Muitas vezes o Credor tem um crédito líquido, mas consignado em título não executivo. A partir da Lei nº 9.079, de 14.07.1995, esse Credor passou a poder buscar o atributo da executoriedade por meio da denominada ação monitória.
No entanto, deve esse Credor ficar atento para o curto prazo de prescrição do novo Código Civil, de 2002.
Segue sentença no qual esse assunto foi enfrentado.
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA
Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2008.83.00.004466-0 – Classe 28 – Ação Monitória
Autor: EMGEA – EMPRESA GESTORA DE ATIVOS
Adv.: ...
Adv.: Réu: F A G A
Adv.: ...
Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2010
Sentença tipo “B”
Ementa:- PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. CONTRATO DE MÚTUO. VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA.
- Aplicação do prazo prescricional do novo Código Civil.
- Dívida Líquida, prescrição do inciso I do § 5º do art. 206 do Código Civil em vigor.
- Prescrição reconhecida ex officio(§ 5º do art. 219 do Código de Processo Civil).
Vistos etc.
A EMGEA – EMPRESA GESTORA DE ATIVOS, qualificada na Inicial, propôs, em 16.01.2008, a presente “Ação Monitória” em face de F G A. Alegou, em suma, que em 03/02/1995, teria firmado com a parte demandada “Contrato por Instrumento Particular de Compra e Venda, Mútuo com Obrigações e Quitação Parcial”; que o Demandado teria deixado de pagar as prestações legalmente pactuadas, estando inadimplente em 124 parcelas, o que teria ensejado o vencimento antecipado da dívida; que teriam restado frustradas todas as tentativas de receber extrajudicialmente os créditos a que faria jus; que o débito atualizado em 03/12/2007, totalizaria o valor de R$441.666,00. Teceu outros comentários. Requereu: a expedição de mandado de citação e pagamento na forma do art. 1.102-b do CPC, determinando que o Demandado efetuasse o pagamento, no prazo de 15(quinze) dias, dos valores ora pleiteados, atualizados e corrigidos na forma prevista no contrato em questão, ou então, que oferecesse Embargos, sob pena de formação do título executivo, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo, acrescendo as custas processuais e os honorários advocatícios, sendo estes à razão de 20% sobre o valor total do débito, bem como a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC. Fez protestos de estilo. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com comprovante de recolhimento de custas, instrumento de procuração e documentos (fls. 06/31).
Em atenção ao despacho de fl. 35, a EMGEA retificou o valor dado à causa, fl. 38.
Às fls. 87/90, FERNANDO ANTÔNIO GUEDES ALCOFORADO apresentou Embargos à ação monitória alegando, em suma, que de acordo com a Cláusula Quinta do contrato acostado aos autos, o pagamento do imóvel seria regido pelo Plano de Equivalência Salarial do mutuário; que, com o passar do tempo, e constatado o não acompanhamento dos reajustes a que tinha direito o Embargado, a dívida teria se tornado impagável, motivando-o a requerer, por diversas vezes, a revisão do índice das prestações; que, inclusive, teria disponibilizado o referido imóvel à Caixa Econômica Federal em março de 2004; que seria judicialmente reconhecida a inexatidão dos índices e o acréscimo de percentuais que distorceriam a filosofia do Sistema Financeiro de Habitação; que teriam sido proferidas decisões judiciais acolhendo a rígida observância da aplicação dos reajustes à variação salarial do mutuário; que a questão do anatocismo teria sido objeto de estudo em sentenças proferidas. Teceu outros comentários e requereu: a improcedência da “ação monitória”, impugnando o pedido na alínea e da Petição Inicial, vez que o imóvel estaria desocupado desde março de 2004; que sejam refeitos os cálculos correspondentes ao débito do Embargante, vez que, ao contratar o financiamento, cerca de 40% do imóvel já teria sido pago à Imobiliária Farinha Ltda. e o valor venal do imóvel não se aproximaria sequer da metade do valor correspondente ao que a Embargada alega ter direito, e o pagamento de tal valor resultaria em enriquecimento ilícito da Embargada. Protestou o de estilo e requereu a revisão do valor da causa. Juntou procuração e documentos, fls. 91/131.
À fl. 132, os Embargos foram recebidos e foi determinada a intimação da Embargada para impugnar.
Às fls. 134/142, a EMGEA/CAIXA ECONÔMICA FEDERAL apresentou Impugnação aos Embargos, pugnando pela rejeição dos Embargos Monitórios, tendo em vista que não se prestariam para o fim de embargar a ação monitória, eis que apenas serviriam para procrastinar o resultado útil do processo e prorrogar a condição de moradia graciosa da Embargante em detrimento do interesse público e da coletividade. Requereu, ainda, o julgamento antecipado da lide e, no mérito, a rejeição dos Embargos Monitórios. Protestou o de estilo.
Vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
Passo a decidir.
Fundamentação
1-Prejudicial de prescrição.
O Réu não argüiu a exceção de prescrição.
Ocorre que a Lei nº 11.280, de 16.02.2006, partindo do entendimento de que a prescrição envolve norma de ordem pública, assim como a decadência, alterou a redação do § 5º do art. 219 do Código de Processo Civil , de modo a permitir o seu reconhecimento de ofício pelo magistrado, garantindo, assim, uma maior agilização das questões postas em juízo.
Destarte, à luz dessa disposição legal, passo a analisar a questão.
É sabido que o termo inicial do prazo prescricional não é a data da celebração do contrato de crédito (03 de fevereiro de 1995, fl. 27), e sim a data de vencimento da dívida.
Importa, em primeiro lugar, saber quando a dívida ora cobrada venceu.
Conforme disposto na Cláusula Sexta (fl. 14) e alínea “C” (fl. 13) do “Contrato de Compra e Venda com Quitação e Cancelamento Parcial (fls. 12/27), as amortizações do financiamento seriam feitas por meio de prestações mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira em 03.03.1995 e as seguintes em igual dia dos meses subseqüentes.
No “Demonstrativo de Débito” acostado à fl. 28 dos autos, datado de 03.12.2007, consta que o contrato em questão estaria com 125 (cento e vinte e cinco) prestações atrasadas.
Assim, considerando os termos do instrumento contratual, e, considerando ainda que, em 03.12.2007, segundo alegado pela EMGEA, estaria o ora Requerido inadimplente em 125 (cento e vinte e cinco) prestações, verifico que a primeira prestação não paga corresponde àquela vencida em 03.07.1997.
Tem-se, portanto, que, à época em que o ora Requerido passara a dever a integralidade da dívida, 03.07.1997, estava em vigor o antigo Código Civil, cujo art. 177 dispunha verbis:
Art. 177. As ações pessoais prescrevem, ordinariamente, em 20 (vinte) anos, as reais em 10 (dez), entre presentes, e entre ausentes, em 15 (quinze), contados da data em que poderiam ter sido propostas.
Ora, ainda que a dívida em questão tenha vencido em 03.07.1997, por se tratar de alteração do prazo prescricional, sua cobrança está submetida ao novo Código Civil por força das disposições transitórias finais, especificamente pelo art. 2.028 .
É que, a partir da vigência do NCC/2002, em 11.01.2003, todas as dívidas originadas na vigência do Código anterior somente adotarão o prazo revogado quando já ultrapassado mais da metade do lapso prescricional nele contido.
No caso concreto, observo que ainda não transcorrera metade do prazo prescricional estabelecido no antigo Código Civil, de modo que é aplicável o prazo previsto no novo Código.
A jurisprudência vem se firmando, no sentido de que o novo prazo somente deve se iniciar a partir do advento do novo Código, ou seja, a partir de 11 de janeiro de 2003.
É o que se verifica nos arestos a seguir colacionados:
LOCAÇÃO. CIVIL. COBRANÇA DE ALUGUERES. PRESCRIÇÃO. ART. 2.028 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. EXEGESE.
1. A aplicação da lei nova, de modo a reduzir prazo prescricional referente a situações a ela anteriores e sujeitas a um lapso prescricional superior, disciplinado pela lei revogada, efetivamente importará em atentado aos postulados da segurança jurídica e da irretroatividade da lei, caso se considere a data do fato como marco inicial da contagem do novo prazo. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.
2. Dessa forma, nas hipóteses em que incide a regra de transição do art. 2.028 do Código Civil de 2002, o termo a quo do novo prazo é o início da vigência da lei nova, no caso 11 de janeiro de 2003, e não a data em que a prestação deixou de ser adimplida.
3. Recurso especial conhecido e provido.
(STJ. 6ª Turma. RESP 948600/SP. Rel.: Min. Maria Thereza de Assis Moura. Julg. 29.nov.2007, u., pub. 17.dez.2007, DJ, p. 00372) (G.N.)
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ATO ILÍCITO. PRESCRIÇÃO. PRAZO. CONTAGEM. MARCO INICIAL. REGRA DE TRANSIÇÃO. NOVO CÓDIGO CIVIL.
1 - Se pela regra de transição (art. 2028 do Código Civil de 2002) há de ser aplicado o novo prazo de prescrição, previsto no art. 206, §3º, IV do mesmo diploma legal, o marco inicial de contagem é o dia 11 de janeiro de 2003, data de entrada em vigor do novo Código e não a data do fato gerador do direito. Precedentes do STJ.
2 - Recurso especial conhecido e provido para, afastando a prescrição, no caso concreto, determinar a volta dos autos ao primeiro grau de jurisdição para julgar a demanda.
(STJ. 4ª Turma. RESP 838414/RJ. Rel.: Min. Fernando Gonçalves. Julg. 08.abr.2008, u., pub. 22.abr.2008, DJE). (G.N.)
Ora, enquanto o Código Civil de 1916, nos seus artigos 177 a 179, previa que as dívidas poderiam ser cobradas em até 20(vinte) anos, o novo Código findou por reduzir esse tempo para, no máximo, 10 (dez) anos, conforme disposto no art. 205 e, para situações idênticas ao da questão sob análise, o novo Código estabeleceu prazo prescricional de cinco anos(art. 206, § 5º-I).
Realmente, a dívida do Requerido, embora espelhada em documento que não constitui título executivo extrajudicial, goza do atributo da liquidez, sendo, pois, uma dívida líquida.
Iniciado o novo prazo, de 5 (cinco) anos, a partir do dia 11 de janeiro de 2003, conclui-se que, na data da propositura da presente ação (16 de janeiro de 2008), a dívida já estava prescrita.
2-Conclusão:
POSTO ISSO, de ofício(§ 5º do art. 219 do Código de Processo Civil) e à vista do inciso I do § 5º do art. 206 do Código Civil em vigor, reconheço a prescrição da pretensão da Requerente e a pronuncio para todos os fins de direito, dando, em razão disso, o processo por extinto, com resolução do mérito(art. 269-IV do Código de Processo Civil).
Condeno a EMGEA ao pagamento das custas processuais, cuja parcela inicial já se encontra satisfeita, e em honorários advocatícios, os quais, com base no § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil, arbitro em R$ 400,00(quatrocentos reais), atualizados a partir do mês seguinte ao da publicação desta sentença, pelos índices de correção monetária do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal, sem prejuízo da aplicação das regras do art. 475-J do Código de Processo Civil, inclusive da multa nele prevista.
No momento próprio, dê-se ciência ao Ministério Público Federal e ao órgão local do Tribunal de Contas da União para verificar se a Caixa Econômica Federal tomou as medidas pertinentes para que o seu Empregado ou Dirigente, que deixou o seu crédito prescrever, providenciasse o ressarcimento do respectivo prejuízo, no caso de dolo ou culpa.
P.R.I.
Recife, 28 de maio de 2010
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara – PE
BLOG COM FINALIDADES CULTURAIS NA ÁREA DO DIREITO BRASILEIRO E DE OUTROS PAÍSES.
sexta-feira, 28 de maio de 2010
sexta-feira, 30 de abril de 2010
IMPOSTO DE RENDA: REGIME DE COMPETÊNCIA OU REGIME DE CAIXA?
O Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer natureza no Brasil é da competência exclusiva da União, que tem sua competência fixada na Constituição da República(art. 153-III). Esse imposto tem o fato gerador,a base de cálculo e aqueles que podem ser tidos por Contribuintes delineados no Código Tributário Nacional(art. 43), cuja Lei(nº 5.172, de 25.10.1966) que o instituiu tem status material de Lei Complementar, no que se amolda ao estabelecido na alínea "a" do inciso III do art. 146 da Constituição da República.
À luz do art. 43 desse Código, chega-se à conclusão que esse imposto submete-se ao denominado regime de competência, o qual leva em consideração o fenômeno econômico ou jurídico, ou ambos simultaneamente.
Realmente, extrai-se desse dispositivo que ocorre o fato gerador desse imposto quando se adquire a disponibilidade econômica ou jurídica de renda, decorrente do trabalho ou do capital, ou de proventos de qualquer natureza,exigindo que nesta hipótese haja acréscimo patrimonial.
Note-se que não se fala em disponibilidade financeira, fenômeno afeto ao denominado regime de caixa(o qual leva em consideração os aspecto financeiro das operações, a entrada/saída de dinheiro em caixa).
No regime de competência, haja ou não o recebimento da renda ou dos proventos de qualquer natureza, caso se concretize a disponibilidade econômica ou jurídica, ocorrerá o fato gerador desse imposto, não tendo, pois, nenhuma relevância o recebimento do respectivo valor.
O Legislador Ordinário brasileiro, no que diz respeito ao contribuinte pessoa física, não respeita essa regra do Código Tributário Nacional e impõe o regime de caixa, quando estabelece que incidirá esse imposto no recebimento do rendimento(v., por exemplo, o Parágrafo Único do art. 3º da Lei nº 9.250, de 26.12.1995).Com relação ao imposto de renda de pessoas coletivas(jurídicas), o Legislador Ordinário tem apenas facultado a submissão ao regime de caixa ou ao regime de competência.
A legislação relatibva à contabilidade comercial fixa o regime de competência.
Então, as Leis Ordinárias que fixam regime de caixa para o imposto de renda do Brasil são inconstitucionais, porque ferem, neste particular, a regra da alínea "a" do inciso III do art. 146 da Constituição da República, segundo a qual cabe ao Legislador, por Lei Complementar, traçar o desenho geral da obrigação tributária, e não por Lei Ordinária, de forma que quando este tipo de Lei trata da matéria em foco de forma diversa da fixada naquela, é inconstitucional.
À luz do art. 43 desse Código, chega-se à conclusão que esse imposto submete-se ao denominado regime de competência, o qual leva em consideração o fenômeno econômico ou jurídico, ou ambos simultaneamente.
Realmente, extrai-se desse dispositivo que ocorre o fato gerador desse imposto quando se adquire a disponibilidade econômica ou jurídica de renda, decorrente do trabalho ou do capital, ou de proventos de qualquer natureza,exigindo que nesta hipótese haja acréscimo patrimonial.
Note-se que não se fala em disponibilidade financeira, fenômeno afeto ao denominado regime de caixa(o qual leva em consideração os aspecto financeiro das operações, a entrada/saída de dinheiro em caixa).
No regime de competência, haja ou não o recebimento da renda ou dos proventos de qualquer natureza, caso se concretize a disponibilidade econômica ou jurídica, ocorrerá o fato gerador desse imposto, não tendo, pois, nenhuma relevância o recebimento do respectivo valor.
O Legislador Ordinário brasileiro, no que diz respeito ao contribuinte pessoa física, não respeita essa regra do Código Tributário Nacional e impõe o regime de caixa, quando estabelece que incidirá esse imposto no recebimento do rendimento(v., por exemplo, o Parágrafo Único do art. 3º da Lei nº 9.250, de 26.12.1995).Com relação ao imposto de renda de pessoas coletivas(jurídicas), o Legislador Ordinário tem apenas facultado a submissão ao regime de caixa ou ao regime de competência.
A legislação relatibva à contabilidade comercial fixa o regime de competência.
Então, as Leis Ordinárias que fixam regime de caixa para o imposto de renda do Brasil são inconstitucionais, porque ferem, neste particular, a regra da alínea "a" do inciso III do art. 146 da Constituição da República, segundo a qual cabe ao Legislador, por Lei Complementar, traçar o desenho geral da obrigação tributária, e não por Lei Ordinária, de forma que quando este tipo de Lei trata da matéria em foco de forma diversa da fixada naquela, é inconstitucional.
sexta-feira, 16 de abril de 2010
A Formação de Elementos do Núcleo da Obrigação Tributária: princípios da legalidade, determinação e segurança jurídica
Segue uma sentença, na qual se discute a formação do núcleo da obrigação tributária e a necessidade de que sejam observados os princípios da legalidade e da determinação, como supedâneos de outro princípio, o da segurança jurídica.
O direito material em questão envolve a problemática de delegação, por lei ordinária, de competência ao Poder Executivo para baixar atos infra-legais, visando a formação da base de cálculo da contribuição do antigo Seguro de Acidente do Trabalho-SAT e agora da possibilidade de esse Poder aumentar sua alíquota em até 100%.
Na sentença, chega-se à conclusão que isso não é possível por Lei Ordinária, mas apenas por parte do Legislador Constituinte originário, pois é matéria acobertada por cláusula pétrea.
Boa leitura.
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA
Juiz Federal: FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
Processo nº 0002388-74.2010.4.05.8300 Classe 126 – Mandado de Segurança
IMPETRANTE: R. G. LTDA. E OUTRO
ADV.: Alexandre de Araújo Albuquerque – OAB/PE 025108
IMPETRADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM RECIFE
Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2010
Sentença tipo A
Ementa:- DIREITO CONSTITUCIONAL-TRIBUTÁRIO. FORMAÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA. PRINCÍPIOs DA LEGALIDADE, DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA DETERMINAÇÃO. CLÁUSULA PÉTREA.
Elementos do núcleo da obrigação tributária não podem ser modificados por ato legislativo infra-legal, exceto quando houver expressa autorização na Constituição da República, por força dos princípios da legalidade, da determinação e da segurança jurídica.
Concessão da Segurança.
Vistos etc.
