quinta-feira, 27 de julho de 2017

FALTA LEGITIMAÇÃO PARA A EXECUÇÃO DE ACÓRDÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO DE PESSOA QUE NÃO ERA ASSOCIADA DA ENTIDADE IMPETRANTE NA DATA DA IMPETRAÇÃO


Por Francisco Alves dos Santos Júnior


A Associação impetra um mandado de segurança coletiva e é vencedora. Aqueles que eram seus associados na data da impetração podem executar o titulo judicial, mesmo individualmente. Mas e aqueles que só se associaram posteriormente, podem?
Veja a resposta na decisão que segue. 
Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0807726-83.2016.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA

IMPETRANTE:
A E L
ADVOGADO: C E V A 
IMPETRADO: DELEGADO DA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)


DECISÃO EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO




1. Breve Relatório




A Impetrante opôs Embargos de Declaração (Id. 4058300.2472048), aduzindo, em apertada síntese, que: não se aplicaria ao mandado de segurança coletivo a exigência inscrita no  art. 2º-A da Lei nº 9.494/97, de instrução da petição inicial com a relação nominal dos associados da impetrante e da indicação dos seus respectivos endereços; tal requisito  não se aplicaria à hipótese do inciso LXX do art. 5º da Constituição; teria se indeferido a a liminar com lastro em processo sujeito a repercussão geral que não se amolda ao caso dos autos, pois não se pode confundir o disposto no inciso XXI que deu ensejo a repercussão geral consagrada nos RE 573232/SC com o inciso LXX "b" da Constituição federal que possui outra envergadura constitucional, caracterizadores do Mandado de Segurança coletiva próprio da Substituição processual; sequer haveria necessidade de comprovar a filiação na ação de conhecimento, no caso de mandado de segurança coletivo, que configura a hipótese de substituição processual, cuja necessidade de demonstrar filiação se daria tão somente na fase de execução. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pelo acolhimento dos aclaratórios e pela concessão do pleito liminar formulado.




A autoridade coatora apresentou as Informações (Id. 4058300.2732046).



Apresentada contrarrazões aos Embargos de Declaração na qual se pugnou, genericamente, pelo improvimento dos aclaratórios (Id. 4058300.3285924).



Exarada decisão na qual a MM. Magistrada Danielli Farias Rabelo Leitão Rodrigues  declarou-se suspeita para atuar no feito, por motivo de foro íntimo (Id. 4058300.3668363)



É  o relatório, no essencial.



Passo a decidir.




2. Fundamentação




2.1. De início, vejo que a Secretaria deve proceder com as anotações pertinentes no sistema, eis que a MM. Juíza Danielli Farias Rabelo Leitão Rodrigues declarou-se suspeita para atuar neste feito (Id. 4058300.3668363).



2.2. No que se refere aos Embargos de Declaração opostos, registro que, segundo o art. 1.022 do vigente Código de Processo Civil, os embargos de declaração podem ser manuseados para "esclarecer obscuridade ou eliminar contradição" ou "suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento" ou, ainda, "corrigir erro material".



Com a finalidade de uma melhor compreensão da questão em debate, passo a transcrever a r. decisão de lavra do MM. Juiz Isaac Batista de Carvalho Neto - Magistrado, acostada sob identificador nº  4058300.2444928, objeto do recurso embargos de declaração sob análise):




"1. Breve Relatório


ARCLIMA ENGENHARIA LTDA., qualificada na inicial, impetrou o presente "mandado de segurança individual com pedido de tutela de urgência inaudita altera pars", em face de ato que teria sido praticado pelo Ilustríssimo Sr. Delegado da Secretaria da receita Federal do Brasil em Recife e em face do Sr. ABEL NUNES DE OLIVEIRA NETO.


