terça-feira, 6 de setembro de 2016

A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, O PRINCÍPIO DA TRANSPARÊNCIA E A OBRIGATORIEDADE DE FORNECER CERTIDÕES AOS ADMINISTRADOS.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.
Na decisão que segue, discute-se interessante matéria que envolve a transparência das atividades dos Órgãos e Entes da Administração Pública.
Boa leitura.
PROCESSO Nº: 0806807-94.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTOR: G M F
ADVOGADO: G M F
RÉU: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF.
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR


DECISÃO

1 -Relatório

G M F, qualificado na petição inicial, atuando em causa própria, propôs está ação ordinária com pedido de tutela provisória de urgência (tutela antecipada) em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA, objetivando o acesso ao número de desligamentos de técnicos bancários do dia 20.06.2014 até a presente data em todas as agências da CAIXA, nas regiões 1) Recife (Abreu e Lima, Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Igarassu, Ilha de Itamaracá, Ipojuca, Jaboatão dos Guararapes, Olinda, Paulista, Recife e São Lourenço da Mata); 2) Caruaru (Afogados da Ingazeira, Arcoverde, Barreiros, Belo Jardim, Bezerros, Bom Conselho, Bonito, Carpina, Caruaru, Catende, Custódia, Escada, Garanhuns, Goiana, Gravatá, Itambé, Lajedo, Limoeiro, Nazaré da Mata, Palmares, Paudalho, Pesqueira, Ribeirão, Sanharó, Santa Cruz do Capibaribe, São José do Egito, Serra Talhada, Sertânia, Surubim, Timbaúba, Toritama e Vitória de Santo Antão); 3) Petrolina (Araripina, Cabrobó, Ouricuri, Petrolina e Salgueiro). Requereu, inicialmente, os benefícios da justiça gratuita. Alegou, em síntese, que: a) em 23.02.2016, por meio do e-Sic (Solicitação e-SIC - ID. 4058300.2320405), requereu à Ré o número de desligamentos de técnicos bancários do dia 20.06.2014 até a data de solicitação em todas as agências da CAIXA do polos Recife e Caruaru; b) em 09.03.2016, a Requerida concedeu parcial acesso à informação argumentando que a divulgação poderia comprometer a competitividade da empresa e, por fim, alegando genericamente que o número de desligamentos de "empregados" da CAIXA no Estado de Pernambuco foi de 196; c) embora tenha recorrido administrativamente de tal negativa, o órgão manteve sua posição; d) teria direito de acesso à informação primária, íntegra, autêntica e atualizada (art. 7º, VI, Lei nº 12.527/2011), não podendo ser fornecida de forma incompleta ou imprecisa (art. 32, I, Lei nº 12.527/2011); e) não solicitou o número de desligamentos de "empregados" da CAIXA em Pernambuco, e sim o número de desligamentos de "técnicos bancários" delimitando os municípios, e que em outro momento a própria CAIXA já fornecera esse detalhamento (Solicitação 2 e-SIC - ID. 4058300.2320407). Teceu outros comentários. Colacionou precedentes jurisprudenciais. Ao final, requereu a concessão da tutela provisória de urgência a fim de compelir a Ré (CAIXA) a fornecer o número de desligamentos de técnicos bancários do dia 20.06.2014 até a presente data em todas as agências da CAIXA nas regiões dos polos de Recife, Caruaru e Petrolina. Instruiu a inicial com documentos.

Vieram os autos conclusos.

2 -Fundamentação

2.1. Dos benefícios da Justiça Gratuita.

Merece ser concedido à parte Autora o benefício da justiça gratuita, porque presentes os requisitos legais, mas com as ressalvas da legislação criminal pertinente, no sentido de que se, mais tarde, ficar comprovado que declarou falsamente ser pobre, ficará obrigada ao pagamento das custas e responderá criminalmente (art. 5º, LXXIV da Constituição da República e Lei nº 1.060, de 1950).

Outrossim, o benefício ora concedido não abrange as prerrogativas previstas no §5º, art. 5º da Lei nº 1.060/50, pois estas são exclusivas de defensor público ou de quem ocupe cargo equivalente.

2.2. Do pedido de tutela provisória de urgência antecipatória,  liminarmente.

2.2.1 - Nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, a concessão da tutela de urgência exige a presença dos elementos: a) que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano; b) ou o risco ao resultado útil do processo.

Trata-se de medida excepcional, utilizada apenas quando houver urgência na obtenção de determinados efeitos que somente seriam alcançados ao final do processo. A excepcionalidade decorre do fato de se tratar de medida concedida antes que se instaure o regular contraditório, de modo que a urgência afirmada permita conceder antecipadamente alguns efeitos fáticos da sentença de procedência, desde que haja meios de prova para, mediante cognição sumária, constatar-se a verossimilhança das alegações, bem como seja possível reverter o provimento antecipado (art. 300, §3º, do CPC).

Além disso, revela-se necessário que a medida seja juridicamente possível.


2.2.2 - A Caixa Econômica Federal, sendo uma Empresa Pública Bancária Estatal Federal, submete-se, entre outros, ao princípio da transparência fiscal, vale dizer, é obrigada a divulgar na rede internacional de comunicação tudo que diga respeito as suas receitas e despesas, logo, também ao seu quadro de Empregados.

