Por Francisco Alves dos Santos Júnior
O Judiciário, principalmente para os menos favorecidos, finda por ainda ser a última trincheira que lhes resta para salvar-lhes do péssimo serviço público brasileiro, mormente no campo previdenciário e assistencial.
Se o Legislador Ordinário, buscando fazer valer os princípios constitucionais da duração razoável do processo e da celeridade processual, no campo administrativo da Previdência e da Assistência Social, fixa prazos para que os Administradores cumpram com o seus poderes-deveres constitucionais e legais, caso estes não observem esses prazos, resta aos Prejudicados, normalmente os que estão na base da pirâmide social, socorrer-se do Poder Judiciário.
Então, o Judiciário, principalmente quando o infrator faz parte da Administração Pública, em qualquer campo, não pode dizer que determinada Entidade Pública, porque está com problemas administrativos, pode, de forma ilesa, descumprir os prazos legais.
Não, o Judiciário tem que fixar penalidades pecuniárias, como lhe autorizou o Poder Legislativo, que serão pagas aos Administrados prejudicados.
Estes não podem ficar na chamada "rua da amargura", sem ter à quem apelar.
Na sentença que segue, essa problemática é detalhadamente debatida na área assistencial, tendo em vista o péssima gestão atual do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
Boa leitura.
PROCESSO
Nº: 0802333-07.2021.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: PAULO ROBERTO DA SILVA QUEIROZ
ADVOGADO: Paulianne Alexandre Tenório
IMPETRADO: GERENTE EXECUTIVO DA AGÊNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL DE RECIFE- CASA
AMARELA e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)
Sentença tipo B
EMENTA: - ADMINISTRATIVO. DIREITO PREVIDENCIÁRIO-ASSISTENCIAL.
-Princípios, incorporados na Constituição da República, cujas orientações foram incorporadas em Leis, fixadoras de prazos rígidos, não podem ser descumpridos por maus Gestores Públicos.
-Concessão da segurança.
Vistos, etc.
1.Relatório
PAULO ROBERTO DA SILVA QUEIROZ impetrou este
Mandado de Segurança com pedido Liminar em face de ato do GERENTE EXECUTIVO DA
AGÊNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL DE RECIFE - Casa Amarela.
Alegou, em síntese: teria requerido a concessão do
Benefício de Prestação Continuada ao Idoso - BPC LOAS Idoso, protocolado em 20
de outubro de 2020; até a presente data, a decisão administrativa não teria
sido proferida; não haveria razão para a morosidade administrativa; passados
mais de 3 meses desde a Data de Entrada do Requerimento - DER, a Autarquia
Previdenciária teria se quedado inerte quanto à conclusão do processo
administrativo instaurado. Ao final, pugnou pela ": "(...) CONCESSÃO
DA MEDIDA LIMINAR, determinando de imediato à Autoridade Coatora que conclua
a análise do requerimento do impetrante exarando decisão, em prazo determinado
pelo Juízo, sob pena de multa. 2. Confirmado o direito do impetrante,
requer que seja proferida sentença de mérito concedendo a segurança deferida em
sede de liminar, ratificando a obrigação de análise do requerimento
administrativo. 3. Determinar a notificação da autoridade coatora, no endereço
declinado no preâmbulo desta, do conteúdo da petição inicial, a fim de que, no
prazo de 10 (dez) dias, preste as informações necessárias; 4. A citação,
nos termos da Súmula nº 631 do STF, da pessoa Jurídica interessada, INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, na pessoa do seu representante legal, para querendo
integrar a lide; 5. Determinar a intimação do digno representante do
Ministério Público Federal, nesta Vara, para sua manifestação acerca do
presente pedido. 6. A concessão do benefício JUSTIÇA GRATUITA,
por não ter a parte autora como arcar com as custas processuais e
honorários advocatícios sem prejuízo de seu sustento, uma vez que não está
recebendo benefício previdenciário e não possui emprego fixo."
Atribuiu valor à causa. Instruiu a inicial com Instrumento de Procuração e
documentos.
R. Decisão do Magistrado Federal Substituto Isaac
Batista de Carvalho Neto, que atuou no exercício da titularidade desta 2ª
Vara Federal/PE, nas férias deste Magistrado, na qual foi deferido o benefício
da assistência judiciária gratuita e concedida a medida liminar, com
prazo de 30(trinta) dias, sob pena de multa diária de R$ 500,00.
O INSS, na manifestação sob id. 4058300.17309738,
requereu a juntada de requerimento administrativo, no qual consta que o
requerimento administrativo do (a) Impetrante não foi concluído.
Em seguida, o INSS comunicou a interposição de
recurso de agravo de instrumento em face da r. decisão supra.
Anexada comunicação e anexo da comunicação da r.
decisão exarada pelo E. TRF-5ª Região, nos autos do recurso de agravo de
instrumento, a qual concluiu pela ausência de inércia ou mora da Administração.
