Por Francisco Alves dos Santos Jr.
O novo Código de Processo Civil do Brasil, editado em 2015, tendo entrado em vigor em 18.03.2016, trouxe inúmeras e detalhadas regras sobre verba honorária sucumbencial. Na sentença que segue aplicam-se, num caso concreto, as regras dos §§ 2º, 3º, 4º e 5º do seu artigo 85.
Discute-se também quando é que um ato judicial é considerado contraditório para ser reparado via embargos de declaração.
Boa leitura.
Obs.: sentença pesquisada pela Assessora Luciana Simões Correa de Albuquerque, tendo prevalecido a sua minuta no subtópico 2.2 da fundamentação da sentença.
PROCESSO Nº: 0801064-06.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTORA: FUNDACAO C DE P E A
ADVOGADO: H S M Da F
RÉU: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
Sentença em Embargos de Declaração.
EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA.
-Merecem ser providos os pedidos do recurso de embargos de declaração da UNIÃO - Fazenda Nacional, porque houve a apontada omissão e também erro material, reconhecido de ofício.
-Não merecem provimento os pedidos do recurso de embargos de declaração da Parte Auto0ra, porque não se fez presente a omissão por ela apontada, tampouco contradição que possa ser reparada por embargos de declaração.
Vistos, etc.
1. Breve Relatório
A
UNIÃO (FAZENDA NACIONAL), opôs Embargos de Declaração (Id.
4058300.2668606). Aduziu, em síntese, que: ao se estabelecer os
honorários sucumbenciais em 5% sobre o valor da causa, devidamente
atualizado, adotando como fundamento legal as regras dos §§ 2º e 3º,
III, do art. 85 do CPC, teria havido inobservância quanto ao preceito
contido no § 5ª do mesmo dispositivo, relativo à forma de cálculo quando
a base de cálculo da verba advocatícia ultrapassar os limites do inciso
I do § 3º; a sentença embargada fora omissa no que se refere à
aplicação da regra do § 5º, possibilitando, assim, o manejo destes
aclaratórios; a manutenção da condenação dos honorários advocatícios nos
termos em que fixada resultaria em um valor menor devido à ora
embargante, acarretando descumprimento às normas processuais, bem como
ocasionando enriquecimento ilícito do autor; cumpriria a este juízo,
reconhecendo a omissão alegada, suprir o vício apontado no sentido de
fixar a condenação da verba sucumbencial nos moldes previstos no § 5º do
art. 85 doCPC, estabelecendo os percentuais aplicáveis a cada faixa do
valor da causa.
A
FUNDAÇÃO C DE P E A também opôs Embargos de
Declaração (Id. 4058300.2674514) aduzindo, em síntese, que: o juiz na
respeitável sentença teria se fundamentado na ausência de uma das
condições da ação, mais precisamente no que se refere a falta do
interesse de agir da demandante; tal premissa deveria ser refutada,
posto que, pela natureza jurídica da demanda aqui tratada (declaratória
em matéria tributária) o interesse de agir do contribuinte, no caso dos
autos, estaria revelado pela necessidade em afastar o estado de
incerteza, tipicamente presente nas ações declaratórias; quando do
ajuizamento da ação, momento processual em que se verifica a existência
das condições da ação, conforme os predicados da "teoria da asserção", o
acórdão proferido no RE 595.838/STF não gozava de efeitos erga omnes,
portanto, não poderia ser auto aplicável à autora, que necessitava de
um provimento jurisdicional que lhe resguardasse quanto à suspensão dos
recolhimentos da contribuição previdenciária em tela; os atos
administrativos mencionados na sentença (Solução de Consulta COSIT
152/2015 e a Nota Técnica PGFN/CASTF nº 174/15), até por sua natureza,
não teria o condão de afastar a crise de incerteza que fundamenta o
pedido autoral, visto que à Administração Pública seria dada a
prerrogativa de autotutela de seus atos, permitindo assim que os revogue
por razões de oportunidade e conveniência; não se poderia partir da
premissa de que o posicionamento indicativo da administração pública
traria a segurança jurídica necessária a implementar a compensação ou o
próprio pedido de restituição, tendo em vista a possibilidade de ser
revisto, a qualquer tempo, o entendimento externado pelos órgãos
tributários federais; a Autora seria uma entidade fechada de previdência
privada, destinando-se unicamente a gerir o patrimônio dos empregados e
aposentados da C., o que exigiria máxima cautela quanto às suas
obrigações fiscais, sob pena de causar prejuízos coletivos, razão pela
qual somente adota posturas contrárias ao que determina a lei em vigor
mediante obtenção de decisão judicial concreta em seu favor; teria sido
justamente o caso presente; a Autora teria ingressado com ação judicial
pretendendo ver declarada a inconstitucionalidade do dispositivo então
