Por Francisco Alves dos Santos Júnior
Na decisão que segue, debate-se a questão relativa à competência do Juiz e do Juízo para processar, apreciar e julgar as ações populares, quando em mais de uma discute-se uma mesma matéria principal. Faz-se referência ao dispositivo legal e aos respectivos precedentes do Superior Tribunal de Justiça que tratam do assunto.
Boa leitura.
Observação: decisão pesquisada e minutada pela Assessora Rossana Marques Rocha.
PROCESSO
Nº: 0800591-79.2019.4.05.8311 - AÇÃO POPULAR
AUTOR: R S DE A e outros
ADVOGADO: M N G
RÉU: PETROLEO BRASILEIRO S A PETROBRAS e outros
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)
AUTOR: R S DE A e outros
ADVOGADO: M N G
RÉU: PETROLEO BRASILEIRO S A PETROBRAS e outros
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)
DECISÃO
1-
Relatório
R S DE A, D S B DA S, M A D Z, F M DA C, A L
DA S e J B S S, qualificados na Petição Inicial, ajuizaram em 28/06/2019, às
20h12min16s, esta "AÇÃO POPULAR COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA EM
CARÁTER LIMINAR" em face da PETRÓLEO BRASILEIRO S.A. - PETROBRAS, do
CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA PETROBRAS, na pessoa de seu presidente, do
CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA - CADE, na pessoa de seu
presidente, e da UNIÃO, na qual pretendem obter, em síntese: a decretação da "anulação
do Termo de Compromisso de Cessação de Prática estabelecido entre o Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (CADE) e a Petrobras SA em que a Companhia
se compromete a privatizar metade de sua capacidade de refino; a
Disponibilização, por parte da Petrobras da ata da Reunião do Conselho de
Administração da Companhia que aprovou o TCC objeto da presente ação, para que
sejam responsabilizadas as pessoas físicas responsáveis pelo dano ao patrimônio
público, na forma da lei;" Juntaram instrumentos de procuração e
documentos.
A presente ação foi protocolada em 28/06/2019, às
20h 12min 16s (Id. 4058311.11025941), e distribuída para a 30ª Vara Federal/PE
(v. certidão sob Id. 4058311.11026198).
Aos 02 dias do mês de julho de 2019, lavrou-se
certidão cartorária que procedeu à redistribuição do feito para uma das Varas
Cíveis da Capital, ao fundamento de que a 30º Vara tem competência privativa
para processar e julgar as ações de Execução Fiscal e Juizado Especial.
Certificada a redistribuição da ação em 02/07/2019,
realizada por sorteio, o processo foi redistribuído para esta 2ª Vara Federal,
nessa mesma data.
2- Fundamentação
Está sendo veiculada na internet notícias sobre o
ajuizamento de ações populares envolvendo o tema em questão.
Além disso, no dia de ontem (03/07/2019),
compareceram na sede deste Juízo (2ª Vara/PE), perante este magistrado, duas I.
advogadas noticiando a existência da Ação Popular distribuída para a 16ª Vara
Federal da SJDF sob o nº 1017599-85.2019.4.01.3400, ajuizada por T F B em face
de PETRÓLEO BRASILEIRO S/A PETROBRAS e do CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA
ECONÔMICA - CADE, que supostamente envolveria o tema em liça.
Nesse contexto, determinei à Assessoria deste 2ª
Vara Federal/PE que entrasse em contato com a 16ª Vara Federal/SJDF,
solicitando o envio, por e-mail, da cópia da petição inicial da Ação
Popular tombada sob o nº 1017599-85.2019.4.01.3400, e que a anexasse aos autos
para fins de verificação da conexão/prevenção, o que foi cumprido, sendo a
referida cópia da Petição Inicial anexada aos autos (v. Id. 4058300.11076101).
Pois bem, da leitura dos pedidos formulados nas
duas Ações, os Autores/Populares pretendem, em ambos os feitos, a anulação do
Termo de Compromisso de Cessação de Prática estabelecido entre o Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (CADE) e a Petrobras SA, homologado em
sessão do dia 11/06/2019, no qual a Petrobrás se comprometeu a vender 8 de suas
13 refinarias.
