quadros de advogados e estagiários;

Requer, inclusive, a impugnação da Realização da Segunda Fase do Exame da Ordem Edição XXXI a ser realizado no Estado de Pernambuco com data prevista para dia 06/12/2020, por ilegalidade e consequente ilegitimidade ativa por parte da associação privada de classe profissional denominada Ordem dos Advogados do Brasil Secção de Pernambuco;

No que Autor passa requerer para mitigar essa situação danosa, em proveito ao processo, ao direito e a justiça, a exigência tão somente da aprovação na primeira Fase do Exame da Ordem aos examinados quanto cumprimento do Inciso IV, do Artigo 8º, da Lei nº 8.906/94, para Habilitação Profissional ao livre exercício da Advocacia Privada de direito público, com o direito estendido para todos os examinados que se encontram nestas condições de aprovados na primeira fase do exame da ordem inscritos através da OAB-PE para fazer a referida segunda fase do Exame da Ordem, em razão do periculum in mora e fumus boni iuris; proveito necessário para minimizar os danos dos atos lesivos reiterados que essa situação de ilegitimidade, ilegalidade e incompetência tem provocado;

Requer ainda a gratuidade da justiça com isenção de custas judiciais e do ônus da sucumbência, com fulcro no inciso LXXIII, do Artigo 5º da Constituição Federal, pela boa fé objetiva;

Requerendo, por fim, a citação do réu para apresentar sua defesa naquilo que lhe couber, por zelo ao Direito e a Justiça."

Atribuiu valor à causa e juntou documentos.   

Na Petição Inicial, o Autor pugnou pela distribuição desta  Ação Popular por dependência à ação de procedimento comum de nº 0806247-16.2020.4.05.8300T, distribuída em 19/03/2020, em trâmite nesta 2ª Vara Federal/PE, na qual pretende, em síntese:

"1) Que seja concedida a Tutela Provisória de Urgência, com fulcro no Art. 300, §2, do CPC, declarando que o modo de ser da relação jurídica efetiva aplicada do Art. 27 do Regulamento Geral previsto na Lei nº 8.906/94 torna-se  instrumento de supressão da necessidade de submissão à segunda fase da prova exame da OAB; cumulada com a condenação do réu na obrigação de fazer a inscrição do proponente no quadro de Advogado Profissional da OAB Seccional Recife/PE, segundo o Caput do Art. 497 do CPC, em razão do seu resultado prático equivalente; para salvaguardar iminente risco maior dano e perda irreparável do direito no melhor fazimento da justiça sob a égide do Periculum in mora e Fumus boni iuris. 2) Que seja Declarada o cabimento da ação declaratória do modo de ser de uma relação jurídica cumulada com obrigação de fazer, segundo o Art. 19, I, e o Caput do Art. 497, ambos do CPC. 3) Que seja Declarada a tempestividade, com fulcro no Art. 20 do CPC. 4) Que seja Declarada que efetiva aplicação e cumprimento, pelo examinado, do Art. 27 do Regulamento Geral previsto na Lei nº 8.906/94, seguida da obrigatoriedade de o examinado fazer a segunda fase da prova exame da OAB, esta última exigência seria somente mais uma situação de atraso ao fazimento da justiça e ao cumprimento dos direitos constitucionais disciplinados nos artigos 5º, XIII e 170, VII, VIII, da CF, que versam sobre o trabalho e a livre iniciativa. 5) Que seja Declarada cumprido o requisito necessário do compromisso legal, conforme dispõe em seu artigo 20º do Regulamento Geral previsto na Lei nº 8.906/94, sendo este de igual força, poder e teor tanto para celebração do compromisso de Advogado Estagiário quanto para o compromisso de Advogado Profissional perante a OAB. 6) Que seja Declarada o modo de ser da relação jurídica efetiva aplicada do Art. 27 do Regulamento Geral previsto na Lei nº 8.906/94 torna-se  instrumento de supressão da necessidade de submissão à segunda fase da prova exame da OAB. 7) Que seja condenado o réu na obrigação de fazer a inscrição do proponente no quadro de Advogado Profissional da OAB Seccional Recife/PE, segundo o Caput do Art. 497 do CPC, em razão do seu resultado prático equivalente."

Processo distribuído livremente por sorteio, consoante certidão sob id. 4058300.16752312.

2 - Fundamentação

2.1- Da prevenção

O Código de Processo Civil de 2015 - CPC/2015 determina, em seu art. 55, §§1º e 3º, que devem ser distribuídas por dependência as causas de qualquer natureza, quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir ou então, mesmo sem conexão entre elas, houver risco de decisões conflitantes ou contraditórias, caso decididas separadamente.

Pois bem, ante o risco de decisões conflitantes ou contraditórias, pois nos dois processos está em evidência o exame da OAB/PE, a ser realizado no próximo dia 06/12/2020, forçoso reconhecer a prevenção deste Juízo da 2ª Vara Federal/PE para processar e julgar esta ação.