em vigor (art. 22, inciso IV, da Lei nº 8.212/91), a fim de dar os
corretos contornos à relação jurídico-tributária, permitindo-lhe cessar
os recolhimentos da contribuição previdenciária e, ao final, repetir o
valor pago indevidamente; a premissa equivocada utilizada para
caracterizar a carência da ação residiria no entendimento de que os Atos
Administrativos Interpretativos anteriormente mencionados, teriam o
condão de afastar a incerteza jurídica trazida pelo julgamento
interpartes do RE 595.838/STF; tal entendimento não se sustentaria visto
que, por sua própria natureza de ato administrativo, estes poderiam ser
revogados ou modificados, discricionariamente; o interesse de agir,
como condição de ação, em ações declaratórias de matéria tributária,
deveria ser analisado sob o prisma da segurança jurídica do
contribuinte, a qual somente seria alcançada quando da revogação legal
da exação tributária ou mediante o afastamento da obrigação por decisão
judicial; o interesse de agir relacionado com o pedido de repetição de
indébito tributário decorreria diretamente da existência de pagamentos
indevidos, o que também restaria comprovado na petição inicial; quando
da Réplica, a Autora/Embargante teria apresentado precedentes
jurisprudenciais (do STJ e do TRF 5a Região) que tratariam
especificamente de ações que visam à repetição de indébito tributário,
não estando condicionadas à exigência de prévio requerimento no âmbito
administrativo; na decisão ora embargada, teria sido invocado o
precedente do STF (RE 631.240-MG) que trata de tema alheio ao dos autos;
o julgado excetuaria a regra geral de inafastabilidade de acesso ao
judiciário, exigindo prévio requerimento administrativo, apenas no que
concerne às ações ajuizadas para fins de concessão de benefícios
previdenciários; tal situação não seria aplicável aos autos; onde se
buscaria a declaração de inexistência da obrigação tributária in concreto
e a repetição dos valores pagos indevidamente; não observando o art.
489, § 1º, VI do CPC/2015; a decisão embargada teria deixado de "demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento" invocado pela Autora em suas manifestações; seria necessário realizar o devido distinguish, ou seja, a distinção, comprovando que a ratio decidendi
do precedente seria inaplicável ao caso sob julgamento, em razão de
alguma peculiaridade ou mesmo em face da total descoincidência das
relações jurídicas de direito material discutidas no processo; o
Tribunal Regional da 5a Região, em situação semelhante à dos autos, em
que se buscava a declaração de inexistência de obrigação (igualmente em
relação à tributo sujeito ao lançamento por homologação) e posterior
restituição do indébito tributário, teria emitido julgamento em que se
ratifica a desnecessidade de prévio requerimento administrativo para
ajuizamento da ação; a sentença ora embargada teria acabado por
extinguir o processo, sem resolução de mérito, com fundamento na suposta
"falta de interesse de agir", revogando a decisão inicial que antecipou
a tutela em favor da Autora/Embargante; o fundamento versado pelo
próprio Juízo ao conceder a antecipação dos efeitos da tutela; haveria
evidente contradição endoprocessual quando o juízo concede antecipação
da tutela de mérito e, posteriormente, extingue o feito por suposta
falta de interesse de agir; a própria tutela antecipada registra a
necessidade da lide, seja pela presença do periculum in mora seja
pela plausibilidade juridical do pedido, uma vez que ainda não havia
Lei revogando mencionado dispositivo considerado inconstitucional ou
mesmo decisão judicial dotada de efeitos erga omnes que
favorecesse a Fundação ora Embargante; a extinção do feito sem resolução
de mérito, além de penalizar desproporcionalmente a Autora/Embargante,
configuraria evidente contradição e obscuridade em relação à postura de
concessão da tutela antecipada por parte deste MM. Juízo; não haveria
dúvidas, portanto, que o provimento jurisdicional buscado teria se
mostrado inútil e necessário para declarar o afastamento da lei no caso
concreto e prover segurança juridica à postura da fundação de cessar os
recolhimentos da contribuição previdenciária em tela, caracterizando
seu evidente interesse processual. Teceu outros comentários. Pugnou, ao
final, fossem conhecidos e providos os presentes Embargos de Declaração,
para que este Juízo, com esteio nos art. 1.022 e 489, § 1º, do CPC,
suprisse os vícios ora apontados, conferindo efeitos infringentes aos
embargos, de modo a afastar a carência da ação referida na sentença
terminativa, promovendo-se o julgamento de mérito da lide, sendo
intimada previamente a União em respeito ao contraditório.