Esse princípio é importante, porque possibilita o controle social, econômico e financeiro da Administração pelos Administrados.
E tem fundamento no inciso XXXIII do art. 5º, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216, todos da vigente Constituição da República, que têm a seguinte redação:
"Art. 5º (...).
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;
Art. 37 - (...).
§ 3º A lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, regulando especialmente:       (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
I - (...);
II - o acesso dos usuários a registros administrativos e a informações sobre atos de governo, observado o disposto no art. 5º, X e XXXIII; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998);
Art. 216 - (...).
§ 1º (...).
§ 2º Cabem à administração pública, na forma da lei, a gestão da documentação governamental e as providências para franquear sua consulta a quantos dela necessitem.".

O § 4º do art. 32 e os arts. 48 e 49, todos da Lei Complementar nº 101/2000, a denominada Lei da Responsabilidade Fiscal, tratam desse princípio e exigem a sua observância, o qual passou a ser regulamentado, para pronta implantação na Administração Pública,  pela Lei nº 12.257, de 18 de novembro de 2011,  cujo artigo primeiro e respectivo Parágrafo Único rezam:

"Art. 1o  Esta Lei dispõe sobre os procedimentos a serem observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5o, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal. 
Parágrafo único.  Subordinam-se ao regime desta Lei: 
I - os órgãos públicos integrantes da administração direta dos Poderes Executivo, Legislativo, incluindo as Cortes de Contas, e Judiciário e do Ministério Público; 
II - as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.".

O art. 7º dessa Lei garante ao Autor o direito ao acesso às informações indicadas na petição inicial, e os arts. 6º e 8º obrigam a Requerida a prestá-las.

Mesmo antes, a Lei 9.051, de 18.05.1995, por força da alínea "b" do inciso XXXIV do mencionado art. 5º da vigente Constituição da República, já assegurava a todo Administrado direito à obtenção de certidão, com as informações que fossem do seu interesse, perante qualquer Órgão ou Ente da Administração Pública, no prazo de 15(quinze)dias, fixado no art. 1º dessa Lei.
Então, prima facie, tenho por presentes os elementos que evidenciam a probabilidade do direito e o perigo de dano, bem como o risco ao resultado útil do processo, exigidos no art. 300 do novo Código de Processo Civil, que autorizam a concessão da tutela provisória de urgência de antecipação do pleito autoral. 

3 -Conclusão

Posto isso:

a) defiro os benefícios da justiça gratuita, porque preenchidos os requisitos legais, com a ressalva indicada na fundamentação supra;

b) defiro o pedido de tutela de tutela provisória de urgência de antecipação e concedo à Caixa Econômica Federal o prazo máximo de 15(quinze)dias para fornecer à Parte Autora todas as informações indicadas na petição inicial, juntando tais informações aos autos deste processo eletrônico, sob pena de pagamento de multa mensal, a favor da Parte Autora, correspondente ao valor do salário bruto do cargo que disputa no noticiado concurso público, sem prejuízo da responsabilização civil, administrativa e criminal do Servidor e/ou Dirigente da Requerida que venha a dar azo ao pagamento dessa multa.

Cite-se a Requerida, na forma e para os fins legais, e a  intime da íntegra desta decisão, para o seu fiel cumprimento, sob a pena acima consignada.

Com urgência.


Recife, 06 de setembro de 2016. 



Francisco Alves dos Santos Jr.
Juiz Federal, 2ª Vara/PE

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Judicialização da Saúde Pública. Novo Caso.

Por Francisco Alves dos Santos Jr
 
 
Segue sentença, na qual se debate, novamente, um problema que envolve a judicialização da saúde pública.
Boa leitura.
 
 
 
 
PROCESSO Nº: 0800255-16.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTORA: A K R DE A N
ADVOGADO: D F G P (e outro)
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR
 
 
 
Sentença tipo B.
 
EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SAÚDE PÚBLICA. UNIVERSALIZAÇÃO, ISONOMIA E FORÇAS ORÇAMENTÁRIAS.
A universalização constitucional da saúde pública, de caráter programático, tem por limite as forças econômico-financeiras do orçamento público nacional, e tem em vista  que todos tenham direito ao uso da saúde pública, mas esse princípio há de ser observado dentro da isonomia igualmente constitucional, vale dizer, em igualdade de condições, sem privilégios para quem quer que seja.
O Sistema Único de Saúde - SUS é universal, mas igualitário por excelência.
Improcedência.
 