R. G. LTDA. E OUTRO, qualificados na Petição Inicial, impetraram, em 18/02/2010, o presente mandado de segurança preventivo, contra ato na iminência de ser praticado pelo Ilmº Sr. Delegado da Receita Federal do Brasil em Recife, o qual, no exercício de sua atividade vinculada, deverá impor à parte impetrante, o recolhimento das alíquotas do GIIL – RAT (antigo SAT), majorada pelo FAP, em violação aos princípios da legalidade, publicidade, transparência, contraditório, ampla defesa, motivação, segurança jurídica e separação dos poderes. Alegou, a parte impetrante, em síntese, que, de acordo com o art. 10 da Lei nº 10.666/2006, as alíquotas do GIIL – RAT(Grau de Incidência da Incapacidade Laborativa decorrente dos Riscos de Acidente de Trabalho), antigo SAT (Seguro de Acidente do Trabalho), poderiam ser reduzidas ou aumentadas, conforme disposto em regulamento, sendo esta discricionariedade conferida ao Poder Executivo, o ponto nodal da presente ação; que a possibilidade de o Poder Executivo alterar as alíquotas da mencionada contribuição violaria os princípios acima mencionados. Sustentou a constitucionalidade do “antigo SAT” ; que padeceria de ilegalidade e inconstitucionalidade a outorga ao Poder Executivo do direito de fixar, a seu critério, o valor das alíquotas mínima e máxima, sem que houvesse critério de grau de risco (leva, médio e grave). Invocou o princípio da legalidade genérica (CR/88, art. 5º -II) e o princípio da legalidade tributária (CR/88, art. 150-I) e aduziu que o art. 10 da Lei nº 10.666/03, criou o FAT, dispondo que seria um fator de redução em até 50%(cinqüenta por cento), ou de majoração em até 100%(cem por cento) da alíquota do GIIL-RAT, todavia, não teria fixado a alíquota, nem os critérios para alcançá-la, delegando ao regulamento essa tarefa; que, por força do princípio da legalidade tributária, caberia à lei definir as alíquotas ou estabelecer os critérios para ser alcançada, e não aos decretos e ou regulamentos; que a discussão travada no C. STF em relação ao SAT cingia-se à possibilidade de o Poder Executivo definir os conceitos de atividade preponderante e graus de risco leve, médio ou grave, sendo que as alíquotas de cada um já estariam definidas; que seria deferente o caso dos autos, porque teria sido delegado ao Poder Executivo a própria definição das alíquotas. Transcreveu r. decisão judicial favorável à sua tese e ressaltou que o Poder Executivo, “regulamentando” o instituto, teria criado uma fórmula que seria complexa para alcançar o FAP de cada empresa, formula esta que cujo resultado seria de difícil ou impossível constatação, onde o resultado nunca estaria certo e acabado, porque lhe faltaria um critério que atingisse a isonomia na cobrança; que o conjunto de cálculos afrontaria aos princípios da publicidade e da segurança jurídica; que dois dos critérios utilizados pelo Poder Executivo extrapolariam o que dispõe o art. 10 da Lei nº 10.666/2003, quais sejam, a trava de mortalidade (Resolução MPS/CNPS 1.308/2009) e de rotatividade (Resolução MPS 1.309/2009), porque não teriam sido contemplados na norma regulamentada. Teceu outros comentários e requereu, a parte impetrante: a) liminarmente, autorização para depositar em juízo a diferença entre o SAT com e sem aplicação do FAP(a parte incontroversa será recolhida normalmente), na forma e para os fins do art. 151-II do CTN; b) a notificação da autoridade impetrada e a ciência ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada; c) a oitiva do MPF; d) a concessão definitiva da segurança, declarando-se, de forma incidental, a inconstitucionalidade do art. 10 da Lei nº 10.666/03, no tocante à delegação ao regulamento da competência para dispor sobre os critérios de majoração e redução da alíquota do GIIL-RAT, e, em conseqüência, a declaração de inexistência de relação jurídica válida que obrigue a parte impetrante ao recolhimento do GIIL-RAT sob outros parâmetros senão os dispostos no art. 22-II da Lei nº 8.212/91 ou, sucessivamente, ainda que se considere constitucional o dispositivo, que seja declarada a inexistência de relação jurídica, porque o FAP, definido para a Impetrante, o teria sido à margem dos princípios da publicidade, transparência, motivação e segurança jurídica, assegurando, assim, o direito da Impetrante de não se submeter à regra impugnada, determinando-se à Autoridade Impetrada que se abstenha de exigir o GIIL-RAT majorado pelo FAP e punir a Impetrante pela não sujeição à regra. Requereu, ao final, a liberação dos depósitos a seu favor e a condenação do Impetrado ao ressarcimento das custas processuais. Deu valor à causa e juntou procuração e documentos (fls. 20/67). Comprovou o recolhimento das custas processuais (fl. 68).
À fl. 69, o MM Juiz Distribuidor determinou a livre distribuição do feito.
Às fls. 71/72, decisão interlocutória facultando à parte impetrante a realização do depósito referido na Petição Inicial, juntando aos autos os respectivos comprovantes.
À fl. 76, REFRESCOS GUARARAPES LTDA. ingressou com petição requerendo a juntada de guias de depósitos judiciais (fls. 77/87).
Notificada, a Autoridade Impetrada apresentou Informações às fls. 89/98. Alegou, em suma, que inexistiria qualquer direito líquido e certo da Impetrante a ser protegido mediante o presente mandado de segurança. Fez uma breve digressão acerca do fundamento constitucional e legal da contribuição SAT e aduziu que o C. STF, em regra, teria se posicionado no sentido de reconhecer a validade das normas que regulamentam a SAT; que a aplicação de alíquotas diferenciadas para as contribuições previdenciárias das empresas estaria amparada no princípio constitucional da equidade na forma de participação no custeio(CR/88, art. 194, parágrafo único) e no §9º do art. 195 da CR/88; que o princípio constitucional da equidade na forma de participação no custeio exigiria que o recolhimento fosse proporcional aos infortúnios ocorridos na empresa; que a metodologia adotada pelo FAP (Fator Acidentário de Prevenção) enquadrar-se-ia perfeitamente em mencionado princípio constitucional, porque a alíquota do SAT seria reduzida para aqueles empregadores que tivessem apresentado menores índices de acidentabilidade e majorada para aquelas empresas que apresentassem índices de acidentabilidade superiores à média de seu setor econômico; que a aplicação do FAP às alíquotas do SAT teria como fundamento legal o art. 10 da Lei nº 10.666/2003; que o fato de a lei deixar para o regulamento e para o Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) a complementação da metodologia de cálculo dos índices de freqüência, gravidade e custo, não implicaria ofensa ao princípio da legalidade genérica e ao da legalidade tributária; que, com base na delegação legislativa prevista no art. 10 da Lei nº 10.666/03, os Decretos nºs 6042/07 e 6.957/09, teriam regulamentado o FAP, dando nova redação ao art. 202-A do Decreto nº 3.048/99; que a flexibilização das alíquotas do SAT teria sido materializada mediante a aplicação da metodologia do FAP, aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS, consoante as Resoluções CNPS nºs 1308 e 1309, ambas de 2009; que a metodologia aprovada buscaria bonificar aqueles empregadores que tivessem feito um trabalho intenso nas melhorias ambientais em seus postos de trabalho e apresentado no último período menores índices de acidentes e, ao mesmo tempo, aumentar a cobrança daquelas empresas que tivessem apresentado índices de acidentes superiores à média de seu setor econômico; que, portanto, o FAP não seria ofensivo ao princípio da igualdade, porque teria tratado igualmente os desiguais; que a majoração da contribuição relativa ao SAT somente ocorreria se a empresa apresentar índice de acidentes superior à média do seu setor econômico, mas, se passar a adotar medidas de prevenção dos acidentes e doenças do trabalho, a aplicação do FAP poderia reduzir a alíquota do SAT em até 50% (cinqüenta por cento). Teceu outros comentários e requereu o indeferimento da liminar e a denegação da segurança.
À fl. 100, a União tomou ciência da decisão de fls. 71/72, requereu seu ingresso no feito e vista dos autos após qualquer decisão judicial.
Às fls. 102/108, o MPF apresentou Parecer, deixando de opinar sobre o mérito do presente feito, sob alegação de que não haveria interesse a justificar sua intervenção e pugnou pelo normal prosseguimento do feito.
Vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório.
Passo a decidir.
Fundamentação
1. Do Ponto Fulcral da Questão
As Impetrantes alegam justo receio de virem a ser obrigadas a pagar a contribuição do antigo Seguro de Acidente do Trabalho-SAT, hoje Riscos de Acidente do Trabalho-RAT, com majoração que poderá ser veiculada por meio de Decreto Presidencial, em face do art.10º da Lei nº 10.666, de 08.05.2003 , que autorizou essa majoração, em até 100%, por meio de regra regulamentar.
Como bem registram as Impetrantes, o Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, quando, no julgamento do RE 343.446-2/SC, Rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, DJ de 04.04.2003, analisou a constitucionalidade de dispositivos então vigentes da Lei nº 7.787, de 1999, e da Lei nº 8.212, de 1991, e concluiu que não eram inconstitucionais, porque definiam, satisfatoriamente, todos os elementos capazes de fazer nascer a obrigação tributária válida, deixando para o regulamento apenas delimitar o que seria “atividade preponderante” e “grau de risco leve, médio e grave”.
Mencionada C. Corte decidiu no mesmo sentido, conforme as Informações da Autoridade apontada como coatora, no julgamento do AI-AgR 439713/MG, rel. Min. Celso de Melo, 2ª Turma, DJ de 14.11.2003.
Nessa mesma esteira seguiu o E. Superior Tribunal de Justiça, em diversos julgados, dos quais destaco o que segue:
"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. SEGURO DE ACIDENTE DO TRABALHO - SAT. LEI Nº 8.212/91, ART. 22, II. DECRETO N.º 2.173/97. ALÍQUOTAS. FIXAÇÃO PELOS GRAUS DE RISCO DA ATIVIDADE PREPONDERANTE DESEMPENHADA EM CADA ESTABELECIMENTO DA EMPRESA, DESDE QUE INDIVIDUALIZADO POR CNPJ PRÓPRIO. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA PELA PRIMEIRA SEÇÃO. SÚMULA 7/STJ. 1. A Primeira Seção assentou que: A Lei nº 8.212/91, no art. 22, inciso II, com sua atual redação constante na Lei nº 9.732/98, autorizou a cobrança do contribuição do SAT, estabelecendo os elementos formadores da hipótese de incidência do tributo, quais sejam: (a) fato gerador — remuneração paga, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos; (b) a base de cálculo — o total dessas remunerações; (c) alíquota — percentuais progressivos (1%, 2% e 3%) em função do risco de acidentes do trabalho. Previstos por lei tais critérios, a definição, pelo Decreto n. 2.173/97 e Instrução Normativa n. 02/97, do grau de periculosidade das atividades desenvolvidas pelas empresas não extrapolou os limites insertos na referida legislação, porquanto tenha tão somente detalhado o seu conteúdo, sem, contudo, alterar qualquer daqueles elementos essenciais da hipótese de incidência. Não há, portanto, ofensa ao princípio da legalidade, posto no art. 97 do CTN, pela legislação que institui o SAT - Seguro de Acidente do Trabalho. (EREsp 297215 / PR, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 12.9.2005). 2. A Primeira Seção reconsolidou a jurisprudência da Corte, no sentido de que a alíquota da contribuição para o Seguro de Acidente do Trabalho - SAT, de que trata o art. 22, II, da Lei n.º 8.212/91, deve corresponder ao grau de risco da atividade desenvolvida em cada estabelecimento da empresa, individualizado por seu CNPJ. Possuindo esta um único CNPJ, a alíquota da referida exação deve corresponder à atividade preponderante por ela desempenhada (Precedentes: ERESP nº 502.671/PE, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 10.8.2005; EREsp n.º 604.660/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 1.7.2005 e EREsp n.º 478.100/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 28.2.2005). Incidência da Súmula 351/STJ. 3. A alíquota da contribuição para o seguro de acidentes do trabalho deve ser estabelecida em função da atividade preponderante da empresa, possuidora de um único CNPJ, considerada esta a que ocupa, em cada estabelecimento, o maior número de segurados empregados e trabalhadores avulsos, nos termos do Regulamento vigente à época da autuação (§ 1º, artigo 26, do Decreto nº 612/92). 4. Vale ressaltar que o reenquadramento do pessoal administrativo em grau de risco adequado e a estipulação da alíquota devida, assentados pela instância ordinária com fundamento na prova produzida nos autos, decorre de enquadramento tarifário, restando, assim, inviável o exame da matéria pelo E. STJ, a teor do disposto na Súmula 7, desta Corte, que assim determina:"A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial". 5. Agravo regimental não-provido".
Mas, agora, como também argumentam com pertinência as Impetrantes, o Legislador Ordinário foi mais longe ainda e autorizou o Poder Executivo a majorar a alíquota do tributo em até 100%, sem base em qualquer regra constitucional.
2. Da Questão no Sistema Tributário Brasileiro
Tenho que, data maxima venia do C. Supremo Tribunal Federal e do E. Superior Tribunal de Justiça, até mesmo para definir o alcance do que é “atividade preponderante” e “grau de risco leve, médio e grave”, não se poderia deixar a critério do Poder Executivo, por ser o dirigente máximo da União, titular do sujeito ativo da obrigação tributária, pelo que lhe falta isenção necessária para tomar qualquer decisão sobre elementos essenciais da base de cálculo dessa contribuição, sobretudo nestes tempos de ânsia do Estado Brasileiro por receitas.
Note-se que na quaestio ora sob análise, o Poder Executivo sentiu-se à vontade com o entendimento acima indicado do C.Supremo Tribunal Federal e do E. Superior Tribunal de Justiça, e então avançou, atropelando regras constitucionais do sistema tributário nacional, auto autorizando-se, via Medida Provisória nº 82, de 2002, a majorar a alíquota do tributo sob análise em até 100%, quando se sabe que o Legislador Constituinte deu essa autorização, observados limites e condições fixados em Lei, apenas para os tributos arrolados no § 1º do art. 153 da Constituição da República. E, tendo maioria no Congresso Nacional, extraiu deste a homologação da sua auto autorização, mediante transformação da referida Medida Provisória na indigitada Lei nº 10.666, de 08.05.2003.
A respeito de qualquer delegação ao Poder Executivo no campo tributário, já tive oportunidade de escrever: “...a lei formal deve delinear com certo rigor esse “poder normativo do Executivo”, não lhe dando abertura para instituição de tributo, porque, como vimos acima, o princípio da legalidade figura como garantidor mínimo de liberdades dos contribuintes, de forma que, para sua segurança jurídica, as eventuais indeterminações da lei devem ser esclarecidas pela doutrina e pelo Poder Judiciário, nunca pelo Poder Executivo, por lhe faltar a indispensável imparcialidade”.
3. Breve Histórico Legal
Eis um breve histórico legal do problema:
Atualmente, a Lei nº 8.212, de 24.07.1991, estabelece no inciso II do seu art. 22:
Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de: 6
II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos: (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 1998).
a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;
c) 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.
O § 3º desse dispositivo legal dá poderes ao Ministério do Trabalho para apuração do enquadramento de cada contribuinte:
§ 3º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá alterar, com base nas estatísticas de acidentes do trabalho, apuradas em inspeção, o enquadramento de empresas para efeito da contribuição a que se refere o inciso II deste artigo, a fim de estimular investimentos em prevenção de acidentes.
E, como já dissemos, a Lei nº 10.666, de 2003, no seu art. 10, foi mais longe ainda:
Art. 10. A alíquota de contribuição de um, dois ou três por cento, destinada ao financiamento do benefício de aposentadoria especial ou daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, poderá ser reduzida, em até cinqüenta por cento, ou aumentada, em até cem por cento, conforme dispuser o regulamento, em razão do desempenho da empresa em relação à respectiva atividade econômica, apurado em conformidade com os resultados obtidos a partir dos índices de freqüência, gravidade e custo, calculados segundo metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social.
Mencionada alteração legal gerou modificações do respectivo regulamento, ou seja, no art. 202-A e respectivos parágrafos do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 06.05.1999, que ficaram com a seguinte redação:
Art. 202-A. As alíquotas constantes nos incisos I a III do art. 202 serão reduzidas em até cinqüenta por cento ou aumentadas em até cem por cento, em razão do desempenho da empresa em relação à sua respectiva atividade, aferido pelo Fator Acidentário de Prevenção - FAP. (Incluído pelo Decreto nº 6.042, de 2007).
§ 1o O FAP consiste num multiplicador variável num intervalo contínuo de cinco décimos (0,5000) a dois inteiros (2,0000), aplicado com quatro casas decimais, considerado o critério de arredondamento na quarta casa decimal, a ser aplicado à respectiva alíquota. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 2o Para fins da redução ou majoração a que se refere o caput, proceder-se-á à discriminação do desempenho da empresa, dentro da respectiva atividade econômica, a partir da criação de um índice composto pelos índices de gravidade, de frequência e de custo que pondera os respectivos percentis com pesos de cinquenta por cento, de trinta cinco por cento e de quinze por cento, respectivamente. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 3º - (Revogado pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 4o Os índices de freqüência, gravidade e custo serão calculados segundo metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social, levando-se em conta: (Incluído pelo Decreto nº 6.042, de 2007).