A União (Fazenda Nacional) apresentou contrrrazões aos Embargos de Declaração, rebatendo de forma detalhada cada um das omissões/contradições apontadas pela Parte Autora. Pugnou, ao final, fossem rejeitados os aclaratórios. (Id. 4058300.2782151).
Certificado o decurso de prazo sem manifestação da Parte Autora acerca dos Embargos de Declaração opostos pela União (Fazenda Nacional). (Id. 4058300.3360411);
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação
A União (Fazenda Nacional) apresentou contrrrazões aos Embargos de Declaração, rebatendo de forma detalhada cada um das omissões/contradições apontadas pela Parte Autora. Pugnou, ao final, fossem rejeitados os aclaratórios. (Id. 4058300.2782151).
Certificado o decurso de prazo sem manifestação da Parte Autora acerca dos Embargos de Declaração opostos pela União (Fazenda Nacional). (Id. 4058300.3360411);
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação
2.1. Dos Embargos de Declaração opostos pela UNIÃO - Fazenda Nacional (Id. 4058300.2668606)
Segundo
o art. 1.022 do vigente Código de Processo Civil, os embargos de
declaração podem ser manuseados para "esclarecer obscuridade ou eliminar
contradição" ou "suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia
se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento" ou, ainda, "corrigir
erro material".
No
caso em exame, aduz a parte Ré, ora Embargante, em apertada síntese,
ao se estabelecer os honorários sucumbenciais em 5% sobre o valor da
causa, devidamente atualizado, adotando como fundamento legal as regras
dos §§ 2º e 3º, III, do art. 85 do CPC, teria havido inobservância
quanto ao preceito contido no § 5ª do mesmo dispositivo, relativo à
forma de cálculo quando a base de cálculo da verba advocatícia
ultrapassar os limites do inciso I do § 3º; de acordo com o citado
preceito.
Tem razão a Embargante.
A
fórmula de fixação e apuração da verba honorária adotada na sentença
embargada não considerou a adotada nos §§ 4º e 5º em consonância com as
regras do § 2º e os parâmetros dos incisos do § 3º, todos do art. 85 do
NCPC e aquela fórmula, se aplicada, findará por causar prejuízo aos
Procuradores da União - Fazenda Nacional, porque implicará em valor
menor que o realmente devido à luz de tais dispositivos legais.
Com
efeito, o mencionado § 5º manda aplicar o percentual fixado pelo juiz,
no caso, o mínimo legal de 10%(dez por cento) do inciso I do § 3º do
art. 85 do NCPC, até o limite máximo de 200 salários mínimos desse
dispositivo; o que exceder, sofrerá incidência do percentual mínimo de
8%(oito por cento) do inciso II do mencionado § 3º; e se ainda houver
valor que exceda o limite do inciso II, será aplicado o percentual
mínimo de 5%(cinco por cento)sobre tal valor, e assim sucessivamente.
Cabe
ainda esclarecer que também se impõe a observância do estabelecido nas
regras do § 4º do referido art. 85, especialmente a regra do final dos
seus incisos III e IV, os quais, respectivamente, mandam observar o
valor da causa e, na apuração dos parâmetros da base de cálculo, o
salário mínimo vigente na data da prolação da sentença líquida ou o
vigente na data da prolação da decisão de liquidação.
