Por Francisco Alves dos Santos Júnior
Ser magro(a) demais ou estar com sobrepeso impedem qualquer pessoa de ingressar nas Forças Armadas do Brasil, ainda que para o exercício de cargos administrativos, porque a Legislação, calcada em regras de Lei que tem base na Constituição da República, espelhada nos editais dos concursos, dentro de proporcionalidade aceitável, fixam qual o peso mínimo e qual o peso máximo que o candidato pode ter. E existe pertinência temática, pois, mesmo exercendo cargo administrativo, esse futuro Servidor passará a ostentar uma patente e terá, no dia a dia, obrigações no campo da educação física, com exercícios físicos rotineiros, voltados para um bom padrão de saúde.
No caso que segue, por excesso de magreza, uma candidata foi considerada inapta no exame de saúde, tendo sido eliminada do concurso.
Na sentença que segue, inclusive reportando-se a outro caso que tramitou pela mesma 2a Vara Federal de Pernambuco, envolvendo obesidade, esses assuntos são tratados amiudamente.
Boa leitura.
Obs; sentença pesquisada pelo Assessor Saulo de Melo Barbosa Souza.
PROCESSO Nº: 0806833-24.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: C S R
ADVOGADO: I C S C
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO. e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)
SENTENÇA TIPO A
Vistos, etc.
EMENTA:
ADMINISTRATIVO. CONCURSO SELETIVO PARA PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM DA
AERONÁUTICA. LIMITAÇÃO DE PESO. RAZOABILIDADE. SERVIDOR MILITAR.
-
Não é gratuita, nem fortuita, tampouco discriminatória, mas sim
proporcional e razoável regra que veda o ingresso de pessoas com magreza
excessiva em Unidade das Forças Armadas do Brasil.
- Improcedência dos pedidos.
1. Breve Relatório
C S R ajuizou esta Ação Ordinária com Pedido de Tutela Provisória de Urgência em face do UNIÃO e do SEGUNDO COMANDO AÉREO REGIONAL DA AERONÁUTICA- II COMAR. Requereu, inicialmente, os benefícios da justiça gratuita e alegou, em síntese, que: a)
teria feito sua inscrição no Edital de Convocação para SELEÇÃO E
INCORPORAÇÃO DE PROFISSIONAIS DE NÍVEL MÉDIO VOLUNTÁRIOS À PRESTAÇÃO DO
SERVIÇO MILITAR TEMPORÁRIO, PARA O ANO DE 2018, para o cargo de
Enfermagem; b) teria passado em todas as etapas de seleção,
chegando à Inspeção de Saúde Inicial (INSPSAU) em 7º lugar na
classificação, de um total de 14 vagas à serem preenchidas, conforme
informa o Edital de Convocação ; c) na referida INSPSAU, teriam
sido feitos diversos exames, tais quais, o exame de sangue e urina,
aferição de pressão arterial, medição de peso e altura, IMS, avaliação
clínica, dentre outros; d) após a realização dos exames acima
transcritos, a Autora, teria tomado posse do Documento de Informação de
Saúde (DIS), onde teria ficado atestado que a Autora era considerada
INAPTA para exercer a função no cargo desejado, em razão da ocorrência
da seguinte patologia: R63.4 (MAGREZA); e) quando da apresentação
dos Laudos e Exames médicos descritos no Edital de Convocação, na etapa
de Concentração Inicial, a Autora teria acostado Exame de Análise de
Massa Corporal que apresentava IMC de 18,2 Kg/m², ou seja, abaixo da
limitação prevista no ICA 160-6-3 ; f) quando da realização da INSPSAU em grau de recurso, a Autora teria apresentado Prontuário Médico que informava que a Autora "está
em boas condições de saúde em relação à avaliação nutricional,
classificada em biótipo Ectomorfo de típica magreza e metabolismo
acelerado, com o devido acompanhamento nutricional regular"; g)
entretanto, mesmo após a apresentação de tal prontuário médico, a
Autora teria continuado como INAPTA para prosseguimento no certame; h)