I - para o índice de freqüência, os registros de acidentes e doenças do trabalho informados ao INSS por meio de Comunicação de Acidente do Trabalho - CAT e de benefícios acidentários estabelecidos por nexos técnicos pela perícia médica do INSS, ainda que sem CAT a eles vinculados; (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
II - para o índice de gravidade, todos os casos de auxílio-doença, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez e pensão por morte, todos de natureza acidentária, aos quais são atribuídos pesos diferentes em razão da gravidade da ocorrência, como segue: (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
a) pensão por morte: peso de cinquenta por cento; (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
b) aposentadoria por invalidez: peso de trinta por cento; e (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
c) auxílio-doença e auxílio-acidente: peso de dez por cento para cada um; e (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
III - para o índice de custo, os valores dos benefícios de natureza acidentária pagos ou devidos pela Previdência Social, apurados da seguinte forma: (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
a) nos casos de auxílio-doença, com base no tempo de afastamento do trabalhador, em meses e fração de mês; e (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
b) nos casos de morte ou de invalidez, parcial ou total, mediante projeção da expectativa de sobrevida do segurado, na data de início do benefício, a partir da tábua de mortalidade construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE para toda a população brasileira, considerando-se a média nacional única para ambos os sexos. (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 5o O Ministério da Previdência Social publicará anualmente, sempre no mesmo mês, no Diário Oficial da União, os róis dos percentis de frequência, gravidade e custo por Subclasse da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE e divulgará na rede mundial de computadores o FAP de cada empresa, com as respectivas ordens de freqüência, gravidade, custo e demais elementos que possibilitem a esta verificar o respectivo desempenho dentro da sua CNAE-Subclasse. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 7o Para o cálculo anual do FAP, serão utilizados os dados de janeiro a dezembro de cada ano, até completar o período de dois anos, a partir do qual os dados do ano inicial serão substituídos pelos novos dados anuais incorporados. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009).
§ 8o Para a empresa constituída após janeiro de 2007, o FAP será calculado a partir de 1o de janeiro do ano ano seguinte ao que completar dois anos de constituição. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 9o Excepcionalmente, no primeiro processamento do FAP serão utilizados os dados de abril de 2007 a dezembro de 2008. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 10. A metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social indicará a sistemática de cálculo e a forma de aplicação de índices e critérios acessórios à composição do índice composto do FAP. (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009).
E máquina burocrática continuou com a implementação do referido dispositivo legal: o Conselho Nacional de Previdência Social, com base nas novas regras do Regulamento, baixou a Resolução CNPS nº 1.308, de 27.05.2009, cujo anexo foi alterado pela Resolução nº 1.309, de 24.06.2009.
Note-se que todas essas alterações no direito positivo infra-constitucional vieram após os julgados acima referidos das duas maiores Cortes do País.
4. Os Atos Infra-Constitucionais x Princípios Positivados ou Não e a Cláusula Pétrea
Os princípios da determinação e da segurança jurídica orientam no sentido de que todos os elementos da denominada obrigação tributária principal observem o princípio da legalidade, ou seja, tenham o delineamento em Lei e não em atos infralegais, porque nesse sentido é a expressa regra do inciso I do art. 150 da Constituição da República, que, por sapiência do Legislador Constituinte, encontra encartada em uma Seção dessa Carta denominada “Das Limitações do Poder de Tributar”, título esse claramente inspirado no título de uma obra de um dos nossos maiores tributaristas, o saudoso ALIOMAR DE ANDRADE BALEEIRO, autor do livro “Limitações ao Poder de Tributar”.
É verdade que, como o direito faz parte das denominadas ciências humanas, haverá sempre um item de indeterminação na delimitação da obrigação tributária e, como exemplo, temos alguns itens da Lei Complementar nº 116, de 2003, nos quais são utilizadas expressões tais como “similar”, “do mesmo gênero”, etc. Mas, tratam-se de indeterminações aceitáveis, porque passíveis de enquadramento pela doutrina e pela jurisprudência.
No entanto, é altamente perigoso para os contribuintes que a Lei Ordinária delegue ao Poder Executivo e este a seus Órgãos a delimitação da parte mais importante da obrigação tributária, o modo pelo que se forma partes do núcleo da obrigação tributária, o valor tributável, e agora também a majoração da alíquota em até 100%(cem por cento).
Isso só pode ser admitido excepcionalmente e apenas quando expressamente autorizado pelo Legislador Constituinte originário, como, conforme já vimos, aconteceu com os tributos arrolados no § 1º do art. 153 da vigente Constituição da República.
E a Constituição da República, neste particular, não pode sequer ser alterada para majorar o rol desse seu dispositivo, porque se trata de matéria que envolve as garantias e direitos individuais, portanto, abrangida pela cláusula pétrea do inciso IV do § 4º do art. 60 dessa Carta e, como se sabe, o C.Supremo Tribunal Federal assim já decidiu, quando considerou inconstitucionais diversos dispositivos da Emenda Constitucional nº 3, de 1993, quando se tentou afastar a aplicação dos princípios da legalidade e da anterioridade do exercício no caso do extinto Imposto sobre Movimentação Financeira-IPMF.
Conclusão
POSTO ISSO, incidenter tantum, declaro a inconstitucionalidade do art. 10 da Lei nº 10.666, de 2003, na parte em que autoriza a majoração em até 100% da alíquota da contribuição ali referida por regra regulamentar, e todos os atos infra-legais dela decorrentes e acima referidos, julgo procedentes os pedidos desta ação mandamental, concedo a segurança, autorizando as Impetrantes a continuar recolhendo referida contribuição na alíquota e base de cálculo praticadas antes das alterações da legislação decorrentes do referido art. 10 da Lei nº 10.666, de 2003, e determinando à Autoridade apontada como coatora que se abstenha de autuar as Impetrantes por essa prática, sob as penas das Leis administrativas e criminais.
Sem verba honorária(art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009, e Súmula 512 do C.Supremo Tribunal Federal)
Após o trânsito em julgado, caso a União não tenha se utilizado dos valores depositados pelas Impetrantes, como lhe permite a legislação em vigor, que se libere tais valores, a favor das Impetrantes, via alvará deste juízo. Todavia, se a União já utilizou desses valores, que sejam restituídos às Impetrantes, por quem de direito, na forma da respectiva legislação, sob as penas das Leis administrativas e criminais.
De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição e determino que seja dada ciência à Autoridade do inteiro teor desta Sentença, bem como sejam efetuadas as demais intimações determinadas por Lei.
P. R. I.
Recife, 15 de abril de 2010.
FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
Juiz Federal da 2ª Vara – PE
O direito material em questão envolve a problemática de delegação, por lei ordinária, de competência ao Poder Executivo para baixar atos infra-legais, visando a formação da base de cálculo da contribuição do antigo Seguro de Acidente do Trabalho-SAT e agora da possibilidade de esse Poder aumentar sua alíquota em até 100%.
Na sentença, chega-se à conclusão que isso não é possível por Lei Ordinária, mas apenas por parte do Legislador Constituinte originário, pois é matéria acobertada por cláusula pétrea.
Boa leitura.
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA
Juiz Federal: FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
Processo nº 0002388-74.2010.4.05.8300 Classe 126 – Mandado de Segurança
IMPETRANTE: R. G. LTDA. E OUTRO
ADV.: Alexandre de Araújo Albuquerque – OAB/PE 025108
IMPETRADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM RECIFE
Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2010
Sentença tipo A
Ementa:- DIREITO CONSTITUCIONAL-TRIBUTÁRIO. FORMAÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA. PRINCÍPIOs DA LEGALIDADE, DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA DETERMINAÇÃO. CLÁUSULA PÉTREA.
Elementos do núcleo da obrigação tributária não podem ser modificados por ato legislativo infra-legal, exceto quando houver expressa autorização na Constituição da República, por força dos princípios da legalidade, da determinação e da segurança jurídica.
Concessão da Segurança.
Vistos etc.
R. G. LTDA. E OUTRO, qualificados na Petição Inicial, impetraram, em 18/02/2010, o presente mandado de segurança preventivo, contra ato na iminência de ser praticado pelo Ilmº Sr. Delegado da Receita Federal do Brasil em Recife, o qual, no exercício de sua atividade vinculada, deverá impor à parte impetrante, o recolhimento das alíquotas do GIIL – RAT (antigo SAT), majorada pelo FAP, em violação aos princípios da legalidade, publicidade, transparência, contraditório, ampla defesa, motivação, segurança jurídica e separação dos poderes. Alegou, a parte impetrante, em síntese, que, de acordo com o art. 10 da Lei nº 10.666/2006, as alíquotas do GIIL – RAT(Grau de Incidência da Incapacidade Laborativa decorrente dos Riscos de Acidente de Trabalho), antigo SAT (Seguro de Acidente do Trabalho), poderiam ser reduzidas ou aumentadas, conforme disposto em regulamento, sendo esta discricionariedade conferida ao Poder Executivo, o ponto nodal da presente ação; que a possibilidade de o Poder Executivo alterar as alíquotas da mencionada contribuição violaria os princípios acima mencionados. Sustentou a constitucionalidade do “antigo SAT” ; que padeceria de ilegalidade e inconstitucionalidade a outorga ao Poder Executivo do direito de fixar, a seu critério, o valor das alíquotas mínima e máxima, sem que houvesse critério de grau de risco (leva, médio e grave). Invocou o princípio da legalidade genérica (CR/88, art. 5º -II) e o princípio da legalidade tributária (CR/88, art. 150-I) e aduziu que o art. 10 da Lei nº 10.666/03, criou o FAT, dispondo que seria um fator de redução em até 50%(cinqüenta por cento), ou de majoração em até 100%(cem por cento) da alíquota do GIIL-RAT, todavia, não teria fixado a alíquota, nem os critérios para alcançá-la, delegando ao regulamento essa tarefa; que, por força do princípio da legalidade tributária, caberia à lei definir as alíquotas ou estabelecer os critérios para ser alcançada, e não aos decretos e ou regulamentos; que a discussão travada no C. STF em relação ao SAT cingia-se à possibilidade de o Poder Executivo definir os conceitos de atividade preponderante e graus de risco leve, médio ou grave, sendo que as alíquotas de cada um já estariam definidas; que seria deferente o caso dos autos, porque teria sido delegado ao Poder Executivo a própria definição das alíquotas. Transcreveu r. decisão judicial favorável à sua tese e ressaltou que o Poder Executivo, “regulamentando” o instituto, teria criado uma fórmula que seria complexa para alcançar o FAP de cada empresa, formula esta que cujo resultado seria de difícil ou impossível constatação, onde o resultado nunca estaria certo e acabado, porque lhe faltaria um critério que atingisse a isonomia na cobrança; que o conjunto de cálculos afrontaria aos princípios da publicidade e da segurança jurídica; que dois dos critérios utilizados pelo Poder Executivo extrapolariam o que dispõe o art. 10 da Lei nº 10.666/2003, quais sejam, a trava de mortalidade (Resolução MPS/CNPS 1.308/2009) e de rotatividade (Resolução MPS 1.309/2009), porque não teriam sido contemplados na norma regulamentada. Teceu outros comentários e requereu, a parte impetrante: a) liminarmente, autorização para depositar em juízo a diferença entre o SAT com e sem aplicação do FAP(a parte incontroversa será recolhida normalmente), na forma e para os fins do art. 151-II do CTN; b) a notificação da autoridade impetrada e a ciência ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada; c) a oitiva do MPF; d) a concessão definitiva da segurança, declarando-se, de forma incidental, a inconstitucionalidade do art. 10 da Lei nº 10.666/03, no tocante à delegação ao regulamento da competência para dispor sobre os critérios de majoração e redução da alíquota do GIIL-RAT, e, em conseqüência, a declaração de inexistência de relação jurídica válida que obrigue a parte impetrante ao recolhimento do GIIL-RAT sob outros parâmetros senão os dispostos no art. 22-II da Lei nº 8.212/91 ou, sucessivamente, ainda que se considere constitucional o dispositivo, que seja declarada a inexistência de relação jurídica, porque o FAP, definido para a Impetrante, o teria sido à margem dos princípios da publicidade, transparência, motivação e segurança jurídica, assegurando, assim, o direito da Impetrante de não se submeter à regra impugnada, determinando-se à Autoridade Impetrada que se abstenha de exigir o GIIL-RAT majorado pelo FAP e punir a Impetrante pela não sujeição à regra. Requereu, ao final, a liberação dos depósitos a seu favor e a condenação do Impetrado ao ressarcimento das custas processuais. Deu valor à causa e juntou procuração e documentos (fls. 20/67). Comprovou o recolhimento das custas processuais (fl. 68).
À fl. 69, o MM Juiz Distribuidor determinou a livre distribuição do feito.
Às fls. 71/72, decisão interlocutória facultando à parte impetrante a realização do depósito referido na Petição Inicial, juntando aos autos os respectivos comprovantes.
À fl. 76, REFRESCOS GUARARAPES LTDA. ingressou com petição requerendo a juntada de guias de depósitos judiciais (fls. 77/87).
Notificada, a Autoridade Impetrada apresentou Informações às fls. 89/98. Alegou, em suma, que inexistiria qualquer direito líquido e certo da Impetrante a ser protegido mediante o presente mandado de segurança. Fez uma breve digressão acerca do fundamento constitucional e legal da contribuição SAT e aduziu que o C. STF, em regra, teria se posicionado no sentido de reconhecer a validade das normas que regulamentam a SAT; que a aplicação de alíquotas diferenciadas para as contribuições previdenciárias das empresas estaria amparada no princípio constitucional da equidade na forma de participação no custeio(CR/88, art. 194, parágrafo único) e no §9º do art. 195 da CR/88; que o princípio constitucional da equidade na forma de participação no custeio exigiria que o recolhimento fosse proporcional aos infortúnios ocorridos na empresa; que a metodologia adotada pelo FAP (Fator Acidentário de Prevenção) enquadrar-se-ia perfeitamente em mencionado princípio constitucional, porque a alíquota do SAT seria reduzida para aqueles empregadores que tivessem apresentado menores índices de acidentabilidade e majorada para aquelas empresas que apresentassem índices de acidentabilidade superiores à média de seu setor econômico; que a aplicação do FAP às alíquotas do SAT teria como fundamento legal o art. 10 da Lei nº 10.666/2003; que o fato de a lei deixar para o regulamento e para o Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) a complementação da metodologia de cálculo dos índices de freqüência, gravidade e custo, não implicaria ofensa ao princípio da legalidade genérica e ao da legalidade tributária; que, com base na delegação legislativa prevista no art. 10 da Lei nº 10.666/03, os Decretos nºs 6042/07 e 6.957/09, teriam regulamentado o FAP, dando nova redação ao art. 202-A do Decreto nº 3.048/99; que a flexibilização das alíquotas do SAT teria sido materializada mediante a aplicação da metodologia do FAP, aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS, consoante as Resoluções CNPS nºs 1308 e 1309, ambas de 2009; que a metodologia aprovada buscaria bonificar aqueles empregadores que tivessem feito um trabalho intenso nas melhorias ambientais em seus postos de trabalho e apresentado no último período menores índices de acidentes e, ao mesmo tempo, aumentar a cobrança daquelas empresas que tivessem apresentado índices de acidentes superiores à média de seu setor econômico; que, portanto, o FAP não seria ofensivo ao princípio da igualdade, porque teria tratado igualmente os desiguais; que a majoração da contribuição relativa ao SAT somente ocorreria se a empresa apresentar índice de acidentes superior à média do seu setor econômico, mas, se passar a adotar medidas de prevenção dos acidentes e doenças do trabalho, a aplicação do FAP poderia reduzir a alíquota do SAT em até 50% (cinqüenta por cento). Teceu outros comentários e requereu o indeferimento da liminar e a denegação da segurança.
À fl. 100, a União tomou ciência da decisão de fls. 71/72, requereu seu ingresso no feito e vista dos autos após qualquer decisão judicial.
Às fls. 102/108, o MPF apresentou Parecer, deixando de opinar sobre o mérito do presente feito, sob alegação de que não haveria interesse a justificar sua intervenção e pugnou pelo normal prosseguimento do feito.
Vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório.
Passo a decidir.
Fundamentação
1. Do Ponto Fulcral da Questão
As Impetrantes alegam justo receio de virem a ser obrigadas a pagar a contribuição do antigo Seguro de Acidente do Trabalho-SAT, hoje Riscos de Acidente do Trabalho-RAT, com majoração que poderá ser veiculada por meio de Decreto Presidencial, em face do art.10º da Lei nº 10.666, de 08.05.2003 , que autorizou essa majoração, em até 100%, por meio de regra regulamentar.
Como bem registram as Impetrantes, o Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, quando, no julgamento do RE 343.446-2/SC, Rel. Min. Carlos Velloso, Plenário, DJ de 04.04.2003, analisou a constitucionalidade de dispositivos então vigentes da Lei nº 7.787, de 1999, e da Lei nº 8.212, de 1991, e concluiu que não eram inconstitucionais, porque definiam, satisfatoriamente, todos os elementos capazes de fazer nascer a obrigação tributária válida, deixando para o regulamento apenas delimitar o que seria “atividade preponderante” e “grau de risco leve, médio e grave”.
Mencionada C. Corte decidiu no mesmo sentido, conforme as Informações da Autoridade apontada como coatora, no julgamento do AI-AgR 439713/MG, rel. Min. Celso de Melo, 2ª Turma, DJ de 14.11.2003.
