quinta-feira, 10 de março de 2022

INSS. FORNECIMENTO DE CÓPIAS DE DOCUMENTOS = FORNECIMENTO DE CERTIDÃO. LEI 9.051, DE 1995 C/C ART. 46 DA LEI 9.784, DE 1999.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior

A obrigação do INSS de fornecer cópias de peças de processos administrativos e/ou de qualquer outro documento a Segurados ou a Interessados, para uso lícito, corresponde ao fornecimento de uma certidão de inteiro teor. 

Na decisão que segue, explica-se por qual motivo. 

Boa leitura 



PROCESSO Nº: 0803525-38.2022.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL

IMPETRANTE: M O B
ADVOGADO: Anna Tallyta Bione De Sa Carvalho
IMPETRADO: GERENTE EXECUTIVO e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)
--
DECISÃO

1. Relatório

M O B, qualificada na petição inicial, impetrou, em 04/03/2022, este mandado de segurança com pedido de concessão de medida liminar em face de ato omissivo do GERENTE EXECUTIVO DA AGÊNCIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL RECIFE - ENCRUZILHADA. Alegou, em síntese, que: em 01.11.2021 teria protocolado o requerimento solicitando a cópia do processo administrativo; o pedido não teria sido analisado pela Autoridade Impetrada; teria sido extrapolado o prazo de conclusão do seu requerimento administrativo. Teceu outros comentários e requereu: "a) O recebimento e o deferimento da presente peça inaugural; b) O deferimento do benefício da Gratuidade da Justiça, por ser a parte Autora pobre na acepção legal do termo; c) A concessão liminar de tutela de urgência para determinar a análise de requerimento de disponibilização da cópia do processo administrativo; d) A notificação da autoridade coatora, Sr. Gerente-Executivo da Agência da Previdência Social Recife - Encruzilhada - a ser encontrado na Avenida Mário Melo, 343, Santo Amaro, Recife - PE, 50040-010, neste município; e) A CONCESSÃO DA SEGURANÇA a fim de determinar a confirmação da tutela de urgência, devendo ser determinada a análise de requerimento de disponibilização de cópia do processo administrativo." Deu valor à causa. Instruiu a inicial com Instrumento de Procuração e documentos.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório. Decido.

2. Fundamentação

2.1 - Matérias Preliminares

2.1.1 - Ressalto, inicialmente, que não há, no caso concreto, a decadência do direito de impetrar o mandado de segurança, porque o ato atacado neste writ é omissivo, consistente na inércia na análise do requerimento administrativo do(a) impetrante, sendo que os efeitos dessa omissão são continuados e se protraem no tempo; portanto, renova-se de forma continuada o prazo de 120 (cento e vinte) dias previsto no art. 23 da Lei nº 12.016/2009. 

Nesse sentido, a 5ª Turma do E. Superior Tribunal de Justiça, verbis:

"Ementa

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. PRAZO DECADENCIAL PARA IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA. ATO OMISSIVO CONTINUADO. DECADÊNCIA AFASTADA. PRECEDENTES.

1. A insurgência se dirige quanto a portaria de promoção, publicada em 24/04/2006, porquanto a Administração teria deixado de atribuir a esse ato, retroativamente e conforme previsão legal, os devidos efeitos funcionais e financeiros, os quais são o objeto da pretensão ora posta ao crivo do Poder Judiciário.
2. Na hipótese, o prazo decadencial previsto no art. 18 da Lei n.º 1.533/51 se renova continuamente, enquanto permanece a omissão da Administração em implementar o direito perseguido. 3. Agravo regimental desprovido.

                                  Acórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Jorge Mussi, Marco Aurélio Bellizze, Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ/RJ) e Gilson Dipp votaram com a Sra. Ministra Relatora. [1].

2.1.2 - O benefício da assistência judiciária merece ser concedido, provisoriamente, podendo a Parte do polo passivo impugnar ou não essa concessão.

