terça-feira, 18 de junho de 2013

PRESCRIÇÃO CIVIL. CRÉDITO BANCÁRIO ROTATIVO. HIPÓTESE DE APLICAÇÃO DO NOVO CÓDIGO CIVIL DO BRAISL.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.

Na sentença que segue, enfrenta-se questão de direito intertemporal relativa à aplicação de prazo prescricional do novo Código Civil brasileiro, do ano de 2002, à dívida vencida antes do seu advento.
 
A pesquisa jurisprudencial foi efetuada pela Assessora Luciana Simões C. Albuquerque.
 
Boa leitura.  
 

 

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA

 

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 0013153-36.2012.4.05.8300  Classe: 28 - AÇÃO MONITÓRIA

AUTORA: C E F

Advogado: R P B de A

RÉU: M N S

Advogado: M N

 

Registro nº ...........................................

Certifico que eu, ..................,  registrei esta Sentença às fls..........

Recife, ...../...../2013

 

Sentença tipo A

 

Ementa: - DIREITO COMERCIAL, CIVIL E BANCÁRIO. CONTRATO DE CRÉDITO ROTATIVO. PRESCRIÇÃO.

 

-É líquida, sem o atributo da executividade, a dívida decorrente de contrato bancário de crédito rotativo.

 

-A fluência do prazo de prescrição de crédito da Entidade Bancária, decorrente de dívida de contrato de crédito rotativo, inicia-se no dia seguinte à existência de débito que deixou de ser pago.

 

-Acolhimento da exceção de prescrição

 

Vistos etc.

 

1.      Breve Relatório

 

Trata-se de Ação Monitória ajuizada pela C E F, em face de M N S, qualificado na Inicial.  Aduziu, em síntese, que: o Requerente, através de sua agência, teria celebrado com o Requerido um contrato de Abertura de Conta e de Produtos e Serviços, onde estaria previsto um contrato de crédito rotativo de nº 15.0045.195.003188258-5, sendo disponibilizado na mesma data, na conta-corrente do Requerido, um limite de crédito de R$10.000,00, estando em situação de inadimplência desde 04/09/2006, de acordo com o demonstrativo em anexo; o Requerido teria utilizado efetivamente os créditos dos financiamentos concedidos, deixando, contudo, de efetuar os pagamentos das parcelas mensais, em montante idôneo ao valor utilizado e dos respectivos encargos, ensejando os vencimentos antecipados, conforme expresso nas cláusulas pactuadas nos aludidos contratos; os extratos analíticos acostados representariam e espelhariam toda a movimentação financeira, oriunda dos tipos de operações contratadas, ocorridas na conta do Requerido, onde constariam, inclusive, os excessos no limite praticados, bem como as devoluções de cheques havidas por insuficiência de saldo credor em conta corrente; conforme demonstrativos de débitos acostados, a soma dos débitos inadimplidos pelo Requerido, até 26/06/2012, totalizaria R$22.580,57; a Requerente teria desenvolvido, sem sucesso, todos os esforços necessários à recuperação do seu crédito pelas vias administrativas, não restando outra alternativa senão, com base nos documentos que instruem essa peça, buscar a tutela do Judiciário.  Teceu outros comentários.  Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos (fls. 60-20).

Custas recolhidas às fls. 21.

Determinada a citação (fl. 23), o Réu ofertou Embargos Monitórios(fl.28), suscitando, prejudicialmente, prescrição quinquenal, eis que a inadimplência datara de 04.06.2006. No mérito, mencionou que: não conseguira saldar os débitos em face de dificuldades financeiras; para quitar a dívida, estaria oferecendo como pagamento do veículo, descrito na petição e ainda os valores investidos na C VIDA E PREVIDÊNCIA. Teceu outros comentários. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos (fl.29).

A C E F apresentou Impugnação aos Embargos Monitórios.  Alegou, em sede de prejudicial, inocorrência da prescrição, eis que o contrato que não constitui uma obrigação líquida, e, por essa razão, não seja título executivo, estaria sujeito ao prazo prescricional de 10 (dez) anos, previsto no art. 205, caput do Código Civil brasileiro; o vencimento antecipado da dívida não poderia lastrear o termo inicial da prescrição. Teceu comentários sobre a atividade bancária e do equilíbrio econômico-financeiro das atividades; os contratos teriam força obrigacional; o Embargante deveria ser intimado a comparecer a uma agência onde fora pactuado o contrato, visando obter, pessoalmente, condições atuais de pagamento/parcelamento do débito exequendo e da desnecessidade de perícia contábil.

Embargos recebidos e determinada a intimação da parte ré acerca da Impugnação (fl. 37).

Certidão de decurso de prazo sem manifestação da parte Embargada (fl. 38-vº).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

 

2.      Fundamentação


Examinemos, em primeiro lugar, a exceção de prescrição, levantada pelo Devedor nos embargos monitórios de fl. 28.

Nessa peça de defesa, o Devedor levantou exceção de prescrição quinquenal,  prevista no inciso I do § 5º do art. 206 do atual Código Civil, eis que, entre a sua inadimplência, datada de 04.09.2006, e a o ajuizamento da presente Ação Monitória, teria transcorrido prazo superior a 5 (cinco) anos.