Nessa mesma esteira seguiu o E. Superior Tribunal de Justiça, em diversos julgados, dos quais destaco o que segue:
"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. SEGURO DE ACIDENTE DO TRABALHO - SAT. LEI Nº 8.212/91, ART. 22, II. DECRETO N.º 2.173/97. ALÍQUOTAS. FIXAÇÃO PELOS GRAUS DE RISCO DA ATIVIDADE PREPONDERANTE DESEMPENHADA EM CADA ESTABELECIMENTO DA EMPRESA, DESDE QUE INDIVIDUALIZADO POR CNPJ PRÓPRIO. JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA PELA PRIMEIRA SEÇÃO. SÚMULA 7/STJ. 1. A Primeira Seção assentou que: A Lei nº 8.212/91, no art. 22, inciso II, com sua atual redação constante na Lei nº 9.732/98, autorizou a cobrança do contribuição do SAT, estabelecendo os elementos formadores da hipótese de incidência do tributo, quais sejam: (a) fato gerador — remuneração paga, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos; (b) a base de cálculo — o total dessas remunerações; (c) alíquota — percentuais progressivos (1%, 2% e 3%) em função do risco de acidentes do trabalho. Previstos por lei tais critérios, a definição, pelo Decreto n. 2.173/97 e Instrução Normativa n. 02/97, do grau de periculosidade das atividades desenvolvidas pelas empresas não extrapolou os limites insertos na referida legislação, porquanto tenha tão somente detalhado o seu conteúdo, sem, contudo, alterar qualquer daqueles elementos essenciais da hipótese de incidência. Não há, portanto, ofensa ao princípio da legalidade, posto no art. 97 do CTN, pela legislação que institui o SAT - Seguro de Acidente do Trabalho. (EREsp 297215 / PR, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 12.9.2005). 2. A Primeira Seção reconsolidou a jurisprudência da Corte, no sentido de que a alíquota da contribuição para o Seguro de Acidente do Trabalho - SAT, de que trata o art. 22, II, da Lei n.º 8.212/91, deve corresponder ao grau de risco da atividade desenvolvida em cada estabelecimento da empresa, individualizado por seu CNPJ. Possuindo esta um único CNPJ, a alíquota da referida exação deve corresponder à atividade preponderante por ela desempenhada (Precedentes: ERESP nº 502.671/PE, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 10.8.2005; EREsp n.º 604.660/DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 1.7.2005 e EREsp n.º 478.100/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 28.2.2005). Incidência da Súmula 351/STJ. 3. A alíquota da contribuição para o seguro de acidentes do trabalho deve ser estabelecida em função da atividade preponderante da empresa, possuidora de um único CNPJ, considerada esta a que ocupa, em cada estabelecimento, o maior número de segurados empregados e trabalhadores avulsos, nos termos do Regulamento vigente à época da autuação (§ 1º, artigo 26, do Decreto nº 612/92). 4. Vale ressaltar que o reenquadramento do pessoal administrativo em grau de risco adequado e a estipulação da alíquota devida, assentados pela instância ordinária com fundamento na prova produzida nos autos, decorre de enquadramento tarifário, restando, assim, inviável o exame da matéria pelo E. STJ, a teor do disposto na Súmula 7, desta Corte, que assim determina:"A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial". 5. Agravo regimental não-provido".
Mas, agora, como também argumentam com pertinência as Impetrantes, o Legislador Ordinário foi mais longe ainda e autorizou o Poder Executivo a majorar a alíquota do tributo em até 100%, sem base em qualquer regra constitucional.
2. Da Questão no Sistema Tributário Brasileiro
Tenho que, data maxima venia do C. Supremo Tribunal Federal e do E. Superior Tribunal de Justiça, até mesmo para definir o alcance do que é “atividade preponderante” e “grau de risco leve, médio e grave”, não se poderia deixar a critério do Poder Executivo, por ser o dirigente máximo da União, titular do sujeito ativo da obrigação tributária, pelo que lhe falta isenção necessária para tomar qualquer decisão sobre elementos essenciais da base de cálculo dessa contribuição, sobretudo nestes tempos de ânsia do Estado Brasileiro por receitas.
Note-se que na quaestio ora sob análise, o Poder Executivo sentiu-se à vontade com o entendimento acima indicado do C.Supremo Tribunal Federal e do E. Superior Tribunal de Justiça, e então avançou, atropelando regras constitucionais do sistema tributário nacional, auto autorizando-se, via Medida Provisória nº 82, de 2002, a majorar a alíquota do tributo sob análise em até 100%, quando se sabe que o Legislador Constituinte deu essa autorização, observados limites e condições fixados em Lei, apenas para os tributos arrolados no § 1º do art. 153 da Constituição da República. E, tendo maioria no Congresso Nacional, extraiu deste a homologação da sua auto autorização, mediante transformação da referida Medida Provisória na indigitada Lei nº 10.666, de 08.05.2003.
A respeito de qualquer delegação ao Poder Executivo no campo tributário, já tive oportunidade de escrever: “...a lei formal deve delinear com certo rigor esse “poder normativo do Executivo”, não lhe dando abertura para instituição de tributo, porque, como vimos acima, o princípio da legalidade figura como garantidor mínimo de liberdades dos contribuintes, de forma que, para sua segurança jurídica, as eventuais indeterminações da lei devem ser esclarecidas pela doutrina e pelo Poder Judiciário, nunca pelo Poder Executivo, por lhe faltar a indispensável imparcialidade”.
3. Breve Histórico Legal
Eis um breve histórico legal do problema:
Atualmente, a Lei nº 8.212, de 24.07.1991, estabelece no inciso II do seu art. 22:
Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de: 6
II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos: (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 1998).
a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% (dois por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;
c) 3% (três por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.
O § 3º desse dispositivo legal dá poderes ao Ministério do Trabalho para apuração do enquadramento de cada contribuinte:
§ 3º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá alterar, com base nas estatísticas de acidentes do trabalho, apuradas em inspeção, o enquadramento de empresas para efeito da contribuição a que se refere o inciso II deste artigo, a fim de estimular investimentos em prevenção de acidentes.
E, como já dissemos, a Lei nº 10.666, de 2003, no seu art. 10, foi mais longe ainda:
Art. 10. A alíquota de contribuição de um, dois ou três por cento, destinada ao financiamento do benefício de aposentadoria especial ou daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, poderá ser reduzida, em até cinqüenta por cento, ou aumentada, em até cem por cento, conforme dispuser o regulamento, em razão do desempenho da empresa em relação à respectiva atividade econômica, apurado em conformidade com os resultados obtidos a partir dos índices de freqüência, gravidade e custo, calculados segundo metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social.
Mencionada alteração legal gerou modificações do respectivo regulamento, ou seja, no art. 202-A e respectivos parágrafos do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 06.05.1999, que ficaram com a seguinte redação:
Art. 202-A. As alíquotas constantes nos incisos I a III do art. 202 serão reduzidas em até cinqüenta por cento ou aumentadas em até cem por cento, em razão do desempenho da empresa em relação à sua respectiva atividade, aferido pelo Fator Acidentário de Prevenção - FAP. (Incluído pelo Decreto nº 6.042, de 2007).
§ 1o O FAP consiste num multiplicador variável num intervalo contínuo de cinco décimos (0,5000) a dois inteiros (2,0000), aplicado com quatro casas decimais, considerado o critério de arredondamento na quarta casa decimal, a ser aplicado à respectiva alíquota. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 2o Para fins da redução ou majoração a que se refere o caput, proceder-se-á à discriminação do desempenho da empresa, dentro da respectiva atividade econômica, a partir da criação de um índice composto pelos índices de gravidade, de frequência e de custo que pondera os respectivos percentis com pesos de cinquenta por cento, de trinta cinco por cento e de quinze por cento, respectivamente. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 3º - (Revogado pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 4o Os índices de freqüência, gravidade e custo serão calculados segundo metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social, levando-se em conta: (Incluído pelo Decreto nº 6.042, de 2007).
I - para o índice de freqüência, os registros de acidentes e doenças do trabalho informados ao INSS por meio de Comunicação de Acidente do Trabalho - CAT e de benefícios acidentários estabelecidos por nexos técnicos pela perícia médica do INSS, ainda que sem CAT a eles vinculados; (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
II - para o índice de gravidade, todos os casos de auxílio-doença, auxílio-acidente, aposentadoria por invalidez e pensão por morte, todos de natureza acidentária, aos quais são atribuídos pesos diferentes em razão da gravidade da ocorrência, como segue: (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
a) pensão por morte: peso de cinquenta por cento; (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
b) aposentadoria por invalidez: peso de trinta por cento; e (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
c) auxílio-doença e auxílio-acidente: peso de dez por cento para cada um; e (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
III - para o índice de custo, os valores dos benefícios de natureza acidentária pagos ou devidos pela Previdência Social, apurados da seguinte forma: (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
a) nos casos de auxílio-doença, com base no tempo de afastamento do trabalhador, em meses e fração de mês; e (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
b) nos casos de morte ou de invalidez, parcial ou total, mediante projeção da expectativa de sobrevida do segurado, na data de início do benefício, a partir da tábua de mortalidade construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE para toda a população brasileira, considerando-se a média nacional única para ambos os sexos. (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 5o O Ministério da Previdência Social publicará anualmente, sempre no mesmo mês, no Diário Oficial da União, os róis dos percentis de frequência, gravidade e custo por Subclasse da Classificação Nacional de Atividades Econômicas - CNAE e divulgará na rede mundial de computadores o FAP de cada empresa, com as respectivas ordens de freqüência, gravidade, custo e demais elementos que possibilitem a esta verificar o respectivo desempenho dentro da sua CNAE-Subclasse. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 7o Para o cálculo anual do FAP, serão utilizados os dados de janeiro a dezembro de cada ano, até completar o período de dois anos, a partir do qual os dados do ano inicial serão substituídos pelos novos dados anuais incorporados. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009).
§ 8o Para a empresa constituída após janeiro de 2007, o FAP será calculado a partir de 1o de janeiro do ano ano seguinte ao que completar dois anos de constituição. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 9o Excepcionalmente, no primeiro processamento do FAP serão utilizados os dados de abril de 2007 a dezembro de 2008. (Redação dada pelo Decreto nº 6.957, de 2009)
§ 10. A metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social indicará a sistemática de cálculo e a forma de aplicação de índices e critérios acessórios à composição do índice composto do FAP. (Incluído pelo Decreto nº 6.957, de 2009).
E máquina burocrática continuou com a implementação do referido dispositivo legal: o Conselho Nacional de Previdência Social, com base nas novas regras do Regulamento, baixou a Resolução CNPS nº 1.308, de 27.05.2009, cujo anexo foi alterado pela Resolução nº 1.309, de 24.06.2009.
Note-se que todas essas alterações no direito positivo infra-constitucional vieram após os julgados acima referidos das duas maiores Cortes do País.
4. Os Atos Infra-Constitucionais x Princípios Positivados ou Não e a Cláusula Pétrea
Os princípios da determinação e da segurança jurídica orientam no sentido de que todos os elementos da denominada obrigação tributária principal observem o princípio da legalidade, ou seja, tenham o delineamento em Lei e não em atos infralegais, porque nesse sentido é a expressa regra do inciso I do art. 150 da Constituição da República, que, por sapiência do Legislador Constituinte, encontra encartada em uma Seção dessa Carta denominada “Das Limitações do Poder de Tributar”, título esse claramente inspirado no título de uma obra de um dos nossos maiores tributaristas, o saudoso ALIOMAR DE ANDRADE BALEEIRO, autor do livro “Limitações ao Poder de Tributar”.
É verdade que, como o direito faz parte das denominadas ciências humanas, haverá sempre um item de indeterminação na delimitação da obrigação tributária e, como exemplo, temos alguns itens da Lei Complementar nº 116, de 2003, nos quais são utilizadas expressões tais como “similar”, “do mesmo gênero”, etc. Mas, tratam-se de indeterminações aceitáveis, porque passíveis de enquadramento pela doutrina e pela jurisprudência.
No entanto, é altamente perigoso para os contribuintes que a Lei Ordinária delegue ao Poder Executivo e este a seus Órgãos a delimitação da parte mais importante da obrigação tributária, o modo pelo que se forma partes do núcleo da obrigação tributária, o valor tributável, e agora também a majoração da alíquota em até 100%(cem por cento).
Isso só pode ser admitido excepcionalmente e apenas quando expressamente autorizado pelo Legislador Constituinte originário, como, conforme já vimos, aconteceu com os tributos arrolados no § 1º do art. 153 da vigente Constituição da República.
E a Constituição da República, neste particular, não pode sequer ser alterada para majorar o rol desse seu dispositivo, porque se trata de matéria que envolve as garantias e direitos individuais, portanto, abrangida pela cláusula pétrea do inciso IV do § 4º do art. 60 dessa Carta e, como se sabe, o C.Supremo Tribunal Federal assim já decidiu, quando considerou inconstitucionais diversos dispositivos da Emenda Constitucional nº 3, de 1993, quando se tentou afastar a aplicação dos princípios da legalidade e da anterioridade do exercício no caso do extinto Imposto sobre Movimentação Financeira-IPMF.
Conclusão
POSTO ISSO, incidenter tantum, declaro a inconstitucionalidade do art. 10 da Lei nº 10.666, de 2003, na parte em que autoriza a majoração em até 100% da alíquota da contribuição ali referida por regra regulamentar, e todos os atos infra-legais dela decorrentes e acima referidos, julgo procedentes os pedidos desta ação mandamental, concedo a segurança, autorizando as Impetrantes a continuar recolhendo referida contribuição na alíquota e base de cálculo praticadas antes das alterações da legislação decorrentes do referido art. 10 da Lei nº 10.666, de 2003, e determinando à Autoridade apontada como coatora que se abstenha de autuar as Impetrantes por essa prática, sob as penas das Leis administrativas e criminais.
Sem verba honorária(art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009, e Súmula 512 do C.Supremo Tribunal Federal)
Após o trânsito em julgado, caso a União não tenha se utilizado dos valores depositados pelas Impetrantes, como lhe permite a legislação em vigor, que se libere tais valores, a favor das Impetrantes, via alvará deste juízo. Todavia, se a União já utilizou desses valores, que sejam restituídos às Impetrantes, por quem de direito, na forma da respectiva legislação, sob as penas das Leis administrativas e criminais.
De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição e determino que seja dada ciência à Autoridade do inteiro teor desta Sentença, bem como sejam efetuadas as demais intimações determinadas por Lei.
P. R. I.
Recife, 15 de abril de 2010.
FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
Juiz Federal da 2ª Vara – PE
quarta-feira, 14 de abril de 2010
Síntese de Dois Princípios de Direito Financeiro
Por Francisco Alves dos Santos Jr.
Breves Notas Introdutórias
Originariamente, principalmente no período clássico, os princípios de direito financeir tinham a finalidade de controle financeiro do Executivo pelo poder econômico privado, por meio do Poder Legislativo. Atualmente, não se afasta de todo essa finalidade, mas a tendência mais forte consiste no aprimoramento social e da gestão das contas públicas.
Os princípios de direito financeiro encontram-se incorporados no ordenamento jurídico, desde a Constituição da República, passando por Leis, Decretos e etc, incorporação essa, quanto aos dois primeiros diplomas, realizada pelo Poder Legislativo, agora como representante do meio social e não mais apenas do poder econômico, pelo menos teoricamente.
Há princípios que não estão positivados, mas são tão ínsitos a esse ramo do direito, que são naturalmente observados.
Eis uma pequena síntese de dois princípios, que, pensando numa moeda, correspndem às suas duas faces.
Princípio da Exclusividade
Veta a discussão de assuntos alheios ao orçamento na Lei Orçamentária.
Impede a existência das caudas orçamentárias ou dos "rabilongos", assim chamados pelo saudoso-genial baiano Rui Barbosa, que foram expressamente vedados na Reforma Constitucional de 1926. Caudas ou "rabilongos", porque vinham inseridos no final da Lei do orçamento anual, tais como nomeação de parentes, de amigos ou de simples afilhados políticos, modificações das leis civis, para favorecimento de determinadas pessoas, e etc.
Esse princípio, incorporado no ordenamento jurídico pela noticiada reforma constitucional de 1926, encontra-se agasalhado, atualmente, no parágrafo 8º do artigo 165 da vigente Constituição, com poucas exceções, com a seguinte redação: “Art. 165 – (...). § 8º – A lei orçamentária anual não conterá dispositivo estranho à previsão da receita e à fixação da despesa, não se incluindo na proibição a autorização para abertura de créditos suplementares e contratação de operações de crédito, ainda que por antecipação de receita, nos termos da lei.”
Assim, não se pode colocar, nas Leis orçamentárias, como se fazia antes de 1926, quaisquer assuntos que sejam diversos de receitas, despesas,operações de crédito, créditos públicos, ou antecipação de receitas.
Princípio da Universalidade
Aqui está a outra face da moeda. Todas as receitas e despesas devem ser incluídas na Lei do Orçamento (art. 2º da Lei nº 4.320/64 e § 5º do art. 165 da Constituição), devendo constar no valor bruto, sem dedução ou compensação (art. 6º da Lei nº 4.320/64).
Incluem-se até as receitas não previstas, como as receitas de impostos instituídos após a aprovação da Lei Orçamentária (final do art. 57 da Lei nº 4.320/64).
Visível sua finalidade de consolidação ou totalização das contas públicas para conhecimento dos reflexos da atividade financeira estatal na economia, volume da pressão fiscal, participação do Estado na vida nacional e etc.(art. 111 da Lei nº 4.320/64).
Outras influências desse princípio no Brasil: Secretaria do Tesouro Nacional; Conta Única do Tesouro com Administração do Respectivo Caixa Centralizado (quanto a essa centralização, v. regulamentação na Medida Provisória nº 2.170, de 23.08.2001, ato legal que continua válido, por força do artigo 2º da Emenda Constitucional nº 32, de 11.09.2001).
Observação: No nosso livro, "Finanças Públicas, Orçamento Público e Direito Financeiro", 1ª edição de 2008, publicado pela Editora Livro Rápido, à venda na Livraria Imperatriz, na cidade do Recife-PE, ou no site www.livrorapido.com.br, consta um capítulo inteiro sobre todos os princípios de direito financeiro.
Breves Notas Introdutórias
Originariamente, principalmente no período clássico, os princípios de direito financeir tinham a finalidade de controle financeiro do Executivo pelo poder econômico privado, por meio do Poder Legislativo. Atualmente, não se afasta de todo essa finalidade, mas a tendência mais forte consiste no aprimoramento social e da gestão das contas públicas.
Os princípios de direito financeiro encontram-se incorporados no ordenamento jurídico, desde a Constituição da República, passando por Leis, Decretos e etc, incorporação essa, quanto aos dois primeiros diplomas, realizada pelo Poder Legislativo, agora como representante do meio social e não mais apenas do poder econômico, pelo menos teoricamente.
Há princípios que não estão positivados, mas são tão ínsitos a esse ramo do direito, que são naturalmente observados.
Eis uma pequena síntese de dois princípios, que, pensando numa moeda, correspndem às suas duas faces.
Princípio da Exclusividade
Veta a discussão de assuntos alheios ao orçamento na Lei Orçamentária.
Impede a existência das caudas orçamentárias ou dos "rabilongos", assim chamados pelo saudoso-genial baiano Rui Barbosa, que foram expressamente vedados na Reforma Constitucional de 1926. Caudas ou "rabilongos", porque vinham inseridos no final da Lei do orçamento anual, tais como nomeação de parentes, de amigos ou de simples afilhados políticos, modificações das leis civis, para favorecimento de determinadas pessoas, e etc.