2.1.3 - Registro que não cabe, no mandado de segurança, a aplicação das figuras jurídicas do art. 300 do vigente CPC, porque a Lei 12.016, de 2009, fixou procedimento próprio para o mandado de segurança.

Se presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora caberá concessão de medida liminar, conforme consta do art. 7º, III, da Lei nº 12.016/09, e não de alguma das tutelas do referido art. 300 do CPC.

2.2 - Matéria de Mérito: Medida Liminar

Neste mandado de segurança, a Parte Impetrante sustenta que seu direito líquido e certo teria sido violado por omissão da DD Autoridade apontada coatora, eis que não teria sido apreciado o seu requerimento administrativo de solicitação de cópia do processo administrativo, protocolado em 01/11/2021, em prazo razoável, em consonância com princípios constitucionais e a própria legislação de regência.

Mencionado pedido corresponde a um pedido de certidão de inteiro teor de tais documentos. Então, para evitar o trabalho de se expedir certidão tão longa, com o inteiro  teor desses documentos, admite-se que a Administração forneça ao Administrado cópia de tais documentos, na verdade de peças do Processo Administrativo.

Pois bem, de acordo com o princípio da duração razoável do processo e do princípio da celeridade processual, incluídos inciso LXXVIII do no art. 5º da Constituição da República/88 pela Emenda Constitucional 45/04, a Administração Pública deve solucionar, em tempo razoável, o processo judicial e o administrativo.

Antes dessa EC, a Lei nº 9.784/99, já estabelecia "normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da Administração" (art. 1º). Essa Lei, em seu art. 49, fixou o prazo de trinta dias para a Administração decidir o processo administrativo, a saber:

"Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada."

Aliás, o art. 46 da citada Lei nº 9.784/99, sem fixar prazo, consignou que os interessados têm direito à obtenção de certidões ou de cópias reprográficas dos dados e documentos que integram o processo administrativo, in verbis.

"Art. 46. Os interessados têm direito à vista do processo e a obter certidões ou cópias reprográficas dos dados e documentos que o integram, ressalvados os dados e documentos de terceiros protegidos por sigilo ou pelo direito à privacidade, à honra e à imagem.".

Finalmente, a Lei nº 9.051/95, que dispõe sobre a expedição de certidões para a defesa de direitos e esclarecimentos de situações, concedeu à Administração o prazo improrrogável de quinze dias para a emissão de certidões, in verbis:

"Art. 1º As certidões para a defesa de direitos e esclarecimentos de situações, requeridas aos órgãos da administração centralizada ou autárquica, às empresas públicas, às sociedades de economia mista e às fundações públicas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, deverão ser expedidas no prazo improrrogável de quinze dias, contado do registro do pedido no órgão expedidor.".

No caso em análise, pelo que se infere da documentação anexada com a Petição Inicial, o referido arcabouço constitucional e legal deixou de ser observado pela Autoridade Impetrada, pois ultrapassado período de tempo bem superior a 15 (quinze) dias, sem que o requerimento administrativo da Parte Impetrante protocolado em 01.11.2021 (protocolo nº 1804015706), tenha sido analisado.

Mais quinze dias será suficiente para que a referida DD Autoridade atenda ao mencionado pleito da Parte ora Impetrante. 

3. Dispositivo

Posto ISSO:

3.1 - Preliminarmente, afasto a decadência do direito de uso do procedimento mandado de segurança, afasto a aplicação das figuras jurídicas do art. 300 do CPC, e concedo à Parte Impetrante, provisoriamente, o benefício da assistência judiciária gratuita.