Na Ação Popular em trâmite na 16ª Vara da SJDF, a
Parte Autora formulou pedido subsidiário; e, na presente Ação Popular,
requereu-se, ademais, a "Disponibilização, por parte da Petrobras
S.A., da ata da Reunião do Conselho de Administração da Companhia que
aprovou o TCC objeto da presente ação, para que sejam responsabilizadas as
pessoas físicas responsáveis pelo dano ao patrimônio público, na forma da
lei;"
Assim, diante da identidade do pedido
principal das duas ações, causas de pedir e pedidos, é o caso de aplicar o
disposto no §3º do art. 5º da Lei nº 4.717/65, verbis:
"Art. 5º. Omissis
§ 3º A propositura da ação prevenirá a jurisdição
do juízo para todas as ações, que forem posteriormente intentadas contra as
mesmas partes e sob os mesmos fundamentos."
Saliente-se que não há necessidade de que os
fundamentos jurídicos adotados na Petição Inicial de ambos os feitos e os
pedidos coincidam ipsis literis, para que seja reconhecida a prevenção
entre Ações Populares, e, neste sentido já decidiu a Primeira Seção do E. STJ, verbis:
"PROCESSUAL CIVIL - CONFLITO DE COMPETÊNCIA -
AÇÃO POPULAR - PREVENÇÃO.
Tratando-se de ações populares que têm causa de
pedir e pedido muito semelhantes, aforadas perante Juízes igualmente
competentes, aplica-se o critério da prevenção para resolver a questão acerca
da competência. Conflito de competência conhecido para declarar competente o
Juízo Federal da Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro." (CC
27.886/PE, Rel. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 29/02/2000,
DJ 03/04/2000, p. 104[1]).
Acrescente-se que o risco de decisões conflitantes
enseja a reunião dos feitos nos termos do §3º do art. 55 do CPC, verbis:
"Art. 55. Reputam-se conexas 2 (duas) ou mais
ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir.
§ 3º Serão reunidos para julgamento conjunto os
processos que possam gerar risco de prolação de decisões conflitantes ou
contraditórias caso decididos separadamente, mesmo sem conexão entre
eles.".
A esse respeito, a Primeira Seção do E. STJ, ao
julgar Conflito Positivo de Competência veiculado no bojo de ações
populares, decidiu pela reunião das aludidas ações populares, com o fim de
evitar decisões conflitantes, reconhecendo, com fundamento no §3º do
art. 5º da Lei nº º 4.717/65, a competência do Juízo para o qual foi
distribuída a primeira demanda, verbis:
"PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO
POSITIVO DE COMPETÊNCIA ENTRE VARAS DE REGIÕES DIVERSAS DA JUSTIÇA FEDERAL.
AÇÕES POPULARES PROPOSTAS COM O FIM DE SUSPENDER/ANULAR NOMEAÇÃO E
POSSE DE MINISTRO-CHEFE DA CASA CIVIL. IDENTIDADE DE PARTES E DE OBJETO.
COMPETÊNCIA DO JUÍZO PARA O QUAL FOI DISTRIBUÍDA A PRIMEIRA
DEMANDA. ART. 5º, § 3º, DA LEI N. 4.717/65. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR
COMPETENTE O JUÍZO DA 22ª VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL.
1. Consigna-se, a princípio, que o presente
conflito de competência se refere, na origem, a ações populares propostas
com o objetivo de verificar a higidez, ou não, do ato de nomeação
do Sr. Luiz Inácio Lula da Silva para ocupar o cargo de Ministro-Chefe da Casa
Civil.
2. Cumpre mencionar, inicialmente, que não há
se falar em perda de objeto do conflito de competência
(assim como alegada por alguns autores das vias
populares em questão) pelo fato de o Sr. Luiz Inácio
Lula da Silva não mais ocupar o cargo de Ministro-Chefe da Casa
Civil. Isso porque, tratando-se, no caso, de ações populares, ainda
que haja desistência do respectivo processamento na instância de
origem, caberá ao Ministério Público assumir a titularidade da
ação, tendo em vista o interesse público
subjacente ao tema, na forma da Lei n. 4.717/1964.