Então,
tenho que houve omissão quanto à aplicação dos referidos §§ 4º e 5º e
erro material na aplicação direta e única do inciso III do § 3º do
mencionado art 85 do NCPC.
Embora
o valor da causa de R$ 2.274.077,33 (dois milhões, duzentos e setenta e
quatro mil, setenta e sete reais e trinta e três centavos), tomado como
base de cálculo da verba honorária, deva ser atualizado a partir da
data da citação, tenho que estamos diante de uma sentença líquida, para
os fins dos incisos I e IV do § 4º do art. 85 do NCPC, porque temos como
apurar o valor da verba honorária, o qual dependerá, posteriormente, de
mera atualização(correção monetária e juros de mora)por índices já
conhecidos, porque fixados em Lei e organizados no manual de cálculos do
Conselho da Justiça Federal e que incidirão a partir da data da
citação, conforme a sentença embargada e o art. 219 do CPC de 1973, bem
como art. 240 do NCPC.
2.1.1 - Temos então a seguinte situação:
Valor da causa, base de cálculo do valor da verba honorária, R$ 2.274.077,33, em 17.02.2016.
Salário mínimo base R$ 880,00.
a) Aplicação do inciso I do § 3º do art. 85 do NCPC
200(duzentos)
salários mínimos de novembro de 2016, ou seja, 200 x R$ 880,00 = R$
176.000,00. Verba honorária 10% de R$ 176.000,00 = R$ 17.600,00(dezessete mil e seiscentos reais);
Valor
da causa(base de cálculo da verba honorária) 2.274.077,33 - R$
176.000,00 = Valor que remanesce como excedente R$ 2.098.077,33.
b) Aplicação do inciso II do § 3º do art. 85 do NCPC - 2.000(dois mil)salários mínimos do excedente de R$ 2.098,077,33.
2.000(dois mil)salários mínimos de R$ 880,00 = 1.760.000,00.
Verba honorária de 8% sobre R$ 1.760.000,00 = R$ 140.800,00(cento e quarenta mil e oitocentos reais).
Valor que remanesce como excedente R$ 338.077,33.
c) Aplicação do inciso III do § 3º do art. 85 do NCPC.
R$ 2.098.077,33 - R$ 1.760.000,00 implica no remanescente excedente
R$ 338.077,33, que é inferior ao 2.000(dois mil)salários mínimos de R$
880,00, fixados nesse inciso III do § 3º do art. 85, logo os próprios R$
338.077,33 serão a base de cálculo desta última parcela da verba
honorária.
Então, 5% sobre R$ 338.077,33 = R$ 16.903,87(dezesseis mil, novecentos e três reais e oitenta e sete centavos.
Total da verba honorária, sobre base de cálculo atualizada até 16.02.2016(data da distribuição desta ação):
R$ 17.000,00 + R$ 140.800,00 + R$ 16.903,87 = R$ 175.303,87(cento e setenta e cinco mil, trezentos e três reais e oitenta e sete centavos)
Este
é o valor devido a título de verba honorária, atualizado até
16.02.2016, sem prejuízo de atualização(correção monetária e juros de
mora), contados da citação, até a data do efetivo depósito ou pagamento,
conforme consta da sentença embargada e conforme regra do art. 240 do
NCPC, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça
Federal.
Então,
mencionado recurso de embargos de declaração da União - Fazenda
Nacional, merece acolhida, com efeito infringente do julgado, nos termos
supra.
2.2. Dos Embargos de Declaração opostos pela Parte Autora (Id. 4058300.2674514).
Aduz a Autora, ora embargante, existir omissão na sentença recorrida, uma vez que o decisum
teria sido fundamentado em premissa fática distinta da dos autos, ao
não analisar o feito frente à ausência de repercussão geral do RE nº
595.838/SP, o qual declarou inconstitucional a contribuição do art. 22,
IV, da Lei nº 8.212, de 1991, quando do ajuizamento desta ação, fato
este que autorizaria a discussão judicial, uma vez que os atos
normativos da administração pública federal não consolidaria, no seu
entender, a segurança jurídica vislumbrada.