Vistos, etc.
1. Relatório
A K R DE A N, qualificada na petição inicial, propôs esta ação de obrigação de fazer com pedido de antecipação de tutela em face da UNIÃO. Alegou, em síntese, que: a) é portadora de uma doença genética rara, sem cura e potencialmente fatal denominada ANGIODEMA HEREDITÁRIO (CID 10 - D 84.1); b) conforme laudo médico assinado pela Dra. Roberta A. Castro - CRM-SP: 153.449 / CRM-PE: 17.809, a Autora "tem o diagnóstico confirmado de Angioedema Hereditário Tipo 2 (CID-10:D84.1) desde julho de 2014, com déficit funcional da proteína inibidora de C1 esterase em duas ocasiões - 25% e 49% (valor de referência 70 a 130%) e inibidor de C1 esterase quantitativo - 26mg/dl (valor de referência 23 a 41 mg/dl)."; c) o mesmo laudo indica que a Autora "apresenta edema recorrente em pés, mãos, face além de episódios de dor abdominal intensa e acompanhada de vômitos secundária a edema de alças intestinais. Por tais crises, necessitou procurar o pronto socorro diversas vezes e esses edemas não respondem ao tratamento com corticoesteroides e/ou anti-histamínicos, sendo necessário o uso de icatibanto ou do inibidor de C1 esterase nas crises graves. Atualmente em uso de Ácido Tranêxamico (1g/dia) como profilaxia das crises, mantendo um bom controle. Sua última foi em maio de 2014."; d) "o Angioedema Hereditário é uma condição genética que temos como controlá-la, porém, mesmo sob controle poderão haver crises as quais, mais uma vez, são imprevisíveis. Como a paciente tem desejo de gastar, não deve continuar com o tratamento atual (Ácido tranexâmico) por ser contra indicado na gestação, e como as outras opções de tratamento profilático seriam Inibidor de C1 Esterase humano (que pode ser usado em gestantes) e o Danazol, o qual não pode ser utilizado em gestantes, por ser um andrógeno atenuado tem como efeito colateral o aumento de peso, hirsutismo, alterações menstruais, aumento do apetite, acne, aumento das enzimas hepáticas, além de masculinização do feto feminino. Visando sua segurança, solicito a liberação do paciente, Ana Karine Rocha Andrade Nattrod, tenha o tratamento de profilaxia adequado e seguro para programar sua vida familiar, sem correr o risco de causar danos aos feto e/ou de apresentar crises graves de angioedema, os quais podem levar ao edema laríngeo (edema de glote), colocando sua vida em risco de morte por asfixia."; e) o medicamento prescrito CINRYZE (c1 esterase) é o único indicado para o tratamento medicamentoso da autora diante das suas atuais e excepcionais condições de saúde, já que se encontra em risco pela superdose do DANAZOL (que não está sendo eficaz) e, pois, não existindo nenhum outro com o mesmo princípio ativo, similar ou genérico que o substitua; f) o tratamento com medicamento prescrito, CINRYZE® tem um custo altíssimo; g) diante da impossibilidade de adquirir o tratamento medicamentoso indicado e prescrito por seu médico, repita-se, ÚNICO APTO PARA TAL FIM, o qual lhe garantirá a preservação de sua saúde e, mais do que isso, de sua vida, foi solicitado ao Ministério da Saúde informações sobre a disponibilização/padronização do referido medicamento; h) o Ministério da Saúde, por meio da Portaria 109/2010, informou que o medicamento em questão não está "contemplado" na rede pública de saúde que para a sua doença, há disponibilidade de alternativas terapêuticas no âmbito do SUS. Teceu outros comentários. Protestou o de estilo. Ao final, requereu a antecipação dos efeitos da tutela para que a União seja condenada a disponibilizar o medicamento, na forma e nos quantitativos que se façam necessários, de acordo com o relatório médico/prescrição. Deu valor à causa. Instruiu a inicial com documentos. Comprovou o recolhimento das custas.
Decisão de 15/01/2016, indeferindo o pleito antecipatório[1].
A União Federal apresentou Contestação[2]. Levantou, preliminarmente, ilegitmidade passiva ad causam. No mérito, defendeu ausência de fundamento jurídico para determinação de fornecimento de medicamento; que não teria sido solicitado, até o momento, a inclusão do medicamento no registro da ANVISA; não teria sido comprovada a impropriedade ou ineficácia da política de saúde existente. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela decretação de improcedência dos pedidos.
Requerida a habilitação do advogado DANIEL FERREIRA GOMES PERCHON.[3]
Em sede de Réplica, foram rebatidos os argumentos da defesa e reiterados os termos da Inicial. Requereu-se, ainda, a concessão de tutela antecipada e realização de perícia médica.
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação
2.1. Da preliminar de ilegitimidade passiva ad causam
O Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal têm firme jurisprudência, no sentido de que podem ficar no polo passivo de ações como esta, envolvendo sempre delicado assunto relativo à saúde pública, qualquer das Unidades da Federação, porque, no entender dessas Cortes, todas têm responsabilidades pela saúde pública brasileira.
Nessa esteira de raciocínio, tenho que não deve ser acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva levantada pela União.
2.2. Do mérito propriamente dito
Requereu, a Autora, a título de especificação de provas, a produção de prova pericial médica, oportunidade na qual poderiam ser mitigadas as eventuais dúvidas quanto à eficácia do medicamento postulado e/ou ineficácia dos medicamentos fornecidos pelo SUS para o caso em apreço.
Tenho que não cabe a realização de perícia médica, como requerido, porque mesmo que se concluísse, na pretendida perícia, que o médico que indicou o noticiado medicamento estava com razão, conforme veremos, o tratamento por ele indicado não poderia ser deferido, porque à margem dos procedimentos aprovados pelo SUS.
O interesse médio coletivo da população coloca-se acima de um interesse isolado de um médico e do seu Cliente, porque, como veremos, embora o Sistema Único de Saúde - SUS seja universal, também é igualitário por excelência.