 

A C E F alega que ao caso não se aplica o prazo do mencionado dispositivo do novo Código Civil brasileiro, mas sim o prazo do art. 205 do desse Código, porque a dívida do Devedor, ora Réu-Embargante,  não seria líquida, mas sim ilíquida.

 

Data venia, tenho que a C E F não está com a razão, porque a dívida em questão é líquida e certa, como líquido e certo é o crédito dela decorrente, crédito esse que apenas não goza do atributo de executividade, e é por isso que está sendo cobrada via ação monitória.

 

Aliás, conforme se extrai do art. 1.102-A do código de processo civil,  utiliza-se desse tipo de ação todo Credor que pretende receber o pagamento de soma em dinheiro, sem força executiva, mas em valor líquido, pois se não fosse líquido teria que se utilizar de ação de conhecimento.

Resta, examinar, se o crédito em questão estava realmente prescrito, quando da propositura desta ação.

 
Trata-se de contrato bancário de crédito rotativo que, segundo o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça, não goza do atributo de executividade(Súmulas 233 e 247 desse E. Tribunal), embora gere dívida líquida e certa.

 

É tanto que a C E F, conforme consta da sua petição inicial,  está a cobrar do ora Réu o valor de R$ 22.508,57, em decorrência de não pagamento desde 04.09.2006, tendo inclusive instruído mencionada peça com demonstrativo de crédito, acostado à fl. 12 dos autos, onde realmente consta que a inadimplência deu-se a partir da referida data.

 

Logo, o prazo prescricional de cinco anos passou a fluir a partir de 05.09.2006, tendo se completado em 05.09.2011, de forma que quando a C E F propôs esta ação monitória, em 23.07.2012(v. fl. 02), a sua pretensão de exigir[1] o seu crédito já se encontrava fulminada pela prescrição quinquenal, prevista no invocado inciso I do § 1º do art. 206 do vigente Código Civil.

 

         E realmente aplica-se, neste caso, o prazo desse dispositivo do novo Código Civil, porque, levando-se em consideração as regras de direito intertemporal do seu art. 2.028(“Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor[2], já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”), verifica-se que, quando esta ação foi proposta, em 23.07.2012(v. fl. 02), a partir do dia seguinte ao vencimento da dívida, qual seja, a partir de 05.09.2006 até 23.07.2012 ainda não havia transcorrido “mais da metade do tempo estabelecido” na Lei revogada que, para o caso concreto, era o art. 177 do revogado Código Civil de 1916[3], o qual fixava o prazo de 20(vinte)anos para ações pessoais. Realmente, note-se que entre 05.09.2006 e 23.07.2012 ainda não havia transcorrido o período de 10(dez)anos e 1(um)dia, que seria “mais da metade do tempo estabelecido”  da Lei revogada.  

 

         E também não é possível aplicar o prazo de 10(dez)anos do art. 205 do novo Código Civil, como pretendido pela Caixa Econômica Federal-CEF na sua impugnação aos embargos monitórios,  porque esse prazo só se aplica para casos em que não haja, nesse novo Código, nem em Lei extravagante, um prazo específico.

 

            Ora, como demonstrado, para o caso concreto há regra legal específica, o acima invocado inciso I do § 1º do art. 206 do novo Código Civil, que fixa prazo específico de 5(cinco)anos.

 

Então, como já dito acima, quando a C E F propôs esta ação, em 23.07.2012, sua pretensão de exigir o crédito em questão já tinha sido fulminada pela prescrição quinquenal, porque já transcorridos cinco anos entre o início da fluência do prazo prescricional(05.09.2006)e a referida data(23.07.2012).

 

           Nesse sentido vem se firmando a jurisprudência do E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, conforme r. julgados que seguem:

 

CIVIL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. PRESCRIÇÃO. CRÉDITO LÍQUIDO. INSTRUMENTO PARTICULAR. ARTS. 206, PARÁGRAFO 5º, INCISO I E 2.028 DO CÓDIGO CIVIL. ACOLHIMENTO DA PREJUDICIAL DE MÉRITO.

1. Cinge-se a controvérsia recursal à insurgência da Caixa Econômica Federal em face de sentença judicial singular que nos autos de ação monitória, extinguiu o processo com julgamento do mérito, acolhendo a prejudicial de prescrição, a teor do art. 209, inciso IV do CPC.

2. O prazo prescricional quando se pretende a cobrança de débito referente à inadimplência de contrato de crédito rotativo, tratando-se, pois, de cobrança de dívida líquida constante no instrumento contratual firmado entre as partes, deve ser quinquenal, nos termos do art. 206, parágrafo 5º, I, do Código Civil.

3. O art. 2.028 do Código Civil é expresso ao invocar a possibilidade de aplicação do prazo anterior, reduzido pelo novo, quando apenas tiver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada, quando seria aplicável à hipótese fática o art. 177 que previa um prazo de 20 (vinte) anos.

