quinta-feira, 26 de agosto de 2021

ANTECIPAÇÃO DE VACINA. MATÉRIA QUE ENVOLVE MÉRITO ADMINISTRATIVO. NEGAÇÃO DA SEGURANÇA.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O Conselho Regional da categoria de Educadores Físicos queria que este Juízo obrigasse o Município  de Jaboatão dos Guararape-PE a incluir os profissionais da sua categoria no mesmo plano de vacinação dos profissionais de saúde, tendo sido negada a medida liminar e no final negada a segurança. Extrai-se da fundamentação que esse tipo de matéria não pode ser judicializada, porque faz parte do mérito administrativo, ou seja, cabe ao Sr. Prefeito decidir, como, alíás, concluiu o Supremo Tribunal Federal em julgado do início da pandemia da covid19. 

Boa leitura.  

 PROCESSO Nº: 0800542-67.2021.4.05.8311 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL

IMPETRANTE: CONSELHO REGIONAL DE EDUCACAO FISICA DA 12 REGIAO PERNAMBUCO/ALAGOAS - CREF12/PE-AL

ADVOGADO: F B De A S

IMPETRADO: MUNICIPIO DE JABOATÃO DOS GUARARAPES
AUTORIDADE COATORA: PREFEITO DO MUNICÍPIO DE JABOATÃO DOS GUARARAPES - ANDERSON FERREIRA RODRIGUES
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



Sentença tipo B


EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA. INCLUSÃO DOS PROFISSIONAIS DA SUA CATEGORIA NO PLANO PRIORITÁRIO DE VACINAÇÃO ESTADUAL/MUNICIPAL CONTRA A COVID-19. ALEGADA OMISSÃO DO MUNICÍPIO DO JABOATÃO DOS GUARARAPES/PE. INOCORRÊNCIA.

- DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA. 

 

Vistos etc.

1. Relatório

O CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA 12ª REGIÃO - PERNAMBUCO - CREF12/PE, qualificado na petição inicial, impetrou, em 28/05/2021, este "MANDADO DE SEGURANÇA  C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA", em face de ato atribuído à autoridade coatora do MUNICÍPIO DO JABOATÃO DOS GUARARAPES, representado pelo seu prefeito, Sr. Anderson Ferreira Rodrigues, objetivando, em sede de tutela de urgência antecipada, seja determinado ao Município Impetrado a inclusão imediata de todos os Profissionais de Educação Física no programa prioritário de vacinação do grupo de Profissionais e Trabalhadores da Saúde contra a Covid-19. Alegou, em síntese, que: no Brasil, a COVID-19 já teria atingido cerca de 16.274.695 casos confirmados e ainda o total de 422.340 óbitos, até o último dia 26/04/2021, conforme os dados extraídos do site do Ministério da Saúde; o Estado de Pernambuco teria registrado o acumulado de 470.063 casos confirmados de COVID, com 15.524 óbitos em decorrência da síndrome respiratória aguda grave, conforme os dados da Secretaria Estadual de Saúde constantes do site do órgão; conforme informação do Governo Federal, os trabalhadores de saúde integrariam os primeiros grupos prioritários, e já teriam sido aplicadas pelo Governo do Estado de Pernambuco o total de 2.656.224 doses da vacina para Covid-19, sendo que nenhuma dessas doses teriam sido destinadas aos profissionais de Educação Física no Município coator, mesmo estes se enquadrando no Plano Nacional de Vacinação do Governo Federal; o Ministério da Saúde teria publicado o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19, com vista a estabelecer ações e estratégias para operacionalização da vacinação contra a doença, ficando estabelecida a prioridade de vacinação dos Profissionais de Educação Física, juntamente com outros trabalhadores da saúde; a maior parte das categorias dos Profissionais da saúde listados pelo Plano de Imunização formulado pelo Governo Federal já teria sido cadastrada ou recebido a primeira dose da vacina contra a Covid-19 pelos auspícios da rede municipal de saúde, contudo, os profissionais de educação física não teriam recebido uma única dose e quando intentam a imunização seriam barrados; o Prefeito do Município de Jaboatão dos Guararapes teria autorizado a vacinação de pessoas com mais de 59 anos e a inclusão de diversas classes alheias aos profissionais de saúde; ou seja, pessoas sem qualquer contato com o vírus em razão do seu trabalho, mas que tenham mais de 59 anos poderiam se vacinar em detrimento aos profissionais de saúde da educação física; o Município de Jaboatão estaria executando o seu plano de vacinação sem qualquer embasamento técnico-estatístico, contrariando o disposto no Plano Nacional de Vacinação; o Conselho Regional de Educação Física teria encaminhado, ainda em janeiro de 2021, o Ofício CREF12/PE/0026/2021, cobrando ao Governo do Estado a inclusão dos  Profissionais de Educação Física no grupo de prioridade do plano de imunização do Estado de Pernambuco, independentemente do local de trabalho, em homenagem aos princípios da universalidade e de integralidade garantidos por lei; sem que houvesse qualquer ação concreta do Ente Público Estatal para com a inserção dos profissionais de saúde em seu plano de imunização, o CREF teria voltado a expedir novo ofício, desta vez o ofício/CREF12/PE/0153/2021, reiterando a importância da inclusão dos Profissionais de Educação Física, independentemente de local de trabalho, no grupo prioritário do Plano de Operacionalização para Vacinação Contra a COVID-19 no Estado de Pernambuco, garantindo assim a essencialidade das intervenções dos 13.462 Profissionais de Educação Física registrados no CREF12/PE que trabalhariam em hospitais, CAPS, Nasf, parques, praças, praias, condomínios, residências e também nas 1.899 pessoas jurídicas (academia, box, estúdios, clubes etc.) registradas no Conselho; restaria demonstrada a total omissão do Município de Jaboatão dos Guararapes/PE quando o mesmo ignora o comando decorrente do Plano Federal, violando direito fundamental da preservação da saúde pública, uma vez que os profissionais de Educação Física estariam sendo expostos diariamente ao vírus e colocando em risco não apenas a sua saúde, mas também a saúde dos seus familiares e alunos dada a natureza essencial das suas atividades; não teria restado outra saída, a não ser impetrar o presente mandamus, a fim de que seja o Município de Jaboatão dos Guararapes compelido a incluir os Profissionais de Educação Física de todo o município no grupo prioritário de Profissionais da Saúde alvo do plano de Vacinação municipal, bem como para que oriente e direcione os seus técnicos, enfermeiros e médicos a realizarem adequadamente a vacinação. Teceu outros comentários. Requereu, ao final, a concessão da tutela de urgência antecipada: "a) Seja o pedido de antecipação da tutela de urgência concedido para, determinar que o Impetrado, em caráter imediato e urgente, seja compelido ao cumprimento da obrigação de fazer consubstanciada na inclusão imediata de todos os Profissionais de Educação Física no programa prioritário de vacinação do grupo de Profissionais e trabalhadores da saúde, do Município de Jaboatão dos Guararapes, sob pena de ser aplicada multa pecuniária no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por dia de descumprimento." No mérito, requereu: "c) A concessão da segurança, com a procedência do presente mandado de segurança, para tornar definitivos os efeitos da liminar pleiteada, assegurando-se o direito líquido e certo referido no item "a)" destes pedidos." Atribuiu valor à causa. Petição inicial instruída com instrumento de procuração e documentos.

A ação foi ajuizada, originariamente, perante a 30ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Jaboatão dos Guararapes/PE, tendo sido redistribuída a este Juízo da 2ª Vara Federal (id. 4058311.18997281),

Despacho no qual se determinou a intimação da Parte Impetrante para completar a petição inicial, apontando a autoridade coatora (id. 4058300.19023678).

A Parte Impetrante, em atenção ao despacho supra, indicou como Autoridade coatora o Sr. Prefeito do Município de Jaboatão dos Guararapes/PE (id. 4058300.19134359).

Decisão proferida em 25/06/2021 (id. 4058300.19346833), na qual foi indeferida a medida liminar pleiteada; determinada a notificação da Autoridade apontada como coatora para prestar informações, bem como ciência ao órgão de representação judicial da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL; e vista ao MPF, para o r. parecer legal.

A Autoridade apontada como coatora, o I. Sr. Prefeito Municipal Anderson Ferreira, e o MUNICÍPIO DO JABOATÃO DOS GUARARAPES, manifestando desde já seu interesse na lide, apresentaram informações (id. 4058300.19588219), esclarecendo que os profissionais de educação física já estão sendo contemplados no plano nacional de vacinação, razão pela qual requerem a extinção do processo pela perda de objeto. Juntado ofício da Secretaria Municipal de Saúde (id. 4058300.19588220).