2.2 - Da Autuação

Antes da publicação desta sentença, a Secretaria deve alteração a autuação para a classe de ação popular.

2.3 - Inicialmente, importante consignar que, nos autos do PJE nº 0806247-16.2020.4.05.8300T, ajuizado pelo ora Autor em face da ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECÇÃO DE PERNAMBUCO, este Juízo concedeu, parcialmente, a tutela provisória de urgência de antecipação e declarou que, enquanto a OAB/PE não realizasse a segunda fase do Exame de Ordem e não viesse à luz o respectivo resultado, o Autor poderia, uma vez que já cumpriu estágio e foi aprovado na primeira fase do Exame de Ordem, advogar, como se Advogado Habilitado fosse, e determinou que a OAB/PE, fornecesse documento escrito, com essa autorização, para que o ora Autor o exibisse como habilitação para advogar.

Ocorre que a OAB/PE interpôs recurso de Agravo de Instrumento em face da mencionada Decisão, e o E. TRF-5ª Região concedeu efeito suspensivo ao recurso, para sustar os efeitos e o cumprimento da decisão, até o pronunciamento da Turma.

Na sequência, a Parte Autora foi intimada, nos autos do PJE nº 0806247-16.2020.4.05.8300T, a regularizar representação processual, apresentando instrumento de procuração.

Recentemente, o mérito do Agravo de Instrumento foi julgado, conforme noticiado naqueles autos, e a Terceira Turma do E. TRF-5ª Região deu provimento ao AI manejado pela OAB/PE.

2.4 - Feitas essas considerações preambulares, passa-se a analisar esta Ação Popular.

2.4.1- Da legitimidade ativa

O Autor-Popular é cidadão brasileiro e, como prova da cidadania, apresentou o seu título eleitoral e, ainda, o comprovante de votação no primeiro turno das eleições municipais/2020.

Assim, encontra-se satisfeita a prova da cidadania exigida pela Lei nº 4.717, art. 1º, §3º, que o legitima a ingressar com esta Ação Popular.

2.4.2 - Da capacidade postulatória do Autor.

Em apertada síntese, o Autor-Popular pretende não se submeter à segunda fase do Exame da OAB/PE prevista para acontecer neste Estado de Pernambuco, no dia 06/12/2020, e impugna a referida segunda fase pelas razões aduzidas na Inicial. Requer, ademais, que a Decisão a ser proferida nestes autos alcance todos os Examinandos que se encontrem na mesma situação.

Trata-se de Ação Popular cuja Petição Inicial não está assinada por Advogado, mas por Bacharel em Direito, diplomado em curso de Direito, e que também é Estagiário em Direito.

Inicialmente, não se pode deixar de mencionar, consoante historiado, que o E. TRF-5ª Região deu provimento ao Agravo de Instrumento interposto pela OAB/PE em face da Decisão deste Juízo que autorizava o ora Autor, que já realizara e fora aprovado na primeira fase do Exame da OAB, a advogar, até que realizasse a segunda fase do Exame da OAB.

Ocorre que a mencionada Decisão fora suspensa  pelo E. TRF-5ª Região e, posteriormente, totalmente modificada no respectivo v. acórdão da mencionada d. Turma  do referido Tribunal.

Importante lembrar que no PJE nº 0806247-16.2020.4.05.8300T este Juízo não isentou o  Autor de realizar a segunda fase do Exame da OAB/PE; apenas se lhe permitiu  que exercesse a atividade profissional de Advogado, até que pudesse realizar a segunda fase do Exame da OAB/PE.

Nestes autos, o Autor pretende não se submeter à segunda fase do Exame da OAB, e impugna a própria segunda fase.

E, sem estar amparado em decisão judicial, e também sem estar assistido por Advogado regularmente inscrito na OAB, ingressou com esta Ação Popular e assinou a referida Petição Inicial.

Oportuno observar que a "Ação Popular" não se enquadra em nenhuma das exceções nas quais a lei concede à própria parte a capacidade de postular sozinha, sem assistência de Advogado, perante os órgãos do Poder Judiciário[1].

Assim, salvo em hipóteses excepcionais, nas quais não se enquadra a Ação Popular, não se pode ingressar em Juízo sem a presença de Advogado, regularmente inscrito na OAB.  

Nesse contexto, forçoso reconhecer a ausência de capacidade postulatória do Autor para ingressar com esta Ação Popular.

No sentido do exposto já decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

"PROCESSUAL CIVIL AÇÃO POPULAR MOVIDA POR PARLAMENTAR CONTRA O ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL E SEU GOVERNADOR CONCESSÃO DE LIMINAR PARA SUSPENDER O EMPREGO DE PESSOAL E RECURSOS PÚBLICOS NA PRÁTICA DE ATOS RELATIVOS AO DENOMINADO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA MEDIDA LIMINAR  AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO DO PRESIDENTE DO TRIBUNAL A QUO. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO, POR FALTA DE CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO AGRAVANTE. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 30, INCISO II, DA LEI Nº 8.906/94 RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO PARA REFORMAR O ACÓRDÃO RECORRIDO E ACOLHER A PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO REGIMENTAL.