Defendeu,
ainda que, a sentença embargada teria sido omissa pelo fato de não ter
realizado, em relação ao precedente trazido pela parte autora da
desnecessidade de prévio requerimento administrativo para o ajuizamento
da ação de repetição de indébito, o devido distinguish, ou seja, a distinção, comprovando que a ratio decidendi do precedente inaplicável ao caso sob o julgamento", já que o precedente judicial utilizado não se adequaria ao caso.
Por
fim, afirmou que a respeitável sentença também teria sido contraditória
e obscura ao extinguir o feito, sem resolução do mérito, quando, na
análise do pleito da antecipação dos efeitos da tutela teria sido
deferida por entender presentes os requisitos necessários para tanto.
Pois bem.
Diante da multiplicidade das alegações, passo a analisar cada uma delas, detalhadamente:
2.2.1. Da falta de interesse de agir
Alega a Autora, ora Embargante, existir omissão na sentença recorrida, uma vez que o decisum
teria sido fundamentado em premissa fática distinta da dos autos, ao
não analisar o feito frente à ausência de repercussão geral do RE nº
595.838/SP, o qual declarou inconstitucional a contribuição do art. 22,
IV, da Lei nº 8.212, de 1991
No
que se refere ao primeiro ponto, verifica-se que a fundamentação da
sentença foi consubstanciada nas próprias informações prestadas pela
parte autora, quando indicou a existência de atos normativos expedidos
pela administração fazendária, reconhecendo o direito por ela pleiteado,
e lastreados no julgamento do recurso extraordinário 595.838/SP.
A
propositura da ação não teria nenhuma utilidade, porque, como se extrai
da própria petição inicial, atos normativos dos Órgãos próprios da
UNIÃO, à luz do referido julgado do Plenário da Supre Corte, impedem a
cobrança administrativa do tributo em debate e autorizam acolhimento de
pedidos administrativos para a respectiva regularização, inclusive de
pedidos de restituição.
Assim,
resta patente a ausência de interesse de agir da autora, pelo que não
há se falar em omissão do julgado quanto a este ponto.
2.2.2. Da necessidade de manifestação quanto ao precedente trazido pela parte autora e da desnecessidade de prévio requerimento administrativo para o ajuizamento da ação de repetição de indébito
2.2.2. Da necessidade de manifestação quanto ao precedente trazido pela parte autora e da desnecessidade de prévio requerimento administrativo para o ajuizamento da ação de repetição de indébito
Alega
a Autora, ora Embargante, que a sentença Embargada teria sido omissa
quanto à distinção dos precedentes invocados pela autora quando da
Réplica.
De
plano, observo que os mencionados precedentes levantados pela parte
Autora pautam-se, essencialmente, no que diz respeito ao princípio da
inafastabilidade do controle jurisdicional previsto no art. 5º, XXXV, da
Constituição Federal e desnecessidade do prévio requerimento na via
administrativa para que se configure o interesse processual.
Nesse contexto, para uma melhor compreensão da matéria, passo a transcrever a fundamentação da sentença objurgada, verbis:
"2 - Fundamentação
Sendo assim, não há também de se falar em omissão quanto a este ponto.
A UNIÃO - Fazenda Nacional levantou, na sua contestação, preliminar de falta de interesse de agir.
A respeito desta preliminar, eis o bem alinhavado texto da contestação da UNIÃO - Fazenda Nacional:
"É indene de dúvidas a fata de interesse de agir da parte adversa, impondo a extinção do feito sem resolução do mérito com esteio no art. 485, VI, do Código de Ritos.
Com efeito, o exercício do direito de ação não fica ao puro talante do autor, mas pressupõe o atendimento de requisitos para tornar legítima a busca do Poder Judiciário.