O Ministério Público Federal ofertou seu r. parecer, no qual opina pela denegação da segurança (id. 4058300.19745877).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2.  Fundamentação

2.1 - Não existe a prevenção acusada pelo sistema PJe com o(s) processo(s) ali indicado(s), pois os pedidos e as causas de pedir dos feitos acusados preventos são distintos do pedido e da causa de pedir do presente mandamus.

Nessa situação, a Secretaria deste Juízo deve retirar a anotação de prevenção.

2.2 - O cerne do presente mandamus consiste em decidir se houve, ou não, omissão do Município Impetrado na inclusão dos profissionais de Educação Física nos grupos prioritários de vacinação contra a Covid-19.

Como não houve alterações das circunstâncias fático-jurídicas desde o indeferimento da medida liminar, passo a transcrever a suprarreferida decisão exarada em 25/06/2021 (id. 4058300.19346833), verbis:

"2.3 - A concessão de medida liminar em mandado de segurança exige a concorrência dos dois pressupostos legais: a relevância do fundamento (fumus boni juris) e o perigo de um prejuízo se do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida caso, ao final, seja deferida (periculum in mora).

No presente mandado de segurança, pretende o Conselho Impetrante obter provimento jurisdicional a fim de que seja o Município Impetrado compelido a incluir os profissionais de Educação Física em sua programação prioritária de vacinação contra a Covid-19.

Eis o pedido de concessão de medida liminar, formulado pela Parte Impetrante na petição inicial:

"a) Seja o pedido de antecipação da tutela de urgência concedido para, determinar que o Impetrado, em caráter imediato e urgente, seja compelido ao cumprimento da obrigação de fazer consubstanciada na inclusão imediata de todos os Profissionais de Educação Física no programa prioritário de vacinação do grupo de Profissionais e trabalhadores da saúde, do Município de Jaboatão dos Guararapes, sob pena de ser aplicada multa pecuniária no importe de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por dia de descumprimento".

Data venia, não tenho por presentes os requisitos autorizadores da pretendida medida liminar, como passo a demonstrar.

Afirma o Conselho Impetrante, em suma, ser direito da categoria por ele representada a inclusão no plano prioritário de vacinação municipal contra a Covid-19, organizado pelo Município de Jaboatão dos Guararapes/PE, sob o argumento de que os profissionais de Educação Física são trabalhadores reconhecidos como profissionais da saúde, tanto pela Resolução nº 218/1997, do Conselho Nacional de Saúde, quanto pelo Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a COVID-19 elaborado pelo Ministério da Saúde.

De fato, os profissionais de Educação Física, desde 1997, com a publicação da Resolução nº 218, do Conselho Nacional de Saúde - CNS (id. 4058311.18979197), integram a lista de profissionais de saúde e estão contemplados no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19, elaborado pelo Ministério da Saúde (id. 4058311.18979183 a 4058311.18979196), assim como no Plano de Operacionalização para Vacinação contra a Covid-19 no Estado de Pernambuco (id. 4058311.18979186).

Registro que no presente mandamus não se discute o reconhecimento, nem muito menos a importância, dos profissionais de Educação Física na atuação como profissionais de saúde, mas tão-somente a suposta omissão do Município Impetrado em incluir tais profissionais nos grupos prioritários de vacinação contra a Covid-19.

Nesse ponto, tenho que o fato de os profissionais de Educação Física estarem previstos no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 no grupo prioritário de trabalhadores da saúde, por si só, não significa que eles devam ou possam ser vacinados no mesmo momento que outras categorias de trabalhadores da saúde ou outros grupos prioritários (idosos, profissionais da "linha de frente" de combate à Covid etc.), haja vista que a noticiada escassez de vacina exige que, dentro de cada grupo com o direito à vacinação, seja definida a prioridade de subgrupos, que seria uma prioridade dentro das prioridades, conforme disponibilização das vacinas pelo Ministério da Saúde.

Sobre a ordem de priorização na vacinação dentro dos grupos prioritários, a 5ª edição do Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação Contra a COVID-19, editado em 15/03/2021 (id. 4058311.18979184, 4058311.18979183 e 4058311.18979196), traz em seu Anexo II a NOTA TÉCNICA Nº 155/2021-CGPNI/DEIDT/SVS/MS, "que trata da ordem de priorização na vacinação dentro dos grupos prioritários, nas distintas fases de vacinação contra a Covid-19", na qual se esclarece que alguns grupos prioritários possuem um grande volume populacional, fazendo-se necessário estabelecer "prioridade dentro da prioridade", uma vez que não há doses suficientes para vacinar todo o grupo em etapa única, in verbis:

"(...)

Assim, considerando que alguns grupos prioritários elencados possuem um grande volume populacional, faz-se necessário prever algumas prioridades dentro desses estratos populacionais ("prioridade dentro da prioridade") dado a possibilidade de doses insuficientes para cobrir todo o grupo em etapa única. Resgata-se no quadro abaixo os grupos descritos no PNO, segundo sua ordem de priorização para vacinação na Campanha Nacional 2021:

(...)"

Especificamente sobre os profissionais da saúde, há orientação de se priorizar os trabalhadores da "linha de frente" no combate à Covid-19 e, à medida que forem sendo disponibilizadas as doses de vacinas, deverá ser estendida aos demais grupos de trabalhadores da saúde, até atender 100% desses profissionais:

"(...)

Em caráter de continuidade, de se estabelecer critérios para vacinação por etapas dentro do grupo prioritário, nas ocasiões em que o quantitativo de doses distribuídas não forem suficientes para cobrir o grupo específico do chamamento, recomenda-se:

Trabalhadores da Saúde: equipes de vacinação que estiverem inicialmente envolvidas na vacinação dos grupos; trabalhadores das Instituições de Longa Permanência de Idosos e de Residências Inclusivas; trabalhadores dos serviços de saúde públicos e privados em unidades de referência para atendimento aos casos suspeitos e confirmados de covid-19. Seguidamente, conforme mais doses de vacinas forem sendo disponibilizadas ao grupo de trabalhadores da saúde, elencar os demais trabalhadores de saúde, até atender em 100% esse público prioritário."

Portanto, a orientação do Plano Nacional de Imunização - PNI é clara no sentido de que as doses de vacinas disponibilizadas devem ser destinadas àqueles grupos que, inicialmente, já apresentam maior risco de exposição, complicação e óbito pela covid-19, conforme conclusão da referida Nota Técnica:

"Diante do quantitativo ainda limitado na disponibilidade das vacinas para oferta à população-alvo da Campanha Nacional de Vacinação contra a Covid-19 2021, o PNI ratifica a importância das doses disponibilizadas serem destinadas àqueles grupos que, inicialmente, já apresentam maior risco de exposição, complicação e óbito pela covid-19, conforme prioridades elencadas no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19 (PNO).

Conforme o chamamento dos grupos prioritários, em ordem elencada pelo PNO, não havendo doses suficientes para cobrir 100% do referido grupo, recomenda-se a adoção das estratégias supracitadas nesta Nota, em consonância com as orientações divulgadas oportunamente nos Informes Técnicos da campanha."  (grifei)

Por outro lado, da análise dos documentos juntados pelo Conselho Impetrante, o Município de Jaboatão dos Guararapes vem dando, aparentemente, regular prosseguimento à vacinação dos grupos prioritários, de acordo com as orientações do Plano Nacional de Imunização - PNI e da Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco, observando, naturalmente, a disponibilidade das vacinas aprovadas e adquiridas para o uso no país.

É oportuno ressaltar que o controle jurisdicional dos atos omissivos ou comissivos da Administração Pública deve ser efetuado com cautela, na medida em que, via de regra, não cabe ao Judiciário avançar sobre competências que foram legitimamente outorgadas ao Poder Executivo.

Neste contexto, a pretensão do Conselho Impetrante, como visto, é obter provimento jurisdicional no sentido de compelir o Município Impetrado a alterar a programação estabelecida para a vacinação dos grupos prioritários contra a Covid-19, com a inclusão dos profissionais de Educação Física em seu programa de imunização.

Ora, repito, isso faz parte do mérito do ato administrativo municipal, o qual, por não estar contrariando nenhum outro ato normativo superior, pelo menos não há prova em sentido contrário, não pode sofrer interferência do Poder Judiciário.