Aduziu, em síntese, que: seria filiada à Associação Nacional dos Contribuintes de Tributos - ANCT, conforme termo de filiação e declaração fornecida pela Associação; esta Associação teria obtido decisão judicial transitada em julgado em favor de seus filiados por meio do processo nº 0807054-46.2014.4.05.8300, distribuído em 28/11/2014 e ajuizado na forma de substituição processual; haja vista a decisão judicial transitada em julgado de natureza coletiva, a Impetrante teria requerido junto à Administração Pública a habilitação de seu crédito nos termos do art. 82, da Instrução Normativa nº 1.300 (processo administrativo nº 10480.726.802/2016-17); todavia, teria sido proferido despacho decisório indeferindo tal pedido sob o fundamento de que a Impetrante haveria se filiado à associação após o ingresso da ação judicial, não fazendo parte do polo ativo da ação e, em consequência, não podendo exercer o direito de execução do julgado


Pugnou, liminarmente, a concessão de tutela de urgência a fim de que se determine a Autoridade Impetrada que Defira o pedido de Habilitação de Crédito reconhecido por Decisão Judicial Transitada em Julgado, objeto do presente "writ" decorrente de decisão transitada em julgado fruto do mandado de segurança coletivo - processo n.o 0807054-46.2014.4.05.8300, pelos fundamentos à saciedade delineados, eis que os motivos para o indeferimento do pedido de habilitação expostos no despacho decisório proferido no processo administrativo n.o 10480.726802/2016-17 - não possuem sustentação jurídica.


2. Fundamentação


A concessão de liminar em mandado de segurança exige a concorrência dos dois pressupostos legais: a relevância do fundamento e o perigo de um prejuízo se do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida caso, ao final, seja deferida.


A Instrução Normativa RFB nº 1.300/2012, que estabelece normas sobre restituição, compensação, ressarcimento e reembolso, no âmbito da Secretaria da Receita Federal do Brasil, prevê expressamente no inciso I § 4º do art. 82 que o pedido de habilitação do crédito será deferido mediante a confirmação de que a empresa figure no polo ativo da ação mandamental coletiva, verbis: 


    "Art. 82. Na hipótese de crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado, a Declaração de Compensação será recepcionada pela RFB somente depois de prévia habilitação do crédito pela DRF ou pela Delegacia Especial da RFB com jurisdição sobre o domicílio tributário do sujeito passivo.


     (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1661, de 29 de setembro de 2016) 


    (...) 


    § 4º O pedido de habilitação do crédito será deferido por Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, mediante a confirmação de que: 


     (Redação dada pelo(a) Instrução Normativa RFB nº 1661, de 29 de setembro de 2016)


  I - o sujeito passivo figura no polo ativo da ação;


 II - a ação refere-se a tributo administrado pela RFB;


 III - a decisão judicial transitou em julgado;


 IV - (...)


 V -  (...)"


De acordo com o art. 2-A da Lei 9.494/1997, a coisa julgada nas ações coletivas apenas atingirá os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator, verbis:





"Art. 2o-A.  A sentença civil prolatada em ação de caráter coletivo proposta por entidade associativa, na defesa dos interesses e direitos dos seus associados, abrangerá apenas os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito da competência territorial do órgão prolator. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)


Parágrafo único.  Nas ações coletivas propostas contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial deverá obrigatoriamente estar instruída com a ata da assembléia da entidade associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus associados e indicação dos respectivos endereços. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)"


Por seu turno, o caput do art. 22 da Lei 12.016/2009 reza o seguinte:


     "Art. 22.  No mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos pelo impetrante."


Sobre o tema, a atual orientação do C. Supremo Tribunal Federal, com repercussão geral, firmada no julgamento do Recurso Extraordinário nº 573.232/SC, é no sentido de que a atuação das associações não enseja substituição processual, mas representação específica, consoante o art. 5º, XXI, da Constituição da República. In verbis:


    "REPRESENTAÇÃO - ASSOCIADOS - ARTIGO 5º, INCISO XXI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ALCANCE. O disposto no artigo 5º, inciso XXI, da Carta da República encerra representação específica, não alcançando previsão genérica do estatuto da associação a revelar a defesa dos interesses dos associados. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL - ASSOCIAÇÃO - BENEFICIÁRIOS. As balizas subjetivas do título judicial, formalizado em ação proposta por associação, é definida pela representação no processo de conhecimento, presente a autorização expressa dos associados e a lista destes juntada à inicial.