não se poderia aceitar como devida a limitação imposta pelo Edital de
Convocação e pelo ICA160-6-3 em razão das mesmas qualificarem a
capacidade laboral do candidato apenas pelo seu índice de massa
corporal, o que obviamente configura discriminação vedada pela ordem
constitucional vigente; i) todos os exames entregues e realizados
perante a Junta Médica da Aeronáutica, encontrar-se-iam de posse da
mesma, restando a Autora impossibilitada de demonstrar tais
comprovações, senão através apenas dos documentos apresentados ao
presente petitório; j) por entender que o edital do certame, bem
como, o ICA160-6-3, encontram-se eivados de nulidades, e em
desconformidade com as garantias constitucionais, vem a Autora
socorrer-se do Judiciário para que lhe garanta o seu direito líquido e
certo de participar das próximas fases da seleção, quais sejam
"Concentração Final", "Habilitação à Incorporação" e "Incorporação e
início dos estágios, que estariam à ocorrer neste dia 21/05/2018. Teceu
comentários, citou a legislação pertinente, apresentou documentos e ao
final requereu a concessão da Tutela Antecipada de Urgência para "que
seja declarada a nulidade do ato inaudita altera pars administrativo
que culminou na eliminação da Autora, garantindo-se a mesma à sua
participação nas demais etapas do certame, e, em sendo aprovada nelas,
seja garantida a sua nomeação e posse" ou, alternativamente, que "em
caso de aprovação, seja reservada vaga para que, ao final do processo,
em sendo comprovada a APTIDÃO, a mesma possa desempenhar as funções
inerentes ao cargo". Juntou procuração e documentos.
Na r. decisão de identificador 4058300.5399982, deferiu-se o benefício da justiça gratuita e indeferiu-se o pedido de tutela provisória de urgência.
Contra
essa r. decisão supra, a Autora apresentou pedido de reconsideração
(Id. 4058300.5411196), o qual foi indeferido (Id. 4058300.5428486).
Então
a Autora interpôs, contra essa r. decisão, agravo de instrumento
(processo nº 0808601-53.2018.4.05.0000), o qual se encontra conclusos
para julgamento no E. TRF5R.
Em
contestação, a União defendeu, em síntese, que: para ser oficial das
Forças Armadas, deve o candidato ter maior rigor físico e melhor
condição de saúde em relação àqueles que almejam cargos públicos civis; o
não preenchimento de qualquer um dos requisitos de saúde previstos no
edital implicará na incapacidade do candidato na Inspeção de Saúde para o
fim a que se destina; ao realizar inspeção de saúde inicial, a Autora
teria sido eliminada devido ao fato de ter sido diagnosticada pela Junta
de Saúde com magreza excessiva, requisito considerado incapacitante
ainda que o processo seletivo seja para cargo administrativo, o
candidato aprovado será um militar, ao qual será submetido a
treinamentos e tarefas específicas da carreira militar, pelo que se faz
necessário o rigor físico característico dos integrantes das Forças das
Armadas; o atendimento ao pleito da Autora implicará tratamento
diferenciado, que fere o artigo 37, incisos I e II, da Constituição
Federal e a isonomia dos concorrentes, insurgindo em ilegalidade de
procedimento, já que todos os candidatos que participaram do certame
tiveram que ser inspecionado pela junta regular de saúde e comprovar o
atendimento das exigências dispostas no edital. Pugnou, ao final, pela
improcedência dos pedidos (Id. 4058300.6297576).
Intimada para réplica, a Parte quedou-se inerte (Id. 4058300.6520268).
Intimadas
para se manifestarem sobre produção de provas (Id. 4058300.10110079), a
União manifestou seu desinteresse (Id. 4058300.10222618), ao passo em
que a Autora quedou-se inerte (Id. 4058300.11570170).