Tenho que a universalização da saúde pública, na Constituição, tem a finalidade de estabelecer que todos podem dela fazer uso, mas dentro das forças econômico-financeiras do orçamento público, em igualdade de condições, sem privilégios e/ou tratamento diferenciado.  Assim, cabe a Administração Central da saúde pública, dentro das regras orçamentárias e administrativas, estabelecer os limites da saúde pública universal e quem dela quiser fazer uso tem que observar esses limites, sob pena de ferir-se o princípio da isonomia, igualmente estabelecido na Constituição.
Ou seja, o Estado Brasileiro não pode conceder tratamento médico diferenciado para nenhum dos seus súditos, tem que fazê-lo em caráter universal, mas igualitário.
E os médicos brasileiros deveriam ser cientificados disso para não passarem medicamentos e/ou tratamentos à margem dos limites econômico-financeiros do SUS, provocando a judicialização desse delicado problema nacional.
Então, inspirado nesse entendimento, é que decido o mérito desta demanda.
Impende registrar, ademais, que o medicamento pretendido não está, sequer,  registrado na Agência de Vigilância Sanitária - ANVISA, fato esse que até impede a sua negociação e uso no território nacional.
Com efeito, o caput do art. 12 da Lei nº 6.360/1976 estabelece que nenhum medicamento, droga, insumo farmacêutico e correlato, inclusive importado, pode ser industrializado, exposto à venda ou entregue a consumo antes de registrado no Ministério da Saúde, atribuição atualmente exercida pela Anvisa, força do inciso II do §1º do art. 2º da Lei nº 9.782/1999.
Eis a redação do referido art. 12 da Lei nº 6.360/76:
"Art. 12 - Nenhum dos produtos de que trata esta Lei, inclusive os importados, poderá ser industrializado, exposto à venda ou entregue ao consumo antes de registrado no Ministério da Saúde.".
A Lei nº 9.782/99 estabelece, no inciso II do §1º do seu art. 2º:
"Art. 2º  Compete à União no âmbito do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária:  § 1º  A competência da União será exercida: II - pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVS, em conformidade com as atribuições que lhe são conferidas por esta Lei;"
Portanto, embora o medicamento tenha sido receitado por importante e competente Médica, para fins de tratamento da doença que acomete a Autora, a ausência do respectivo registro na ANVISA, e consequente não autorização por procedimento do SUS, constituem óbices intransponíveis à determinação para que seja fornecido pela rede de saúde pública.
Ademais, ressalte-se que o art. 19-T da Lei nº 8.080/90, incluído pela Lei nº 12.401/2011, veda, em todas as esferas de gestão do SUS, a dispensação, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento e produto, nacional ou importado, sem registro na ANVISA, verbis:
"Art. 19-T. São vedados, em todas as esferas de gestão do SUS: I - o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento, produto e procedimento clínico ou cirúrgico experimental, ou de uso não autorizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA; II - a dispensação, o pagamento, o ressarcimento ou o reembolso de medicamento e produto, nacional ou importado, sem registro na Anvisa.".
Sublinhe-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da STA 175 (Rel. Min. GILMAR MENDES), firmou orientação no sentido de que, regra geral, deverá ser privilegiado o tratamento fornecido pelo SUS em detrimento de opção diversa escolhida pelo paciente, sempre que não for comprovada a ineficácia ou a impropriedade da política de saúde existente.
Registre-se, finalmente, que o Judiciário não pode interferir na Administração da saúde pública, obrigando essa Administração a fornecer medicamento, cujo uso não está aprovado no território nacional pela Autarquia própria, a ANVISA, tampouco encontra-se na lista de remédios que devem ser fornecidos à população pelo Serviço Único de Saúde - SUS.
Sendo assim, sob todas as óticas, a decretação de improcedência dos pedidos é medida que se impõe.
2.3 - Verba Sucumbencial
A parte autora está em gozo do benefício conhecido por 'Justiça Gratuita', pelo que a sua condenação nas verbas de sucumbência(§ 2º do art. 98 do novo Código de Processo Civil)deve ficar subordinada à condição suspensiva e temporal do § 3º desse mesmo artigo desse diploma processual, o qual incorporou regras semelhantes da Lei nº 1.060, de 1950, e do entendimento do  plenário do Supremo Tribunal Federal - STF, no julgamento de três embargos de declaração, transformados em agravos regimentais, nos recursos extraordinários nºs 249.003, 249.277 e 284.729[4]
E a verba honorária, tendo em vista o esforço, dedicação do Patrono da UNIÃO na elaboração da sua peça de defesa, para qual, tendo em vista a respectiva fundamentação. deve ser arbitrada em valor razoável(§ 2º do art. 85 do NCPC) e de forma fixa, porque presente situação prevista no § 8º do art. 85 do NCPC.
3. Dispositivo
Diante de todo o exposto, julgo improcedentes os pedidos desta ação e dou o processo por extinto, com resolução do mérito(art. 487, I, NCPC).
Por força dos julgados acima referidos do Supremo Tribunal Federal - STF e dos § 2º do art. 98 do NCPC, sob a condição suspensiva e temporal do § 3º desse dispositivo legal, condeno a Autora nas custas judiciais e em verba honorária, que, à luz dos dispositivos legais indicados no subtópico "2.3" da fundamentação supra, arbitro em R$ 3.000,00 (três mil reais), corrigidos monetariamente a partir do mês seguinte ao da publicação desta sentença, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal - CJF, observada as regras da Lei nº 11.960, de 2009, mais juros de mora, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, incidentes a partir da data do trânsito em julgado desta sentença ou de acórdão que a mantenha(§ 16º do art. 85 do NCPC), sobre o valor já monetariamente corrigido.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Recife, 28 de agosto de 2016.