    (RE 573232, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 14/05/2014, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-182 DIVULG 18-09-2014 PUBLIC 19-09-2014 EMENT VOL-02743-01 PP-00001)"


Conclui-se, portanto, que o fato de se tratar de mandado de segurança coletivo não representa obstáculo para que o contribuinte, favorecido pela sentença coletiva, promova a execução individual desse mesmo julgado, desde que integre o grupo ou categoria processualmente substituídos pela parte impetrante quando do ajuizamento da ação.


Deve ser analisado, primeiramente, se o provimento jurisdicional pleiteado se coaduna com a via estreita que é o mandado de segurança.


No presente caso, analisando-se os documentos acostados e conforme narrado na inicial, vê-se que, de fato, a solicitação da Empresa Impetrante para ingresso na Associação data de 18/11/2014, mas, como apontado no ato ora impugnado, só houve o reconhecimento da assinatura do representante legal em 27/05/2016. Observo ainda que a "Declaração de Filiação", expedida pela ANCT, não informa desde quando a Impetrante seria sua filiada, nem ao menos consta a data de sua expedição (identificador nº 4058300.2432027).


Essa situação afasta, prima facie, o fumus boni iuris e, consequentemente, a possibilidade de conceder-se a pretendida medida liminar.


Ausente o pressuposto supracitado, entendo desnecessária a análise da presença do periculum in mora, tendo em vista que a concessão do provimento demanda a concomitância dos pressupostos.


3. Conclusão


Posto isso:


3.1 - indefiro o pedido de medida liminar;


3.2 - notifique-se a Autoridade apontada como coatora, na forma e para os fins do  inciso I do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009;


3.3 - dê-se ciência ao órgão de representação judicial da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, na forma e para os fins do inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009;


3.4 - no momento oportuno, ao Ministério Público da União - MPU para, querendo, apresentar o r. parecer legal.


Intime-se. Cumpra-se.".





Noto, no longo recurso de embargos de declaração ora sob análise, a sustentação da tese de que os vários julgados que invoca afastariam a necessidade do cumprimento da exigência do art. 2º-A da Lei nº 9.494, de 1997, e que a Pessoa pertencente à categoria representada pela Associação Impetrante poderia, individualmente, executar o julgado que foi favorável à categoria profissional ou econômico como um todo.







No entanto, o principal argumento utilizado pelo mencionado d. Magistrado, na r. decisão ora embargada,  consistiu no fato de que a ora Embargante não comprovou que era associada da Associação Impetrante na data em que esta impetrou o mandando de segurança em questão, ou seja, que se deu início à relação processual com a Parte do Polo Passivo, que irá sofrer as consequências da execução do julgado.

Data venia,  a ora Embargante confunde a ampla legitimação extraordinária que detém os Sindicatos com a legitimação conferida às Associações pela Lei Maior, ainda que para o manejo do mandado de segurança coletivo.



 Conforme bem declinado nas contrarrazões da UNIÃO, acostadas sob identificador nº 4058300.3285924, à luz das regras da vigente Constituição da República, a Associação é legitimada para impetrar mandado de segurança coletivo a favor dos seus membros ou associados, não a favor de todos que fazem parte da respectiva da categoria(art. 5º, LXX), pois quem tem legitimação constitucional para toda a categoria, seja ou não membro ou associado,  é apenas o Sindicato(inciso III do art. 8º da referida Carta).

Então, quando uma Associação, como a que impetrou o noticiado mandado de segurança coletivo, assim procede, favorecerá, se procedente o pleito, apenas aqueles que eram seus associados na data da impetração, os quais,  subentende-se, deram-lhe autorização, não individual, mas de forma expressa no Estatuto ou num ato de assembleia, porque só assim a Associação estava legitimada para tanto, de forma que não abrange os associados que só nela se integraram em data posterior, porque estes novos associados não fazem parte subjetiva da relação processual em questão.

E se assim não fosse, dar-se-ia uma amplidão infinita ao título judicial executivo, pois a Associação passaria a ter um verdadeiro "cheque em branco" para os seus futuros associados, que poderia até mesmo usá-lo, indevidamente, para atrair novos associados, e geraria uma insegurança jurídica sem fim para a Parte Executada, ora Embargada.