Vieram os autos conclusos.
É o relatório no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação
2.1
- Inicialmente, cabe destacar que o principal motivo que a d.
Magistrada DANIELLI FARIAS RABELO LEITÃO RODRIGUES negou a pretendida
tutela provisória de urgência não foi apenas o fato de que a ora Autora
inobservava o grau mínimo de magreza previsto no edital do
concurso, mas também o fato de que a Autora não se enquadrava no total
de vagas existentes(14), uma vez que estava então classificada na 20ª
posição, verbis:
"Isso
porque, embora afirme que logrou êxito em ficar classificada, até a
fase de Inspeção de Saúde, em 7ª de um total de 14 vagas, na verdade,
classificou-se na 20ª posição, como se vê no documento de identificador
4058300.5391222, fora, portanto, do número de vagas disponibilizado no
certame.".
2.2
- Mas, realmente, o ponto fulcral da demanda cinge-se em saber se a
parte Autora poderia ser impedida de continuar no referido concurso
público para cargo em Órgão Militar, por estar abaixo do grau mínimo de
magreza previsto em normas administrativas, autorizadas por Lei, bem
como no edital do concurso, ou se deveria continuar, porque poderia
obter classificação final para ficar em possível lista de aprovados,
embora sem nomeação imediata, porque não classificada entre as
14(quatorze) primeiras vagas existentes.
Essa
exigência do edital feriria, segundo a Autoria na petição inicial, os
princípios da legalidade, da isonomia e da proporcionalidade.
2.2.1.
No que diz respeito ao princípio da legalidade, a Constituição da
República, nos artigos 142 e seguintes, ao tratar das Forças Armadas,
reserva à Lei o disciplinamento das exigências para ingresso, conforme
se segue:
"Art. 142. ...
§3º
Os membros das Forças Armadas são denominados militares,
aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as
seguintes disposições:
(...)
X
- a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de
idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar
para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as
prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas
as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por
força de compromissos internacionais e de guerra. (grifos acrescidos)".
O
inciso II do art. 5º da Constituição da República estabelece que
ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de Lei.
O inciso XIII desse mesmo artigo da Carta Magna estabelece: "XIII
-- é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão,
atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;".
O
art. 37, inciso I, da mesma Carta traz regra no sentido de que os
cargos públicos são acessíveis aos brasileiros que preencham os
requisitos estabelecidos em lei.
Esse art. 37 também estabelece, no seu inciso "II
- a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia
em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a
natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei,
ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de
livre nomeação e exoneração;". (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
O
ingresso de qualquer pessoa na Aeronáutica e sua habilitação à
matricula nos respectivos cursos ou estágios destinados à formação ou
adaptação de oficiais e de praças, da ativa e da reserva, tem as regras
estabelecidas na Lei nº 12.464/11, cujo artigo 20 traz os requisitos
para ingresso na Aeronáutica e, dentre eles, o relativa à inspeção de
saúde, nos seguintes termos:
"I - ser aprovado em processo seletivo, que pode ser composto por exame de provas ou provas e títulos, prova prático-oral, prova prática, inspeção de saúde, teste de avaliação do condicionamento físico, exame de aptidão psicológica e teste de aptidão motora;"(grifo nosso).
No
Edital do processo seletivo, que é a lei do certame, encontram-se
descritas as seguintes disposições referentes à inspeção de saúde:
"4.4 INSPEÇÃO DE SAÚDE INICIAL
(...)
4.4.2 A INSPSAU é de caráter eliminatório e estará a cargo dos Órgãos da Diretoria de Saúde da Aeronáutica (DIRSA).
4.4.3
A INSPSAU desta seleção avaliará as condições de saúde dos candidatos,
por meio de exames clínicos, de imagem e laboratoriais, inclusive
toxicológicos, se necessário, definidos em Instruções do COMAER, de modo
a comprovar não existir patologia ou característica que torne o
candidato
"INCAPAZ" para o Serviço Militar nem para as atividades previstas.