Francisco Alves dos Santos Jr.
Juiz Federal, 2ª Vara/PE



[1] Id. 4058300.1628566
[2] Id. 4058300.1718233
[3] 4058300.1735966
[4] ATA Nº 37, de 09/12/2015. DJE nº 251, divulgado em 14/12/2015
No mesmo sentido, mesmo relator, no julgamento de idênticos embargos de declaração, relativamente ao RE 249.003/RS(disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1760105) e no RE 284.729(disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1865697).
 

quinta-feira, 7 de julho de 2016

UMA DAS NOVIDADES DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

Por Francisco Alves dos Santos Jr. 


O novo Código de Processo Civil, instituído pela Lei nº 13.105, de 2015, que entrou em vigor no dia 18.03.2016, trouxe inúmeras novidades nesse campo do direito:  uma delas consta da decisão que segue. 
Devem os Advogados ficar atentos, para evitar atraso no andamento do processo. 
Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0804412-32.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTOR: M Z P DA S
ADVOGADO: L DE M L
RÉU: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CEF. (e outro)
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR

        A Autora pede, na petição inicial, o benefício da Justiça Gratuita, nos termos da Lei nº 1060/50.
        A Parte, para obtenção desse benefício, bastava declarar o estado de hipossuficiência na própria petição inicial, conforme estabelecia o art. 4º da Lei nº 1.060, de 1950. 
       Todavia, mencionado artigo da Lei nº 1.060, de 1950, foi expressamente revogado pelo art. 1.072 da Lei nº 13.105, de 2015, que instituiu o novo Código de Processo Civil.
        Esse novo Código criou novas regras para a formalização desse pedido, consignadas no seu art. 105.
       Segundo essa nova regra legal, se a declaração de hipossuficiência econômica for consignada na petição inicial e esta estiver assinada apenas pelo(a) Advogado(a) e não também pela Parte que dela se beneficiará, só terá validade se o(a) Advogado(a) juntar procuração na qual se lhe tenha sido concedido, em cláusula específica, poder específico para tal fim.
        Se na procuração não constar esse poder específico, a petição inicial terá que ser instruída com "declaração de hipossuficiência econômica" assinada pela própria Parte que vier a requerê-la.
         Observo que não consta, da procuração ad judicia acostada nos autos,  cláusula específica para o(a) Advogado(a) assinar referida declaração, à parte ou na petição inicial, e observo também que a Parte Autora não assinou mencionada peça, tampouco que tenha sido juntada,  entre os documentos que instruem a petição inicial, qualquer declaração neste sentido, assinada pela Parte Autora.
        Portanto, concedo à Parte Autora o prazo de 15(quinze)dias para, por meio do(a) seu(a) I. Patrono(a), juntar procuração outorgando a este(a), em cláusula específica, o poder para "assinar declaração de hipossuficiência econômica" ou então que a própria Parte Autora assine esse tipo de declaração e providencie a sua juntada nos autos, no prazo de 15(quinze) dias, sob pena de indeferimento desse pleito.

       Intime-se.

      Recife, 07.07.2016.

      Francisco Alves dos Santos Júnior
       Juiz Federal, 2a Vara-PE


Obs.: matéria suscitada pela Diretora da Secretaria da 2ª Vara Federal de Pernambuco, Sra. Cléia Lucena de Melo. 

quarta-feira, 6 de julho de 2016

PENSÃO ESTATUTÁRIA POST MORTEM. PRESCRIÇÃO DO “FUNDO DO DIREITO”. PRAZOS

Por Francisco Alves dos Santos Júnior.


A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça – STJ, que corresponde ao seu Plenário, decidiu que o direito à percepção de pensão estatutária post mortem prescreve no prazo de cinco anos(art. 1º do Decreto nº 20.910, de 1932), prazo esse contado do dia seguinte à data da morte do Instituidor da Pensão.
Segue ementa do julgado da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça – STJ que trata do assunto.
“ADMINISTRATIVO - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA - PENSÃO POR MORTE DE SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL - PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO - ART. 1º DO DECRETO 20.910/32.1. Nos termos da Súmula 158 desta Corte: "Não se presta a justificar embargos de divergência o dissídio com acórdão de Turma ou Seção que não mais tenha competência para a matéria neles versada."
2. O STJ tem firme entendimento de que a prescrição atinge o próprio fundo de direito quando transcorridos mais de 05 (cinco) anos entre a morte do instituidor (servidor público estadual) e o ajuizamento da ação em que se postula o reconhecimento do benefício da pensão por morte. Precedentes.3. O requerimento administrativo formulado quando já operada a prescrição do próprio fundo de direito não tem o poder de reabrir o prazo prescricional.4. Embargos de divergência conhecidos e providos.”Nota: - Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Corte Especial. Relatora Ministra Eliana Calmon. EREsp 1.164.224/PR, julgado em 16/10/2013, publicado no Diário da Justiça Eletrônico – Dje de  25/10/2013.
        
      Parece-me que seria caso de decadência, perda de um direito por não ter sido exercido a tempo e modo, pois só seria de prescrição se aquele direito tivesse sido exercido e negado e, então, a partir da negação fluiria prazo de prescrição, entendimento esse que encontra respaldo no art. 189 do atual Código Civil brasileiro.

   Turmas do referido Superior Tribunal de Justiça - STJ também já firmaram o entendimento que ocorre igualmente a prescrição do fundo do direito quando o pretenso Beneficiário da pensão post mortem a requer, tempestivamente, na via administrativa, mas tem o seu pedido indeferido nessa via e só pleiteia na via judicial quando já decorrido o prazo de cinco anos, contado da data da ciência do indeferimento administrativo.

       Nesse caso, sim, trata-se de prescrição, porque houve violação do direito na via administrativa, conforme mencionado art. 189 do vigente Código Civil brasileiro. 