Esse princípio, incorporado no ordenamento jurídico pela noticiada reforma constitucional de 1926, encontra-se agasalhado, atualmente, no parágrafo 8º do artigo 165 da vigente Constituição, com poucas exceções, com a seguinte redação: “Art. 165 – (...). § 8º – A lei orçamentária anual não conterá dispositivo estranho à previsão da receita e à fixação da despesa, não se incluindo na proibição a autorização para abertura de créditos suplementares e contratação de operações de crédito, ainda que por antecipação de receita, nos termos da lei.”
Assim, não se pode colocar, nas Leis orçamentárias, como se fazia antes de 1926, quaisquer assuntos que sejam diversos de receitas, despesas,operações de crédito, créditos públicos, ou antecipação de receitas.
Princípio da Universalidade
Aqui está a outra face da moeda. Todas as receitas e despesas devem ser incluídas na Lei do Orçamento (art. 2º da Lei nº 4.320/64 e § 5º do art. 165 da Constituição), devendo constar no valor bruto, sem dedução ou compensação (art. 6º da Lei nº 4.320/64).
Incluem-se até as receitas não previstas, como as receitas de impostos instituídos após a aprovação da Lei Orçamentária (final do art. 57 da Lei nº 4.320/64).
Visível sua finalidade de consolidação ou totalização das contas públicas para conhecimento dos reflexos da atividade financeira estatal na economia, volume da pressão fiscal, participação do Estado na vida nacional e etc.(art. 111 da Lei nº 4.320/64).
Outras influências desse princípio no Brasil: Secretaria do Tesouro Nacional; Conta Única do Tesouro com Administração do Respectivo Caixa Centralizado (quanto a essa centralização, v. regulamentação na Medida Provisória nº 2.170, de 23.08.2001, ato legal que continua válido, por força do artigo 2º da Emenda Constitucional nº 32, de 11.09.2001).
Observação: No nosso livro, "Finanças Públicas, Orçamento Público e Direito Financeiro", 1ª edição de 2008, publicado pela Editora Livro Rápido, à venda na Livraria Imperatriz, na cidade do Recife-PE, ou no site www.livrorapido.com.br, consta um capítulo inteiro sobre todos os princípios de direito financeiro.
sábado, 3 de abril de 2010
ENTREVISTA PARA O JORNAL PORANDUBA DE MOSSORÓ-RN
O Professor e Jornalista Francisco Rubens Coelho Figueiredo, nascido na cidade de Milagres-CE, foi professor, por longos anos, no Sindicato dos Bancários de São Paulo, depois mudou-se para Mossoró-RN, onde se aposentou como Vogal(Juiz Classista)da Justiça do Trabalho. Encontra-se radicado nessa cidade potiguar desde a década de oitenta do século passado(século XX) e ali fundou o jornal PORANDUBA, palavra tupi, que significa contos, notícias. Trata-se de ótimo jornal noticioso e cultural, do qual sou assinante e colaborador. Mencionado jornalista entrevistou-me e publicou a entrevista no PORANDUBA de março de 2010. Eis trechos da entrevista:
Concorda com o sistema de cota para o curso universitário?
Sim. Como juiz federal, já prolatei pelo menos duas decisões, garantido o bônus de 10% na nota, para vestibulandos originários de escolas públicas municipais ou estaduais. Essa é a cota da UFPE. É econômico-financeira, ignorando raça, cor, sexo, etc. Parece-me muito boa.
No entanto, também concordo com as cotas para negros e índios, porque têm finalidades de compensação histórico-social, isto é, essas cotas permitem que as pessoas afro-descendentes e indígenas sejam compensadas pelos massacres que sofreram no passado recente da nossa história, no campo econômico e educacional.
Acho também muito positivo o sistema de bolsa, via PROUNI, privilegiando alunos de escolas públicas, pelo mérito(as melhores notas no ENEM ganham as bolsas mais completas).
A propósito, você concorda com as críticas feita a propalada morosidade da justiça brasileira?
Sim. E acho que não vai terminar tão cedo. Tem que se mudar a mentalidade dos Magistrados. Principalmente dos Desembargadores dos Tribunais, que são muito apegados à forma, aos procedimentos. Pesquisas recentes constataram que o processo não demora muito com o juiz de primeiro grau. A demora está nos Tribunais. Por exemplo. Na Justiça Federal da quinta região, que atende a quase todos os Estados do Nordeste, onde trabalho, houve um aumento muito grande de Varas(juízos de primeiro grau). Mas o Tribunal Regional Federal da 5ª Região continua com a mesma composição de quando foi criado, em 1988. O Tribunal Regional Federal do Rio Grande do Sul, que atende quase a mesma população que é atendida pelo TRF da 5ª Região, já gozou do aumento de inúmeras vagas para novos Desembargadores. Mas o nosso não, continua com a mesma composição inicial. Inércia dos respectivos administradores? Comodismo dos políticos nordestinos?. Não sei. Só sei que o resultado é muito ruim, porque o referido Tribunal recebe cada vez mais processos e não tem condições físico-materiais para julgá-los, com a celeridade exigida. E por lá se acautelam, no mínimo, por dois anos.
Depois, quando as partes vencidas recorrem, os processos vão para o Superior Tribunal de Justiça-STJ, em Brasília, que recebe processos do Brasil inteiro, e por lá ficam mais três anos. E se o caso envolver matéria constitucional, ainda vai para o Supremo Tribunal Federal: mais três anos. Volta para execução. Se a execução for contra a Fazenda Pública, começa tudo de novo. Citação para execução. Ação de Embargos. Impugnação. Sentença. Recurso. E ainda tem o maldito precatório, que os nossos Parlamentares Federais autorizaram, recentemente, o parcelamento para pagamento em prazo maior ainda. Mas se o Réu(executado)for um particular, a execução será mais célere, porque, nessa parte reformaram o Código de Processo Civil em 2005 e 2006 e agora está mais ágil.
Torço para que o princípio da celeridade e o princípio da efetividade, que agora constam da Constituição da República, sejam realmente observados. E acho que serão, porque isso passou a ser uma exigência dos donos do dinheiro, que têm prejuízos com a morosidade do Judiciário, e quando eles querem, tudo conseguem, afinal somos um País capitalista. É tanto que está em andamento célere um projeto de reforma do Código de Processo Civil, pela qual inúmeros recursos deixarão de existir e então, talvez, a morosidade seja reduzida. Se vingar, findará por favorecer a todos os brasileiros.
E a impunidade reinante, deve-se a estrutura da justiça ou das leis existentes?
A impunidade faz parte da nossa cultura autoritária. Num verdadeiro regime democrático não há impunidade, porque as Leis aplicam-se igualmente a todos. Infelizmente, ainda não incorporamos essa forma de pensar. Mas está mudando um pouco, embora só tenha ido para a cadeia pessoas que não fazem parte do grupo do poder central. O poder central é ainda muito forte no Brasil. Precisa ser reduzido. O poder necessita, urgentemente, ser pulverizado no Brasil, afinal somos uma república federativa, dando-se maior força econômico-institucional às demais Unidades da Federação. A Polícia Federal deve alcançar a mesma autonomia atualmente obtida pelo Ministério Público Federal. E a escolha dos dirigente máximos dessas duas importantes Instituições, deve ser feita pelo Congresso Nacional, que deverá apreciar uma lista quíntupla de membros eleitos internamente. O voto, no Congresso Nacional, deve ser secreto, sendo vencedor o que tiver maioria simples, de um quorum mínimo, representado pela maioria absoluta das duas casas desse Congresso.
O cangaceiro Antônio Silvino, preso em Recife na década de 30, entrevistado pelo jornal O Estado de São Paulo, na ocasião disse uma frase inusitada: "No Brasil temos na justiça dois códigos; o código civil para os ricos e o penal para os pobres". Esse conceito ainda é válido nos dias atuais?
Sim, essa arguta conclusão do velho cangaceiro Antonio Silvino, infelizmente, ainda é em grande parte verdadeira no Brasil atual.
O presidente Lula, certa feita afirmou que a justiça é uma caixa preta. Que você tem a dizer sobre essa afirmação?
Acho que a caixa do Poder Executivo é mais preta ainda. Abriram a caixa do Judiciário e não se encontrou quase nada. A caixa do Poder Executivo, embora continue fechada, aqui, acolá, nos traz péssimas surpresas.
Você concorda com a forma de escolha dos ministros dos tribunais superiores(STF,STJ), nomeados pelo Presidente da República?
Não. Até participei de um debate na TV Justiça, sobre o assunto, promovido pela Associação Nacional dos Juízes Federais-AJUFE. Acredito que a escolha deveria ser mais democrática.
Os Ministros do STF deveriam ser escolhidos por órgãos do meio social. Exemplo: as faculdades de direito oficiais, por eleição, indicariam um candidato; as faculdades de direito privadas elegeriam outro; o Ministério Público Federal elegeria o seu, assim como os Ministérios Públicos Estaduais, a Ordem dos Advogados do Brasil, as Associações de Juízes, as Associações de Procuradores e etc. Essas eleições dariam origem a uma lista, com tantos indicados quantos fossem as Entidades, indicadas edm Lei e essa lista seria encaminhada para o Presidente do Supremo Tribunal Federal e esse Tribunal, em sessão plenária, reduziria a lista para cinco nomes, em votação secreta. Caberia ao Congresso Nacional(e não apenas ao Senado), por maioria simples(com quorum mínimo da maioria absoluta), escolher o futuro Ministro do STF, em votação secreta.
Na composição do STJ, dever-se-ia acabar com o denominado “quinto constitucional”(vaga destinada a membros do Ministério Público e a advogados). E adotar-se o mesmo critério, acima indicado, para a escolha dos seus Ministros, sendo que a formação da lista quíntupla seria decidida pelo plenário desse Tribunal, por votação secreta. E a escolha final seria do Congresso Nacional, na mesma sistemática indicada para a escolha de Ministros do STF.
Creio também que o mandato desses Ministros deveria ser, no máximo, de 10(dez)anos, para que houvesse renovação nos seus quadros.
Assim, creio, seria mais democrático. E os Ministros mais independentes e representativos.
No entrevero entre o ministro Joaquim Barbosa e o presidente Gilmar Mendes, a razão está com quem?
Nesse assunto, como magistrado federal, não posso externar minha opinião em público. Mas o incidente ocorrido entre os dois, ao vivo, na TV Justiça, certamente em nada contribuiu para o crescimento do Poder Judiciário perante os brasileiros.
Qual é sua sugestão para melhorar a justiça no Brasil?
Acho que a resposta está acima.
Você se sente melhor como juiz, professor ou escritor?
Gosto muito das três atividades, mas ensinar talvez seja a minha maior realização. Sinto-me útil transferindo o pouco que aprendi na vida, para aqueles que estão iniciando a caminhada.
Dr. Francisco Alves dos Santos, Junior, as páginas do jornal Poranduba, estão a sua disposição para as considerações finais. Obrigado pela entrevista.
Agradeço a oportunidade de expressar minhas opiniões, sobre assuntos tão variados, para o grande público desse grande jornal, o PORANDUBA, gerado da vontade e da força férrea do seu combativo editor-chefe, o jornalista e professor Rubens Coelho, extraído do calor e da rica poeira cultural de Mossoró-RN, donde irradia a variada cultura nordestina para todos os rincões do Brasil. Parabéns a todos que compõem a equipe desse valoroso órgão de imprensa, voltado para a cultura, e que o seu exemplo se espalhe, porque, como se sabe, isso, infelizmente, é muito raro por essas paragens,
Concorda com o sistema de cota para o curso universitário?
Sim. Como juiz federal, já prolatei pelo menos duas decisões, garantido o bônus de 10% na nota, para vestibulandos originários de escolas públicas municipais ou estaduais. Essa é a cota da UFPE. É econômico-financeira, ignorando raça, cor, sexo, etc. Parece-me muito boa.
No entanto, também concordo com as cotas para negros e índios, porque têm finalidades de compensação histórico-social, isto é, essas cotas permitem que as pessoas afro-descendentes e indígenas sejam compensadas pelos massacres que sofreram no passado recente da nossa história, no campo econômico e educacional.
Acho também muito positivo o sistema de bolsa, via PROUNI, privilegiando alunos de escolas públicas, pelo mérito(as melhores notas no ENEM ganham as bolsas mais completas).
A propósito, você concorda com as críticas feita a propalada morosidade da justiça brasileira?
Sim. E acho que não vai terminar tão cedo. Tem que se mudar a mentalidade dos Magistrados. Principalmente dos Desembargadores dos Tribunais, que são muito apegados à forma, aos procedimentos. Pesquisas recentes constataram que o processo não demora muito com o juiz de primeiro grau. A demora está nos Tribunais. Por exemplo. Na Justiça Federal da quinta região, que atende a quase todos os Estados do Nordeste, onde trabalho, houve um aumento muito grande de Varas(juízos de primeiro grau). Mas o Tribunal Regional Federal da 5ª Região continua com a mesma composição de quando foi criado, em 1988. O Tribunal Regional Federal do Rio Grande do Sul, que atende quase a mesma população que é atendida pelo TRF da 5ª Região, já gozou do aumento de inúmeras vagas para novos Desembargadores. Mas o nosso não, continua com a mesma composição inicial. Inércia dos respectivos administradores? Comodismo dos políticos nordestinos?. Não sei. Só sei que o resultado é muito ruim, porque o referido Tribunal recebe cada vez mais processos e não tem condições físico-materiais para julgá-los, com a celeridade exigida. E por lá se acautelam, no mínimo, por dois anos.
Depois, quando as partes vencidas recorrem, os processos vão para o Superior Tribunal de Justiça-STJ, em Brasília, que recebe processos do Brasil inteiro, e por lá ficam mais três anos. E se o caso envolver matéria constitucional, ainda vai para o Supremo Tribunal Federal: mais três anos. Volta para execução. Se a execução for contra a Fazenda Pública, começa tudo de novo. Citação para execução. Ação de Embargos. Impugnação. Sentença. Recurso. E ainda tem o maldito precatório, que os nossos Parlamentares Federais autorizaram, recentemente, o parcelamento para pagamento em prazo maior ainda. Mas se o Réu(executado)for um particular, a execução será mais célere, porque, nessa parte reformaram o Código de Processo Civil em 2005 e 2006 e agora está mais ágil.
Torço para que o princípio da celeridade e o princípio da efetividade, que agora constam da Constituição da República, sejam realmente observados. E acho que serão, porque isso passou a ser uma exigência dos donos do dinheiro, que têm prejuízos com a morosidade do Judiciário, e quando eles querem, tudo conseguem, afinal somos um País capitalista. É tanto que está em andamento célere um projeto de reforma do Código de Processo Civil, pela qual inúmeros recursos deixarão de existir e então, talvez, a morosidade seja reduzida. Se vingar, findará por favorecer a todos os brasileiros.
E a impunidade reinante, deve-se a estrutura da justiça ou das leis existentes?
A impunidade faz parte da nossa cultura autoritária. Num verdadeiro regime democrático não há impunidade, porque as Leis aplicam-se igualmente a todos. Infelizmente, ainda não incorporamos essa forma de pensar. Mas está mudando um pouco, embora só tenha ido para a cadeia pessoas que não fazem parte do grupo do poder central. O poder central é ainda muito forte no Brasil. Precisa ser reduzido. O poder necessita, urgentemente, ser pulverizado no Brasil, afinal somos uma república federativa, dando-se maior força econômico-institucional às demais Unidades da Federação. A Polícia Federal deve alcançar a mesma autonomia atualmente obtida pelo Ministério Público Federal. E a escolha dos dirigente máximos dessas duas importantes Instituições, deve ser feita pelo Congresso Nacional, que deverá apreciar uma lista quíntupla de membros eleitos internamente. O voto, no Congresso Nacional, deve ser secreto, sendo vencedor o que tiver maioria simples, de um quorum mínimo, representado pela maioria absoluta das duas casas desse Congresso.
O cangaceiro Antônio Silvino, preso em Recife na década de 30, entrevistado pelo jornal O Estado de São Paulo, na ocasião disse uma frase inusitada: "No Brasil temos na justiça dois códigos; o código civil para os ricos e o penal para os pobres". Esse conceito ainda é válido nos dias atuais?
Sim, essa arguta conclusão do velho cangaceiro Antonio Silvino, infelizmente, ainda é em grande parte verdadeira no Brasil atual.
O presidente Lula, certa feita afirmou que a justiça é uma caixa preta. Que você tem a dizer sobre essa afirmação?
Acho que a caixa do Poder Executivo é mais preta ainda. Abriram a caixa do Judiciário e não se encontrou quase nada. A caixa do Poder Executivo, embora continue fechada, aqui, acolá, nos traz péssimas surpresas.
Você concorda com a forma de escolha dos ministros dos tribunais superiores(STF,STJ), nomeados pelo Presidente da República?
Não. Até participei de um debate na TV Justiça, sobre o assunto, promovido pela Associação Nacional dos Juízes Federais-AJUFE. Acredito que a escolha deveria ser mais democrática.
Os Ministros do STF deveriam ser escolhidos por órgãos do meio social. Exemplo: as faculdades de direito oficiais, por eleição, indicariam um candidato; as faculdades de direito privadas elegeriam outro; o Ministério Público Federal elegeria o seu, assim como os Ministérios Públicos Estaduais, a Ordem dos Advogados do Brasil, as Associações de Juízes, as Associações de Procuradores e etc. Essas eleições dariam origem a uma lista, com tantos indicados quantos fossem as Entidades, indicadas edm Lei e essa lista seria encaminhada para o Presidente do Supremo Tribunal Federal e esse Tribunal, em sessão plenária, reduziria a lista para cinco nomes, em votação secreta. Caberia ao Congresso Nacional(e não apenas ao Senado), por maioria simples(com quorum mínimo da maioria absoluta), escolher o futuro Ministro do STF, em votação secreta.