(...)
4.4.6
A INSPSAU tem amparo legal na Lei nº 4.375/1964 (Lei do Serviço
Militar), na Lei nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), na Lei nº
12.464/2011 (Lei de Ensino da Aeronáutica) e no Decreto nº 57.654/1966
"Regulamento da Lei do Serviço Militar".
4.4.7
Os requisitos que compõem a INSPSAU e os parâmetros exigidos para se
obter a menção "APTO" constam da ICA 160-6, "Instruções Técnicas das
Inspeções de Saúde na Aeronáutica", que se encontra disponível no sítio http://www.fab.mil.br/selecaodetemporarios." (grifo nosso).
A ICA160-6 (Instruções Técnicas das Inspeções de Saúde na Aeronáutica), por sua vez, dispõe no seu item 4.3.2.1 que "Nas
Inspeções de Saúde Iniciais serão considerados como "INCAPAZES PARA O
FIM A QUE SE DESTINAM", todos os candidatos, que obtiverem os valores de
IMC menores que 18,5, caracterizando a magreza, e maiores que 29,9
caracterizando obesidade".
Pois bem.
Resta
incontroverso, nos autos, que a Autora, quando do exame de saúde, não
observou os requisitos antropométricos definidos em instrução do Comando
da Aeronáutica e nas regras do edital, porque indiscutivelmente estava
abaixo do peso, conforme comprovado nos documentos de identificador
4058300.5391227 e 4058300.5391228.
Então,
no que diz respeito ao princípio da legalidade, a Autora não tem razão,
porque realmente não observava, na data do exame de saúde, exigência
que foi fixada com base em dispositivo legal.
Resta,
então, analisar se tais regras, a legal e a administrativa, bem como o
edital feririam os princípios da isonomia e da proporcionalidade, como
alegado na petição inicial.
2.2.2
-A respeito do princípio da isonomia, ensina o jurista da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, Dr. Celso Antônio Bandeira de
Mello[1]
"Então,
no que atina ao ponto central da matéria abordada procede afirmar: é
agredida a igualdade quando o fator diferencial adotado para qualificar
os atingidos pela regra não guarda relação de pertinência lógica com a
inclusão ou exclusão no benefício deferido ou com a inserção ou
arredamento do gravame imposto."
"Em
outras palavras: a discriminação não pode ser gratuita ou fortuita.
Impende que exista uma adequação racional entre o tratamento
diferenciado construído e a razão diferencial que lhe serviu de
supedâneo. Segue-se que, se o fator diferencial não guardar conexão
lógica com a disparidade de tratamentos jurídicos dispensados, a
distinção estabelecida afronta o princípio da isonomia.".
Queira
ou não, ainda que exercendo atividade na área de enfermagem, a Autora,
caso ingressasse na Aeronáutica, seria uma Militar.
Tenho
que não é gratuita ou fortuita a exigência em questão, porque feita por
uma das Unidades das Forças Armadas do Brasil, com base em Lei, e não
deixa de ser razoável que uma Unidade Militar exija que os seus futuros
membros não ostentem sobrepeso ou magreza excessiva, acima de padrões
fixados em normas administrativas, editadas com base em Lei, bem como no
respectivo edital.
Os exames de saúde atestaram que a Autora estava com magreza excessiva, abaixo da magreza mínima exigida.
E a exigência foi feita com relação a todos os candidatos e não apenas com relação à Autora
Então, o princípio constitucional da isonomia(igualdade), fixado no caput do art. 5º da vigente Constituição da República, foi rigorosamente observado.
2.2.3
- No que diz respeito ao princípio da proporcionalidade, embora não
previsto expressamente na vigente Constituição da República, é tratado,
com respaldo do § 2º do art. 5º da mencionada Carta Magna, na Lei nº
9.784, de 1999, no caput do seu art. 2º e no respectivo inciso VI, nos seguintes termos:
"Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
VI
- adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações,
restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias
ao atendimento do interesse público;".