4. Entretanto, considerando que na hipótese fática apresentada a inadimplência se efetivou em 07.12.2002, no dia de entrada em vigor do Novo Código Civil, 11 de janeiro de 2003, que reduziu o prazo de prescrição para cobrança de crédito líquido contratual para 5 anos, não havia sequer transcorrido do prazo anterior, em face do que a inovação legislativa deve ser aplicada.

5. Considerando que o termo inicial da inadimplência se efetivou em 07.12.2002 e tendo a ação monitória sido proposta em 18.12.2007, há de se verificar o transcurso de mais de cinco anos, tendo prescrevido a pretensão de cobrança.

6. Apelação da Caixa Econômica Federal conhecida, mas não provida.

(PROCESSO: 200780000081760, AC493502/AL, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, JULGAMENTO: 15/06/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 22/06/2010 - Página 227)

 

ROTATIVO. INEXISTÊNCIA DE CITAÇÃO VÁLIDA. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.

1.  A CEF ajuizou ação monitória objetivando a cobrança de dívida no valor de R$23.385,06, resultante de Contrato de Crédito Rotativo Cheque Azul firmado com os promovidos.

2. Inexistência de citação válida, eis que os réus não foram encontrados nos endereços indicados e a CEF não requereu a citação por edital, razão pela qual continuou a fluir o prazo prescricional, nos termos do art. 219, parágrafo 4º, do CPC.

3. No tocante à prescrição, o art. 177 do Código Civil de 1916 previa o prazo prescricional de 20 anos para as ações pessoais. Ocorre que esse prazo foi reduzido pelo novo Código Civil, restando ressalvados os casos em que já houvesse transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada quando da entrada em vigor do novo diploma legal, conforme estabelecido no art. 2.028, do Código Civil de 2002.

4.  In casu, na data da entrada em vigor do Código Civil de 2002 (11/01/2003) ainda não havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional, devendo ser observadas, por conseguinte, as disposições constantes desse diploma normativo.

5. Consoante art. 206, parágrafo 5º, I, do Código Civil, é de 5 (cinco) anos o prazo para cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular.

6. Considerando que transcorreram mais de cinco anos da data da vigência do Código Civil de 2002 (11/01/2003) sem que houvesse sido efetivada a citação interruptiva do prazo prescricional, impõe-se reconhecer a prescrição da pretensão autoral.

7. Apelação improvida.(PROCESSO: 200481000209704, AC489733/CE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 03/05/2012, PUBLICAÇÃO: DJE 11/05/2012 - Página 157) (original sem grifos).

 

3.      Conclusão

 

POSTO ISSO:

a)                       acolho a exceção de prescrição da pretensão da C E F de exigir o crédito em debate, exceção essa levantada pelo Embargante nos embargos monitórios,  e dou este processo por extinto, com resolução do mérito(art. 269-IV do Código de Processo Civil);

b)                      condeno a C E F nas custas processuais e em verba honorária que arbitro em 10%(dez por cento)sobre o valor da causa, valor esse que será atualizado, a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, pelos índices de correção monetária do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal, e acrescido de juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento)ao mês, contados todavia apenas da intimação da execução desta sentença, na forma preconizada no art. 475-J do Código de Processo Civil, mas incidentes sobre o valor já monetariamente atualizado.

P.R.I.

 

Recife,  18 de junho de 2013.

 

 

Francisco Alves dos Santos Júnior

  Juiz Federal, 2ª Vara-PE



[1] O que prescreve é a pretensão de exigir, conforme art. 189 do novo Código Civil do Brasil, o qual, neste particular, seguiu o Código Civil alemão. O crédito persiste, é tanto que, caso o Devedor, por mera liberalidade, queira pagá-lo, nada o impede de fazê-lo. Todavia, o Credor não pode exigir, porque o crédito persiste sem o atributo da exigibilidade. Mesmo antes do atual Código Civil, que é de 2002, sustentamos esse ponto de vista em nossa dissertação de mestrado na Faculdade de Direito do Recife da Universidade Federal de Pernambuco(FDRUFPE), que foi publicada em livro, sob o título de Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil: análise das principais teorias existentes e proposta para alteração da respectiva legislação. Rio de Janeiro, Renovar, 2001, encontrando-se o assunto na sua p. 48.
 
[2] O novo Código Civil do Brasil, que é de 2002, por força do seu art. 2044, entrou em vigor em 12.01.2003, qual seja, um ano depois da sua publicação, que se deu em 11.01.2013.
 
[3] Código Civil de 1916:
  “Art. 177. As ações pessoais prescrevem, ordinàriamente, em vinte anos, as reais em dez, entre presentes e entre ausentes, em quinze, contados da data em que poderiam ter sido propostas.”.
 
 

segunda-feira, 17 de junho de 2013

ENSINO SUPERIOR PRIVADO. TAXAS QUE NÃO PODEM SER COBRADAS DOS ALUNOS.