Nesse sentido, eis um julgado da 2ª Turma desse Egrégio Tribunal, sob a relatoria da Ministra  Assusete Magalhães, no qual se faz referência a outros julgados de outras Turmas desse mesmo E. Tribunal.
“CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE ESTATUTÁRIA. ART. 219 DA LEI 8.112/90. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. ACTIO NATA. RENOVAÇÃO DO PEDIDO ANTERIORMENTE NEGADO, PELA ADMINISTRAÇÃO. IRRELEVÂNCIA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. 
I. Nos termos da Súmula 85/STJ, "nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior a propositura da ação". 
II. Na forma da jurisprudência, "a eventual demora na solicitação do pagamento de pensão por morte estatutária acarreta, em princípio, apenas a perda, por força da prescrição, das parcelas cujo vencimento tenha ocorrido mais de cinco anos antes da apresentação do pedido de pensionamento, decorrendo tal compreensão do fato de que, ordinariamente, benefícios dessa natureza podem ser requeridos a qualquer tempo, conforme prevê, por exemplo, o art. 219, caput, da Lei nº 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico aplicável aos servidores públicos federais. Indeferido, na via administrativa, o pedido de pensão estatutária, o interessado deve submeter a sua postulação ao Poder Judiciário no prazo de cinco anos, contados da data do indeferimento administrativo, sob pena de ver fulminada, pela prescrição, a pretensão referente ao próprio fundo de direito" (STJ, AgRg no REsp 1.164.224/PR, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, DJe de 08/06/2012). 
Nota - O entendimento consignado na primeira parte desse inciso II já não tem respaldo na Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, conforme julgado acima publicado. 
III. "'O indeferimento do pedido administrativo formulado para a obtenção de direito abstratamente previsto em lei constitui o termo a quo para a contagem do prazo prescricional a que se refere o art. 1º do Dec. nº 20.910/32' (AgRg no REsp 971.931/PI, Rel. Min. FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJe 10/11/08)" (STJ, AgRg no Ag 1.389.093/RS, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 29/04/2011).  
IV. A mera reiteração de pedido administrativo anteriormente indeferido, pela Administração, não tem o condão de novamente suspender o prazo prescricional já iniciado. Nesse sentido, mutatis mutandis: STJ, AgRg no Ag 1.301.925/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 14/09/2010. 
V.  Caso concreto em que a agravante formulou pedido administrativo, objetivando o recebimento da pensão estatutária, sendo o pedido indeferido, em 19/10/98, com ciência da interessada, em 01/02/2001. A agravante reiterou o pedido anterior, o qual também foi indeferido, pela Administração, em 13/05/2005, ajuizando ela a presente ação, em 10/03/2006, quando já condenada a prescrição do direito de ação. Considerando-se que o segundo pedido administrativo, formulado pela agravante foi mera reprodução do pedido anterior, não tem ele o condão de novamente suspender o prazo prescricional, de sorte que, ajuizada a ação em 10/03/2006, mais de 5 (cinco) anos após a agravante ter tomado ciência, em 01/02/2001, do indeferimento do primeiro pedido administrativo, é de rigor o reconhecimento da prescrição do direito de ação. 
VI. Agravo Regimental improvido.”.Nota: - Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 2ª Turma. Relatora Ministra Assusete Magalhães. AgRg no REsp 1.359.037/PB, julgado em 07/04/2015, publicado no Diário Judiciário Eletrônico – Dje de 16/04/2015.
 Portanto, que fiquem atentos os eventuais Beneficiários desse tipo de pensão, para que não percam o prazo para pedi-la na via administrativa ou para, na via judicial, buscar modificar a decisão administrativa que lhe negue essa pretensão.

Obs.: pesquisa feita pela Assessora Rossana Rocha Marques 


sexta-feira, 10 de junho de 2016

LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA, NEM CONTADA PARA APOSENTADORIA. CONVERSÃO EM PECÚNIA E PAGAMENTO DO RESPECTIVO VALOR AO SERVIDOR APOSENTADO. NÃO INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.

A licença-prêmio já não mais existe para o Servidor Público Federal Civil. Mas, quando existia, a Lei previa que era convertida em pecúnia, a favor dos Sucessores do Servidor, que morresse antes de gozá-la. E se o Servidor se aposentasse, sem gozá-la e sem contar o respectivo período, em dobro, para a aposentadoria? A Lei era omissa. Então a jurisprudência se firmou no sentido de que mencionada licença-prêmio, em tal situação, tinha que ser convertida em pecúnia e paga ao próprio Servidor Aposentado. 
A jurisprudência também se firmou no sentido de que sobre o respectivo valor não incidia, como não incide, imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza, porque não se enquadra como renda-acréscimo, tampouco como proventos de qualquer natureza-acréscimo, logo não se concretiza o fato gerador desse imposto, como descrito no art. 43 do Código Tributário Nacional. 
Na sentença infra, essas matérias são minudentemente debatidas. 
Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0804282-13.2014.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTOR: F. J. V. 
ADVOGADO: M. A. DE S. F. 
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR




Sentença registrada eletronicamente
Sentença tipo A

EMENTA:-  LICENÇA PRÊMIO. CONVERSÃO EM PECÚNIA APÓS APOSENTADORIA.     PROCEDÊNCIA.
A hoje extinta licença-prêmio, quando existia e não era gozada a tempo e modo e também não era computada em dobro para fins de aposentadoria, convertia-se em pecúnia quando da morte e também quando da aposentadoria do Servidor,  sob pena de indevido locupletamento por parte da Administração Pública.
Sobre o respectivo valor, não incide o Imposto sobre Rendas e Proventos de Qualquer Natureza, conforme Súmula 136 do Superior Tribunal de Justiça - STJ.
      
       Vistos, etc.