Conforme
já vimos, não se observa nenhuma inadequação entre a referida
exigência e a atividade a ser exercida em Órgão Militar, no qual,
embora a Autora, se aprovada, iria exercer atividade administrativa,
pelas regras legais e administrativas, passaria a ocupar posto militar,
para o qual seria obrigada a determinado padrão físico, com atividades
de educação física rotineiras, com relação a quais, pessoas com excesso
de magreza ou excesso de peso não suportam, segundo os padrões de saúde
da Corporação Militar em questão.
2.3
- No processo nº 0804178-84.2015.4.05.8300, que tramitou nesta 2ª Vara
Federal de Pernambuco, o respectivo pleito foi julgado improcedente.
Uma candidata ao posto de enfermeira fora considerada inapta no exame de
saúde, porque estava com sobrepreso. Ou seja, estava com peso
acima do máximo permitido pela Legislação acima referida e também pela
regra do respectivo Edital. Aquela Autora recorreu e a 3ª Turma do TRF5R
manteve a minha sentença, com a seguinte ementa:
"Poder Judiciário - Tribunal Regional Federal da 5ª Região
Gabinete do Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira.
AC Nº 0804178-84.2015.4.05.8300
APELANTE: BARBARA CAMPOS DA ROCHA CARVALHO
ADVOGADO: JOSÉ FOERSTER JUNIOR
APELADO: UNIÃO FEDERAL
ORIGEM: 2ª VARA FEDERAL/PE - JUIZ FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
RELATOR(A): DESEMBARGADOR(A) FEDERAL ROGERIO DE MENESES FIALHO MOREIRA - 3ª TURMA
EMENTA
ADMINISTRATIVO.
CONSTITUICIONAL. CONCURSO. CURSO DE FORMAÇÃO PARA CORPO AUXILIAR DE
PRAÇAS DA MARINHA. NÃO APROVAÇÃO NA INSPEÇÃO DE SAÚDE. ÍNDICE DE MASSA
CORPORAL - IMC FORA DO PADRÃO. PREVISÃO EDITALÍCIA. LEGALIDADE. SENTENÇA
MANTIDA. APELAÇÃO IMPROVIDA.
1. Apelação interposta em face de
sentença que indeferiu o pedido de tutela antecipada e julgou
improcedentes os pedidos, consistentes em: a) tomar providência imediata
a fim de determinar o direito à convocação para o período de Adaptação
em 07/07/2015; b) uma vez aprovada, submeter-se a avaliação psicológica,
finalizando com direito à matrícula no Curso de Formação para Ingresso
no Curso Auxiliar de Praças da Marinha.
2. Em suas razões
recursais, a apelante alega, em síntese, que: a) houve cerceamento de
defesa pela não realização da perícia médica judicial pleiteada; b)
embora tenha obtido parecer conclusivo de "Inapta - Índice de Massa
corporal (IMC)" na fase de Inspeção de Saúde (IS), sob a alegação de
sobrepeso, foi considerada apta na fase posterior, referente ao Teste de
Aptidão Física (TAF); c) a apelante anexou aos autos documentação
médica em sede da fase do exame de saúde, e nada consta que seja
portadora de doença incapacitante, não podendo ser considerada inapta
sob a alegação de sobrepeso, índice de massa muscular incompatível com o
exercício do cargo público em comento; d) a especialidade do cargo
público que pretende é "Desenho de Arquitetura", o que não se
compatibiliza com a inaptidão física em virtude de índice de massa
corporal, não podendo ser considerada doença incapacitante.