3.2 - Liminarmente, concedo à DD Autoridade Impetrada mais 15(quinze) dias úteis(caput do art. 219 do CPC, prazo processual[2]), contados da notificação para prestar informações e cumprir esta decisão, para decidir o pedido administrativo da Parte ora Impetrante, sob pena de o INSS ficar obrigado a pagar, após esse prazo, multa a cada 30(trinta) dias corridos(Parágrafo Único do art. 219 do CPC, prazo não processual[2]) de atraso, no valor de R$ 1.250,00(hum mil, duzentos e cinquenta reais), contado o prazo de 30(trinta) dias para o cálculo e pagamento da multa de forma corridos, com atualização anual pelo IPCA-E, sem prejuízo também da responsabilização da Autoridade apontada como coatora, nos termos do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009, bem como pela possibilidade de o INSS cobrar-lhe regressivamente o valor da multa, que tenha que pagar à Parte Impetrante.

3.3 - Notifique-se a referida DD Autoridade para o cumprimento da decisão supra, sob as penas acima indicadas, bem como para prestar informações no prazo legal de 10(dez) dias, e que também se dê ciência à representação processual do INSS, na forma e para os fins do inciso II do art. 7º da Lei acima referida.

No momento oportuno, ao MPF para apresentação do seu r. parecer legal.

Intime-se.

Recife, 10.03.2022

Francisco Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal da 2a Vara da JFPE

 (lb)

________________________________________________

[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 5ª Turma.  AgRg no RMS 31213/PE. Relatora Laurita Vaz. Julgamento em 13.09.2011, in DJe 27/09/2011.

Disponível em 

https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=17530144&num_registro=200902484366&data=20110927&tipo=5&formato=PDF

Acesso em 15.02.2022

[2] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Terceira Turma. Recurso Especial RESP nº 1708348 2017.02.92104-9, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 01/08/2019

 

terça-feira, 1 de março de 2022

CONTRATO BANCÁRIO. MÚTUO PARA PESSOA JURÍDICA. NÃO APLICAÇÃO DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS E PERCENTAUIS DOS JUROS. AFASTAMENTO DE TARIFAS.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Na sentença que segue, há um bom estudo sobre a capitalização de juros no Brasil, bem como se indica o motivo pelo qual o Código do Consumidor não se aplica à operação em debate, o problema dos percentuais dos juros e o afastamento da cobrança de tarifas não previstas no contrato. 


Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0822355-57.2019.4.05.8300 - EMBARGOS À EXECUÇÃO
EMBARGANTE: M V C DA S e outros
ADVOGADO: Diego Henrique De Arruda Santos
EMBARGADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL
ADVOGADO: Servio Tulio De Barcelos
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)



 

Sentença tipo A



EMENTA: DIREITO ECONÔMICO. CONTRATO DE MÚTUO.

EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL. TÍTULO EXECUTIVO CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. CONTRATO FIRMADO APÓS 31.03.2000. POSSIBILIDADE. COBRANÇA INDEVIDA DE TARIFA DE SERVIÇO.

PROCEDÊNCIA EM PARTE.

 

Vistos etc..

1. Relatório

ATITUDE NEGÓCIOS IMOBILIÁRIOS E PARTICIPAÇÕES SOCIETÁRIAS, CARLOS FELIPE DA SILVA e MARILIA VERÇOSA CARNEIRO DA SILVA, qualificados na petição inicial, propuseram, tempestivamente, estes embargos à execução de título extrajudicial nº 0814549-68.2019.4.05.8300 em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA. Alegaram, em síntese, que: a) celebraram com a Embargada, em 14.08.2018, um empréstimo mediante CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO GIROCAIXA FÁCIL nº 153536734000029563 (PESSOA JURÍDICA - PJ), com o propósito de abertura de crédito no importe de R$300.000,00(trezentos mil reais), tendo sido realizado Termo de Constituição de Garantia, sob o veículo M.BENZ, ANO DE FABRICAÇÃO: 2013, MODELO: AXOR 2544 S, PLACA: PGR-5265, COR: BRANCA, CÓDIGO RENAVAM: 600425266; b) o título apresentado não teria força executiva, porque não preencheria os termos do art784,XII do Código de Processo Civil c/c art. 28, caput, da Lei 10.931/2004; c) não foram carreados aos autos os extratos referentes aos demais períodos, a saber, da data do início da inadimplência até a data da propositura da ação, em 30.07.2019; d) a aplicação do Código de Defesa do Consumidor; e) a existência de cláusulas contratuais ilegais e abusivas; f) cobrança de encargos ilegais (juros capitalizados; juros remuneratórios; tarifas de serviços; comissão de permanência com juros moratórios). Ao final, requereram:

"1Preliminarmenteseja reconhecida a ausência de viabilidade de Execução do Título em razão de não ser dotado dos requisitos essenciais: certeza, liquidez e exigibilidade. (Conforme item III, desta petição.)