Colho no voto do Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, relator do recurso extraordinário nº 573.2323/SC, invocado na r. decisão ora embargada, as seguintes esclarecedoras passagens:
"Conforme assentei acima, em sede de agravo de instrumento, o TRF da 4ª Região deu provimento ao recurso dos recorridos, ao fundamento de que eles têm legitimidade para propor, individualmente, a execução de direito assegurado em ação proposta pela Associação Catarinense do Ministério Público, na qualidade de associados desta.
A questão que se discute neste RE, pois, diz respeito, basicamente, ao alcance da expressão "quando expressamente autorizados", constante do inc. XXI do art. 5 º da Carta Política e às suas consequências processuais. Eis o teor do dispositivo em comento (grifos meus) "Art. 5 º (...) XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente". A recorrente, como assinalei, sustenta, com base na decisão monocrática reformada pela Corte a quo, que os efeitos do acórdão executado somente alcançam aqueles que tinham, na data de propositura da ação de conhecimento, autorizado, de forma expressa, a associação a ajuizar a demanda, nos estritos termos do art. 5º, XXI, da CF.
(...)
A questão discutida nestes autos, registro, não é nova nesta Casa. Por ocasião do julgamento da AO 152/RS, Rel. Min. Carlos Velloso, em 15/9/1999, o Plenário do Supremo Tribunal Federal acolheu os argumentos do Min. Sepúlveda Pertence, decidindo que, para a propositura de ação de natureza coletiva, basta a autorização colhida em assembléia geral, conforme se observa do trecho de seu voto, abaixo transcrito (grifos no original): "Em síntese: no caso presente, como em outras hipóteses que tais, estou em que a legitimação da entidade por força de deliberação da assembléia geral resulta, de um lado, de compreender-se o seu objeto nas finalidades estatutárias da associação, somado, em relação a cada um deles, ao ato voluntário de filiação do associado, que envolve a adesão aos respectivos estatutos." 
Nota 1 - Brasil. Supremo Tribunal Federal. Pleno. Recurso Extraordinário nº 573.232/Santa Catarina. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Julgado em 14.05.2014, publicado no Diário Judiciário Eletrônico - DJe de 19.09.2014. Disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630085, acesso em 27.07.2017.
O Ministro Relator invocou voto do Min. Sydney Sanches em outro julgado, do qual destacou o seguinte trecho:
"Ademais, assentou que qualquer filiado pode promover a execução da sentença, desde que sua pretensão esteja compreendida no âmbito da eficácia subjetiva do título judicial.".
Nota 2 - idibdem.
Elucidativo também é o voto do Ministro Marco Aurélio quando do julgamento do recurso extraordinário nº 572.232, invocado na r. decisão ora embargada, verbis:
"Indago: formado o título executivo judicial, como o foi, a partir da integração na relação processual da associação, a partir da relação apresentada por essa quanto aos beneficiários, a partir da autorização explícita de alguns associados, é possível posteriormente ter-se - e aqui penso que os recorridos pegaram carona nesse título - a integração de outros beneficiários? A resposta para mim é negativa.".
Nota 3 - Idibdem.
Frise-se que esse Recurso Extraordinário foi submetido à repercussão geral, que foi aprovada.
 Nota 4 - Disponível em http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=532309, acesso em 27.07.2017.
Então, por todos os ângulos que se examine a questão, chega-se à segura conclusão que a r. decisão, ora embargada, não merece qualquer reparo.

3. Dispositivo




Posto isso:


3.1 - faça a Secretaria as anotações necessárias, tendo em vista o consignado no subitem 2.1 da fundamentação supra;

3.2 - nego provimento aos pedidos do recurso de embargos de declaração, acostado sob identificador nº 4058300.2637756,  e mantenho, em sua integralidade, a respeitável decisão embargada, acostada sob identificador nº  4058300.2444928).



No momento oportuno, encaminhem-se os autos ao MPF para apresentação de parecer legal.



Sucessivamente, venham-me os autos conclusos para julgamento.



Finalmente, observe a Secretaria o consignado no item 2.1. da decisão.



Intimem-se.



Recife, 27 de julho de 2017. 




Francisco Alves dos Santos Jr.



Juiz Federal, 2a Vara-PE




lsc

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