I Não há confundir capacidade postulatória com legitimidade processual para propor ação.

II Na ação popular movida por parlamentar (Deputado Federal) contra Estado da Federação, não pode o autor, mesmo em causa própria e na condição de advogado, interpor como signatário único, recurso de agravo regimental, impugnando decisão que, no curso do processo, suspendeu liminar concedida em primeiro grau, porquanto está impedido de exercer a advocacia, no caso, a teor do disposto no artigo 30, inciso II, da Lei nº 8.906/94.

III Recurso especial parcialmente conhecido e provido, para reformar a decisão recorrida, acolhendo a preliminar de não conhecimento do agravo regimental. (REsp 292.985/RS, Rel. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/03/2001, DJ 11/06/2001, p. 131[2]). (G.N.)

O C. Supremo Tribunal Federal - STF também já teve oportunidade de examinar a questão, consoante se extrai da r. Decisão exarada pela Ministra Carmem Lúcia, que, por motivo de incompetência absoluta do STF, não conheceu da Petição Inicial da Ação Popular.

No que interessa ao caso em apreço, eis o que constou da r. Decisão in verbis:

"(...)

3. Registre-se, inicialmente, que a petição inicial não foi assinada por advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, o que seria suficiente para o não-conhecimento da ação.

É que, apesar de ser direito de todo cidadão postular judicialmente, a capacidade postulatória é constitucionalmente conferida a advogado.

Neste sentido, por exemplo, a lição de Cândido Rangel Dinamarco, segundo o qual:

'Tem duas importantes razões de ser a indispensabilidade do advogado, proclamada constitucionalmente e refletida no Estatuto do Advogado (art. 2º). A primeira delas é a conveniência técnica de confiar a defesa a pessoas com capacitação profissional adequada e sujeitas a um regime organizacional e disciplinar imposto por entidade de categoria estruturada para tanto (a Ordem dos Advogados do Brasil). A segunda é a conveniência psíquica de evitar as atitudes passionais da parte em defesa própria; como puro profissional, que não é o titular dos interesses em conflito, ele não fica tão envolvido como a parte nas angústias e acirramentos de ânimos a que esta está sujeita. O advogado profissionalmente bem formado opera como eficiente fator de arrefecimento dos conflitos e reúne condições muito melhores que a parte para argumentar racionalmente, evitar condutas agressivas ou desleais e eventualmente negociar a conciliação com o advogado da parte contrária (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Vol. II. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 287).

(...)" (Pet. 4342/SP - São Paulo. Petição. Relator (a): Min. Cármem Lúcia. Julgamento: 27/08/2008. Publicação DJe-173 DIVULG 12/09/2008 PUBLIC 15/09/2008. Partes REQTE.(S): JOSÉ CARLOS BARBOSA REQDO.(A/S): CAIXA ECONÔMICA FEDERAL REQDO.(A/S): CAIXA SEGURADORA S/A[3]).

Ademais, o Estatuto da OAB dispõe que os atos praticados por quem não possui capacidade postulatória são nulos, ou seja, inválidos.

Reza o art. 4º da Lei nº 8.906/94:

"Art. 4º São nulos os atos privativos de advogado praticados por pessoa não inscrita na OAB, sem prejuízo das sanções civis, penais e administrativas.

Parágrafo único. São também nulos os atos praticados por advogado impedido - no âmbito do impedimento - suspenso, licenciado ou que passar a exercer atividade incompatível com a advocacia."

Com essas considerações, não será recebida a "petição inicial", ante a falta de um pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular, qual seja a capacidade postulatória, sendo imperativa a extinção do processo, sem resolução do mérito.

3 - Dispositivo

Posto isso:

3.1 - Preliminarmente, antes de publicar esta sentença, determino que a Secretaria deste Juízo providencie a alteração da classe processual desta ação, para Ação Popular.

 3.2 -  Ainda preliminarmente. ante o exposto, de ofício, extingo o processo, sem resolução do mérito, por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo (CPC, art.   485, inc. IV, §3º).

Sem custas e sem honorários (CRFB/88. Art. 5º, LXXIII).

De ofício, submeto esta sentença ao duplo grau de jurisdição obrigatório (Lei nº 4.717/65, art. 19, caput).

R.I.

Recife, 30.11.2020.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal da 2ª Vara Federal/PE


 

 



[1] Ações que se processam nos Juizados Especiais Cíveis (causas de até 20 salários mínimos/Lei nº 9.099/95, art. 95), Juizado especial Federal e Juizado da Fazenda Pública Estadual, e também nas ações de alimentos (Lei nº 5.478/68, art. 2º), em ações de habeas corpus e nas reclamações trabalhistas (CLT, art. 791).

[2] BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp Acesso em: 30/11/2020.

[3] BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/despacho102374/false Acesso em: 30/11/2020.