2. Que, caso se admita o exame de mérito referente ao TÍTULO DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL, se limite o valor da Execução ao importe das parcelas vencidas até a data da propositura da ação. (Conforme item III, desta petição.)

3No Mérito, reconhecer a hipótese patente de aplicação do Código de Defesa do Consumidorpor ser a empresa creditada a destinatária final do Capital, ou ainda, por haver, no caso dos autos, onerosidade excessiva. (Conforme item IV, desta petição.)

4. Se determine a apuração do saldo devedor mediante Perícia de Contador Judicial, após delimitadas as obrigações contratuaisImpossibilidade de cumulação de comissão de permanência com juros moratórios, vedação da capitalização de juros, ilegalidade na cobrança de Tarifa de Serviço e o reajuste dos Juros Remuneratórios para a taxa média de Mercado(Conforme item V, desta petição.)

Instruíram a inicial com Instrumento de Procuração e documentos.

CAIXA apresentou impugnação aos embargos à execução (ID.4058300.13202344). Oportunidade na qual defendeu a liquidez e exigibilidade do crédito; a impossibilidade de alterar os termos da avença pactuada pelas partes; ausência de qualquer vício que invalide o negócio jurídico celebrado entre as partes; a inexistência de limitação da taxa de juros, uma vez que o Decreto nº 22.626, de 1933, não se aplicaria às taxas de juros advindos de operações realizadas por instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional; a legalidade da capitalização de juros nos contratos bancários consubstanciados em cédulas de crédito bancário inteligência do art. 28, § 1º, inciso I, da lei 10.931/04 - aplicabilidade ainda das Medidas Provisórias n.º 1.963-17, de 31/03/2000 e 2.170-36, art. 5º, de 23/08/2001; a possibilidade de cobrança da comissão de permanência; a legalidade das tarifas de serviço; e a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Ao final requereu a total improcedência dos Embargos à Execução.

Despacho (ID.4058300.13280126) no qual os embargos foram recebidos, apenas, no efeito devolutivo e, diante da manifestação da Parte Embargada, foi determinada a remessa dos autos à Contadoria Judicial para verificar sobre a correção dos cálculos apresentados pelas partes, devendo apontar o valor correto.

A Contadoria Judicial informou que:

"(...) a CEF elaborou seus cálculos em conformidade com a cláusula de inadimplência do contrato firmado entre as partes (Id. 4058300.11332911).

Assim, ante o exposto, esta Contadoria concorda com os cálculos efetuados pela CEF." (ID.4058300.13436270).

Ato ordinatório (ID.4058300.13968236) no qual as partes foram intimadas acerca do parecer da Contadoria Judicial.

Certificado o decurso do prazo sem a manifestação das partes (ID.4058300.14565191).

CAIXA requereu o cadastramento do nome do I. advogado SERVIO TULIO DE BARCELOS, OAB/PE1885A, CPF: 317.745.046-34 (ID.4058300.15389168). E juntou Substabelecimento (ID.4058300.15389170).

CAIXA requereu a juntada do Demonstrativo discriminado e atualizado do débito (ID.4058300.15389627 e ID.4058300.15389629).

A Parte Embargante informou que os documentos acostados pela CAIXA sob o id.4058300.15389627 e id.4058300.15389629 não se relacionariam com a demanda em deslinde. Informou, ainda, que possuiria interesse pela composição com a Parte Embargada, na busca de uma solução equilibrada, viável e tangível para as partes e pugnou pela designação de Audiência de Conciliação (ID.4058300.19166124).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório. Decido.