 
Por Francisco Alves dos Santos Jr

   Segue decisão, lançada nos autos de uma ação civil pública, proposta pelo Ministério Público Federal de Pernambuco contra a determinada Entidade privada de Ensino Superior, buscando proibir esta de cobrar dos seus alunos determinadas taxas não previstas em Lei e cujos respectivos serviços já têm seus custos cobertos pelas mensalidades ou semestralidades pagas pelos alunos.
   Na decisão, indica-se também o que pode ser cobrado à parte, além das mensalidades ou semestralidades.
    Boa leitura!



PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2ª VARA

 

Processo nº 0005792-31.2013.4.05.8300

Classe:    1 AÇÃO CIVIL PÚBLICA

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RÉU: A V I DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA

 

C O N C L U S Ã O

 

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

 

Recife, 13/06/2013

 

Encarregado(a) do Setor

 

 

D E C I S Ã O

 

1-                   Relatório

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ingressou com esta “AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR” em face da A V DO IDE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE J L F DE CIÊNCIAS APLICADAS). Alegou, em síntese, que em 13.03.2013, teria sido instaurado na Procuradoria da República em Pernambuco o Procedimento Administrativo nº 1.26.000.000766/2013-55, com a finalidade de apurar possíveis irregularidades cometidas pela Instituição de Ensino Superior Faculdade J L F de Ciências Aplicadas, no que diz respeito à cobrança de taxas para expedição de documentos escolares, assim como para a realização de outras medidas inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada; que a Faculdade José Lacerda Filho de Ciências Aplicadas teria confirmado que, de fato, cobraria as taxas internas de seus alunos, contudo, teria ressaltado que a cobrança estaria prevista no Contrato de Prestação de Serviços Educacionais. Sustentou a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público Federal e o cabimento da presente ação civil pública, assim como a competência da Justiça Federal para apreciar e julgar o presente feito, e aduziu que a natureza de ente privado, por si só, não seria hábil para excluir a demandada da incidência das normas constitucionais e legais, tampouco o fundamento de que a livre iniciativa lhe permitiria escapar dos regramentos impostos pelas normas legais da educação nacional, cujo cumprimento seria condição para que o serviço educacional fosse prestado no âmbito da iniciativa privada; que a cobrança de taxas para a emissão de documentos acadêmicos, assim como para a realização de outros serviços também inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada, é pratica que não se coadunaria com a legislação vigente; que os serviços prestados por uma Instituição de Ensino Superior – IES, via de regra, seriam remunerados pelas anuidades, semestralidades ou mensalidades, e deveriam estar obrigatoriamente inclusos na referida contraprestação todos os serviços inerentes ao objetivo da prestação escolar; que a Lei nº 9.870/99 teria revogado a Lei nº 8.170/91, que preveria a existência e o modo de fixação dos encargos educacionais nos estabelecimentos particulares de ensino de nível pré-escolar, fundamental, médio e superior, e estipulava a forma de reajuste, e autorizava a intervenção da Delegacia Regional do MEC; que, se a nova lei revogou a anterior e passou a prever, como forma de remuneração das IESs apenas as anuidades e a semestralidades, seria evidente o propósito do legislador de extinguir os encargos educacionais antes existentes; que, no mesmo sentido estariam inclinadas as Resoluções nºs 01/83 e 03/89, editadas pelo extinto Conselho Federal de Educação, que, ao tratar dos encargos pagos aos alunos às IESs, preconizariam que a anuidade/mensalidade escolar constituiria a contraprestação pecuniária correspondente à educação ministrada e à prestação de serviço a ela diretamente vinculados, enquanto a taxa escolar remuneraria, a preço de custo, apenas os serviços extraordinários efetivamente prestados pelo corpo discente; que apesar de tais resoluções terem sido revogadas pelo Conselho Nacional de Educação, permaneceriam íntegros os balizamentos postos à disciplina das taxas cobradas pelas IESs; que seria inconstitucional a cobrança de taxa para emissão de certidões que visam esclarecer situações de interesse pessoal; que também seria inadequada a cobrança de taxa para prestação de outros serviços inerentes à prestação educacional, como a realização de segunda chamada, quando motivada pro fatores excepcionais (saúde, por exemplo), que impediram o aluno de se submeter ao exame regular; que o mesmo raciocínio seria aplicável à revisão de prova, que constituiria um direito do aluno e seria inerente à prestação do serviço de ensino; que a cobrança de taxa pela transferência do aluno da IES seria expressamente vedada pela Portaria nº 230/2007 do MEC; que os preços cobrados seriam desproporcionais ao serviço prestado. Invocou o Código de Defesa do Consumidor e acrescentou que a previsão contratual de cobrança das taxas referidas seria nula de pleno direito. Transcreveu ementas de decisões judiciais. Teceu outros comentários, e requereu a concessão da medida liminar para que seja determinado à Ré que: suspenda imediatamente a cobrança de qualquer tipo de prestação pecuniária, como condição para emissão de documentos escolares, como ementa de disciplina, declaração de vínculo, histórico escolar, certidão de notas, declaração de conclusão de curso, declaração de regime de aprovação, declaração de frequência, declaração de aprovação no vestibular, declaração de horário de prova, declaração de quitação de mensalidades, dentre outros documentos que constituem decorrência lógica da prestação educacional, assim como para a realização de outros serviços também inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada, tais como realização de segunda chamada, revisão de prova, dentre outros. A petição inicial veio acompanhada de duas pastas: uma pasta da cor amarela contendo o Inquérito Civil nº 018/2011 (Peças de Informação) e a outra pasta da cor branca contendo o IC nº 018/2011.