Sobre o ponto, Cleide Previtalli Cais citando a Couture afirma:
"Couture sustenta que a idéia de processo é, necessariamente, teleológica, pois somente se explica por seu fim, já que processo por processo não existe. O fim do processo é o de dirimir o conflito de interesses submetido aos órgãos jurisdicionais, fim esse privado e público, que satisfaz, ao mesmo tempo, o interesse individual comprometido no litígio e o interesse social de assegurar a efetividade do direito por meio da atividade incessante da jurisdição".[1]
E mais à frente[2] com alusão ao mestre Cândido Dinamarco:
"Como considera Cândido Dinamarco, mesmo que não haja, em abstrato, impedimento ao exercício da função jurisdicional por força da impossibilidade jurídica, "o Estado não se põe invariavelmente à disposição do particular, para lhe dar, em qualquer situação, o provimento que este entender de lhe pedir". Daí encontrar justificativa o requisito do interesse de agir como condição para o exercício do direito de ação, o qual se traduz segundo o mesmo autor na coincidência entre o interesse do Estado e do particular pela atuação da vontade da lei e se apresenta, analiticamente, como a soma de dois requisitos básicos: necessidade concreta do processo e adequação do provimento e do procedimento desejados. O requisito da necessidade concreta da jurisdição "significa que não nasce a ação enquanto as forças do próprio direito substancial objetivo ainda não se mostram incapazes de extinguir a situação de lide"." ( grifo nosso)
Por sua vez, a professor Alexandre Freitas Câmara[3] discorrendo acerca de tal requisito, consigna:
"Assim é que, para que se configure o interesse de agir, é preciso antes de mais nada que a demanda ajuizada seja necessária. Essa necessidade da tutela jurisdicional decorre da proibição da autotela, sendo certo assim que todo aquele que se considere titular de um direito( ou outra posição jurídica de vantagem) lesado ou ameaçado, e que não possa fazer valer seu interesse por ato próprio, terá de ir a juízo em busca de proteção. Assim, por exemplo, o credor terá de demandar o devedor inadimplente para ver seu crédito satisfeito, da mesma forma que o locador terá de demandar o locatário para ter restituída a posse do bem locado." ( grifo nosso)
Sendo assim, como se divisa, a necessidade de busca do Poder Judiciário deve estar presente para que se possa fazer valer um direito, o que inexiste no caso dos autos. Explica-se.
Ora, como bem asseverado pela parte adversa, por meio da Solução de Consulta COSIT 152/2015, a Receita Federal do Brasil restou vinculada ao entendimento firmado Pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional que a partir da Nota Técnica PGFN/CASTF nº 174, de 2015, deixou de oferecer resistência a pedidos como que tais.
A aludida Solução de Consulta ainda se assenta no Ato Declaratório RFB n.º 5, de 26/05/2015 pelo qual a Receita Federal deixou de constituir crédito tributário relativo à contribuição em testilha.
Com efeito, assim dispõe o referido Ato Interpretativo em seu art. 2º:
"Art. 2º A Secretaria da Receita Federal do Brasil não constituirá crédito tributário decorrente da contribuição de que trata o § 1º do art. 1º da Lei nº 10.666, de 8 de maio de 2003, que instituiu contribuição adicional àquela prevista no inciso IV do art. 22 da Lei nº 8.212, de 1991, para fins de custeio de aposentadoria especial para cooperados filiados a cooperativas de trabalho."
De ressaltar, por relevante, que a Solução de Consulta COSIT 152/2015 ainda faz referência ao direito de pleitear a repetição de indébito, dada a não modulação de efeitos no RE 595838. Veja-se:
SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 152, DE 17 DE JUNHO DE 2015
(Publicado(a) no DOU de 23/06/2015, seção 1, pág. 41)
ASSUNTO: CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS EMENTA: CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. CONTRIBUIÇÃO DE 15% SOBRE NOTA FISCAL OU FATURA DE COOPERATIVA DE TRABALHO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 595.838/SP.
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 595.838/SP, no âmbito da sistemática do art. 543-B do Código de Processo Civil (CPC), declarou a inconstitucionalidade, e rejeitou a modulação de efeitos desta decisão, do inciso IV, do art. 22, da Lei nº 8.212, de 1991, dispositivo este que previa a contribuição previdenciária de 15% sobre as notas fiscais ou faturas de serviços prestados por cooperados por intermédio de cooperativas de trabalho.
Em razão do disposto no art. 19 da Lei nº 10.522, de 2002, na Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 1, de 2014, e na Nota PGFN/CASTF nº 174, de 2015, a Secretaria da Receita Federal do Brasil encontra-se vinculada ao referido entendimento.