2. Fundamentação

2.1. O pedido de realização de audiência de tentativa de conciliação já foi objeto de apreciação nos autos da execução principal e foi indeferido, consoante decisão tombada sob o número de id.4058300.20423594.

As poderiam ter se conciliado por petição, mas não o fizeram. 

Então o novo pedido de realização de audiência de conciliação tem feição procrastinatória. 

Por isso, não merece ser acolhido. 

2.1.1. Os documentos "Demonstrativo de Débito" juntados pela CAIXA (ID.4058300.15389627 e ID.4058300.15389629), NÃO PODEM SER CONHECIDOS, uma vez que não dizem respeito a esta demanda.

2.2. A respeito da alegada ausência de título executivo, constato, nos documentos acostados do id  4058300.11332909 até id. 4058300.11332912 nos autos da ação executiva, feito principal, tombada sob PJe nº 0814549-68.2019.4.05.8300, que dizem respeito à "Cédula de Crédito Bancário - GIROCAIXA Fácil - OP 734" de nº 734-3536.003.00001004-6, bem como ao respectivo Demonstrativo de Débito, Demonstrativo de Evolução Contratual, Sistema de Histórico de Extratos - SIHEX (id. 4058300.11662905 até id. 4058300.11332908). 

O art. 784 do CPC identifica os requisitos necessários de um título executivo extrajudicial, verbis:

Código de Processo Ccivil de 2015

"Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais:

I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque;

II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor;

III - o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas;

(...)

XII - todos os demais títulos aos quais, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva. (grifei).".

E a Lei nº 10.931/2004, que dispõe sobre a Cédula de Crédito Bancário, em seu art. 28, estabelece, verbis:

"Art. 28. A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo, ou nos extratos da conta corrente, elaborados conforme previsto no §2º.".

Então, na merece acolhida a alegação da ausência de título de crédito em execução, nos autos principais.

2.3. Quanto à alegada, pela CAIXA, de inaplicabilidade do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, Lei 8.078, de 1990, na operação financeira em debate, realmente, mencionado Código não incide nas relações firmadas entre pessoas jurídicas em que o produto ou serviço contratado é utilizado na implementação da atividade econômica da Empresa Mutuária, ou seja, esta, com relação à tal operação bancária, não é consumidora final, conforme se extrai  claramente do caput do art. 2º desse Código.

Nesse sentido, invoco o seguinte precedente da 4ª Turma do STJ:

"RECURSO ESPECIAL. CONEXÃO COM RESP. 1.190.525/SP. ART. 535 DO CPC/1973. NÃO VIOLADO. RELAÇÃO DE CONSUMO E RELAÇÃO DE INSUMO. EMPRÉSTIMO BANCÁRIO. NATUREZA DE INSUMO. UTILIZAÇÃO DA ANALOGIA. DESNECESSIDADE. NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR. POSSIBILIDADE DE PROSSEGUIMENTO DO CESSIONÁRIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS ARBITRADOS. MAJORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ.

1. Recurso especial conexo ao REsp n. 1.190.525/SP.

2. (...)

3. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza, como destinatário final, produto ou serviço oriundo de um fornecedor. Por sua vez, destinatário final, segundo a teoria subjetiva ou finalista, adotada pela Segunda Seção desta Corte Superior, é aquele que ultima a atividade econômica, ou seja, que retira de circulação do mercado o bem ou o serviço para consumi-lo, suprindo uma necessidade ou satisfação própria, não havendo, portanto, a reutilização ou o reingresso dele no processo produtivo.

Logo, a relação de consumo (consumidor final) não pode ser confundida com relação de insumo (consumidor intermediário).

Inaplicabilidade das regras protetivas do Código de Defesa do Consumidor.

4. Em caso de empréstimo bancário feito por empresário ou pessoa jurídica com a finalidade de financiar ações e estratégias empresariais, o empréstimo possui natureza de insumo, não sendo destinatário final e, portanto, não se configurando a relação de consumo.