E, quanto à aplicação da multa diária, ressaltou que a E. Segunda Turma do
TRF-5ª Região possui posicionamento consolidado no sentido da impossibilidade
de aplicação de astreintes contra a Fazenda Pública como meio de coação
ao cumprimento da obrigação de fazer. Finalmente, deferiu o pedido liminar e
determinou a suspensão da decisão agravada.
Por fim, o INSS informou que o processo
administrativo aguardando o cumprimento de exigência pelo Impetrante.
Certificado o decurso do prazo sem que a Autoridade
Impetrada tivesse apresentado suas Informações.
Despacho no qual foi determinado o cumprimento da
r. Decisão proferida pelo E. TRF-ª Região que suspendeu a r. Decisão agravada.
O Impetrante comunicou que a exigência documental
exigida pelo INSS já teria sido cumprida; que a Administração já teria toda a
documentação necessária à análise do pleito; o requerimento permaneceria em
análise; portanto, a liminar teria sido desobedecida; pugnou pela renovação da
intimação do Impetrado para cumprir a obrigação de fazer, concluindo a análise
do requerimento, sob pena de multa. Juntou documentos.
O Ministério Público Federal ofertou seu r.
parecer, no qual deixou de se manifestar neste feito, sem prejuízo de revisão
do entendimento em face de fato superveniente que torne necessária a sua
intervenção.
2- Fundamentação
2.1- Medida Liminar
Inicialmente, quanto ao requerimento do Impetrante
formulado na petição sob id. 4058300.17934657, no sentido de renovar a
intimação da Autoridade Impetrada para cumprir a r. Decisão, da lavra do d.
Juiz Federal Substituto Isaac Batista de Carvalho Neto, na qual se
concedeu a medida liminar, resta prejudicado, tendo em vista que o E. TRF-5ª
Região julgou o mérito do Agravo de Instrumento interposto pelo INSS, e revogou
aquela r. Decisão.
2.2 - Do mérito
Trata-se de mandado de segurança no qual se busca
compelir a Autoridade Impetrada a analisar o requerimento administrativo
previdenciário-assistencial do Impetrante.
Alega o Impetrante haver mora da Administração.
Obviamente, o mencionado r. acórdão da 2a Turma do
E. TRF5R, acostado sob id 4050000.26662609, diz respeito apenas à
referida r. Decisão, pela qual se concedeu a medida liminar, mas não afasta o poder-dever
deste Magistrado de exercer a sua jurisdição de primeiro grau, apreciando
o mérito da questão ora em debate, até mesmo porque referido poder-dever não
pode ser usurpado nem mesmo pelo pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal,
muito menos por Magistrados de 2a Instância do referido E. Tribunal, porque o
exercício da jurisdição de qualquer Magistrado é-lhe concedido pelo Legislador
Constituinte.
Então, passo a examinar o mérito da causa.
Primeiramente, data maxima venia, o
Judiciário não pode deixar os Segurados do INSS, tampouco os que pleiteiam Benefícios Assistenciais(caso dos autos) à mercê da péssima gestão dessa
Autarquia Federal, cujos cargos de direção são ocupados geralmente por Pessoas
indicadas politicamente, sem qualquer conhecimento técnico do assunto, causando
o caos no qual se encontra atualmente referido Ente Previdenciário Federal.
Se a culpa não é do Segurado ou de quem pode ter direito a Benefício Assistencial, este tem que
receber alguma verba que lhe tire da agrura financeira decorrente da referida
péssima gestão da Autarquia Previdenciária e Assistencial, que não aprecia o seu pleito
legal, nos largos prazos que se encontram fixados em Leis específicas ou
na Lei Geral do Processo Administrativo.
E, para situações como essa, o Legislador
Processual, observando a regra constitucional que incorporou os princípios da
duração razoável do processo e da celeridade processual(art. 5º, LXXVIII,
Constituição da República), concedeu ao Judiciário instrumentos fortes para que
os Gestores, públicos ou privados, cumpram com essa importante estrutura
jurídico-constitucional e legal, qual seja, o de fixar multa punitiva e ao
mesmo tempo reparatória: punindo o mau gestor e trazendo algum consolo para
aquele que sofre os prejuízos da respectiva má-gestão.
Realmente, como se sabe, o princípio da duração
razoável do processo e o princípios da celeridade processual, incluídos no art.
5ª da Constituição da República/88 pela Emenda Constitucional 45/04, a
Administração Pública deve solucionar, em tempo razoável, o processo administrativo(princípios esses que também são dirigidos aos próprios Magistrados, aos quais não me refiro aqui, porque em debate falhas de um certo setor da Administração Pública):
"Art. 5º. Omissis
LXXVIII - A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.".
Antes dessa EC, a Lei nº 9.784/99 já estabelecia
"normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da
Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos
direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração"
(art. 1º).