Na composição do STJ, dever-se-ia acabar com o denominado “quinto constitucional”(vaga destinada a membros do Ministério Público e a advogados). E adotar-se o mesmo critério, acima indicado, para a escolha dos seus Ministros, sendo que a formação da lista quíntupla seria decidida pelo plenário desse Tribunal, por votação secreta. E a escolha final seria do Congresso Nacional, na mesma sistemática indicada para a escolha de Ministros do STF.
Creio também que o mandato desses Ministros deveria ser, no máximo, de 10(dez)anos, para que houvesse renovação nos seus quadros.
Assim, creio, seria mais democrático. E os Ministros mais independentes e representativos.
No entrevero entre o ministro Joaquim Barbosa e o presidente Gilmar Mendes, a razão está com quem?
Nesse assunto, como magistrado federal, não posso externar minha opinião em público. Mas o incidente ocorrido entre os dois, ao vivo, na TV Justiça, certamente em nada contribuiu para o crescimento do Poder Judiciário perante os brasileiros.
Qual é sua sugestão para melhorar a justiça no Brasil?
Acho que a resposta está acima.
Você se sente melhor como juiz, professor ou escritor?
Gosto muito das três atividades, mas ensinar talvez seja a minha maior realização. Sinto-me útil transferindo o pouco que aprendi na vida, para aqueles que estão iniciando a caminhada.
Dr. Francisco Alves dos Santos, Junior, as páginas do jornal Poranduba, estão a sua disposição para as considerações finais. Obrigado pela entrevista.
Agradeço a oportunidade de expressar minhas opiniões, sobre assuntos tão variados, para o grande público desse grande jornal, o PORANDUBA, gerado da vontade e da força férrea do seu combativo editor-chefe, o jornalista e professor Rubens Coelho, extraído do calor e da rica poeira cultural de Mossoró-RN, donde irradia a variada cultura nordestina para todos os rincões do Brasil. Parabéns a todos que compõem a equipe desse valoroso órgão de imprensa, voltado para a cultura, e que o seu exemplo se espalhe, porque, como se sabe, isso, infelizmente, é muito raro por essas paragens,
sábado, 27 de março de 2010
O Princípio da Neutralidade no Direito Tributário
O princípio da neutralidade tributária orienta no sentido de que a tributação não deve causar distorções no setor econômico, donde a receita tributária é extraída. A tributação deve ser dosada a ponto de não provocar desequilíbrio na livre concorrência empresarial, de forma que nenhum setor deve ser favorecido ou desfavorecido. Deve ser neutra.
Não há dúvida que deriva do princípio maior, que é o princípio da isonomia.
A orientação desse princípio foi incorporada na Constituição da República de 1988 pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003: “Art. 146-A. Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo.”.
A lei, prevista no final desse dispositivo, a ser editada pela União, tem que ser Lei Complementar ou pode ser Lei Ordinária?
...
Leia a continuação deste texto, no livro "Direito Tributário do Brasil - Aspectos Estruturais do Sistema Tributário Brasileiro", do autor Francisco Alves dos Santos Júnior, e que pode ser obtido pelo www.livrorapido.com, ou pelo telefone 2121.5300, ou ainda na Livraria Imperatriz, na cidade do Recife, com filiais no Shopping Recife, Shopping Plaza e Shopping Guararapes, e ainda no centro da cidade.
Não há dúvida que deriva do princípio maior, que é o princípio da isonomia.
A orientação desse princípio foi incorporada na Constituição da República de 1988 pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003: “Art. 146-A. Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo.”.
A lei, prevista no final desse dispositivo, a ser editada pela União, tem que ser Lei Complementar ou pode ser Lei Ordinária?
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Leia a continuação deste texto, no livro "Direito Tributário do Brasil - Aspectos Estruturais do Sistema Tributário Brasileiro", do autor Francisco Alves dos Santos Júnior, e que pode ser obtido pelo www.livrorapido.com, ou pelo telefone 2121.5300, ou ainda na Livraria Imperatriz, na cidade do Recife, com filiais no Shopping Recife, Shopping Plaza e Shopping Guararapes, e ainda no centro da cidade.
terça-feira, 16 de março de 2010
HIPOTECA NÃO VALE CONTRA TERCEIRO ADQUIRENTE.
A Construtora tomou empréstimo perante a Caixa Econômica Federal e garantiu a dívida com hipoteca sobre prédio de apartamentos de sua propriedade. Vendeu os apartamentos e recebeu o respectivo pagamento. Não pagou a dívida que tinha perante a Caixa Econômica Federal. Esta, por sua vez, executou a dívida e pediu penhora dos apartamentos, então hipotecados. A proprietária de um dos apartamentos interpôs embargos de terceiros, que foram acolhidos, determinando-se na sentença baixa da hipoteca. Segue a Sentença, que já foi mantida pelo Tribunal Regional da 5ª Região e encontra-se sob recurso especial perante o Superior Tribunal de Justiça.
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA
Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Junior
Processo nº 2006.83.00.011026-9 79 Embargos de Terceiro
EMBGTE: A. F. C.
Adv.: Ignácio de Souto Júnior, OAB/PE nº 19536
EMBGDO : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA
Adv.: Bianca Siquiera Campos, OAB/PE 19.170
Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2007.
Sentença tipo “B”
Ementa: - EMBARGOS DE TERCEIROS. PENHORA. IMÓVEL QUITADO À CONSTRUTORA POR PARTICULARES.
STJ – Súmula 84 “É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro.”.
STJ - Súmula 308 “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel.”.
Procedência.
Vistos etc.
A. F. C., qualificada na Inicial, propôs, em 25.08.2006, esta ação de “EMBARGOS DE TERCEIRO” contra a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. Alegou, em suma, que teria celebrado em 30.09.1993 Contrato de Promessa de Compra e Venda com a Betonbau Engenharia LTDA, cujo objeto seria o apartamento de nº. 702, do Edifício Itayara Village, situado na Rua Gervásio Fiovorante, nº 87, Bairro da Graças, Recife/PE; que o preço firmado teria sido quitado com recursos da própria Embargante, em conformidade com o estabelecido na Cláusula 18 do contrato; que a quitação teria sido feita mediante o pagamento de um sinal, em espécie, no valor de CR$ 1.935.000,00 (hum milhão novecentos e trinta e cinco mil cruzeiros reais), em 30.09.1993, e duas parcelas representadas por duas notas promissórias que teriam sido quitadas no período compreendido entre 10.10.1993, no valor de CR$ 973.000,00, e a terceira e última parcela, no valor de CR$ 5.805,00, com vencimento em 30.09.1994, teria sido paga mediante transferência de imóvel de propriedade da Embargante, localizada no Edifício Galeão, ap 402, situado à Rua Vigário Barreto, nº 82, Bairro Espinheiro, Recife/PE, conforme Contrato Particular de Promessa de Compra e Venda que estaria acostando à Inicial; que teria sido imitida na posse do imóvel em 28 de abril de 1995 e desde então estaria pagando a taxa de Condomínio e todos os tributos referentes ao imóvel; que faria jus a provimento judicial a fim de ser preservada de esbulho, em face da penhora que teria sido efetivada, conforme Auto de Penhora acostado às fls. 183 dos autos do processo de execução movido pela CEF; que a Construtora BETONBAU, promitente vendedora, mutuária perante a CEF, embora tivesse recebido da Embargante a totalidade do preço, teria deixado de recolher ao agente financiador a parcela do financiamento correspondente à unidade em tela; que a atitude da BETONBAU seria dolosa, eis que teria deixado de cumprir o avençado; que as decisões judiciais que transcreveu esclareceriam que os efeitos da pretensa seqüela de hipoteca não poderiam prevalecer como impedimento à exclusão ou afastamento da penhora sobre o bem adquirido de boa-fé, em que teria faltado a diligência do agente financeiro, com vistas a promover, em seu favor, o rapasse das prestações do preço recebido pela Construtora mutuária. Teceu outros comentários e requereu: o deferimento liminar e a procedência do pedido para que fosse determinada a exclusão da penhora que incide sobre o imóvel acima referido (apartamento nº 702 do Edifício Itayaia Villagem) e sobre sua respectiva fração ideal de terreno, situada na Rua Gervásio Fioravante, nº 87, Graças, Recife/PE, declarando a inoperância dos efeitos da hipoteca contratada entre a Embargada e a Executada, sobre o referido bem; a citação da Suplicada; a condenação da CEF ao pagamento das verbas de sucumbência; a suspensão do processo principal. Protestou o de estilo. Deu valor à causa e instruiu a Inicial com instrumento de procuração e documentos, fls. 19/150.
Custas recolhidas às fls. 151.
A Embargante ingressou com petição juntando instrumento de procuração, fls. 155.
A Embargante ingressou com petição aditando a Inicial, requerendo a juntada de decisão emanada pelo E. STJ, a qual se aplicaria aos presentes autos, na medida em que a CEF não poderia executar a penhora de imóveis comprados por terceiros de boa-fé. Invocou as Súmulas nºs 84 e 308 do E.S TJ e requereu a juntada de documentos, fls. 158/163.
Às fls. 164, os Embargos de Terceiros foram recebidos com efeito suspensivo relativamente ao bem em questão, e suspensa a execução noticiada na Inicial.
Citada, a Caixa apresentou Contestação, alegando, em suma, que a Embargante, ao firmar com a BETONBAU a aludida promessa de compra e venda, o imóvel já estaria gravado com o ônus da hipoteca; que, além disso, a BETONBAU teria comercializado a unidade sem que tivesse observado contrato preestabelecido com a CAIXA e excluído mencionada empresa pública da participação no processo; que a BETONBAU teria agido de má-fé quando da obtenção do valor levantado com a alienação, sem repassar tal valor à CEF para que a hipoteca pudesse ser extinta; que, no contrato firmado entre a CEF e a BETONBAU, haveria determinação no sentido de que a CEF deveria atuar como anuente em todos os contratos de compra e venda, logo, a alienação sem a inclusão da CEF revelaria a má-fé da BETONBAU e a negligencia da Embargante que teria deixado de diligenciar para saber a real situação do imóvel; que o valor da venda do bem em questão não teria revertido para abatimento do débito da BETONBAU, o que geraria a liberação do ônus hipotecário; que o gravame subsistiria porque a venda teria ocorrido em confronto com o que teria sido ajustado, já que teria sido efetuada sem a participação da CEF; que a regra geral, por ocasião da aquisição de imóvel hipotecado, seria a de que o imóvel continuaria vinculado ao pagamento da dívida, de modo que o comprador poderia perder o direito à propriedade do bem, caso não fosse paga a dívida; que a penhora realizada nos bens objeto desta ação teria ocorrido no curso de uma execução hipotecária, de modo que, de acordo com o CPC, art. 655, a penhora deveria ocorrer obrigatoriamente sobre os bens hipotecados; que a Embargante, desde o momento em que adquiriu o imóvel junto à BETONBAU, estaria ciente de que mencionado imóvel estava e ainda continuaria hipotecado à CEF, em garantia do financiamento concedido para a execução do empreendimento. Teceu outros comentários e requereu: a improcedência dos pedidos formulados pela Embargante e a condenação desta nos ônus da sucumbência. Protestou o de estilo e juntou instrumento de procuração e documentos, fls. 182/192.
A Embargante apresentou Réplica às fls. 194/203 e juntou cópia de decisão judicial, fls. 204/210.
Vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
Fundamentação
I. No presente caso, a Embargante insurge-se contra penhora sobre o imóvel em questão, registrada no Cartório pertinente, penhora essa feita a pedido da Caixa Econômica Federal nos autos da ação de execução, processo nº 99.8801-8.
II. Julguei caso semelhante a este, nos autos do Processo nº 98.0010810-6 Classe 10000 - AÇÃO SUMÁRIA, promovida por A. A. DA S. S. E OUTROS, tendo como Rés a INCORPORADORA SANTA MARIA LTDA e a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL.
Ali assim fundamentei a Sentença:
“ 1. A Construtora Santa Maria Ltda obteve financiamento da Caixa Econômica Federal-CEF e hipotecou imóvel que vendeu aos ora Autores. Estes pagaram as prestações devidas à Construtora e quando buscaram a escritura definitiva esta lhes foi negada, porque a Construtora não pagou o financiamento à Caixa Econômica Federal-CEF e esta deseja fazer prevalecer sua hipoteca.
Constou da respectiva Promessa de Compra e Venda – Escritura Particular, dentro de um tópico denominado “EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO”, o seguinte tópico:
“1.4 – A unidade imobiliária objeto do negócio jurídico está hipotecada em favor da Caixa Econômica Federal, originário de mútuo firmado para a produção do empreendimento, eis porque o terreno onde está construindo a edificação e suas unidades, inclusive aquela objeto desta promessa de compra e venda, foram dados em garantia, concordando o ADQUIRENTE, expressamente, com o aludido gravame sem objeção ou restrição de qualquer espécie ou natureza.”(Fls. 11).
2. Não há dúvida de que, quando a hipoteca é dada após a assinatura da Promessa de Compra e Venda, ela não tem validade frente ao Promissário Comprador.
3. E quando ela é firmada antes da Promessa de Compra e Venda, como no presente caso?
O E. Superior Tribunal de Justiça-STJ. 4ª T., no julgamento do REsp 239.557/SC , por unanimidade, tendo por relator o d. Min. Ruy Rosado de Aguiar, também já teve oportunidade de apreciar caso idêntico ao discutido neste processo e concluiu no mesmo sentido da situação anterior, ou seja, a hipoteca não tem validade frente ao Promissário Comprador.
No voto condutor, o d. Ministro Relator, argumentou :
“A hipoteca que o financiador da construtora instituir sobre o imóvel garante a dívida dela enquanto o bem permanecer na propriedade da devedora; havendo transferência, por escritura pública de compra e venda ou de promessa de compra e venda, o crédito da sociedade de crédito imobiliário passa a incidir sobre “os direitos decorrentes dos contratos de alienação das unidades habitacionais integrantes do projeto financiado”(art. 22 da Lei nº 4.864/65), sendo ineficaz em relação ao terceiro adquirente a garantia hipotecária instituída pela construtora em favor do agente imobiliário que financiou o projeto. Assim foi estruturado o sistema e assim deve ser aplicado, especialmente para respeitar os interesses do terceiro adquirente de boa-fé, que cumpriu com todos os seus compromissos e não pode perder o bem que lisamente comprou e pagou em favor da instituição que, tendo financiado o projeto de construção, foi negligente na defesa do seu crédito perante a sua devedora, deixando de usar dos instrumentos próprios e adequados previstos na legislação específica desse negócio”
E continou o d. Ministro Relator:
“As regras gerais sobre a hipoteca não se aplicam no caso de edificações financiadas por agentes imobiliários integrantes do sistema financeiro da habitação, porquanto estes sabem que as unidades a serem construídas serão alienadas a terceiros, que responderão apenas pela dívida que assumiram com o seu negócio, e não pela eventual inadimplência da construtora.”.
Um pouco a frente o d. Ministrou Relator também demonstrou que o princípio da boa-fé objetiva não permite que esse tipo de hipoteca possa ter validade contra o Promissário Comprador, verbis:
“O princípio da boa-fé objetiva impõe ao financiador de edificação de unidades destinadas à venda aprecatar-se para receber o seu crédito da sua devedora ou sobre os pagamentos a ela efetuados pelos terceiros adquirentes. O que se não lhe permite é assumir cômoda posição de negligência na defesa dos seus interesses, sabendo que os imóveis estão sendo negociados e pagos por terceiros, sem tomar nenhuma medida capaz de satisfazer os seus interesses, para que tais pagamentos lhe sejam feitos e de impedir que terceiro sofra a perda das prestações e do imóvel.”.
Nos trechos acima transcritos, foram rebatidos todos os argumentos, em sentido contrário, da defesa da Caixa Econômica Federal-CEF(fls. 134-142), bem como da defesa da Construtora-Ré(fl. 248-259).
São, sem dúvida, insuperáveis os lapidares argumentos sócio-jurídicos, acima transcritos, do d. Ministro e Jurista Ruy Rosado de Aguiar.
Ouso acrescentar a esse excelente Voto, apenas mais alguns argumentos.
A Promessa de Compra e Venda que os ora Autores firmaram com a Construtora é regida pelas regras do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078, de 1990, cujo respectivo art. 51 reza:
“Art. 51 – São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou seja, incompatíveis com a boa fé ou a eqüidade”.
Como bem demonstrado no d. Voto acima invocado, esse inciso IV do art. 51 do mencionado Código foi claramente violentado.
Quanto o subitem 1.4 da Promessa de Compra e Venda que a Construtora-Ré firmou com os Autores, transcrita no início desta fundamentação, não fossem os argumentos sócio-jurídico-financeiros acima transcritos, tal subitem só teria possibilidade de gozar de alguma validade frente aos Promissários Compradores, ora Autores, se tivesse sido colocado em destaque, com subtítulo próprio e não às escondidas, como o foi, no meio de um tópico com título de “EMPREENDIMENTO IMOBILIÁRIO”, no qual deveria apenas ser descrito tal empreendimento e não os seus aspectos jurídico-civil-financeiros, e assim teria que ser porque assim exige o invocado Código de Proteção e Defesa do Consumidor, verbis:
“Art. 54 - ...
§ 4º - As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.".
Portanto, por qualquer ângulo que se analise a questão ora debatida, chega-se à conclusão que a hipoteca em questão não tem nenhuma validade frente aos Promissários Compradores, ora Autores.”.
II. a) Mais tarde, em outros r. julgados, o mesmo E. Superior Tribunal de Justiça,por suas Quarta e Terceira Turmas enveredou pelo mesmo caminho daquele precedente, verbis:
“Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 576150
Processo: 200301592418 UF: SP Órgão Julgador: QUARTA TURMA
Data da decisão: 28/06/2005 Documento: STJ000645484
Relator: CESAR ASFOR ROCHA
RECURSOS ESPECIAIS. FINANCIAMENTO PARA CONSTRUÇÃO. SFH. HIPOTECA.
TERCEIROS ADQUIRENTES DE UNIDADES IMOBILIÁRIAS. CANCELAMENTO DA
GARANTIA. PRECEDENTE DO STJ.