5. (...)"[1].

Então, as regras desse Código não serão aplicadas neste caso. 

2.4. No que diz respeito à capitalização dos juros, a Embargada não nega que haja capitalização, mas sustenta que, como o contrato foi firmado em 16.07.2018, mencionada capitalização já se encontrava autorizada para contratos com Instituições Financeiras, por ato legislativo constitucional, de forma que a legislação invocada pelos Embargantes estaria derrogada e mencionada Súmula 121 do STF superada para o tipo de contrato em debate.

Realmente, quanto à capitalização de juros, como se sabe, o art. 192 da Constituição foi mutilado pela Emenda Constitucional nº 40, de 2003, que praticamente o revogou. Então, depois dessa Emenda, o assunto juros passou a poder ser regido por Lei Ordinária e/ou por Medida Provisória.

A Medida Provisória nº 2.170-36, de 23.08.2001, que ratificou a Medida Provisória nº 1.993 e foi perenizada pela Emenda Constitucional nº 32, de 11.09.2001, constitucionalizou-se com o advento da mencionada Emenda Constitucional nº 40, de 2003, porque, quando esta veio à luz, continuavam em vigor por força da referida Emenda Constitucional nº 32, de 2001.

Logo, quando o contrato em questão (ID. 4058300.11332909 até ID. 4058300.11332912) foi firmado, em 16.07.2018, como alegado pela CAIXA e acima demonstrado, havia legislação ordinária autorizando a capitalização de juros, para esse tipo de contrato, ainda que com periodicidade inferior a um ano.

E o Plenário da mencionada Suprema Corte, apreciando mencionada Medida Provisória, decidiu:

"Ementa: CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA. SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO ESTRITO. AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS. RECURSO PROVIDO.

1. A jurisprudência da Suprema Corte está consolidada no sentido de que, conquanto os pressupostos para a edição de medidas provisórias se exponham ao controle judicial, o escrutínio a ser feito neste particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal de relevância e de urgência.

2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP 2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria extremamente sensível para a estruturação do sistema bancário, e, consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida econômica do país.

3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato também não pode ser rechaçada, ainda mais em se considerando que, para tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à época, ou seja, há quinze anos passados.

4. Recurso extraordinário provido.".[2]

Logo, o pleito da Parte Embargante para que seja afastada a capitalização de juros não merece acolhida.

2.4.1. Também não prospera a alegação de que a cobrança da taxa de juros aplicada ao contrato (19,8%a.a.) seria superior ao do mercado, inclusive porque, embora a taxa média apurada para o mês da assinatura do contrato (JUL/2018) e indicada na consulta ao Banco Central (15,8%a.a.), não se verifica a apontada abusividade.

Tampouco merece prosperar o pedido de afastamento da Comissão de Permanência, uma vez que é possível sua cobrança desde que calculada pela taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil e limitada à taxa do contrato (Súmula 294 STJ)

2.4.2. A insurgência da Parte Embargante contra a cobrança da Tarifa de Serviço sob a alegação de que o valor pactuado seria abusivo merece acolhida.

Isso porque, conforme Resolução 3518/2007 do Banco Central é possível a cobrança de serviços de terceiros ou tarifas, desde que expressamente prevista em contrato:

"Resolução 3.518/07 - Art. 1º A cobrança de tarifas pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário.

Parágrafo único. Para efeito desta resolução:

I - considera-se cliente a pessoa que possui vínculo negocial não esporádico com a instituição, decorrente de contrato de depósitos, de operação de crédito ou de arrendamento mercantil, de prestação de serviços ou de aplicação financeira;

II - os serviços prestados a pessoas físicas são classificados como essenciais, prioritários, especiais e diferenciados;

III - não se caracteriza como tarifa o ressarcimento de despesas decorrentes de prestação de serviços por terceiros, podendo seu valor ser cobrado desde que devidamente explicitado no contrato de operação de crédito ou de arrendamento mercantil."