O direito de pleitear restituição tem o seu prazo regulado pelo art. 168 do CTN, com observância dos prazos e procedimentos constantes da Instrução Normativa RFB nº 1.300, de 20 de novembro de 2012, com destaque, no caso, para os arts. 56 a 59, no que toca à compensação.
DISPOSITIVOS LEGAIS: Código Tributário Nacional, art. 168; Lei nº 8.383, de 1991, art. 66; Lei nº 10.522, de 2002, art. 19; Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 1, de 2014; Nota PGFN/CASTF Nº 174, de 2015; Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 5, de 2015.(grifo nosso)
Nessa toada, não somente a Receita Federal, desde 05/2015, deixou de constituir crédito tributário relativo à contribuição previdenciária do art. 22, IV, da Lei 8.212/91, mas ainda reconhece o direito à repetição dos valores dentro do lustro prescricional, observada, quanto à compensação, o disposto nos arts. 56 a 59 da Instrução Normativa RFB n.º 1.300/2012 editados com arrimo no art. 89 da Lei 8.212/91.
Isto porque o indébito alusivo à contribuição previdenciária deve ser compensado apenas com contribuição de mesma espécie e destinação constitucional não lhes sendo aplicável o art. 74 da Lei 9.430/96 por força do art. 26 da Lei 11.457/2007. Mas quanto a este particular, a própria parte autora pleiteia a compensação nos termos da lei aplicável.
Por tudo exposto Exª, resta evidente a falta de interesse de agir da parte autora impondo-se a extinção do feito sem resolução do mérito com'o alhures asseverado.",
Tenho que esta preliminar merece acolhida, pois onde não há pretensão resistida não se forma a lide que justificaria a necessidade de propositura de ação.
E, como bem argumentado pela UNIÃO - Fazenda Nacional na sua contestação, a própria Parte, ora Autora, cuidou de demonstrar que a ora Ré, por seus Órgãos próprios, já baixara atos normativos no sentido de não mais se exigir a contribuição em debate, tampouco recorrer-se contra decisões judiciais que fossem favoráveis aos Contribuintes.
Então, bastava que, após tais atos administrativos, decorrentes do noticiado julgado do Supremo Tribunal Federal, A Autora cessasse de pagar referida contribuição e requeresse, na via administrativa, a restituição ou compensação das parcelas que pagou indevidamente.
Apenas na hipótese de a ora Autora vir a ser autuada por ter cessado de recolher a Contribuição ou de negativa, na via administrativa, da repetição do indébito, é que surgiria a resistência à pretensão e formaria a lide e aí então justificaria a propositura de ação como esta.
A propósito, o Pleno do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento nesse sentido quando julgou, em 03.09.2014, o Recurso Extraordinário nº 631.240, originário de Minas Gerais-MG, tendo por relator o Ministro Roberto Barroso, sob repercussão geral, verbis:
Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir."
Nota 1 : Brasil. Supremo Tribunal Federal. Pleno. Recurso Extraordinário nº 631.240/MG - Minas Gerais. Relator Ministro Roberto Barroso. Julgamento em 03.09.2104. Divulgado no Diário da Justiça Eletrônico - DJe nº 220, de 07.11.2014 e publicado, nesse mesmo Diário, em 10.11.2014[sob efeito de repercussão geral].
Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28PREVIO+REQUERIMENTO+ADMINISTRATIVO%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/gszjw46.
Acesso em 30.11.2016.
Então, para matérias que ainda não tenham sido indeferidas pela Administração Pública, antes de propor ação judicial, o Administrado tem que, previamente, esgotar a via administrativa e apenas na hipótese de o seu pleito administrativo vier a ser indeferido é que surgirá o seu interesse processual de agir. Sem resistência à pretensão do Contribuinte não existe lide e sem esta não há necessidade da utilização de ação judicial(processo).
Óbvio que esse interesse existirá se, para casos idênticos, a Administração já tiver negado o pleito de algum Administrado.