      1 - Relatório

     F. J.V., qualificado na petição inicial, propôs esta ação ordinária para conversão de licença-prêmio em pecúnia em face da UNIÃO FEDERAL. Alegou, em síntese, que: a) na condição de Policial Rodoviário Federal, após 41 anos de serviço, teria obtido sua aposentadoria no dia 08/02/2013; b) o Núcleo de Administração Pessoal da Polícia Rodoviária Federal teria constatado, por meio de cálculo de aquisição de licença-prêmio por assiduidade, que o Autor fazia jus a 04 períodos de licenças-prêmio, totalizando 12 meses; c) não teria gozado as licenças a que teria direito, nem utilizou essas licenças para cômputo em dobro para fins de aposentadoria; d) teria feito um pedido administrativo à Seção de Recursos Humanos da Policia Rodoviária Federal, objetivando a conversão em pecúnia de suas Licenças-Prêmio não gozadas, porém teria sido negado o seu pedido. Teceu comentários, citou textos da legislação e jurisprudência pátria em defesa de seu pleito e ao final requereu:
   " I.  A citação da ré, para querendo venha a contestar esta ação sob pena de revelia;
    II.   Provar o alegado por todos os meios de provas em direito admitidas;
    III.  A concessão da gratuidade judiciária do autor, uma vez que na qualidade de servidor público APOSENTADO, não pode arcar com os ônus processuais sem o prejuízo do sustento próprio ou de sua família;
    IV.  Seja ao final julgada procedente a presente ação, condenando a promovida à conversão do período de licença-prêmio em pecúnia, no número de doze vezes o valor do subsídio mensal de policial rodoviário federal, referente ao autor, acrescidos de juros e correção monetária, bem como no pagamento das custas processuais e verba honorária fixada em 20% (vinte por cento) sobre o montante total da condenação, sem prejuízo dos demais consectários legais, tudo por medida de Justiça;
    V.   No efetivo pagamento, a isenção do imposto de renda sobre os valores devidos, por se tratar verbas de natureza indenizatória;
    VI.  A retenção dos honorários contratuais no percentual de 20% conforme contrato em anexo (doc. 2.2, fls 1)."
        Atribuiu valor à causa e instruiu a inicial com procuração e documentos.
         Despacho inicial deferindo os benefícios da Assistência Judiciária Gratuita e a prioridade na tramitação do feito.
         A UNIÃO apresentou contestação.[1] Aduziu preliminarmente a impossibilidade jurídica do pedido. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela improcedência do pedido.
         A parte Autora apresentou réplica[2] à contestação.
        Vieram os autos conclusos.
        É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.
       
       2 - Fundamentação

       Trata-se de pedido de conversão em pecúnia das licenças-prêmio não gozadas nem utilizadas pelo Autor para contagem de sua aposentadoria, além de não incidência do imposto de renda sobre o valor pleiteado, licenças-prêmio tais obtidas quando vigente o dispositivo legal que assegurava esse prêmio aos Servidores da União. .

       2.1 - Conversão das Licenças-Prêmio em Pecúnia

       No mérito, penso que o Autor tem direito à transformação, em pecúnia, de todas as licenças prêmio.
       A licença-prêmio estava assim prevista na Lei 8.112/90, em seu art. 87, § 2º :

"Art. 87. Após cada quinquênio ininterrupto de exercício, o servidor fará jus a 3 (três) meses de licença, a título de prêmio por assiduidade, com a remuneração do cargo efetivo.(...)§2º Os períodos de licença-prêmio já adquiridos e não gozados pelo servidor que vier a falecer serão convertidos em pecúnia, em favor de seus beneficiários da pensão.".
Nota - Hoje, o Servidor Público Federal não mais faz jus a esse tipo de licença, pois a Lei nº 9.527, de 10.12.1997, deu nova redação a esse dispositivo legal, que passou a ter a seguinte redação:  
"Art. 87.  Após cada qüinqüênio de efetivo exercício, o servidor poderá, no interesse da Administração, afastar-se do exercício do cargo efetivo, com a respectiva remuneração, por até três meses, para participar de curso de capacitação profissional. (Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) Parágrafo único.  Os períodos de licença de que trata o caput não são acumuláveis.(Redação dada pela Lei nº 9.527, de 10.12.97).".
    Assim, antes dessa alteração, a Lei estabelecia  transformação da licença prêmio em pecúnia apenas para o caso de falecimento do Servidor e beneficiava apenas a sua família, e não tratava da hipótese de aposentadoria antes do seu gozo ou da sua contagem em dobro para a aposentadoria. Ora, a aposentadoria do Servidor é, para o serviço público,  como a sua morte, o seu fim, então não tem sentido a interpretação que, na hipótese de aposentadoria, transfere para a UNIÃO a percepção dos respectivos valores que já se integraram no patrimônio do Servidor que se aposentou.
        E foi nesse sentido que se firmou a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, verbis:
"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. SERVIDOR PÚBLICO. LICENÇA-PRÊMIO NÃO USUFRUÍDA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. REQUISITOS PREENCHIDOS NOS TERMOS DA LEGISLAÇÃO ENTÃO VIGENTE. POSSIBILIDADE. DIREITO ADQUIRIDO. PRECEDENTES DO STF.1. Conforme a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os servidores públicos têm direito à conversão em pecúnia de licença-prêmio não usufruída quando os requisitos necessários à sua concessão foram implementados antes do advento de lei revogadora deste direito.
2. Agravo regimental desprovido.".
Nota - Brasil. Supremo Tribunal Federal - STF, 2ª Turma. Realtor Ayres de Britto. Julgado em 14.02.2012.
     No mesmo sentido, já decidiu o Tribunal Regional Federal da 5ª Região:
"ADMINISTRATIVO. EMBARGOS INFRINGENTES. SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO. FÉRIAS E LICENÇAS-PRÊMIO NÃO GOZADAS. CONVERSÃO EM PECÚNIA. POSSIBILIDADE.-
"É direito dos servidores públicos aposentados a conversão em pecúnia das férias e licenças-prêmio não gozadas, tendo em vista o princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, no caso, por parte da Administração Pública. Precedentes do STF, do STJ e desta Corte Regional.- Embargos infringentes providos.".
Nota - Brasil. Tribunal Regional Federal da 5ª Região - TRF5R. Pleno. Relator Desembargador Federal Francisco Wildo. Embargos Infringentes em Apelação Cível - EIAC nº 2008.83000217989802. Publicado no Diário da Justiça Eletrônico - DJe de 05.04.2011, p. 354.
     No caso dos autos temos que o Autor juntou cópias de parte do processo administrativo nº 08.654.003.992/2012-96, que trata de sua aposentadoria,[3] onde consta registrado que ele fazia jus a 12 meses de Licença-Prêmio, correspondente aos períodos de: 1º  06/02/1973 a 06/06/1978; 2º 07/06/1978 a 05/01/1984; 3º 06/01/1984 a 04/01/1989; 4º 05/01/1989 a 04/01/1994. Está consignado também que todos esses períodos não foram gozados e que não caberia o respectivo uso para contagem em dobro,  para fins da aposentadoria, uma vez que, pelo que se depreende dos documentos juntados, o Autor somou mais de 41 anos de tempo de serviço público.
      Então, é inquestionável o direito de o Autor ter essas licenças-prêmio convertidas em pecúnia e de receber o respectivo valor.