Como tais tarifas não se encontram previstas no contrato em debate, esse pleito merece acolhida. 

2.5. Da sucumbência

Constato que a Parte Embargante formulou 8(oito) grandes pedidos, tendo sido vitoriosa em apenas um deles, o afastamento da cobrança da tarifa de serviços, de forma que ficará responsável por 7/8 das custas processuais e a Parte Embargada pelo outro 1/8.

À luz do §14 do art. 85 do vigente Código de Processo Civil, fixa-se a verba honorária sobre as respectivas sucumbências, porque não pode ser objeto de compensação, uma vez que pertencente aos advogados das Partes. 

E deve ser estabelecido o percentual legal mínimo de 10% (dez por cento), conforme § 2º do mencionado artigo legal, porque os temas não exigiram dos respectivos Advogados grande esforço, uma vez que as matérias já foram enfrentadas pelos Tribunais Superiores e pela Suprema Corte.

Assim, os Embargantes pagarão verba honorária aos Patronos da Embargada no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da execução, após exclusão do valor da tarifa de serviços.

E a parte Embargada pagará verba honorária aos Patronos dos Embargantes no mesmo percentual, sobre o valor da tarifa de serviços que estava sendo indevidamente cobrada.

Mencionados valores principais serão apurados nos autos principais, por onde se processa a execução.

Mas a execução dessa verba honorária ocorrerá nestes autos, desta ação de embargos à execução do julgado, para evitar tumulto nos autos principais.

3. Dispositivo

Posto isso:

3.1) preliminarmente, indefiro o pedido de realização de audiência de conciliação;

3.1.1) não conheço dos  documentos juntados pela CAIXA (ID.4058300.15389627 e ID.4058300.15389629), estranhos ao presente caso, e determino que a Secretaria do Juízo providencie a respectiva eliminação destes autos, nos termos do subitem 2.1.1bem como certifique nos autos;

3.1.2) rejeito as preliminares arguidas pela Parte Embargante;

3.2) Quanto ao mérito, julgo parcialmente procedentes os pedidos desta ação, decreto a nulidade da cobrança da tarifa de serviços, e condeno a Embargada a providenciar a exclusão do respectivo valor do total dos valores devidos pela Parte Embargante e o faça nos autos principais, para o que suspendo a execução naqueles autos até que a Embargada faça a devida revisão, com mencionada exclusão, a ser submetida, naqueles autos, à homologação, para posterior retomada da execução.

3.3) no que diz respeito às verbas de sucumbência, condeno:

3.3.1) a Parte Embargante ao pagamento de 7/8(sete oitavos) das custas processuais e de 10% (dez por cento) de verba honorária sobre o valor da execução, após a dedução do valor da tarifa de serviços, a ser realizada na forma indicada na fundamentação supra e no subitem 3.2 deste dispositivo;

3.3.2) a Parte Embargada em 1/8 (um oitavo) das custas judiciais e a pagar aos patronos da Parte Embargante 10% (dez por cento) de verba honorário sobre o valor da tarifa de serviços, a ser apurado na forma indicada na fundamentação supra;

3.4) com urgência, traslade-se cópia desta sentença para os autos principais, cujo andamento deverá ser imediatamente suspenso, para os fins indicados no subitem 3.2 desta parte dispositiva desta sentença.

Registrada. Intimem-se.

Recife/PE, 01.03.2022.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara da JFPE

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Nota(s) de Rodapé

[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. REsp 1599042/SP, Relator Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, julgado em 14/03/2017, in DJe 09/05/2017.

[2] Brasil. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Relator Ministro Marco Aurélio. Relator(a) p/ Acórdão Ministro Teori Zavascki, Recurso Extraordinário - RE nº 592.377, julgado em 04/02/2015, acórdão eletrônico, repercussão geral - mérito, Diário da Justiça Eletrônico - Dje nº 055, divulgado em 19-03-2015, publicado em 20-03-2015.