"A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel" (verbete n. 308/STJ).
Ineficaz a hipoteca perante os terceiros adquirentes, não há possibilidade de o banco credor exercer o seu direito sobre ela, dando-se, via de conseqüência, o perecimento da citada garantia, nos termos dos arts. 77 e 78 do Código Civil de 1916, possibilitando o seu cancelamento.
Recurso do BANESPA S/A não conhecido e recurso de Francesco e Maria Nardi parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.”
“Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 431440
Processo: 200200489396 UF: SP Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA
Data da decisão: 07/11/2002 Documento: STJ000471565
Relatora: NANCY ANDRIGHI
Processual Civil. Civil. Recursos Especiais. Fundamentação. Embargos de declaração. Omissão. Inexistência. Dissídio jurisprudencial.
Comprovação. Contrato de financiamento para a construção de imóvel (prédio com unidades autônomas). Recursos oriundos do SFH. Outorga, pela construtora, de hipoteca sobre o imóvel ao agente financiador. Posterior celebração de compromisso de compra e venda com terceiros adquirentes. Cancelamento da hipoteca.
- É inadmissível o Recurso Especial na parte em que deixa de apontar ofensa à lei ou dissídio jurisprudencial e no ponto em que não fundamenta suas alegações.
- Inexiste omissão a ser suprida por meio de embargos de declaração quando toda a controvérsia posta a desate foi fundamentadamente apreciada no julgado embargado.
- O dissídio jurisprudencial que enseja Recurso Especial deve ser comprovado mediante o cotejo analítico entre os acórdãos tidos como divergentes.
- A hipoteca instituída pela Construtora ao agente financiador, em garantia de empréstimo regido pelo Sistema Financeiro da Habitação, que recai sobre unidade de apartamentos, é ineficaz perante os promissários-compradores, a partir de quando celebrada a promessa de compra e venda.
- Nesse caso, deve ser cancelada a hipoteca existente sobre as unidades de apartamentos alienadas a terceiros adquirentes.”.
II. b) E finalmente esse E. Superior Tribunal de Justiça sumulou a matéria:
“Súmula 308 - A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel.”.
V. Não cabe neste feito decidir se referida Construtora pagou ou não a dívida que a Caixa Econômica Federal está a executar nos autos da Execução Diversa, processo nº. 99.8801-8, cabendo a decisão sobre esta matéria ser lançada na ação própria que tenha sido interposta ou que seja proposta por referida Construtora.
Conclusão
POSTO ISSO: a) ratifico a decisão inicial na qual dei efeito suspensivo a esta ação de embargos de terceiros; b) julgo procedentes os pedidos, desconstituo a penhora em questão e determino o cancelamento do respectivo registro no Cartório de Registro de Imóveis pertinente, via ofício deste Juízo, para todos os fins de direito; c) declaro a inoperância dos efeitos da hipoteca contratada entre a Caixa Econômica Federal e a Executada do feito principal sobre o imóvel em questão e descrito na petição inicial desta ação de embargos de terceiro; d) condeno a Caixa Econômica Federal em verba honorária que, tendo em vista a simplicidade do caso, porque calcada em matéria já sumulada, arbitro em 10%(dez por cento) do valor da causa, atualizado a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal; e) finalmente, condeno a Caixa Econômica Federal a ressarcir as custas processuais, despendidas pela ora Embargante, atualizadas desde a data do efetivo desembolso, pelos índices indicados na alínea anterior.
A partir do mês seguinte ao da intimação da execução desta Sentença, a ser feita na forma prevista no art. 475-J do Código de Processo Civil, as verbas indicadas nas alíneas “d” e “e” desta conclusão serão acrescidas de juros de mora, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, incidente sobre os valores já monetariamente corrigidos, sem prejuízo da multa prevista nesse artigo, caso não pagas no prazo ali estipulado.
Remeta-se ofício ao respectivo Cartório de Registro de Imóveis, para baixa na penhora e na hipoteca.
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P.R.I.
Recife, 17 de setembro de 2007.
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal da 2ª Vara – PE
quarta-feira, 10 de março de 2010
EXECUÇÃO DE CRÉDITO DO SFH
SEGUE UMA SENTENÇA, NA QUAL SE DISCUTE A EXECUÇÃO DE CONTRATOS VINCULADOS AO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO, QUANDO O MUTUÁRIO NÃO PAGA AS PRESTAÇÕES.
Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2008.83.00.007960-0 Classe: 209 EMBARGOS À EXECUÇÃO FUNDADA EM TÍTULO EXTRAJUDICIAL
EMBGTE: A.C.J
Adv.: M. L. M., OAB/PE XXX
EMBGDO: EMGEA – EMPRESA GESTORA DE ATIVOS
Adv.: S. C. – OAB/PE XXX
Registro nº ..............................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..............
Recife, ......../2009
Sentença tipo A
Ementa: - DIREITO ECONÔMICO. SFH. EXECUÇÃO
Não é liquido, nem certo título executivo decorrente de contrato do SFH, que não leva em consideração repactuação do contrato inicial, tampouco a regra de direito material do art. 7º da Lei nº 5.741, de 1971.
Procedência.
Vistos etc.
A. C. J., qualificado nos autos, opôs, em 24/03/2008, os presentes “Embargos à Execução c/c Pedido de Reconvenção”. Alegou, em síntese, que o contrato objeto da ação de execução por título extrajudicial em apenso teria sido firmado com o BANCO BANORTE e não com a Caixa Econômica Federal e não haveria prova nos autos de que o referido contrato tenha sido repassado para a EMGEA ou para a CEF; que o referido título teria sido repactuado em 28/09/1992, pelo que o título ora apresentado não possuiria força executiva e seria nulo; que o mencionado título não teria liquidez e certeza, porque não discriminaria a forma de cálculo dos juros de mora e correção monetária; que a execução proposta pela EMGEA careceria de seus requisitos de admissibilidade, porque, com a repactuação, teria sido alterada a forma de reajuste, conforme a Cláusula Terceira da Alteração Contratual; que seria aplicável ao caso o Código de Defesa do Consumidor; que seria abusiva a prática da Embargada de cobrança de reajuste na forma diversa da contratada; que a Embargada apenas poderia cobrar dos consumidores o percentual de juros estipulados no contrato, sob pena de prática abusiva de cobrança ilegal; que, uma vez apurados os valores cobrados a maior, a Embargada deveria ser condenada a restituir os valores cobrados a maior, em dobro, deduzidos de eventual saldo devedor a ser encontrado após a adequação da planilha de cálculo efetuada pela Exequente, e se encontrados eventuais créditos em favor do Executado que sejam devolvidos em dobre os valores, devidamente corrigidos e acrescidos de juros de mora legais, ou, alternativamente e nas mesmas condições estipuladas pelo contrato; que o contrato especificaria a cobrança de juros sobre juros, “conhecido como tabela Price” (sic.), com taxa nominal de juros de 12%, correspondente à taxa efetiva de 12,683%, prática esta que seria vedada em nosso sistema. Teceu outros comentários e requereu a juntada do contrato de renegociação, dos extratos salariais da mutuária Isolda Tavares de Andrade Costa, bem como dos recibos de pagamento do referido contrato, para que se proceda ao cálculo efetivo devido ou crédito apurado, bem como planilha onde se vislumbraria que o executado teria pago a maior R$ 154.342,33. Teceu outros comentários e requereu: o recebimento dos Embargos; a apresentação, pela Embargada, dos valores cobrados a título de seguro em todas as parcelas, a partir da repactuação em 2/09/1992; que a Exequente seja compelida a apresentar o cálculo discriminado de acordo com o termo de repactuação desde 28/09/1992; que seja declarada a nulidade da cláusula contratual referente à capitalização dos juros, por falta de previsão legal; que, em caso de negativa da juntada retro mencionada, protestou pela produção de prova pericial; que a Embargada seja condenada a restituir os valores pagos a maior, em dobro, conforme acima exposto; a inversão do ônus da prova. Protestou pela realização de audiência de tentativa de conciliação e requereu a condenação da parte contrária nas verbas de sucumbência. Juntou instrumento de procuração e documentos, fls. 08/59.
Despacho recebendo os Embargos e determinando a intimação do Embargado para oferecer impugnação, fl. 61.
Às fls. 63/68, a EMGEA apresentou Impugnação argüindo preliminar de legitimidade ativa ad causam, haja vista a cessão dos créditos do BANORTE à CEF e esta última à EMGEA. Requereu, pois, que seja reconhecida sua legitimidade para figurar no pólo ativo da Execução. No mérito, alegou, em suma, que seria descabida a alegação de nulidade do título, vez que o documento juntado pelo Embargante as fls. 39/41 demonstraria que a repactuação não configuraria novação, consoante Cláusula Sétima, o que faria cair por terra a afirmação constante dos Embargos à Execução; que a Embargada teria cumprido todas as cláusulas do contrato de financiamento, aplicando os índices pertinentes à condição do mutuário; que não teria havido qualquer irregularidade na aplicação dos juros pelo agente financiador do imóvel no contrato do mutuário, e a única explicação para sua inadimplência seria a sua vontade de permanecer no imóvel sem pagar; que a liquide e certeza do crédito poderiam ser vistos no contrato firmado entre as partes e na planilha de evolução do financiamento, que registraria a evolução do referido contrato; que a taxa de juros nominal contratada seria paga mensalmente, e a efetiva seria apenas informativa, sendo que essa taxa teria sido calculada de acordo com a legislação pertinente à época; que, portanto, não haveria que se falar que a taxa de juros pactuada seria excessiva, pois esta obedeceria às regras estipuladas pelo órgão que regeria a disciplina do SFH, e não poderia a CEF/EMGEA se afastar do cumprimento das ordens emanadas daquele órgão, pelo que seriam impertinentes as afirmações lançadas pela parte adversa; que não haveria que se falar em restituição de valores porque os valores estariam sendo cobrados de acordo com o pactuado. Teceu outros comentários e pugnou pela improcedência dos Embargos à Execução e pela condenação da Embargante nas verbas de sucumbência. Juntou documentos, fls. 69/104.
À fl. 107, o Embargante levantou vício na representação processual da Embargada, por ausência de procuração e aduziu que os valores cobrados pela EMGEA/CEF teriam por base o contrato anterior que teria sido repactuado, e estaria sendo cobrado com base no contrato antigo e não no novo, razão pela qual não poderia prosperar o pedido formulado; que, no mínimo, a EMGEA deveria reformular os cálculos apresentados nos termos da repactuação firmada. Reiterou os termos dos Embargos.
Às fls. 108, decisão interlocutória rejeitando as preliminares de ilegitimidade ativa da CEF/EMGEA e de irregularidade na sua representação processual; as demais preliminares ficaram para ser apreciadas por ocasião da sentença; as partes foram intimadas para se pronunciar sobre a possibilidade de acordo.
Às fls. 111/112, a EMGEA/CEF alegou que, antes de apresentar proposta de acordo precisaria obter o valor de mercado bem como as condições atuais de conservação do imóvel ocupado pelo devedor, para tanto, o Embargante deveria pagar o valor de R$400,00 a título de tarifa de serviço para produção do laudo técnico de avaliação que servirá de parâmetro para formulação de proposta de renegociação da dívida exeqüenda; que, concluída a vistoria do imóvel, deverá o Embargante apresentar cópia do Laudo de Avaliação ao Sr. Antônio Alves de Sá Sobrinho na unidade da CAIXA/EMGEA responsável pelas demandas judiciais, a saber: GICOT/RE, situada à Praça Miguel Cervantes, nº 30, Empresarial Cervantes, 2º andar, Ilha do Leite, CEP: 50070-520, requereu, pois, a intimação do Réu para que, concordando com tais condições, providencie o cumprimento da diligência prévia, a fim de viabilizar a eventual proposta conciliatória a ser trazida aos presentes autos, para futura homologação por parte desse Juízo.
À fl. 113, a EMGEA/CEF manifestou interesse na realização da audiência de tentativa de conciliação.
Deferida a realização de audiência de tentativa de conciliação, fl. 114.
À fl. 121, Termo de Audiência de Tentativa de Conciliação registrando que não houve conciliação entre as partes, que ficaram de apresentar eventual acordo por petição. Foi juntada ao termo “PROPOSTA CAIXA/EMGEA”, fl. 122.
À fl. 125, certificado o decurso do prazo sem que a parte embargante houvesse apresentado petição de eventual acordo.
Vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório.
Fundamentação
Matérias Preliminares
O Embargante, levanta na petição inicial desta ação de embargos: a) ilegitimidade ativa da EMGEA para a execução, porque firmou contrato com o BANORTE e não com a Caixa Econômica Federal-CEF, tampouco com a EMGEA e que não haveria prova nos autos do repasse do primeiro para esta; b) nulidade do título, porque houvera firmado com o BANORTE uma repactuação, conforme documento que estaria juntado; c) iliquidez e incerteza.
A cessão dos créditos de contratos imobiliários do BANORTE para a Caixa Econômica Federal-CEF e desta para a EMGEA foi pública e notória, não tendo o ora Embargante registrado, na via administrativa, nenhuma oposição a essas cessões, até mesmo porque nenhum prejuízo econômico-financeiro lhe trouxe, de forma que não merece acolhida esta preliminar.
Tenho por prejudicada a preliminar de nulidade do título, porque sua análise exige adentramento no mérito e por isso essa matéria será enfrentada quando do exame deste.
Idem com referência a alegada iliquidez e incerteza.
Matérias de Mérito
1. O Embargante comprou um imóvel, financiado pelo então Banco BANORTE S/A, hoje Banco BANORTE EM LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL, que cedeu os respectivos créditos para a Caixa Econômica Federal-CEF e esta, por sua vez, fez idêntica cessão para a Empresa Gestora de Ativos, ora Embargada-exequente.
Segundo consta na petição inicial da ação de execução dos autos principais, quando referida ação foi proposta o ora Embargante estava com 74(setenta e quatro)prestações em atraso.
Segundo a petição inicial da execução dos autos principais “para a regularização do débito com a purga da mora, a dívida importa em R$ 451.344,21, cálculo válido até 03/12/07, e para a liquidação do mútuo a dívida importa em R$ 451.344,21”.
Noto que a Exequente não detalhou qual seria o montante correspondente às 74 parcelas em atraso, pelo que concluo que optou pela execução da integralidade do contrato, como permitido pela respectiva cláusula décima segunda(v. fl. 16 dos autos principais).
Noto também que a Exequente preferiu propor a execução com base em artigos do Código de Processo Civil, ou seja, não se utilizou dos procedimentos da Lei nº 5.741, de 01.12.1971, que dispõe sobre a proteção do financiamento de bens imóveis vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação, opção essa permitida por essa Lei e pelo contrato(v. cláusula décima terceira deste, à fl. 16 dos autos principais).
2. Alega o Embargante não caber a execução, por ser ilíquida e incerta a dívida e por haver excesso de excecução, porque teria havido desrespeito à repactuação que firmara com o BANORTE, ferimento a regras do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, aprovado pela Lei nº 8.078, de 11.09.1990, aplicação de juros capitalizados, o que seria ilegal e não apresentação demonstrativo dos valores que já teriam sido pagos.
2.1) O crédito em execução nos autos principais é realmente ilíquido e incerto, pois a Exeqüente não levou em consideração a repactuação do contrato firmado entre o ora Embargante e o BANORTE, repactuação essa comprovada às fls. 09-11 destes autos.
2.2) A Exeqüente também não atentou para as regras do art. 7º da Lei nº 5.741, de 1971.
A opção da ora Embargada de propor a execução pelas regras do Código de Processo Civil e não pelas regras da mencionada Lei nº 5.741, de 1971, não afasta a obrigatoriedade de observar-se a parte de direito material consignada nesta Lei, especialmente a do referido art. 7º, segundo a qual, caso o Devedor não pague a dívida, perde o imóvel hipotecado e fica exonerado do restante da dívida, verbis:
Art . 7º Não havendo licitante na praça pública, o Juiz adjudicará, dentro de quarenta e oito horas, ao exeqüente o imóvel hipotecado, ficando exonerado o executado da obrigação de pagar o restante da dívida.
E nesse sentido há inúmeras r. decisões do E. Superior Tribunal de Justiça, das quais destaco a que segue:
DIREITO ECONÔMICO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. EXECUÇÃO JUDICIAL DO CONTRATO PARA AQUISIÇÃO DE IMÓVEL. ARREMATAÇÃO DO IMÓVEL PELO CREDOR POR PREÇO INFERIOR AO DA DÍVIDA EXEQÜENDA. EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO REMANESCENTE.
1. A Lei n. 5741/71, que disciplina a cobrança de crédito hipotecário para financiamento da casa própria vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação, faculta ao credor adotar o outro procedimento para execução da dívida, além daquele nela previsto (art. 1º).
2. Todavia, a opção de procedimento eleita pelo credor não importa modificação das normas de direito material, que são as mesmas em qualquer hipótese.
3. A disposição normativa do art. 7º da Lei 5.741/71 (segundo a qual, com a adjudicação do imóvel pelo exeqüente, fica "exonerado o executado da obrigação de pagar o restante da dívida") tem natureza de direito material, e não estritamente processual, já que consagra hipótese de extinção da obrigação. Como tal, é norma que se aplica à generalidade dos contratos vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação, independentemente do procedimento adotado para a sua execução.
4. Recurso especial a que se nega provimento.
Logo, não poderia a ora Embargada ter executado toda a dívida e ainda penhorado o imóvel, porque apenas este já quita toda a dívida.
4. E o iter descrito no tópico anterior só poderia acontecer sendo a dívida líquida e certa e tendo o o Devedor negado-se a pagar as parcelas em atraso.
No presente caso, como se pode ver dos autos principais, há uma incerteza muito grande sobre o montante do saldo devedor e o montante do valor das prestações em atraso, exatamente porque os contratos firmados entre particulares e bancos, sob as regras do Sistema Financeiro da Habitação-SFH, nunca são devidamente claros e também, regra geral, o banco nunca aplica corretamente as regras contratuais e legais, relativas aos reajustes do valor da prestação e do valor do saldo devedor.