3. O
cerne do presente recurso consiste na possibilidade ou não, de a autora
ser convocada para o Período de Adaptação e se submeter à avaliação
psicológica para, ao final, ser matriculada no Curso de Formação para
Ingresso no Corpo Auxiliar de Praças da Marinha. A apelante foi
considerada inapta na Inspeção de Saúde, em virtude de ter apresentado
índice de massa corporal (IMC) superior ao limite previsto no edital
para ocupação do cargo militar e, dessa forma, foi impedida de realizar a
matrícula no referido Curso de Formação.
4. O inciso X do artigo
142, §3º, da CF/88, prevê que, em razão da natureza das atribuições, o
preenchimento do cargo pelo militar estará sujeito a determinadas
limitações, a serem estabelecidas mediante lei.
5. "Art. 11-A. A
matrícula nos cursos que permitem o ingresso nas Carreiras da Marinha
depende de aprovação prévia em concurso público, atendidos os seguintes
requisitos, dentre outros estabelecidos, decorrentes da estrutura e dos
princípios próprios dos militares: IV - ser aprovado em inspeção de
saúde, realizada por Agentes Médico-Periciais da Marinha, segundo
critérios e padrões definidos pelo Comando da Marinha; (...) Art. 11-D.
Os editais dos concursos deverão detalhar os requisitos constantes desta
Lei". (Lei nº 11.279/2006).
6. De acordo com o item 10.1 do
Edital do certame, a Inspeção Médica "visa verificar se o candidato
preenche os critérios e padrões de saúde exigidos para a carreira (...) e
será realizada por Agentes Médico-Periciais da Marinha". Já o item 10.5
prevê que "os candidatos julgados incapazes na IS e/ou excluídos por
ocasião da avaliação da auto-declaração de negros, realizada pela JRS
para ingresso, poderão requerer IS em grau de recurso em até 5 (cinco)
dias a contar da data da comunicação do laudo pela JRS, e serão
encaminhados à JSD da respectiva área, para serem submetidos à nova IS,
em grau de recurso (...)".
7. O Edital, lei do certame,
determina, ainda, índices máximos e mínimos para, dentre outros, altura e
peso. Dessa forma, o Anexo IV, item II, alínea "b", prevê o limite de
peso: "Índice de Massa Corporal (IMC) compreendido entre 18 e 30. Tais
limites, que não são rígidos, serão correlacionados pelos Agentes Médico
Periciais (AMP) com outros dados do exame clínico (massa muscular,
conformação óssea, proporcionalidade, biótipo, tecido adiposo
localizado, etc.).
8. Quanto à possibilidade de o edital impor
limite de peso, o STJ já pacificou entendimento de que é possível
realizar exigências quanto à altura e ao peso mínimo e máximo para
ingresso na carreira militar, desde que haja previsão legal específica
que imponha essas restrições (RMS 47.299/MS, Rel. Ministro HERMAN
BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/05/2015, DJe 30/06/2015). No caso
concreto, o limite mínimo e máximo de IMC, para provimento no Corpo
Auxiliar de Praças da Marinha, além de constar do edital, também possui
lastro na Lei que dispõe sobre o ensino na Marinha.
9. As
chamadas "condições psicofísicas" visam a adaptar o candidato à carreira
militar. Levando em consideração as peculiaridades das atividades
desenvolvidas, não se mostra desarrazoada a exigência de limitações de
altura e peso, dentre outras, até para que o combatente naval possa
cumprir suas funções de maneira eficiente. E mesmo aqueles que exercem
atividades, de uma maneira ou de outra, administrativas, devem estar
preparados para situações emergenciais e de combate.
10. A teor
do que restou consignado na sentença recorrida, "Queira ou não, ainda
que exercendo atividade na área de Arquitetura, a Autora, caso
ingressasse na Marinha, seria uma Militar. (...) não é gratuita ou
fortuita a exigência em questão, porque feita por uma das Unidades das
Forças Armadas do Brasil, com base em Lei, e não deixa de ser razoável
que uma Unidade Militar exija que os seus futuros membros não ostentem
sobrepeso, principalmente quando esse sobrepeso está muito acima do
normal, como no caso da Autora, conforme a prova dos autos. Ademais,
impende ressaltar que caso essa regra não fosse observada apenas em
relação à Autora aí sim haveria quebra do princípio constitucional da
isonomia".