Ademais, a complexidade da matéria e a necessidade de observância de determinadas fases na consolidação de um plano de enfrentamento à Covid-19 não autorizam, neste momento, o acolhimento da pretensão do Impetrante.

Com essas considerações, inexistindo elementos nos autos aptos a caracterizar a alegado fumus boni iuris, é de ser indeferido o pedido liminar formulado pelo Conselho Impetrante.

Ausente o pressuposto supracitado, entendo desnecessária a análise da presença do periculum in mora, tendo em vista que a concessão do provimento demanda a concomitância dos pressupostos.

3. Dispositivo

3.1 - Determino que a Secretaria cumpra o consignado no item 2.1 supra.

3.2 - Não conheço do pedido de tutela provisória de urgência antecipada e indefiro a pretendida medida liminar.

3.3 - Notifique-se a Autoridade apontada como coatora, na forma e para os fins do inciso I do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009.

3.4 - Outrossim, determino que o órgão de representação judicial do Município do Jaboatão dos Guararapes/PE seja cientificado da existência deste mandado de segurança e desta decisão, para os fins do inciso II do art. 7º da mencionada Lei.

3.5 - No momento oportuno, dê-se vista ao MPF para o r. parecer legal.

3.6 - Intime-se a Parte Impetrante desta decisão."

Outrossim, ao apresentar manifestação nos autos do Mandado de Segurança nº 0810769-52.2021.4.05.8300T, em trâmite nesta 2ª Vara, também impetrado pelo CREF12/PE, o Ministério Público Federal esclareceu que a matéria em questão foi objeto do procedimento extrajudicial nº. 1.26.000.001706/2021-60, instaurado a partir de representação do próprio Conselho Impetrante. Destaco ainda, da parte final do referido parecer, a informação de que os profissionais de Educação Física já estão incluídos no público-alvo da vacinação contra a COVID-19, verbis:

"Por fim, observa-se que, na fase atual, todos os profissionais da educação física, na qualidade de trabalhadores da saúde, já estão incluídos no público-alvo da vacinação contra a COVID-19, nos termos da Resolução da Comissão Intergestores Bipartite - CIB/PE nº. 5461, de 27 de maio de 2021, que pactuou em seu art. 2º, §2º, que as Secretarias Municipais de Saúde podem avançar na imunização dos demais grupos do PNOV, e população geral por faixa etária, na medida do recebimento de novas doses , mencionando expressamente os "educadores físicos" nessa categoria."

A situação acima indica que esse tipo de matéria não pode ser judicializada, porque faz parte do mérito administrativo, no qual o Judiciário não pode intervir.

Diante de todo o exposto, a denegação da segurança é medida que se impõe.

3. Dispositivo

Posto isso:

3.1 - Determino que a Secretaria cumpra o consignado no item 2.1 supra.

3.2 - Ratifico a decisão inicial, acostada sob identificador 4058300.19346833, que indeferiu a medida liminar pleiteada, julgo improcedentes os pedidos desta ação mandamental, denego a segurança e extingo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC.

Sem condenação em honorários advocatícios (art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009, e Súmula 512 do Supremo Tribunal Federal).

Custas ex lege.

Dê-se ciência do inteiro teor desta Sentença à(s) DD(s). Autoridade(s) Impetrada(s).

Após o trânsito em julgado, dê-se baixa.

Registre-se, intimem-se.

Recife, 26.08.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal da 2a Vara da JFPE

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

ICMS. EXCLUSÃO DAS BASES DE CÁLCULO DA COPIS E DA COFINS. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. STF E STJ.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Depois do julgamento dos recursos de embargos de declaração pelo STF, ficou pacificado o entendimento dessa Suprema Corte a respeito da exclusão do valor do ICMS das bases de cálculo das COPIS e COFINS e estabeleceu-se a data da retroatividade para repetição de indébito. A questão da aplicação do art. 166 do Código Tributário Nacional - CTN ficou em aberto. Quanto à aplicação do art. 170-A desse Código, quer me parecer que não haja dúvida. 

Na sentença que segue, esses assuntos são debatidos. 

Boa leitura. 


 PROCESSO Nº: 0801684-70.2020.4.05.8302 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVELIMPETRANTE: B S LTDAADVOGADO: R B A RIMPETRADO: FAZENDA NACIONALAUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RFB EM RECIFE/PE2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)


SENTENÇA TIPO B


EMENTA:- TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO DO VALOR DO  ICMS PRÓPRIO DAS BASES DE CÁLCULO DA COFINS E DA COPIS. RE 574.706. PROCEDÊNCIA.

- O Plenário do STF decidiu que o valor do ICMS próprio  não pode ser incluído na base de cálculo da COFINS e da COPIS, em operações internas praticadas pelo Contribuinte, tomando-se por base o ICMS indicado nas notas fiscais de saída.

-Restituição ou compensação observando a Súmula 269 do STF, a Súmula 271 do STJ, e as regras dos arts. 166 e 170-A do CTN.

 - Concessão parcial da segurança.

Vistos etc.

1. Breve Relatório

B S LTDA impetrou este mandado de segurança, com pedido liminar, em desfavor do Delegado da Receita Federal do Brasil em Caruaru, com o objetivo de obstar eventual cobrança indevida de tributo decorrente de ilegal inclusão do ICMS destacado nas notas fiscais na base de cálculo do PIS e da COFINS, além da declaração do seu direito de compensação dos valores indevidamente recolhidos nos últimos 05 (cinco) anos.  

Alegou, em apertada síntese, que:  no exercício de suas atividades no comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios, estaria sujeita ao recolhimento do PIS e da COFINS, ambos incidentes sobre o faturamento; a União estaria inserindo o ICMS na base de cálculo dessas contribuições sociais, apesar de a referida cobrança ser inconstitucional;   o STF, em sede de recurso extraordinário com repercussão geral, teria consolidado o entendimento no sentido de vedar expressamente a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS. 

Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela imediata cessação da inclusão do ICMS destacado nas notas fiscais na base de cálculo do PIS e da COFINS, autorizando a impetrante a efetuar o recolhimento dos tributos em questão com base em metodologia de cálculo que exclua a parcela impugnada.

Respeitável despacho sob Id. 4058302.15955122, de lavra do MM. Juiz JOSE MOREIRA DA SILVA NETO, da Seção Judiciária de Caruaru, em que se determinou a intimação do Impetrante para, no prazo de 15 (quinze) dias, corrigir o valor da causa e pagar as custas. Determinou-se, ainda,   a inclusão do Delegado da Receita Federal em Caruaru como autoridade coatora e da Fazenda Nacional como impetrada, excluindo-se a "União Federal/Fazenda Nacional" do polo passivo. 

Efetivada a emenda (Id. 4058302.16271268) foi proferida respeitável decisão Decisão sob Id. 4058302.16280505, de lavra do MM. Juiz  JOSÉ MOREIRA DA SILVA NETOem que se indeferiu o pedido de medida liminar

A União (Fazenda Nacional) manifestou interesse no feito (Id. 4058302.16377581).

A autoridade apontada como coatora suscitou, preliminarmente, ilegitimidade passiva ad causam, uma vez que a  atividade estaria adstrita à Delegacia da Receita Federal do Brasil de Recife. No mérito, pugnou pela denegação da segurança. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. (Id.  4058302.16472350).

O Ministério Público Federal não se manifestou sobre o mérito da questão  (Id.  4058302.16551236).

Decisão sob Id. 4058302.16697582) na qual se determinou a intimação do Impetrante emendar a petição inicial, para, nos termos acima expostos, de modo a efetivar a correta indicação da autoridade coatora, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito (art. 485, VI, do CPC/15).

O Impetrante promoveu a emenda à Inicial.  (Id. 4058302.17161097).

Decisão sob Id.4058302.17181905 reconhecendo a incompetência absoluta daquele juízo federal para processamento e julgamento do feito e determinando a redistribuição para a sede desta seção judiciária (Recife/PE).

Sentença/decisão sob 4058300.18491863 na qual foi determinado que se certificasse eventual decurso de prazo para apresentação de informações por parte da autoridade coatora. Determinou-se ainda, a remessa dos autos ao MPF.

Certificado o decurso de prazo sem manifestação da autoridade coatora (Id. 4058300.18548223).

O Ministério Público Federal manifestou ciência (Id. 4058300.18785996).

Despacho sob Id. 4058300.19470869, na qual foi determinada a intimação do Impetrante para oferecer esclarecimentos, uma vez que a sede da empresa seria na Cidade de Petrolina/PE.