E para completar, no presente caso, existe a noticiada repactuação com o antigo banco credor(BANORTE), que não foi levada em consideração pela ora Embargada.
Ou seja, para se saber se os montantes apresentados com a ação de execução são corretos ou não, haveria necessidade da realização de uma perícia e ainda de interpretação das regras do contrato, para se chegar a um valor definitivo.
Tem-se pois, que: a)a ora Embargada não poderia executar o saldo devedor residual, porque, mesmo que não estivesse coberto por esse Fundo, ficaria o ora Embargante dele exonerado, por força do acima transcrito art. 7º da Lei nº 5.741, de 1971; b) não se sabe qual o valor das prestações em atraso.
Então, por todos os ângulos que se examine a quaestio, chega-se à segura conclusão da iliquidez e incerteza da dívida.
Conclusão
Posto isso: a) rejeito a preliminar de ilegitimidade ativa da EMGEA para a execução; b) tenho por prejudicada as demais preliminares; c) quanto ao mérito, com base no inciso I do art. 745 do Código de Processo Civil, tenho por ilíquido e incerto o título executivo em questão, pelo que julgo procedente o pedido desta ação de embargos à execução de título extrajudicial, dou a execução por extinta, ressalvando-se a cobrança de eventual crédito da ora Embargada pela via ordinária ou, após prévia liquidação na via administrativa, pela via executiva judicial, ou ainda pela execução administrativa do Decreto-lei nº 70, de 1966, observando-se, em qualquer via, os princípios do devido processo legal, ampla defesa e contraditório, sem prejuízo da aplicação do art. 7º da Lei nº 7.541, de 1971.
Outrossim, condeno a Embargada em verba honorária, que arbitro em R$ 1.000,00(hum mil reais), corrigida monetariamente a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, e com juros de mora a partir da intimação da execução desta sentença, com os índices, tanto da correção monetária como dos juros, indicados no art. 1º-F da Lei nº 9.494, de 1997, com redação dada pela Lei 11.960, de 30.06.2009.
Mantida a penhora do imóvel e a respectiva hipoteca.
P. R. I.
Recife, 10 de março de 2010.
FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
Juiz Federal da 2ª Vara-PE
Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2008.83.00.007960-0 Classe: 209 EMBARGOS À EXECUÇÃO FUNDADA EM TÍTULO EXTRAJUDICIAL
EMBGTE: A.C.J
Adv.: M. L. M., OAB/PE XXX
EMBGDO: EMGEA – EMPRESA GESTORA DE ATIVOS
Adv.: S. C. – OAB/PE XXX
Registro nº ..............................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..............
Recife, ......../2009
Sentença tipo A
Ementa: - DIREITO ECONÔMICO. SFH. EXECUÇÃO
Não é liquido, nem certo título executivo decorrente de contrato do SFH, que não leva em consideração repactuação do contrato inicial, tampouco a regra de direito material do art. 7º da Lei nº 5.741, de 1971.
Procedência.
Vistos etc.
A. C. J., qualificado nos autos, opôs, em 24/03/2008, os presentes “Embargos à Execução c/c Pedido de Reconvenção”. Alegou, em síntese, que o contrato objeto da ação de execução por título extrajudicial em apenso teria sido firmado com o BANCO BANORTE e não com a Caixa Econômica Federal e não haveria prova nos autos de que o referido contrato tenha sido repassado para a EMGEA ou para a CEF; que o referido título teria sido repactuado em 28/09/1992, pelo que o título ora apresentado não possuiria força executiva e seria nulo; que o mencionado título não teria liquidez e certeza, porque não discriminaria a forma de cálculo dos juros de mora e correção monetária; que a execução proposta pela EMGEA careceria de seus requisitos de admissibilidade, porque, com a repactuação, teria sido alterada a forma de reajuste, conforme a Cláusula Terceira da Alteração Contratual; que seria aplicável ao caso o Código de Defesa do Consumidor; que seria abusiva a prática da Embargada de cobrança de reajuste na forma diversa da contratada; que a Embargada apenas poderia cobrar dos consumidores o percentual de juros estipulados no contrato, sob pena de prática abusiva de cobrança ilegal; que, uma vez apurados os valores cobrados a maior, a Embargada deveria ser condenada a restituir os valores cobrados a maior, em dobro, deduzidos de eventual saldo devedor a ser encontrado após a adequação da planilha de cálculo efetuada pela Exequente, e se encontrados eventuais créditos em favor do Executado que sejam devolvidos em dobre os valores, devidamente corrigidos e acrescidos de juros de mora legais, ou, alternativamente e nas mesmas condições estipuladas pelo contrato; que o contrato especificaria a cobrança de juros sobre juros, “conhecido como tabela Price” (sic.), com taxa nominal de juros de 12%, correspondente à taxa efetiva de 12,683%, prática esta que seria vedada em nosso sistema. Teceu outros comentários e requereu a juntada do contrato de renegociação, dos extratos salariais da mutuária Isolda Tavares de Andrade Costa, bem como dos recibos de pagamento do referido contrato, para que se proceda ao cálculo efetivo devido ou crédito apurado, bem como planilha onde se vislumbraria que o executado teria pago a maior R$ 154.342,33. Teceu outros comentários e requereu: o recebimento dos Embargos; a apresentação, pela Embargada, dos valores cobrados a título de seguro em todas as parcelas, a partir da repactuação em 2/09/1992; que a Exequente seja compelida a apresentar o cálculo discriminado de acordo com o termo de repactuação desde 28/09/1992; que seja declarada a nulidade da cláusula contratual referente à capitalização dos juros, por falta de previsão legal; que, em caso de negativa da juntada retro mencionada, protestou pela produção de prova pericial; que a Embargada seja condenada a restituir os valores pagos a maior, em dobro, conforme acima exposto; a inversão do ônus da prova. Protestou pela realização de audiência de tentativa de conciliação e requereu a condenação da parte contrária nas verbas de sucumbência. Juntou instrumento de procuração e documentos, fls. 08/59.
Despacho recebendo os Embargos e determinando a intimação do Embargado para oferecer impugnação, fl. 61.
Às fls. 63/68, a EMGEA apresentou Impugnação argüindo preliminar de legitimidade ativa ad causam, haja vista a cessão dos créditos do BANORTE à CEF e esta última à EMGEA. Requereu, pois, que seja reconhecida sua legitimidade para figurar no pólo ativo da Execução. No mérito, alegou, em suma, que seria descabida a alegação de nulidade do título, vez que o documento juntado pelo Embargante as fls. 39/41 demonstraria que a repactuação não configuraria novação, consoante Cláusula Sétima, o que faria cair por terra a afirmação constante dos Embargos à Execução; que a Embargada teria cumprido todas as cláusulas do contrato de financiamento, aplicando os índices pertinentes à condição do mutuário; que não teria havido qualquer irregularidade na aplicação dos juros pelo agente financiador do imóvel no contrato do mutuário, e a única explicação para sua inadimplência seria a sua vontade de permanecer no imóvel sem pagar; que a liquide e certeza do crédito poderiam ser vistos no contrato firmado entre as partes e na planilha de evolução do financiamento, que registraria a evolução do referido contrato; que a taxa de juros nominal contratada seria paga mensalmente, e a efetiva seria apenas informativa, sendo que essa taxa teria sido calculada de acordo com a legislação pertinente à época; que, portanto, não haveria que se falar que a taxa de juros pactuada seria excessiva, pois esta obedeceria às regras estipuladas pelo órgão que regeria a disciplina do SFH, e não poderia a CEF/EMGEA se afastar do cumprimento das ordens emanadas daquele órgão, pelo que seriam impertinentes as afirmações lançadas pela parte adversa; que não haveria que se falar em restituição de valores porque os valores estariam sendo cobrados de acordo com o pactuado. Teceu outros comentários e pugnou pela improcedência dos Embargos à Execução e pela condenação da Embargante nas verbas de sucumbência. Juntou documentos, fls. 69/104.
À fl. 107, o Embargante levantou vício na representação processual da Embargada, por ausência de procuração e aduziu que os valores cobrados pela EMGEA/CEF teriam por base o contrato anterior que teria sido repactuado, e estaria sendo cobrado com base no contrato antigo e não no novo, razão pela qual não poderia prosperar o pedido formulado; que, no mínimo, a EMGEA deveria reformular os cálculos apresentados nos termos da repactuação firmada. Reiterou os termos dos Embargos.
Às fls. 108, decisão interlocutória rejeitando as preliminares de ilegitimidade ativa da CEF/EMGEA e de irregularidade na sua representação processual; as demais preliminares ficaram para ser apreciadas por ocasião da sentença; as partes foram intimadas para se pronunciar sobre a possibilidade de acordo.
Às fls. 111/112, a EMGEA/CEF alegou que, antes de apresentar proposta de acordo precisaria obter o valor de mercado bem como as condições atuais de conservação do imóvel ocupado pelo devedor, para tanto, o Embargante deveria pagar o valor de R$400,00 a título de tarifa de serviço para produção do laudo técnico de avaliação que servirá de parâmetro para formulação de proposta de renegociação da dívida exeqüenda; que, concluída a vistoria do imóvel, deverá o Embargante apresentar cópia do Laudo de Avaliação ao Sr. Antônio Alves de Sá Sobrinho na unidade da CAIXA/EMGEA responsável pelas demandas judiciais, a saber: GICOT/RE, situada à Praça Miguel Cervantes, nº 30, Empresarial Cervantes, 2º andar, Ilha do Leite, CEP: 50070-520, requereu, pois, a intimação do Réu para que, concordando com tais condições, providencie o cumprimento da diligência prévia, a fim de viabilizar a eventual proposta conciliatória a ser trazida aos presentes autos, para futura homologação por parte desse Juízo.
À fl. 113, a EMGEA/CEF manifestou interesse na realização da audiência de tentativa de conciliação.
Deferida a realização de audiência de tentativa de conciliação, fl. 114.
À fl. 121, Termo de Audiência de Tentativa de Conciliação registrando que não houve conciliação entre as partes, que ficaram de apresentar eventual acordo por petição. Foi juntada ao termo “PROPOSTA CAIXA/EMGEA”, fl. 122.
À fl. 125, certificado o decurso do prazo sem que a parte embargante houvesse apresentado petição de eventual acordo.
Vieram os autos conclusos para sentença.
É o relatório.
Fundamentação
Matérias Preliminares
O Embargante, levanta na petição inicial desta ação de embargos: a) ilegitimidade ativa da EMGEA para a execução, porque firmou contrato com o BANORTE e não com a Caixa Econômica Federal-CEF, tampouco com a EMGEA e que não haveria prova nos autos do repasse do primeiro para esta; b) nulidade do título, porque houvera firmado com o BANORTE uma repactuação, conforme documento que estaria juntado; c) iliquidez e incerteza.
A cessão dos créditos de contratos imobiliários do BANORTE para a Caixa Econômica Federal-CEF e desta para a EMGEA foi pública e notória, não tendo o ora Embargante registrado, na via administrativa, nenhuma oposição a essas cessões, até mesmo porque nenhum prejuízo econômico-financeiro lhe trouxe, de forma que não merece acolhida esta preliminar.
Tenho por prejudicada a preliminar de nulidade do título, porque sua análise exige adentramento no mérito e por isso essa matéria será enfrentada quando do exame deste.
Idem com referência a alegada iliquidez e incerteza.
Matérias de Mérito
1. O Embargante comprou um imóvel, financiado pelo então Banco BANORTE S/A, hoje Banco BANORTE EM LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL, que cedeu os respectivos créditos para a Caixa Econômica Federal-CEF e esta, por sua vez, fez idêntica cessão para a Empresa Gestora de Ativos, ora Embargada-exequente.
Segundo consta na petição inicial da ação de execução dos autos principais, quando referida ação foi proposta o ora Embargante estava com 74(setenta e quatro)prestações em atraso.
Segundo a petição inicial da execução dos autos principais “para a regularização do débito com a purga da mora, a dívida importa em R$ 451.344,21, cálculo válido até 03/12/07, e para a liquidação do mútuo a dívida importa em R$ 451.344,21”.
Noto que a Exequente não detalhou qual seria o montante correspondente às 74 parcelas em atraso, pelo que concluo que optou pela execução da integralidade do contrato, como permitido pela respectiva cláusula décima segunda(v. fl. 16 dos autos principais).
Noto também que a Exequente preferiu propor a execução com base em artigos do Código de Processo Civil, ou seja, não se utilizou dos procedimentos da Lei nº 5.741, de 01.12.1971, que dispõe sobre a proteção do financiamento de bens imóveis vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação, opção essa permitida por essa Lei e pelo contrato(v. cláusula décima terceira deste, à fl. 16 dos autos principais).
2. Alega o Embargante não caber a execução, por ser ilíquida e incerta a dívida e por haver excesso de excecução, porque teria havido desrespeito à repactuação que firmara com o BANORTE, ferimento a regras do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, aprovado pela Lei nº 8.078, de 11.09.1990, aplicação de juros capitalizados, o que seria ilegal e não apresentação demonstrativo dos valores que já teriam sido pagos.
2.1) O crédito em execução nos autos principais é realmente ilíquido e incerto, pois a Exeqüente não levou em consideração a repactuação do contrato firmado entre o ora Embargante e o BANORTE, repactuação essa comprovada às fls. 09-11 destes autos.
2.2) A Exeqüente também não atentou para as regras do art. 7º da Lei nº 5.741, de 1971.
A opção da ora Embargada de propor a execução pelas regras do Código de Processo Civil e não pelas regras da mencionada Lei nº 5.741, de 1971, não afasta a obrigatoriedade de observar-se a parte de direito material consignada nesta Lei, especialmente a do referido art. 7º, segundo a qual, caso o Devedor não pague a dívida, perde o imóvel hipotecado e fica exonerado do restante da dívida, verbis:
Art . 7º Não havendo licitante na praça pública, o Juiz adjudicará, dentro de quarenta e oito horas, ao exeqüente o imóvel hipotecado, ficando exonerado o executado da obrigação de pagar o restante da dívida.
E nesse sentido há inúmeras r. decisões do E. Superior Tribunal de Justiça, das quais destaco a que segue:
DIREITO ECONÔMICO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. EXECUÇÃO JUDICIAL DO CONTRATO PARA AQUISIÇÃO DE IMÓVEL. ARREMATAÇÃO DO IMÓVEL PELO CREDOR POR PREÇO INFERIOR AO DA DÍVIDA EXEQÜENDA. EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO REMANESCENTE.
1. A Lei n. 5741/71, que disciplina a cobrança de crédito hipotecário para financiamento da casa própria vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação, faculta ao credor adotar o outro procedimento para execução da dívida, além daquele nela previsto (art. 1º).
2. Todavia, a opção de procedimento eleita pelo credor não importa modificação das normas de direito material, que são as mesmas em qualquer hipótese.
3. A disposição normativa do art. 7º da Lei 5.741/71 (segundo a qual, com a adjudicação do imóvel pelo exeqüente, fica "exonerado o executado da obrigação de pagar o restante da dívida") tem natureza de direito material, e não estritamente processual, já que consagra hipótese de extinção da obrigação. Como tal, é norma que se aplica à generalidade dos contratos vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação, independentemente do procedimento adotado para a sua execução.
4. Recurso especial a que se nega provimento.
Logo, não poderia a ora Embargada ter executado toda a dívida e ainda penhorado o imóvel, porque apenas este já quita toda a dívida.
4. E o iter descrito no tópico anterior só poderia acontecer sendo a dívida líquida e certa e tendo o o Devedor negado-se a pagar as parcelas em atraso.
No presente caso, como se pode ver dos autos principais, há uma incerteza muito grande sobre o montante do saldo devedor e o montante do valor das prestações em atraso, exatamente porque os contratos firmados entre particulares e bancos, sob as regras do Sistema Financeiro da Habitação-SFH, nunca são devidamente claros e também, regra geral, o banco nunca aplica corretamente as regras contratuais e legais, relativas aos reajustes do valor da prestação e do valor do saldo devedor.
E para completar, no presente caso, existe a noticiada repactuação com o antigo banco credor(BANORTE), que não foi levada em consideração pela ora Embargada.
Ou seja, para se saber se os montantes apresentados com a ação de execução são corretos ou não, haveria necessidade da realização de uma perícia e ainda de interpretação das regras do contrato, para se chegar a um valor definitivo.
Tem-se pois, que: a)a ora Embargada não poderia executar o saldo devedor residual, porque, mesmo que não estivesse coberto por esse Fundo, ficaria o ora Embargante dele exonerado, por força do acima transcrito art. 7º da Lei nº 5.741, de 1971; b) não se sabe qual o valor das prestações em atraso.
Então, por todos os ângulos que se examine a quaestio, chega-se à segura conclusão da iliquidez e incerteza da dívida.
Conclusão
Posto isso: a) rejeito a preliminar de ilegitimidade ativa da EMGEA para a execução; b) tenho por prejudicada as demais preliminares; c) quanto ao mérito, com base no inciso I do art. 745 do Código de Processo Civil, tenho por ilíquido e incerto o título executivo em questão, pelo que julgo procedente o pedido desta ação de embargos à execução de título extrajudicial, dou a execução por extinta, ressalvando-se a cobrança de eventual crédito da ora Embargada pela via ordinária ou, após prévia liquidação na via administrativa, pela via executiva judicial, ou ainda pela execução administrativa do Decreto-lei nº 70, de 1966, observando-se, em qualquer via, os princípios do devido processo legal, ampla defesa e contraditório, sem prejuízo da aplicação do art. 7º da Lei nº 7.541, de 1971.
Outrossim, condeno a Embargada em verba honorária, que arbitro em R$ 1.000,00(hum mil reais), corrigida monetariamente a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, e com juros de mora a partir da intimação da execução desta sentença, com os índices, tanto da correção monetária como dos juros, indicados no art. 1º-F da Lei nº 9.494, de 1997, com redação dada pela Lei 11.960, de 30.06.2009.
Mantida a penhora do imóvel e a respectiva hipoteca.
P. R. I.
Recife, 10 de março de 2010.
FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
Juiz Federal da 2ª Vara-PE
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