No presente caso, PAULO ROBERTO DA SILVA QUEIROZ,
ora Autor, pediu na via administrativa, no já distante 20.10.2020, a
concessão do denominado Benefício de Prestação Continuada - BPC, de caráter
assistencial, regido pela Lei 8.742, de 1993, conhecida por LOAS.
As pessoas que pedem esse benefício assistencial
encontram-se na parte mais baixo da pirâmide social, vale dizer, na miséria
total.
Deixar essas Pessoas à sanha irresponsável da
Administração Pública seria um crime social sem tamanho.
Assusta-me, pois, que os d. Magistrados da 2a Turma do
E.TRF5R, por UNANIMIDADE, tenham decidido da forma que decidiram.
Pois bem, referida Lei específica criou vários
procedimentos para que a Administração Pública possa, finalisticamente,
apreciar tal pleito administrativo, todavia não fixou prazos, pelo que, à luz
da regra do art. 69 da Lei nº 9.784, de 1999, que traça regras gerais para o
processo administrativo, aplicam-se então os prazos fixados nessa Lei Geral.
E nessa Lei Geral, consta do seu art. 24 que os
procedimentos terão que ser realizados no prazo de 5(cinco) dias, prazo esse
que poderá ser dobrado, quando houver a necessária fundamentação. E, findos os
procedimentos, o Julgador Administrativo terá o prazo de 30(trinta) dias para
decidir o pleito administrativo.
Como a Lei 8.742, de 1993, estabelece, no seu art.
40-B(com alteração da Lei 14.176, de 2021, DOU de 23.06.2021), dois
procedimentos tendentes ao julgamento do pedido de concessão do BPC, quais sejam,
visita social e, se necessária, perícia médica, temos que esses dois
procedimentos, em vista da degradante situação administrativa do INSS, teriam
que ser realizados, cada uma, no prazo dobrado de 10(dez) dias corridos(não se
trata de prazo processual), logo os dois procedimentos teriam que ter sido
realizados no prazo máximo de 20(vinte) dias corridos.
E, finda essa parte instrutória, teria o Julgador
Administrativo de apreciar definitivamente, em tal via, o pleito do Segurado no
largo prazo de 30(trinta) dias.
Pois, bem, tendo em vista a data do protocolamento
do pedido administrativo, no já distante 20.10.2020, o Magistrado
Federal Substituto deste Juízo concedeu, na r. Decisão de id 4058300.17295170,
datada de 02.02.2021, à DD Autoridade apontada como coatora mais
30(trinta) dias para julgar o pleito administrativo do ora Impetrante.
Diante da cassação dessa r. Decisão pelo d. Relator
da 2a Turma do E. TRF5R, a DD Autoridade apontada como coatora sentiu-se à
vontade e até agora não cumpriu com o seu poder-dever legal de julgar o
pleito administrativo do ora Impetrante, deixando este na popular "rua
da amargura".
Nessa situação, o pleito do Impetrante não pode ser
negado.
E, desta vez, tendo em vista o absurdo e abusivo
atraso da DD Autoridade apontada como coatora, o prazo máximo de 10(dezp)
dias úteis(prazo processual[1] para cumprir com o seu poder-dever legal de
julgar o pleito administrativo do ora Impetrante, quer me parecer mais do que
suficiente.
3 -
Dispositivo
Posto isso:
3.1- Dou por prejudicado o pedido do Impetrante
formulado na petição sob id. 4058300.17934657, para restabelecimento da medida
liminar;
3.2- Julgo procedentes os pedidos desta ação
mandamental e concedo a Segurança, fixando prazo de 10(dez) dias úteis(prazo
processual[1]) para que a DD Autoridade Impetrada aprecie definitivamente
o pedido administrativo de concessão do referido Benefício Assistencial
Continuado do ora Impetrante, sob pena de o INSS ser obrigado a pagar ao ora
Impetrante multa mensal de R$ 1.100,00(hum mil e cem reais), sendo o mês
contados em 30(trinta)dias corridos(prazo não processual[1]), sem prejuízo da
responsabilização pessoal da referida DD Autoridade apontada como coatora, no
campo civil(ressarcimento aos cofres do INSS) e na forma do art. 26 da Lei nº
12.016, de 2009.
3.3 - Submeto esta sentença ao duplo grau de
jurisdição(§ 1º do art. 14 da Lei por último referida), sem efeito
suspensivo(§ 3º desse mesmo artigo da referida Lei).
3.4 - Sem condenação em honorários (art. 25 da Lei
nº. 12.016/09), e não há custas a ressarcir.
3.5 - Por fim, dou por extinto este processo, com
resolução do respectivo mérito (CPC, art. 487, I);
R.I.
Recife, 14.07.2021
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara da JFPE
_____________________________________________
[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Terceira
Turma. Recurso Especial RESP nº 1708348 2017.02.92104-9, Relator Ministro Marco
Aurélio Bellizze, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 01/08/2019
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