     2.2 - Não-incidência do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza - IRPQN

     O valor que o Servidor Público recebe a título de ressarcimento das licenças-prêmio, não gozadas a tempo e modo e não contadas para fins de aposentadoria, não sofre incidência do imposto de renda, porque não há o respectivo fato gerador, uma vez que mencionado valor não se enquadra como renda-acréscimo, nem como proventos de qualquer natureza-acréscimo(art. 43, I e II, respectivamente, do Código Tributário Nacional), em face da sua natureza premial.
      Nesse sentido firmou-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, verbis:
"TRIBUTÁRIO - IMPOSTO DE RENDA - RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO -DEMISSÃO SEM JUSTA CAUSA - VERBAS INDENIZATÓRIAS - INDENIZAÇÃO ESPECIAL PAGA POR LIBERALIDADE DO EMPREGADOR - INCIDÊNCIA - FÉRIAS E RESPECTIVO ADICIONAL - NÃO-INCIDÊNCIA.
1. A Primeira Seção desta Corte, revendo seu posicionamento, pacificou entendimento no sentido de que o imposto de renda incide sobre as verbas recebidas por força da rescisão do contrato de trabalho sem justa causa, quando pagas por liberalidade do empregador, já que tais importâncias representam acréscimo patrimonial tipificado no art. 43 do CTN.
2. Assentou o mesmo órgão que não incide imposto de renda sobre verbas indenizatórias, decorrentes de rescisão sem justa causa, relativas ao abono pecuniário de férias, e sobre a conversão em pecúnia dos direitos não-gozados, tais como licença-prêmio, férias vencidas e proporcionais e seu respectivo adicional.
Agravo regimental provido, para dar parcial provimento ao recurso especial."
Nota - Brasil. Superior Tribunal de Justiça-STJ. Segunda Turma. Relator Humberto Martins. Agravo no Recurso Especial-Agresp nº 1.120.488. Segunda Turma,  julgado em 25.09.2009. Negritei.
     Esse E. Tribunal, quanto à não-incidência do mencionado imposto sobre o valor em questão,  bem antes do julgado acima, já tinha sumulado a sua jurisprudência:
"Súmula 136 - O pagamento de licença-prêmio não gozada por necessidade do serviço não está sujeito ao imposto de renda".
     Assim, é de se dar procedência aos pedidos do Autor.

      2.3 - Verba Honorária

     Como se trata de matéria já por demais conhecida, diante das regras do § 2º do art. 85 do vigente Código de Processo Civil, tenho que o(a) Advogado(a) do Autor não necessitou de realizar muito esforço, tampouco de muito tempo e dedicação para elaborar a petição inicial, pelo que a verba honorária será fixada no percentual mínimo do § 3º desse mesmo artigo de Lei.

        3. Conclusão

        Posto isso:
  1. julgo procedentes os pedidos desta ação e condeno a UNIÃO:
            1.1 - a converter em pecúnia os 4(quatro) períodos de licenças-prêmio, que não foram gozadas pelo Autor quando estava na ativa, períodos esses indicados na fundamentação supra, e que também não foram contados para fins de aposentadoria, e a pagar ao Autor o respectivo valor, por meio de requisitório constitucional, com atualização (correção monetária e juros de mora) na forma e pelos índices estabelecidos no manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal, sem prejuízo de observar-se o que foi decidido pelo STF na modulação dos efeitos do acórdão relativo a ADI 4425, relativamente à Lei nº 11.960, de 2009;
            1.2 - observar a não incidência do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza sobre mencionado valor, ou seja, a não exigir sobre mencionado valor o referido imposto.
            2. Outrossim, condeno a UNIÃO ao pagamento de honorários advocatícios, que, à luz dos § 2º e § 3º-I do art. 85 do vigente Código de Processo Civil, arbitro em 10% (dez por cento) do valor total da condenação.
            Sentença não sujeita ao duplo grau de jurisdição, porque o valor total não corresponderá ao valor de 1.000 (hum mil) salários mínimos (art. 496, §3º, inciso I do CPC).
       
              Registre-se. Intime-se.

              Recife 10 de junho de 2016.

              Francisco Alves dos Santos Júnior

                   Juiz Federal, 2ª Vara/PE