3. No caso, persiste o interesse - até por se
tratar, como dito, de ações populares intentadas - quanto a saber sobre o
alegado vício no ato de nomeação do Sr. Luiz Inácio Lula da Silva para ocupar o
cargo de Ministro-Chefe da Casa Civil. É que, por
óbvio, se, ao final, forem julgadas improcedentes ditas
demandas, tal conclusão terá consequência direta sobre
os efeitos do ato de nomeação, a fim de qualificá-lo como hígido ou não.
4. Com base nessas considerações,
rejeita-se a preliminar de perda de objeto deste conflito positivo de
competência.
5. Segundo a jurisprudência firmada no
âmbito do Superior Tribunal de Justiça, "a conexão
das ações que, tramitando separadamente, podem gerar decisões
contraditórias implica a reunião dos processos em unum et idem judex, in casu,
ações populares e ação civil pública [...]" (CC
36.439/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira
Seção, julgado em 8/10/2003, DJ 17/11/2003, p. 197).
6. Tratando-se de diversas ações populares, com
identidade de causas de pedir e de objeto, as quais foram propostas
com a finalidade de suspender/anular a nomeação e posse do Sr. Luiz Inácio Lula
da Silva para o cargo de Ministro-Chefe da Casa Civil, é competente
o Juízo Federal da 22ª Vara da Seção Judiciária
do Distrito Federal, na medida em que para essa
unidade jurisdicional foi distribuída a demanda primeva.
7. Os documentos coligidos aos autos revelam
acertada a tese que se coaduna com o disposto no
art. 5º, § 3º, da Lei n. 4.717/65, determinando
que a propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo
para todas as ações que forem posteriormente intentadas contra as mesmas partes
e sob os mesmos fundamentos.
8. Conflito conhecido para
declarar competente o Juízo Federal da 22ª Vara da Seção Judiciária do Distrito
Federal. Fica prejudicado o exame dos agravos internos."[2]
Com esses fundamentos (prevenção do Juízo e evitar
decisões conflitantes), tendo em vista que a Ação Popular nº
1017599-85.2019.4.01.3400, que tramita perante a 16ª Vara da SJDF, ajuizada às 17h
42 min 25 s do dia 28 de junho de 2019, perante o MM. Juízo Federal da 16ª
Vara da SJDF, é mais antiga que a presente Ação Popular, ajuizada perante este
Juízo às 20h 12min 16s do dia 28 de junho de 2019, é de se reconhecer a
incompetência absoluta deste Juiz Federal desta 2a Vara Federal de Pernambuco e
do respectivo Juízo para processar, apreciar e julgar este feito, e reconhecer
a prevenção do Juízo da 16ª Vara Federal/SJDF, e consequente competência,
que é absoluta, do respectivo Juiz Federal e Juízo para processar,
apreciar e julgar este feito.
3- Conclusão:
Posto isso, reconheço a incompetência absoluta
deste Juiz Federal e deste Juízo da 2º Vara Federal de Pernambuco para
processar, apreciar e julgar esta Ação Popular e declino a competência, que é
legalmente absoluta, para tal fim, para o Juiz Federal e Juízo da 16ª Vara
Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, para onde determino que
esta Ação Popular, após baixa nesta 2º Vara Federal de Pernambuco, seja
encaminhada, na forma da legislação judiciária-administrativa de regência, com
a urgência que o caso requer.
Após, decorrido o prazo recursal ou apresentada
renúncia a esse prazo, cumpra-se.
Intimem-se.
Recife, 04.07.2019.
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara/PE
(rmc)
[1] BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
Disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/ita/listarAcordaos?classe=&num_processo=&num_registro=199901043379&dt_publicacao=03/04/2000
Acesso em: 04/07/2019.
[2] - Brasil. Superior Tribunal de Justiça.
Primeira Seção. Conflito de Competência nº 145.918/DF. Relator Ministro
Og Fernandes, julgado em 10/05/2017, DJe 17/05/2017, disponível em http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=%22a
%E7%E3o+popular%22+e+conex%E3o+&&tipo_visualizacao=LISTACOMPLETA&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true.
Acesso em 02.10.2017.