Em petição sob Id. 4058300.19565518, a Impetrante confirmou que a sede da empresa de fato seria em Petrolina,  razão pela qual os autos foram distribuídos na Vara da Região recepcionada pela autoridade coatora. Mencionou, ainda, que, em virtude de uma reorganização administrativa da Receita Federal do Brasil, a autoridade coatora competente teria passado a ser a Delegacia da Receita Federal do Brasil em Recife/PE, o que teria motivado a remessa dos autos a essa Seção Judiciária.

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Da Competência para apreciação do feito

Como já sinalizado no despacho sob Id. 4058300.19470869,  tem-se que a jurisprudência mais recente  vem entendendo pela possibilidade de ajuizamento do mandado de segurança no domicílio do impetrante, ainda que não corresponda à sede da Autoridade apontada como coatora, de forma que esse Magistrado está aceitando mandado de segurança mesmo contra ato de Autoridades localizadas em lugares diversos da Capital Pernambucana, onde está sediado este Juízo.

No caso em análise, infere-se da petição sob Id. 4058300.19565518 que, de fato a sede da empresa seria em Petrolina, mas que os autos teriam sido protocolados em Caruaru, em razão do domicílio da autoridade coatora.

Tendo em vista a reorganizações administrativas da Receita Federal do Brasil, a DD Autoridade coatora competente passou a ser a Delegacia da Receita Federal do Brasil em Recife/PE, o que motivou a remessa dos autos a essa Seção Judiciária.

Diante da especificidade deste caso e apesar dos precedentes, entendo por bem manter o processamento deste feito nesta 2ª Vara/PE, para não atrasar ainda mais a prestação jurisdicional e também por se tratar de competência relativa.

2. 2 - Matérias Preliminares.

2.2.1 - Preliminarmente, tendo em vista o  julgamento final do STF nos autos do Recurso Extraordinário nº 574.706/PR, tenho que a ora Impetrante é carente de ação, com relação às parcelas da COPIS e da COFINS que foram pagas sobre os valores do ICMS antes de 15.03.2017, faltando-lhe, para tanto, interesse processual de agir.

Note-se que a Impetrante pede o reconhecimento do direito de repetir as parcelas pagas nos últimos cinco anos, anteriores à data da propositura desta ação mandamental, que foi distribuída em 17.09.2021, logo, retroativas a 17.09.2016.

Todavia, em face do mencionado julgado do STF, a retroatividade desse pleito tem por limite 15.03.2017.

Então, há carência de ação para as verbas do período de 17.09.2016 a 15.03.2017.

2.2.2 - Ainda preliminarmente tendo em vista a Súmula 271 do STJ, a Impetrante também é carente,  quanto a esse pedido, neste mandado de segurança, com relação às verbas do período imediatamente anterior a 17.09.2021(data da impetração deste mandamus) até 15.03.2017.

É que, segundo essa Súmula, no mandado de segurança o reconhecimento ou autorização para repetição de verbas pagas indevidamente só pode abranger as verbas que foram indevidamente pagas ex nunc, ou seja, a partir da data da sua impetração, no caso, 17.09.2021.

Óbvio que, essas parcelas, do período de 16.09.2021 a 15.03.2017, como não serão tratadas aqui, poderão, desde já, ser pleiteadas perante o Órgão próprio da União e, caso não restituídas, podem ser requeridas pela via judicial própria(Súmula 269 do STF c/c a Súmula  271 do STJ).

2.3 - Matérias de Mérito

Diante do quadro acima, temos que, no mérito, cabe a discussão, neste processo,  da exclusão do valor do ICMS, indicado nas notas fiscais da ora Impetrante, das bases de cálculo da COPIS e da COFINS e também da repetição(restituição ou compensação),  após 17.09.2021, data da impetração deste mandado de segurança.

Com efeito, trata-se de mandado de segurança com pedido de medida liminar impetrado por BONTEMPO SUPERMERCADO LTDA. contra ato do Delegado da Receita Federal do Brasil em Recife/PE, objetivando, em síntese, seja-lhe garantido o direito de excluir os valores do ICMS, destacados nas suas notas ficais de saídas,  das bases  de cálculo das COPIS e COFINS.

2.3.1 - Como se sabe, em 15.03.2017, o Plenário do STF, sob repercussão geral, por maioria, decidiu, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 574.706/PR que o ICMS não se inclui na base de cálculo das contribuições COPIS e COFINS, tendo gerado o Tema 69, com a seguinte redação:

"O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do
PIS e da COFINS."

A UNIÃO - FAZENDA NACIONAL opôs recurso de embargos de declaração, para modulação dos efeitos, então mencionada Corte, por seu Plenário, sob repercussão geral, julgou tal recurso declaratório em 13.05.2021 e,  por maioria, estabeleceu que os efeitos daquele acórdão retroagiriam a 15.03.2017, data do julgamento do mencionado Recurso Extraordinário, e que deveria ser considerado o valor do ICMS indicado[1] na nota fiscal de saída do Estabelecimento Contribuinte.

Eis a notícia que captei do site da Suprema Corte,  do dia 13.05.2021, a respeito do julgamento dos recursos de embargos de declaração nos autos do RE 870.947\SE:

 "O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quinta-feira (13), que a exclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da base de cálculo do PIS/Cofins é válida a partir de 15/03/2017, data em que foi fixada a tese de repercussão geral (Tema 69), no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 574706. Os ministros também esclareceram que o ICMS que não se inclui na base de cálculo do PIS/Cofins é o que é destacado na nota fiscal.".[2].

Note-se que agora ficou bem claro que mencionado julgado do STF diz respeito apenas ao ICMS próprio, em operações internas, pois apenas esse tipo de ICMS é destacado na nota fiscal de saída do Contribuinte.

Note-se também que, em tal julgado, o STF não afastou a necessidade de observar-se o estabelecido nos arts. 166 e 170-A do CTN, pois a respeito deles omitiu-se.

Nessa situação, não há dúvida que a ora Impetrante, doravante, pode excluir o valor do ICMS das suas notas fiscais de saída, operações próprias e internas, das bases de cálculo da COPIS e da COFINS e que pode pedir a restituição, na via administrativa das parcelas indevidamente pagas dessas contribuições sobre os valores desse imposto estadual que tenham sido pagas após 17.09.2021, data da impetração deste Mandado de Segurança, sem prejuízo do indicado no subitem 2.2.2 supra, relativamente às parcelas do período de 16.09.2021 a 15.03.2017.

3. Dispositivo

Diante de todo o exposto:

3.1 - preliminarmente, de ofício(§ 3º do art. 485 do CPC), indefiro a petição inicial(art. 330, II, CPC) com relação aos pedidos de restituição ou compensação das parcelas da COPIS e da COFINS pagas sobre o valor do ICMS destacado nas notas fiscais de saída dos períodos anteriores a 17.09.2021(data da impetração deste mandamus) a 15.03.2017 e, com relação a tais parcelas, dou este processo por extinto, sem resolução do mérito(art. 485, VI, CPC), ressalvo o direito de a ora Impetrante pedir a repetição do indébito na via administrativa, se ainda não tiver havido prescrição ou decadência

3.2 - no mérito, concedo parcialmente a segurança pleiteada, reconheço o direito líquido e certo de a Impetrante excluir o valor do ICMS próprio,  destacado nas suas notas fiscais de saída, das bases de cálculo da Contribuição para o Programa de Integração Social (COPIS) e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS);

3.3 - autorizo a ora Impetrante a requerer, na via administrativa própria, observadas as regras da Lei 9.430, de 1996 e as regras dos arts. 166 e 170-A do CTN,   a restituição ou compensação das parcelas da COPIS e da COFINS que incidiram, a partir de 17.09.2021, data da impetração deste mandado de segurança, parcelas essas que serão atualizadas pelos índices da tabela SELIC; 

3.3)  Sem honorários, nos termos do art. 25 da Lei n.º 12.016/2009 e Súmula 512 do STF.

3.4) Custas ex lege.

3.5) De ofício, submeto esta sentença ao duplo grau de jurisdição(§ 1º do art. 14 da Lei nº 12.016, de 2009), sem efeito suspensivo(§ 3º do mesmo artigo).

Registre-se. Intimem-se.

Recife, 16.08.2021.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

________________________________________

[1] Como se sabe, o ICMS não é destacado na nota fiscal de saída do Estabelecimento Contribuinte, mas  apenas indicado, pois faz parte do preço indissociável da mercadoria.

Eis como a matéria é tratada na Lei Complementar nº 87, de 13.09.1996:

"Art. 13 - (...).