 

2-                   Fundamentação

 

2.1) O Ministério Público Federal pretende compelir a A V I DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE J L F DE CIÊNCIAS APLICADAS), a cumprir obrigação de não fazer, consistente na abstenção de cobrança de taxas de seus discentes, a exemplo dos valores exigidos para a expedição de declaração de conclusão de curso, histórico escolar, revisão de prova, e outros que constituam decorrência lógica da prestação educacional.

 

2.2) A Resolução nº 01/83 e também a Resolução nº 03/89, ambas do ora extinto Conselho Federal de Educação (atual Conselho Nacional de Educação), evocadas na Petição Inicial desta ACP, definem os encargos educacionais do corpo discente das Instituições de Ensino Superior, nos seguintes termos:

 

Resolução nº 01, de 1983:

 

Art. 2º. Constituem encargos educacionais de responsabilidade do corpo discente:

I – a anuidade;

(...) § 1º. A anuidade escolar, desdobrada em 2 (duas) semestralidades, constitui a contraprestação pecuniária correspondente à educação ministrada e à prestação de serviços a ela diretamente vinculados, como a matrícula, estágios obrigatórios, utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino e uso coletivo, material destinado a provas e exames, 1ª via de documentos para fins de transferência, certificados ou diplomas (modelo oficial) de conclusão de curso, de identidade estudantil, de boletins de notas, de cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas.

 

     Resolução nº 03, de 1989:

 

Art. 4º. Constituem encargos educacionais de responsabilidade do corpo discente:

I – a mensalidade

II- a taxa

III- a contribuição.

 

 (...) § 1º. A mensalidade escolar constitui a contraprestação pecuniária, correspondente à educação ministrada e à prestação de serviços a ela diretamente vinculados como matrícula, estágios obrigatórios, utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino de uso coletivo, material destinado a provas e exames, de certificados de conclusão de cursos, de identidade estudantil, de boletins de notas, cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas.

 

Tratou também do assunto, mais recentemente, a Portaria Normativa nº 40[1], de 12 de dezembro de 2007, expedida pelo Ministro de Estado da Educação, no §4º do seu art. 32, proíbe que as IES exijam pagamento pela expedição e registro de diplomas e de certificados de conclusão de cursos, por considerar tais serviços incluídos nos serviços educacionais prestados pelas Instituições de Ensino, verbis:

 

§ 4º A expedição do diploma e histórico escolar final considera-se incluída nos serviços educacionais prestados pela  instituição, não ensejando a cobrança de qualquer valor, ressalvada a hipótese de apresentação decorativa, com a utilização de papel ou tratamento gráfico especiais, por opção do aluno.

 

Também recentemente, a Portaria nº 230[2], de 9 de março de 2007, expedida pelo  Ministro de Estado da Educação, no seu art. 2º, veda a cobrança de taxa de matrícula como condição para apreciação e pedidos de emissão de documentos de transferência para outras instituições.

 

Portanto, à luz das Resoluções nºs 01/83 e 03/89, ambas do ora extinto Conselho Federal de Educação, e, ainda, da Portaria Normativa nº 40 e da Portaria nº 230, estas duas últimas do Ministro de Estado da Educação, não podem ser cobrados do corpo discente da ASSOCIAÇÃO VALE IPOJUCA DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (Faculdade José Lacerda Filho de Ciências Aplicadas): o pagamento pela expedição de diploma, expedição de histórico escolar, utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino de uso coletivo, material destinado a provas e exames, 1ª via de documentos para fins de transferência de certificados ou diplomas (modelo oficial) de conclusão de curso, de identidade estudantil, de boletins de notas, de cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas, bem como a taxa de matrícula como condição para apreciação e pedidos de emissão de documentos de transferência para outras instituições.

 

Também não pode ser cobrada dos alunos taxa para realização de exames finais, porque esses exames fazem parte da regular atividade de qualquer estabelecimento de ensino, sendo, por isso, coberto pela mensalidade ou anuidade paga pelo Aluno.

    

2.3.)  As taxas e encargos que podem ser cobrados à margem da mensalidade ou anuidade encontram-se arrolados no § 2º do art. 4º da Resolução nº 03, de 1989, verbis:

 

§2º A taxa escolar remunera, a preços de custos, os serviços extraordinários efetivamente prestados ao corpo discente como a segunda chamada de provas e exames, declarações, e de outros documentos não incluídos no §1º deste artigo, atividades extracurriculares optativas, bem como os estudos de recuperação, adaptação e dependência prestados em horários especiais com remuneração específica para os professores. (G.N.)

     

Acresce o rol desse dispositivo também: os diplomas ou certificados expedidos em modelos não oficiais, decorrentes de escolha do aluno(tais como, em papeis decorativos, em coro de carneiro etc.) e as segundas vias dos documentos relacionados nos dispositivos transcritos no item 2.2 supra. 