O que, como vimos, não é o caso dos autos, nos quais a própria Autora cuidou de demonstrar que a ora Ré, por seus órgãos fazendários, como a Receita Federal do Brasil, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, etc., já tinham baixado atos administrativos normativos, orientando a Administração Pública a não mais cobrar a Contribuição em debate, tampouco a recorrer contra decisões judiciais que fossem favoráveis aos Contribuintes, uma vez que o Plenário do Supremo Tribunal Federal já tinha considerado inconstitucional o dispositivo legal com base no qual a Contribuição era cobrada.
E nessa situação, necessita de ser revogada a decisão inicial, acostada sob identificador nº 4058300.1710751, na qual, liminarmente, antecipou-se a tutela, determinando a suspensão da exigibilidade da contribuição em debate, até mesmo pelo fato de que não estava mais sendo exigida pela Administração Pública."
Observa-se,
assim, que, a despeito de não tratar especificamente de questões que
envolvam matéria tributária, o precedente transcrito no corpo decisão
aborda, indiretamente a desnecessidade de se provocar o Judiciário
quando inexistir resistência administrativa.
Tanto
foi assim que o principal enfoque da sentença foi no sentido de
decretar a carência da ação, em face do reconhecimento por parte da
Autora acerca da edição atos administrativos normativos dos órgãos
fazendários, orientando a administração pública a não mais cobrar a
contribuição em debate.
2.2.3. Da pretensa contradição e obscuridade no que se refere à extinção do feito sem julgamento do mérito.
Defende
a Embargante que haveria contradição endoprocessual no momento em que
Juízo concedeu antecipação da tutela de mérito e, posteriormente,
extinguiu o feito por suposta falta de interesse de agir.
Tanto a decisão inicial, quanto a sentença ora embargada são atos endoprocessuais.
Todavia,
inexiste, no direito processual civil brasileiro, a possibilidade de
firmar-se contradição quando uma decisão inicial de concessão de alguma
tutela provisória de urgência é revogada na sentença, seja esta
meramente terminativa(sem apreciação do mérito) ou resolutória do
mérito(procedente ou improcedente), primeiro porque aquela decisão é
sempre precária, e segundo e principalmente, porque a contradição
passível de reparo por recurso de embargos de declaração é aquela interna corporis, dentro do próprio ato judicial embargado, o que, como já demonstrado, não ocorreu.
Por
outro lado, como é na sentença que o magistrado exerce sua cognição
exauriente, quando tem então em mãos a questão completa, com as teses e
informações da Parte Autora e as teses e informações da Parte Requerida,
resolverá o processo, com ou sem resolução do mérito, podendo
ratificar, modificar parcial ou totalmente o que tenha consignado em
decisão anterior, na qual tenha ou não concedido tutela provisória de
urgência.
3. Dispositivo
Posto isso:
3.1
- julgo procedentes os pedidos dos embargos de declaração da UNIÃO -
Fazenda Nacional e, quanto à verba honorária, declaro a sentença
embargada e, dando ao mencionado recurso efeito infringente da sentença
embargada, estabeleço que da sua fundamentação passa a constar o
consignado no subitem 2.1 e 2.1.1 da fundamentação supra e da sua
conclusão que o subitem 3.2 passa a ter a seguinte redação: "3.2 - e
condeno a Autora nas custas processuais e em verba honorária que,
considerando a simplicidade do caso e tendo em vista as regras dos §§ 4º e 5º c/c as regras dos §§ 2º e dos incisos do § 3º, todos do art. 85
do mencionado NCPC, arbitro essa verba no percentual mínimo legal, a
incidir conforme as regras dos invocados §§ 4º e 5º, observados os seus
parâmetros e também os parâmetros dos incisos do invocado § 3º,
tomando-se por base o salário mínimo da data da sentença embargada, na
forma calculada e consignada no subtópico 2.1.1 da fundamentação supra,
no valor de R$ 175.303,87(cento e setenta e cinco mil, trezentos e três reais e oitenta e sete centavos), que
se encontra atualizado até 17.02.2016(data da propositura desta ação),
sem prejuízo da atualização(correção monetária e juros de mora), pelos
índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, incidindo
os juros sobre o valor já monetariamente corrigido, desde a data da
citação(art. 240 do NCPC)até a data do depósito ou pagamento".
3.2 - nego provimento aos pedidos do recurso de embargos de declaração da Autora.
Recife, 03 de julho de 2017.
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara/PE.