§ 1o Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput deste artigo:      (Redação dada pela Lcp 114, de 16.12.2002)

I - o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle;".

[2] Brasil. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário

Site do Supremo Tribunal Federal.

Disponível em http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=465885&ori=1

Acesso em 05.06.2021.

sábado, 14 de agosto de 2021

JUROS DE MORA. NATUREZA JURÍDICA INDENIZATÓRIA. NÃO INCIDÊNCIA DO IRPF. STF. EXTENSÃO PARA NÃO INCIDÊNCIA DO IRPJ E CSLL.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O Plenário do STF concluiu, no julgado indicado na fundamentação da decisão infra,  que juros de mora recebidos por Trabalhador, decorrente de pagamento de remuneração com atraso, não sofre incidência do IR, em face da sua natureza indenizatória, pelo que não geram acréscimo patrimonial quando recebidos por referido Trabalhador.  

Na decisão que segue, à margem de entendimento da 2a Seção do STJ, estende-se esse entendimento do Plenário do STF para os juros de mora, apurados por índices da tabela SELIC, recebidos por Pessoa Jurídica, na hipótese de repetição de indébito(via restituição ou compensação) de parcelas de tributos que foram pagos indevidamente.

Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0815919-14.2021.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: RADIOTERAPIA ONCOCLINICAS RECIFE LTDA.
ADVOGADO: Aloísio Augusto Mazeu Martins
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

D E C I S Ã O

1. Relatório

MULTIHEMO SERVIÇOS MÉDICOS S/A, RADIOTERAPIA ONCOCLÍNICAS RECIFE S/A e ONCO CLÍNICA RECIFE LTDA., qualificadas na Inicial, impetraram este Mandado de Segurança com pedido de medida liminar em face do Sr. SR. DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE/PE. Aduziram, em síntese, que:  seriam sociedades empresárias  integrantes do Grupo Oncoclínicas, especializado no tratamento de câncer, com atuação em oncologia, hematologia e radioterapia, desenvolvendo diversas atividades relacionadas a esse segmento; por auferir renda (termo genérico que inclui a espécie lucro), estaria sujeita ao recolhimento do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), (Doc. 02 - Escrituração Contábil Fiscal e Comprovantes de IRPJ e CSLL); na qualidade de na qualidade de contribuinte destes tributos federais, estaria sofrendo ilegítima exigência tributária; eventualmente, as Impetrantes promoveriam a recuperação de indébitos tributários e/ou o aproveitamento de créditos fiscais a que fariam jus, de toda e qualquer origem, natureza e espécie, seja relativo a tributo federal, estadual ou municipal, como, por exemplo, por meio de (i) restituição, ressarcimento, reembolso ou compensação de indébito tributário decorrente de pagamento indevido ou a maior reconhecido por decisão administrativa ou judicial transitada em julgado; (ii) compensação de indébito tributário relativo a pagamento indevido ou a maior tacitamente homologado pela Administração Fazendária; (iii) levantamento de depósitos judiciais ou administrativos de tributos, em virtude de decisão administrativa ou judicial transitada em julgado; (iv) utilização de créditos escriturais decorrentes da não cumulatividade e créditos presumidos de variados tributos; dentre outros; no caso dos indébitos tributários, seriam  aqueles créditos do contribuinte que decorreriam de pagamentos indevidos ou a maior, sua restituição ou compensação é assegurada pelos artigos 165 e 170-A do Código Tributário Nacional (CTN), respectivamente, sendo que, na esfera federal, tais indébitos seriam acrescidos monetariamente pela aplicação da Taxa do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Taxa SELIC), que incidiria a partir da data do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição, e de 1% relativamente ao mês em que estivesse  sendo efetuada; a título de exemplo, as Impetrantes possuiriam diversas ações em que teriam a restituição de tributos, a exemplo dos Mandados de Segurança nº. 0809391-95.2020.4.05.8300 e 0804505- 58.2017.4.05.8300 (Doc. 03 - Principais peças do Mandado de Segurança) em que discutiria a incidência de verbas previdenciárias, dentre elas o salário maternidade, cujo julgamento de mérito favorável já fora concluído pelo STF, de modo que sobre os créditos que irá reaver incidiria a SELIC;  por ocasião do trânsito em julgado dessa e de outras ações, as Impetrantes estariam realizando a habilitação para posterior compensação administrativa do seu crédito, devidamente acrescido monetariamente pela Taxa SELIC; em decorrência do mesmo art. 142, inciso II, da Instrução Normativa RFB nº. 1.717, de 17 de julho de 2017, inciso II, da Instrução Normativa RFB nº. 1.717, de 17 de julho de 2017, os pedidos de restituição e compensação de indébito tributário relativo a pagamento indevido ou a maior tacitamente homologado pela Administração Fazendária realizados pelas Impetrantes estariam sujeitos à correção pela Taxa SELIC; eventual levantamento dos depósitos judiciais que a Impetrante tenha realizado em outros processos em que se discute tributos federais também deveriam, necessariamente, ser acrescidos monetariamente pela Taxa SELIC, a teor do que prescreve o artigo 2º-A, §§1º e 2º, da Lei nº. 9.703, de 17 de novembro de 1998; nos casos de créditos originados da apropriação nas correspondentes escritas e livros fiscais (créditos escriturais decorrentes da não cumulatividade e créditos presumidos decorrentes de lei ou regimes especiais concedidos pelas autoridades fiscais), a jurisprudência pátria teria consolidado o entendimento de que, quando houvesse a oposição constante de ato estatal, administrativo ou normativo, impedindo a utilização do direito de crédito, seria aplicável a Taxa SELIC a partir da recusa, sob pena de enriquecimento sem causa do Fisco, já que nestes casos haveria a postergação do reconhecimento do direito pleiteado; e vários outros entes federativos (Estados e Municípios) também aplicariam a Taxa SELIC sobre os indébitos tributários devidos ao contribuinte e sobre os créditos fiscais originados da apropriação pelo contribuinte nas correspondentes escritas e livros fiscais; ocorre que, apesar da Taxa SELIC não representar acréscimo patrimonial (renda) do contribuinte, conforme será melhor evidenciado no tópico subsequente, a Receita Federal do Brasil estaria exigido a sua inclusão na base de cálculo do IRPJ e da CSLL quando incidentes sobre o indébito tributário e sobre o crédito apropriado pelos contribuintes, com base no que dispõem os artigos 17 do Decreto-Lei nº. 1.598/19977 , 3º, § 1º, da Lei nº 7.713/19888 e 8º da Lei nº. 8.541/19929 , por enquadrá-los como receitas financeiras; o que dispõe o Ato Declaratório Interpretativo nº. 25 de 2003 (Doc. 04 - ADI 25/2003), que determina a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os juros computados especificamente em decorrência do indébito recuperado;  no caso específico de repetição de indébito decorrente de ação judicial transitada em julgado, a Receita Federal do Brasil já teria externado o entendimento por meio Solução de Divergência COSIT Nº 19, de 12 de novembro de 2003 (Doc. 05 - COSIT 19/2003) de que haveria tributação do indébito tributário por IRPJ e CSLL a partir da data do trânsito em julgado da decisão judicial, uma vez que tornaria certo o direito de crédito do contribuinte; a Impetrante possuiria o justo receio de ser autuada caso deixasse de promover a inclusão, na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, do valor correspondente à Taxa SELIC incidente sobre o valor dos créditos apurados pelo contribuinte, de qualquer origem, natureza e espécie, seja relativo a tributo federal, estadual ou municipal, inclusive os oriundos de sentença transitada em julgado e PER/DCOMP. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final:

(i) seja deferida medida liminar, inaudita altera parte, para determinar à Autoridade Coatora que se abstenha, pessoalmente ou por seus subordinados, de exigir da Impetrante a inclusão, na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, do valor correspondente à Taxa SELIC incidente sobre o valor dos créditos apurados pelas Impetrantes, de qualquer origem, natureza e espécie, independentemente da adoção dos procedimentos de restituição, ressarcimento, reembolso ou compensação; seja relativo a tributo federal, estadual ou municipal; incluindo, mas não se limitando, à Taxa SELIC incidente sobre créditos: (i) originados de indébito tributário reconhecido por decisão administrativa ou judicial transitada em julgado; (ii) originados de indébito tributário a serem submetidos a pedidos de restituição e compensação administrativa sujeitos a homologação pela Administração Fazendária; (iii) originados da apropriação nas correspondentes escritas e livros fiscais (créditos escriturais decorrentes da não cumulatividade e créditos presumidos decorrentes de lei ou regimes especiais concedidos pelas autoridades fiscais); (iv) referentes a depósitos judiciais ou administrativos de tributos cujo levantamento houver sido autorizado; bem como que se abstenha de tomar qualquer medida que importe denegação de certidões negativas ou inscrição dos nomes das Impetrantes no CADIN, até decisão final do presente Mandado de Segurança

(...)