        

2.4) Como visto, a mensalidade ou anuidade remunera os chamados serviços ordinários, mencionados no subitem 2.2 supra e a taxa escolar, os serviços extraordinários,  referidos no subitem 2.3 supra.

 

2.5) O E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região e, mais recentemente, o E. Tribunal Regional Federal da 1ª Região, ao apreciar pleitos semelhantes ao veiculado na Petição Inicial, com esteio nas Resoluções acima transcritas, reconheceram a ilegitimidade da cobrança da taxa de emissão de histórico escolar e do certificado de conclusão de curso pelas IES, sob o argumento principal de que tais documentos constituem serviços ordinários e vinculados à atividade educativa, já remunerados pelas mensalidades pagas pelos discentes, verbis: 

 

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DE TAXA PARA EMISSÃO DE HISTÓRICO ESCOLAR E ATESTADO DE CONCLUSÃO DE CURSO. ILEGITIMIDADE. 1. Revela-se ilegítima a cobrança por universidade de taxa para a expedição de histórico escolar e atestado de conclusão de curso. Inteligência das Resoluções 01/83 e 03/89, ambas do Conselho Federal de Educação. Precedentes desta Corte. 2. Remessa oficial desprovida. (REOMS 200738110048768, DESEMBARGADOR FEDERAL FAGUNDES DE DEUS, TRF1 - QUINTA TURMA, 09/07/2010)

 

ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. UNIVERSIDADE PRIVADA. HISTÓRICO ESCOLAR. TAXA. ISENÇÃO. PROCEDÊNCIA.- A despesa realizada pelo aluno com o histórico escolar está definida no parágrafo 1º do art. 4º da Resolução nº 3, de 3.10.1989 do Conselho Federal de Educação, como despesa ordinária, e como tal, incluída já no valor das mensalidades escolares cobradas pela Universidade.- Remessa oficial improvida. (REO 200283000105384, Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante, TRF5 - Primeira Turma, 15/10/2004)

 

Conclusão

 

Posto isso:

 

a) defiro, parcialmente, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, e determino que a ASSOCIAÇÃO VALE DO IPOJUCA DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE JOSÉ LACERDA FILHO DE CIÊNCIAS APLICADAS), ora Ré,  cobre dos seus Alunos apenas a anuidade ou as semestralidades, e que suspenda a cobrança de qualquer outro valor ou encargo, tais como valor para expedição de diploma no impresso e no modelo oficial, certidões em geral, inclusive a de conclusão de curso, revisão de prova ou exame, grade curricular, isenção de disciplina, conteúdo programático, guia de transferência, segunda chamada, provas finais e de quaisquer outros documentos ou serviços próprios de Estabelecimentos de Ensino Superior,  podendo ser cobrado, todavia, à parte, encargo ou valor, correspondente ao custo(entendendo-se como tal o total dos gastos que a Entidade de Ensino teve para adquiri-lo e para fornecê-lo), de diploma em impresso e/ou em modelo diverso do oficial(como em pele de carneiro, cartolina dourada,  etc.), a repetição de quaisquer documentos(segunda via) ou serviços, tanto dos  dados como exemplo ou a duplicidade de outros documentos ou serviços que não tenham sido arrolados entre os exemplos indicados e que sejam próprios dos fornecidos ou prestados por esse tipo de Estabelecimento de ensino, sob pena de exigência de multa, no valor correspondente a 100%(cem por cento)do valor indevidamente cobrado, que será majorada em 10%(dez por cento) sempre que houver reincidência, conforme preconizado no ar. 57 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, aprovado pela Lei nº 8.078, de 11.09.1990, multa essa que será destinada ao Fundo Federal, previsto no art. 13 da Lei nº 7.347, de 1985, sem prejuízo da responsabilização criminal dos Dirigentes da Associação ora Ré e de esta poder vir a sofrer as sanções administrativas do art. 56 daquele Código e também sem prejuízo do direito de o aluno ou pessoa por ele responsável, que tenha pago o valor indevido, reclamar e receber a restituição em dobro desse valor, na forma preconizada no Parágrafo Único do art. 42 do referido Código.

 

b) Cite-se e Intimem-se, na forma e para os fins legais.

 

P.I.

 

Recife, 17 de junho de 2013

 

 

Francisco Alves dos Santos Júnior

     Juiz Federal, 2ª Vara/PE

segunda-feira, 10 de junho de 2013

DIREITO TRIBUTÁRIO: DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO NA REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TRIBUTOS INDEVIDAMENTE PAGOS E SUBMETIDOS AO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

 

Firmou-se, no Superior Tribunal de Justiça-STJ, o entendimento segundo o qual a prescrição de crédito na repetição de indébito de tributo submetido a lançamento por homologação, indevidamente pago, por força da interpretação sistemática do inciso I do art. 168 e do inciso VII do art. 156, todos do Código Tributário Nacional – CTN,  só se iniciaria após a extinção do crédito tributário, que, como se sabe, pelo dispositivo legal por último referido(o inciso VII do art. 156 do Código Tributário Nacional – CTN), relativamente a tributos que se submetem a esse tipo de lançamento, só ocorre com a concretização da homologação desse lançamento, seja expressa ou tácita e não apenas pelo pagamento que, nessa hipótese, segundo o § 4º do art. 150 do referido Código, é resolúvel.  