11. O fato de ter sido considerada apta no Teste de
Aptidão Física - TAF, não implica na desnecessidade de aprovação na
Inspeção de Saúde. Ou seja, não é possível que a aptidão no TAF
substitua o exame de saúde, que possui objetivo diferente, qual seja,
identificar se a candidata reúne condições de saúde para que a curto,
médio e longo prazo, possa desenvolver a atividade militar.
12.
Embora o Edital preveja a possibilidade de recorrer da inaptidão na
Inspeção de Saúde, o recurso administrativo apresentado pela autora,
além de confirmar o exame de IMC realizado, limita-se à intenção de
adequar-se aos limites impostos no Edital, até o dia da concentração
para o período de adaptação. A autora, portanto, não demonstra
irresignação quanto ao critério exigido, mas sim reforça a possibilidade
de estar apta quando do início do Curso. Ademais, conforme consta na
sentença recorrida, "a autora não trouxe aos autos qualquer documentação
na qual se especifique, precisamente, seu Índice de Massa Corpórea",
para que se possa averiguar a margem utilizada pela autoridade militar,
quando de sua desclassificação.
13. Apelação improvida.
Condenação da recorrente ao pagamento de honorários recursais, nos
termos do art. 85, § 11, CPC/2015, ficando os honorários sucumbenciais
que lhe cabem majorados de 10% (dez por cento) para 12% (doze por
cento), do valor atualizado da causa.
ACÓRDÃO
Vistos, etc.
Decide
a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à
unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à Apelação, nos termos do voto do relator,
na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Recife, 09 de novembro de 2017."[2]
Dessa
ementa merece ser destacado o seu item 8º, segundo o qual o assunto
encontra-se pacificado no Superior Tribunal de Justiça, no sentido da
validade e legitimidade da Legislação que estabelece limites de peso,
para mais e para menos, como o debatido neste processo.
Portanto, por todos os ângulos que se examine o caso, chega-se à conclusão que os pleitos da Autora não podem prosperar.
3. Dispositivo
Posto isso:
3.1.
ratifico a r. decisão, acima referida, pela qual a d. Magistrada
DANIELLI FARIAS RABELO LEITAO RODRIGUES indeferiu o pedido de tutela
provisória de urgência de antecipação, e julgo improcedentes os pedidos
desta ação e condeno a Autora ao pagamento de custas e dos honorários
advocatícios, os quais, em face da simplicidade do caso, fixo em 10% do
valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §2º, do CPC, e, como a
Autora está sob o gozo do benefício da Justiça Gratuita, submeto a
respectiva cobrança à condição suspensiva do § 3º do art. 98 do mesmo
diploma processual, pelo prazo ali fixado de cinco anos, e dou este
processo por extinto, com resolução do mérito(art. 487, I, CPC).
3.3. com urgência,
remeta-se cópia desta Sentença para o Exmº. Sr. Desembargador Federal
Relator do agravo de instrumento nº 0808601-53.2018.4.05.0000, para os
fins legais.
R.I.
Recife, 04.11.2019
Francisco Alves dos Santos Junior
Juiz Federal da 2ª Vara (PE)
____________________________________________________________
[1] MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. 3ª Edição. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 38.
[2]
Brasil. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. 3ª Turma. Processo nº
0804178-84.2015.4.05.8300. Relator Desembargador Federal Rogério
Moreira.
Disponível em
https://pje.trf5.jus.br/pjeconsulta/ConsultaPublica/DetalheProcessoConsultaPublica
/documentoSemLoginHTML.seam?idProcessoDocumento=75ee2ae172ec1fb2c2abf30f9ca31c44
Acesso em 04.11.2019
smbs