(iv) em confirmação da medida liminar requerida, a concessão final da segurança para fins de:

(iv.a) determinar à Autoridade Coatora, ou quem lhe faça as vezes, que se abstenha, pessoalmente ou por seus subordinados, de exigir das Impetrantes a inclusão, na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, do valor correspondente à Taxa SELIC incidente sobre o valor dos créditos apurados pelo contribuinte, de qualquer origem, natureza e espécie, independentemente da adoção dos procedimentos de restituição, ressarcimento, reembolso ou compensação; seja relativo a tributo federal, estadual ou municipal; incluindo, mas não se limitando, à Taxa SELIC incidente sobre créditos: (i) originados de indébito tributário reconhecido por decisão administrativa ou judicial transitada em julgado; (ii) originados de indébito tributário a serem submetidos a pedidos de restituição e compensação administrativa sujeitos à homologação pela Administração Fazendária; (iii) originados da apropriação nas correspondentes escritas e livros fiscais (créditos escriturais decorrentes da não cumulatividade e créditos presumidos decorrentes de lei ou regimes especiais concedidos pelas autoridades fiscais); (iv) referentes a depósitos judiciais ou administrativos de tributos cujo levantamento houver sido autorizado; bem como que se abstenha de tomar qualquer medida que importe denegação de certidões negativas ou inscrição do nome das Impetrantes no CADIN, até decisão final do presente Mandado de Segurança;

(iv.b) declarar o direito da Impetrante de reaver os valores recolhidos indevidamente a título de IRPJ e da CSLL sobre o valor correspondente à Taxa SELIC incidente sobre o valor dos créditos apurados pelo contribuinte, de qualquer origem, natureza e espécie, independentemente da adoção dos procedimentos de restituição, ressarcimento, reembolso ou compensação; seja relativo a tributo federal, estadual ou municipal, desde os últimos 5 (cinco) anos anteriores à propositura da presente medida (Sumula 213 STJ30), incluindo também o período em curso da demanda, mediante compensação administrativa com parcelas vincendas relativas a tributos federais, crédito este a ser devidamente corrigido pela Taxa SELIC;

(iv.c) nas competências/exercícios nos quais a Impetrante não houver apurado tributo a pagar, mas sim apurado prejuízo fiscal e/ou base negativa de CSLL, seja declarado o direito de recompor as apurações de IRPJ e de CSLL, de forma a excluir a Taxa SELIC das bases de cálculo correspondentes a tais tributos, desde os últimos 5 (cinco) anos anteriores à propositura da presente medida, incluindo também o período em curso da demanda, o que, consequentemente, gerará majoração destes saldos de prejuízo fiscal e/ou base negativa de CSLL, devendo, para tanto, permitir (i) ou o reprocessamento das obrigações acessórias de forma extemporânea; (i) ou o lançamento, no exercício corrente, da diferença apurada dos saldos de prejuízo fiscal e/ou base negativa de CSLL, bem como a atualização desse crédito pela Taxa SELIC.

(v) sucessivamente, caso o pedido anterior não seja acolhido, que seja concedida a segurança a fim de reconhecer o direito de não incluir na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, bem como declarar o direito de não oferecer à tributação a título de renda, a parcela correspondente à mera correção monetária, que corresponde à diferença entre o valor total apurado com a aplicação da taxa SELIC sobre o indébito e a quantia decorrente da aplicação, também sobre o indébito, do índice oficial de atualização monetária utilizado pela Justiça Federal para débitos de natureza não tributária, que atualmente é o IPCA. (v.1) em consequência do deferimento do pedido "v", seja declarado o direito à recomposição da base de cálculo do IRPJ e da CSLL dos últimos 5 anos, excluindo a parcela que não poderia ser adicionada e tributada, bem como o direito à repetição do indébito dos valores eventualmente recolhidos a maior mediante compensação com outros tributos federais, com a devida correção monetária e incidência de juros pela SELIC desde o pagamento indevido ou, caso não tenha ocorrido recolhimento em algum exercício, que seja autorizada nova apuração de prejuízo fiscal (IRPJ) ou base de cálculo negativa (CSLL)

Inicial instruída com procuração e documentos.

Certidão sob Id. 4058300.19854148, em que foi atestada a impossibilidade de cadastramento de todos os Impetrantes

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Do cadastramento do processo

Observo, na certidão sob Id. 4058300.1985414, que se mencionou que teriam sido "realizadas 3 (três) tentativas de cadastrar a MULTIHEMO SERVIÇOS MÉDICOS S/A,  CNPJ sob o nº 03.559.174/0001-87 e a ONCO CLÍNICA RECIFE LTDA, CNPJ sob o nº 02.018.718/0001-30, no polo ativo destes autos, conforme Petição Inicial id. 4058300.19850299, no entanto o sistema (PJe) não concluiu o cadastro, apresentando a mensagem "Falha na transação.Erro inesperado, por favor tente novamente"

Então, tenho por pertinente que a Secretaria deste Juízo tente também fazer mencionada autuação, incluindo no polo ativo as duas mencionadas Pessoas Jurídicas, além da que já se encontra autuada.

E, caso não consiga, que entre em contato com o suporte de informática próprio para sanear tal falha, de modo que, oportunamente, será reavaliada eventual anotação de prevenção.

E considerarei como se mencionadas Pessoas Jurídicas já estivessem devidamente cadastradas.

2.2. Do pleito de medida liminar propriamente dito

A concessão de medida liminar em mandado de segurança requer a coexistência de dois pressupostos, consubstanciados no artigo 7º, III, da Lei 12.016/2009, quais sejam: [i] a relevância do fundamento alegado pelo impetrante, que deve comprovar a violação do seu direito líquido e certo, ou a sua iminente ocorrência - fumus boni juris; e [ii] a possibilidade de ineficácia da medida se concedida apenas ao final - periculum in mora -, em segurança definitiva

Como dito acima, buscam as Impetrantes provimento jurisdicional liminar que lhes garanta a suspensão da exigibilidade do crédito tributário correspondente a exigência da incidência do IRPJ e CSLL sobre os valores correspondentes aos juros-Selic auferidos na recuperação - via restituição, ressarcimento ou compensação - de tributos pagos indevidamente, reconhecidos judicialmente ou administrativamente, impedindo a digna Autoridade Coatora de promover qualquer tipo de exigência com essa natureza ou de aplicar penalidades a ela relacionadas

Examinemos, em primeiro lugar o pedido de suspensão da exigibilidade do IRPJ e da CSLL sobre o valor dos juros, apurados pelos  índices da tabela SELIC.

2.2.1 - Como se sabe, a substituição dos índices de correção monetária e de índices juros de mora na atualização dos tributos federais pagos com atraso pelos índices da tabela SELIC ocorreu por meio da Lei nº 8.981, de 1995, no seu art. 84, verbis:

"Art. 84 - Os tributos e contribuições sociais arrecadados pela Secretaria da Receita Federal, cujos fatos geradores vierem a ocorrer a partir de 1º de Janeiro de 1995, não pagos nos prazos previstos na legislação tributária, serão acrescidos de:

I - Juros de mora, equivalentes à taxa média mensal de captação do Tesouro Nacional relativa à Dívida Mobiliária Federal Interna.

(...).

Os juros de mora de que trata o inciso I, deste artigo, serão aplicados também às contribuições sociais arrecadadas pelo FISCO e aos débitos para com o patrimônio imobiliário, quando não recolhido nos prazos previstos na legislação específica".

Por sua vez o art. 13 da Lei nº 9.065/95 determinou:

"Art. 13 - A partir de abril de 1995, os juros de que tratam a alínea c do parágrafo único do art. 14 da Lei nº 8.847, de 28 de janeiro de 1994, com redação dada pelo art. 6º da Lei 8.850 de 28 de janeiro de 1994, e pelo art. 90 da Lei 9.981, de 1995, o art. 84, inciso I, e o art. 91, parágrafo único, alínea a, da Lei 9.891 de 1995, serão equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para os títulos federais acumulada mensalmente".

E para que os Contribuintes tivessem igual tratamento, quando recebessem, em restituição ou em compensação, parcelas de tributos que tivessem pagado indevidamente, por erro de fato ou de direito, a Lei nº 9.250, de 1995, fixou o mesmo índice para atualização:

"Art. 39 - (....)