E a Fazenda Pública, conforme o dispositivo legal por último mencionado,  tem o prazo decadencial de cinco anos para essa homologação, contado da data do fato gerador.

Como, regra geral, a Fazenda Pública silencia, ou seja, não faz a homologação expressa, concretiza-se a homologação tácita, no final desse prazo de cinco anos.

Daí, então, segundo a jurisprudência desse E. Tribunal, o prazo prescricional para o Contribuinte requerer a restituição de tributo,  indevidamente pago, só começaria a fluir a partir desse momento.

E por isso se dizia que, segundo o Superior Tribunal de Justiça-STJ, o contribuinte teria 5(cinco)anos(para a Fazenda Pública homologar e finalizar o lançamento) + 5(cinco)anos para o Contribuinte repetir(pedir a restituição), entendimento esse que se popularizou como “teoria dos cinco + cinco’.(1).
 

    Nota 1 - BRASIL. Superior Tribunal de Justiça-STJ. 1ª Seção. Embargos em Recurso Especial –ERESP nº 435.835/SC. Relator, para o acórdão,  Ministro José Augusto Delgado. Julgamento em 24.03.2004.[maioria]. Apud Superior Tribunal de Justiça-STJ, 1ª Turma,  Recurso Especial nº 714397, 2005/0005493-3, Relator Ministro Teori Zavascki, julgamento em 12.04.2005, Diário da Justiça de 02.05.2005, p. 236. 

    Então, veio à luz a Lei Complementar nº 118, de 09.02.2005, publicada no Diário Oficial da União de 09.02.2005, tendo entrado em vigor 120 dias após sua publicação, cujo art. 4º estabeleceu que o seu art. 3º teria efeito retroativo.

     A razio iuris desse art. 4º estaria no fato de que mencionado art. 3º teria caráter interpretativo e por isso, ante a regra do inciso I do art. 106 do Código Tributário Nacional – CTN, o seu efeito seria retroativo à data da entrada em vigor desse Código.

    Para melhor clareza, eis a redação desses dispositivos da Lei Complementar nº 118, de 2005:

    “Art. 3o Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1o do art. 150 da referida Lei.

      Art. 4o Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3o, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional.”.

O inciso I do art. 106 do Código Tributário Nacional estabelece que as Leis interpretativas retroagem à data da entrada em vigor da Lei que está sendo interpretada.

Mencionados dispositivos legais vieram à luz para se antepor ao entendimento acima resumido do Superior Tribunal de Justiça – STJ, vale dizer, para que o prazo de prescrição para o Contribuinte pedir a restituição de tributo, submetido a lançamento por homologação, passasse a ser de apenas cinco anos, contados do dia seguinte ao do pagamento indevido e não da data da extinção do crédito tributário(que ocorre com a homologação expressa ou tácita dos atos praticados pelo Contribuinte, tendentes ao lançamento), como consta do inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional(2).

     Nota 2 - O Contribuinte não realiza lançamento, porque, segundo o art. 142 do Código Tributário Nacional-CTN, esse é um ato privativo da Fazenda Pública. Logo, a Fazenda Pública não homologa o lançamento, mas sim realiza o lançamento com a homologação dos procedimentos até então realizados pelo Contribuinte.  

Logo, eliminou a possibilidade de contar-se cinco anos(para homologar) + cinco anos(para requerer a restituição), ficando apenas este último prazo, contado do pagamento indevido.

Seria mencionado art. 3º da Lei Complementar nº 118, de 2005,  uma nova regra, frente à regra do inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional-CTN, ou seria uma regra que apenas interpreta esta, como determinado no referido art. 4º dessa mesma Lei Complementar?

No ano de 1977, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal-STF decidiu que o prazo do inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional-CTN iniciar-se-ia a partir da data do pagamento indevido(3) e nesse sentido sempre se posicionou o jurista Luciano Amaro, no seu conhecido livro Direito Tributário Brasileiro, registrando ser inadequado o texto do inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional-CTN, o qual, ao invés de se referir a pagamento, refere-se à extinção do crédito tributário(4).
 

    Nota 3 – BRASIL. Supremo Tribunal Federal-STF, Segunda Turma. Relator Ministro Cordeiro Guerra. Julgado em 19.04.1977. Revista Trimestral de Jurisprudência-RTJ nº 81/428-431. Fiz referência a esse julgado no livro de minha autoria, denominado Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil – Análise das Principais Teorias Existentes e Proposta para Alteração da Respectiva Legislação, Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 261-262. 

    Nota 4 - Direito Tributário Brasileiro. 11ª Edição, revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, p. 427

   E parece-me que, naquela oportunidade, referida Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu com acerto, pois só poderia ser do pagamento, porque o Direito Tributário não pode modificar os institutos de direito privado(art.110 do Código Tributário Nacional-CTN)e, em direito privado, o prazo prescricional para repetição de indébito sempre se iniciou depois da ocorrência do pagamento indevido.

 No entanto, como vimos acima, o Superior Tribunal de Justiça-STJ não adotou este entendimento e firmou sua jurisprudência no sentido de que o prazo total chegaria a dez anos(os cinco anos decadenciais para a Fazenda Pública homologar e os cinco anos prescricionais para o Contribuinte requerer a restituição do indevidamente pago).

Com o advento da Lei Complementar 118, de 2005, que adotou mencionado posicionamento da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal-STF, qual seja, cinco anos da data do pagamento indevido, os Contribuintes foram ao Judiciário, sustentando a tese de que não se trataria de regra legal interpretativa, mas sim de uma nova regra, pelo que só poderia alcançar fatos(pagamentos indevidos)ocorridos depois da sua vigência, em face do princípio da irretroatividade das leis, agora expresso na alínea “a” do inciso III do art. 150 da Constituição da República.

O assunto chegou ao Superior Tribunal de Justiça-STJ e este, em um primeiro momento, concluiu que a nova Lei só seria aplicável a processos que se iniciaram após a sua entrada em vigor, entendimento esse que seria justificável caso as regras legais sobre esse assunto fossem de direito processual, que, como se sabe, aplicam-se imediatamente, inclusive aos processos em andamento. Mas como a matéria decadência/prescrição sempre foi de direito material, referida tese não vingou e logo, logo o próprio Superior Tribunal de Justiça-STJ tratou de mudar o seu entendimento, para o consignado no texto acima: a data do fato(o pagamento indevido), sendo que quanto este último entendimento há inúmeros julgados desse E. Tribunal, dentre os quais o acima indicado da sua 1ª Turma, relatado pelo Ministro Teori Zavascki(que hoje tem assento no Supremo Tribunal Federal do Brasil).
 
 Mas, essa matéria, depois do advento da Lei Complementar nº 118, de 2005,  também chegou ao Supremo Tribunal Federal-STF e o seu Plenário, em 04.08.2011,  no julgamento do Recurso Extraordinário nº 566.621/RS(5), interposto pela União em abril de 2007, por maioria, seis votos a quatro, decidiu que referida Lei só se aplicará a processos que sejam distribuídos após a data da sua entrada em vigor, ou seja, transformou o assunto decadência e prescrição que, no direito brasileiro, sempre foi de direito material, em assunto de direito  processual, como fizera o Superior Tribunal de Justiça – STJ em um primeiro momento, conforme vimos acima.

    Nota 5 -  Brasil. Supremo Tribunal Federal – STF. Recurso Extraordinário nº 566621/RS(Processo físico). Recorrente: União. Recorrido: RCAF. Intdo(A/S): Estado do Rio Grande do Sul. Relatora Ministra Ellen Grace. “Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto da Relatora, negou provimento ao recurso extraordinário, contra os votos dos Senhores Ministros Marco Aurélio, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. Ausente, licenciado, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Cezar Peluso. Plenário, 04.08.2011.” Dsponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2565341,  acesso em 06.08.2011.

Portanto, o Plenário da Suprema Corte findou por concluir pela inconstitucionalidade da parte do art. 4º da referida Lei Complementar que determinava que se aplicasse ao art. 3º de tal Lei o inciso I do art. 106 do Código Tributário Nacional-CTN, isto é, estabelecia que tal regra seria interpretativa e, por isso, retroagiria à data em que o Código Tributário Nacional-CTN entrara em vigor.  

E, ao assim decidir, o Plenário do Supremo Tribunal Federal-STF, em 04.08.2011, findou por mudar o posicionamento da sua 2ª Turma, adotado no ano de 1977, no AI 69.363(AgRg)SP, acima referido, e, finalisticamente,  passou a admitir que o art. 110 do Código Tributário Nacional-CTN pode ser inobservado, ou seja, que leis do campo tributário podem modificar a definição, o conteúdo e o alcance dos institutos de direito privado.

Logo, o prazo prescricional de cinco anos, para o Contribuinte requerer a restituição de tributo, submetido a lançamento por homologação, passou a ser de cinco anos, contado da data da entrada em vigor da Lei Complementar nº 118, de 2005, vinculando-se à data da propositura da ação, vale dizer, para ações propostas antes da entrada em vigor dessa Lei continua se aplicando o entendimento dos “5 + 5”(prazo decadencial de cinco anos para a Fazenda Pública homologar os procedimentos praticados pelo Contribuinte + cinco anos de prescrição para o Contribuinte entrar com a ação judicial pleiteando a restituição do indevidamente pago), ou seja, nesse caso a Fazenda Pública terá que restituir o que foi pago nos últimos dez anos,  no entanto, para as ações propostas após a entrada em vigor da referida Lei, o prazo só retroage a cinco anos, vale dizer, a Fazenda Pública só terá que restituir o que foi pago indevidamente nos últimos cinco anos.

 Então, se o Contribuinte propuser a ação depois de cinco anos da entrada em vigor da Lei, nada terá a receber, porque a sua pretensão estará integralmente prescrita.