§ 4º A partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada.".  

A Lei nº 9.532, de 1997, estabeleceu,  no seu art. 74, que a incidência do índice da tabela SELIC, na atualização dos valores nos casos de repetição de indébito ou compensação tributárias, ocorreria a partir do primeiro dia do mês seguinte ao do pagamento indevido, verbis: "Art. 73. O termo inicial para cálculo dos juros de que trata o § 4º do art. 39 da Lei nº 9.250, de 1995, é o mês subseqüente ao do pagamento indevido ou a maior que o devido.".

E de 1%(um por cento) sobre o valor do mês da efetiva restituição ou compensação(v. final do § 4º do art. 39 da Lei nº 9.250, de 1995, acima  transcrito).

Então, pela linguagem da Lei, na atualização dos créditos tributários,  deixou de existir correção monetária e passou a existir apenas juros de mora, extraídos da Tabela SELIC.

É verdade que há julgados do Superior Tribunal de Justiça, nos quais se sustentou que dentro do índice da Tabela SELIC há parcela de correção monetária e parcela de juros de mora.

Mas a legislação bancária que deu origem aos índices dessa Tabela SELIC outorga-lhe apenas a natureza de juros bancários, no Sistema Integrado de Liquidação e Custódia (SELIC) para títulos federais.

A respeito desse assunto, ensina  Édison Freitas de Siqueira no artigo acima invocado e indicado na nota de rodapé [1]] infra:

 "A Resolução nº 1.124/96 do Conselho Monetário Nacional instituiu a Taxa SELIC, definida pelas Circulares BACEN 2.868/99 e 2.900/99, assim dispondo: "define-se Taxa SELIC como a taxa média ajustada dos financiamentos apurados no Sistema Integrado de Liquidação e Custódia (SELIC) para títulos federais".[1] 

Essa taxa, além de refletir a liquidez dos recursos financeiros no mercado monetário, tem a característica de juros remuneratórios ao investidor.

E o Legislador Ordinário concedeu a esses juros, no campo tributário, natureza de juros de mora, ora para compensar prejuízo da Fazenda Pública, quando o Contribuinte paga com atraso, ora para recompor perdas do Contribuinte, quando este paga tributo acima do valor realmente devido e a Fazenda Pública demora, além do prazo legal, para ressarci-lo via restituição ou compensação.

Assim, desconsiderando a natureza deste índice, a SELIC foi utilizada para driblar a limitação legal dos juros moratórios dos débitos/créditos tributários, de 1% ao mês, de acordo com o art. 161, § 1º do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25/10/1966).

Essa burla à mencionada regra da Lei nº 5.172, de 1966, que instituiu o Código Tributário Nacional e que hoje tem status de Lei Complementar(v. art. 146 da vigente Constituição da República), findou por ser aceita pelo Superior Tribunal de Justiça.

2.2.1-1 - Agora, adentrando na questão do mandado de segurança ora sob análise, se os juros decorrentes da aplicação da Tabela SELIC, na repetição de indébito tributário, sofre ou não incidência do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza de Pessoa Jurídica, bem como da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido, penso que não, pelas razões que seguem.

Explico.

Do acima exposto, temos que, legalmente, repito, os valores decorrentes da aplicação dos índices da Tabela SELIC têm natureza de juros e, na repetição de indébito, tributário ou não, tem natureza de juros de mora, pois representa a paga pelo uso indevido, pela Fazenda Pública, do dinheiro daquele que faz jus à repetição do indébito, além do prazo legal ou do prazo contratual. 

Uma leitura atenta da íntegra do art. 43 do Código Tributário Nacional leva, facilmente, à conclusão que só ocorre o fato gerador do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza quando o Administrado adquire a disponibilidade de renda que implique em acréscimo do seu patrimônio.

Como os juros de mora, seja na área privada, seja na área pública, tem sempre natureza indenizatória, tem-se, então, que nada acresce ao patrimônio Daquele que os recebe, apenas repõe alguma verba ou alguma coisa que deixou de obter em determinado momento, por culpa de Alguém que reteve indevidamente  o seu dinheiro e foi obrigado a lhe indenizar,  com o pagamento desses juros, de forma que a aquisição da disponibilidade jurídica ou econômica dos valores relativos a esses juros de mora fica à margem do fato gerador do Imposto de Renda, seja com relação à Pessoa Jurídica(Coletiva, como se diz, com maior propriedade, em Portugal) ou à Pessoa Física que os recebe.

E por consequência, também fica à margem do fato gerador da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, cujo fato gerador é em tudo por tudo igual ao fato gerador do Imposto sobre Renda e Proventos da Pessoa Jurídica(Coletiva) e não se pode dizer que alguém obtém lucro com o recebimento de juros de mora, pelas razões já expostas.

2.2.1-2 - No entanto, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.138.695/SC, em julgamento submetido ao regime dos recursos repetitivos,  decidiu:

"PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLL. DISCUSSÃO SOBRE A BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE RENDA DA PESSOA JURÍDICA - IRPJ E DA EXCLUSÃO DOS JUROS SELIC INCIDENTES QUANDO DA DEVOLUÇÃO DE VALORES EM DEPÓSITO JUDICIAL FEITO NA FORMA DA LEI N. 9.703/98 E QUANDO DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO NA FORMA DO ART. 167, PARÁGRAFO ÚNICO DO CTN.

1. Não viola o art. 535, do CPC, o acórdão que decide de forma suficientemente fundamentada, não estando obrigada a Corte de Origem a emitir juízo de valor expresso a respeito de todas as teses e dispositivos legais invocados pelas partes.

2. Os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais possuem natureza remuneratória e não escapam à tributação pelo IRPJ e pela CSLL, na forma prevista no art. 17 do Decreto-lei n. 1.598/77, em cuja redação se espelhou o art. 373, do Decreto n. 3.000/99 - RIR/99, e na forma do art. 8º da Lei n. 8.541/92, como receitas financeiras por excelência. Precedentes da Primeira Turma: AgRg no Ag 1359761/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 6/9/2011; AgRg no REsp 346.703/RJ, Primeira Turma, Rel. Min.Francisco Falcão, DJ de 02.12.02; REsp 194.989/PR, Primeira Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 29.11.99. Precedentes da Segunda Turma: REsp. n. 1.086.875 - PR, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, Rel. p/acórdão Min. Castro Meira, julgado em 18.05.2012; REsp 464.570/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 29.06.2006; AgRg no REsp 769.483/RJ, Segunda Turma, Rel. Min.Humberto Martins, DJe de 02.06.2008; REsp 514.341/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 31.05.2007; REsp 142.031/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 12.11.01; REsp. n.395.569/RS, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 29.03.06.

3. Quanto aos juros incidentes na repetição do indébito tributário, inobstante a constatação de se tratarem de juros moratórios, se encontram dentro da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, dada a sua natureza de lucros cessantes, compondo o lucro operacional da empresa a teor art. 17, do Decreto-lei n. 1.598/77, em cuja redação se espelhou o art. 373, do Decreto n. 3.000/99 - RIR/99, assim como o art. 9º, §2º, do Decreto-Lei nº 1.381/74 e art. 161, IV do RIR/99, estes últimos explícitos quanto à tributação dos juros de mora em relação às empresas individuais.

4. Por ocasião do julgamento do REsp. n. 1.089.720 - RS (Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10.10.2012) este Superior Tribunal de Justiça definiu, especificamente quanto aos juros de mora pagos em decorrência de sentenças judiciais, que, muito embora se tratem de verbas indenizatórias, possuem a natureza jurídica de lucros cessantes, consubstanciando-se em evidente acréscimo patrimonial previsto no art. 43, II, do CTN (acréscimo patrimonial a título de proventos de qualquer natureza), razão pela qual é legítima sua tributação pelo Imposto de Renda, salvo a existência de norma isentiva específica ou a constatação de que a verba principal a que se referem os juros é verba isenta ou fora do campo de incidência do IR (tese em que o acessório segue o principal). Precedente: EDcl no REsp. nº 1.089.720 - RS, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 27.02.2013.

5. Conhecida a lição doutrinária de que juros de mora são lucros cessantes: "Quando o pagamento consiste em dinheiro, a estimação do dano emergente da inexecução já se acha previamente estabelecida. Não há que fazer a substituição em dinheiro da prestação devida. Falta avaliar os lucros cessantes. O código os determina pelos juros de mora e pelas custas" (BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado, V. 4, Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1917, p. 221).

6. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ n. 8/2008".[2] - Destaquei em tom escuro alguns trechos.

Ou seja, à luz desse julgado, de efeito repetitivo, os juros de mora só não serão ofertados à tributação do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza e à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, se o valor do qual se originaram não for tributado ou goze de isenção desses Tributos.

Vale dizer, esse E. Tribunal deu aos juros de mora a mesma natureza do valor dos quais se originaram, logo, não teriam natureza indenizatória.

Data maxima venia, esse entendimento não se amolda à tradição dos velhos comercialistas português e brasileiros.

Na verdade, os juros de mora sempre têm natureza indenizatória, pois representam a recomposição da perda do uso de direito alheio(Credor)  por outrem(Devedor).

Data maxima venia, esse julgado da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça finda por admitir que Leis Ordinárias e Diplomas Legais, como Decretos-Leis, que têm natureza de Lei Ordinária, modifiquem o art. 43 da Lei nº 5.172, de 1966(CTN, que tem status de Lei Complementar), arrolando como fato gerador fato não abrangido nesse artigo desse Código.

As definições do direito privado(civil e comercia) não podem ser alteradas pela legislação do Direito Tributário(art. 110 do Código Tributário  Nacional), de forma que os  juros de mora, decorrente de qualquer verba(submetida  ou não ao IRPJ e à CSLL), em face da sua natureza indenizatória, não podem sofrer a incidência do IRPJ, pois não causam nenhum acréscimo patrimonial, uma vez que apenas repõem aquele valor que não se obteve ou que deixou de ser obtido pelo uso indevido(no caso, cobrança indevida ou não ressarcimento no prazo legal) do dinheiro daquele que recebe tais juros(o Contribuinte) pelo Terceiro(no caso,  a Fazenda Nacional).

E consequentemente, também não pode incidir sobre o valor dos juros de mora a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, que tem, quanto ao fato gerador, a mesma estrutura do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza da Pessoa Jurídica - IRPJ e pode se admitir que quem recebe juros de mora goza de algum tipo de lucro, senão apenas reparação econômico-financeira.

2.2.1-3 -  Como se viu acima(2.2.1 e 2.2.1-1) , data maxima venia, guardo profundas reservas sobre o consignado nesse julgado da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, mas o assunto ainda passará pelo crivo do Supremo Tribunal Federal e nele ainda está sob repercussão geral o  RE 1.063.187/SC, tendo gerado  o Tema "962 - Incidência do Imposto de renda - Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre a taxa Selic (juros de mora e correção monetária) recebida pelo contribuinte na repetição do indébito.".

O Plenário dessa Suprema Corte, quanto às pessoas físicas, já pacificou o assunto, quando julgou o Recurso Extraordinário - RE nº 855.091 e o respectivo acórdão ficou com a seguinte ementa:

"EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão Geral. Direito Tributário. Imposto de renda. Juros moratórios devidos em razão do atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função. Caráter indenizatório. Danos emergentes. Não incidência.

1. A materialidade do imposto de renda está relacionada com a existência de acréscimo patrimonial. Precedentes.

2. A palavra indenização abrange os valores relativos a danos emergentes e os concernentes a lucros cessantes. Os primeiros, correspondendo ao que efetivamente se perdeu, não incrementam o patrimônio de quem os recebe e, assim, não se amoldam ao conteúdo mínimo da materialidade do imposto de renda prevista no art. 153, III, da Constituição Federal. Os segundos, desde que caracterizado o acréscimo patrimonial, podem, em tese, ser tributados pelo imposto de renda.

3. Os juros de mora devidos em razão do atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função visam, precipuamente, a recompor efetivas perdas (danos emergentes). Esse atraso faz com que o credor busque meios alternativos ou mesmo heterodoxos, que atraem juros, multas e outros passivos ou outras despesas ou mesmo preços mais elevados, para atender a suas necessidades básicas e às de sua família.

4. Fixa-se a seguinte tese para o Tema nº 808 da Repercussão Geral: "Não incide imposto de renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função".

5. Recurso extraordinário não provido."[3].

Ora, o Trabalhador que recebe parcelas de remuneração em atraso, não sofre apenas danos emergentes, como parece ter constado na fundamentação desse d. julgado do Plenário da Suprema Corte, mas também poderia sofrer perdas de possíveis lucros cessantes, com operações nas quais aquele dinheiro, indevidamente retido pelo Empregador e que lhe foi pago com atraso, poderia ter sido aplicado  em atividade lucrativa ou, no mínimo, no mercado financeiro.

Dessa forma, os juros de mora, em qualquer vertente, sempre têm natureza indenizatória, natureza essa, estruturada no direito privado, pelo que não pode, como vimos, por força do art. 110 do Código Tributário Nacional - CTN, ser modificada para fins tributários. 

Então, diante desse quadro, no qual, para referida situação, o Plenário da Suprema Corte fez prevalecer a estrutura jurídico-tributária acima delineada(v. subitem 2.2.1 e 2.2.1-1), a qual defendemos nas nossas sentenças há anos, não vejo como possa modificá-la relativamente aos juros de mora da tabela SELIC recebidos pelas Pessoas Jurídicas, quando do recebimento de restituição/compensação de parcelas de tributos que tenham pagado indevidamente.

2.2.1-4 -  A rigor, por força do inciso III do art. 927 do vigente CPC, este Magistrado, como qualquer outro, era obrigado a aplicar mencionado julgado da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça(v. subiem 2.2.1.2 supra),   porque de efeito repetitivo.

Mas agora como o Pleno da Suprema Corte concluiu, corretamente, pela  natureza jurídica indenizatória dos juros de mora,  no d. julgado cuja ementa transcrevi no subitem anterior, e considerando, conforme penso ter demonstrado, que a atualização da tabela SELIC contém apenas percentual de juros de mora, conforme expressamente estabelecido nas Leis que dela tratam no campo tributário(nesse sentido, vide subitem 2.2.1 supra), creio que será essa a conclusão do Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do  RE nº 1.063.187/SC, no qual se gerou o Tema 962, sob repercussão geral e onde está a espera de julgamento definitivo, tenho que cabe a medida liminar para autorizar, desde já, as Impetrantes a não recolher o IRPJ e a CSLL sobre os valores decorrentes de juros da Tabela SELIC.

 3. Dispositivo

Posto isso:

3.1. Proceda a Secretaria às diligências consignadas no item 2.1 supra;

3.2 - concedo a medida liminar e autorizo as ora Impetrantes a não submeter à tributação do IRPJ e da CSLL os valores que receberem a título de juros de mora, apurados pelos índices da Tabela SELIC, na repetição de indébito tributário,  e determino que a DD Autoridade apontada como coatora abstenha-se de autuá-la por essa prática, sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009;

3.3 - Notifique-se a DD. Autoridade Coatora para apresentação de informações (art. 7º,I, da Lei nº 12.016, de 2009), bem como para CUMPRIR a medida liminar supra, sob as penas ali estabelecidas; 

3.4 - Dê-se ciência deste writ ao órgão de representação judicial da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, qual seja, a Procuradoria Geral da Fazenda  Nacional em  Recife-PE, para os fins do inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009.

3.5 -  Após, abra-se vista ao Ministério Público Federal para o r. parecer (art. 12 da Lei nº 12.016/2009).

3.6 - Sucessivamente, voltem-me os autos conclusos para julgamento.

Cumpra-se.

Intime-se.

Recife, data da assinatura.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

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[1] Nesse sentido, Édison Freitas de Siqueira, in "Taxa SELIC - Origem, Conceito, Fórmula e Legalidade" no site Thomsom Reuters FISCO on Line 

[2]  Brasil Superior Tribunal de Justiça. 1ª Seção REsp 1138695 / SC
RECURSO ESPECIAL 2009/0086194-3, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Julgamento em 22.05.2013, in DJe de 31.05.2013 e in RDTAPET vol. 38 p. 223.

Disponível em

https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?i=1&b=ACOR&livre=((%27RESP%27.clas.+e+@num=%271138695%27)+ou+(%27REsp%27+adj+%271138695%27.suce.))&thesaurus=JURIDICO&fr=veja

Acesso em 06.08.2021

[3]  Brasil. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário 855.091, Relator Ministro Dias Toffoli, Julgamento em 15.03.2021, Publicação em 08.04.2021.

Disponível em

https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search?base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&page=1&pageSize=10&queryString=855091%20&sort=_score&sortBy=desc

Acesso em 06.08.2021