sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

CONCURSO PÚBLICO COM VAGAS. OBRIGAÇÃO DE NOMEAR.


Por Francisco Alves dos Santos  Júnior

Segue uma decisão com uma  matéria muito importante: o edital do concurso estabelece que existem 18 vagas. A candidata, ao longo do tempo de validade do concurso, finda por se enquadrar nessas 18 vagas, em face de desistências, afastamentos, etc de outro candidatos. Tem ela direito de ser nomeada. Veja o porquê. 


Obs.: a decisão teve pesquisa feita pela Assessora Luciana Simões, que também a minutou.




PROCESSO Nº: 0813556-59.2018.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: ALVARO AUGUSTO VIANA BRAGA TORRES
ADVOGADO: Ana Patricia Vieira De Almeida
IMPETRADO: COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS
AUTORIDADE COATORA: SUPERINTENDENTE DE TRENS URBANOS DO RECIFE CBTU STU REC
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)
D E C I S Ã O
1. Breve Relatório

ALVARO AUGUSTO VIANA BRAGA TORRES, qualificado na Inicial, impetrou este MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA em face do Ilmo. Sr SUPERINTENDENTE DE TRENS URBANOS DO RECIFE - CBTU - STU. Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita. Aduziu, em síntese, que:  teria concorrido ao CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO ao cargo de ANT - ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO promovido pela CBTU - Companhia de Trens Urbanos conforme Edital 001/2014 para 03 vagas imediatas mais Cadastro de Reserva (ANEXO IV do EDITAL) pertinentes a CBTU/STU-REC Superintendência de Trens urbanos - Recife (Doc. 02); nos termos do Edital, o concurso se destinaria ao preenchimento de vagas, bem como à formação de cadastro de reserva para os cargos discriminados no item 1 deste Edital; o Impetrante teria sido aprovado dentre as vagas imediatas ofertadas obtendo a 2º colocação para 03 vagas disponibilizadas no edital (DOC 03), quando em 2015, fora convocado por telegrama para cumprimento do  item 10.2 do edital, 1º fase (DOC 04)  mas ultrapassado o prazo de validade  não teria havido a respectiva nomeação ao cargo para o qual teria concorrido não obstante encontrar-se dentre as vagas imediatas disponibilizadas; apenas o primeiro colocado teria sido admitido, o concurso em tela teria a validade de  2(dois) anos prorrogável por mais dois anos, e portanto tal prazo teria se encerrado  em 16.09.2018 conforme documento anexo (DOC 05); imperiosa seria a propositura do presente writ; o candidato aprovado  dentro das vagas ofertadas ou aqueles que passem a figurar dentre as vagas em decorrência da desistência, eliminação e renúncia de candidatos classificados em colocação superior, teria direito líquido e certo a convocação e consequente nomeação; haveria 03 vagas ofertadas pelo Edital e apenas 1 preenchida; o STF já teria reconhecido, em repercussão geral nos termos da  Sumula 15 que prescreve o direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado dentre o numero de vagas ofertadas entendendo  que "O direito à nomeação também se estende ao candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital, mas que passe a figurar entre as vagas em decorrência da desistência de candidatos classificados em colocação superior. Precedentes." (RE 946425 AgR, Relator Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, julgamento em 28.6.2016, DJe de 9.8.2016. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, pelo deferimento da liminar para que seja determinada  a imediata convocação do impetrante para   nomeação e posse   ao cargo de ANT - ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO    ficando na condição sub judice até o transito em julgado da presente mandamus. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos. 
Foi determinada a notificação da autoridade apontada como coatora (Id. 4058300.6259458).
A autoridade apontada como coatora apresentou Informações  (Id. 4058300.6407014, alegando, preliminarmente: a) o sobrestamento do feito em razão da transformação em empresa pública; b) a necessidade de intervenção da Advocacia Geral da União na qualidade de assistente litisconsorcial; c) ausência de interesse de agir. No mérito, aduziu, em síntese, que: a) a Companhia Brasileira de Trens Urbanos - CBTU fora submetida a modificação societária, o que teria resultado na modificação do status de Sociedade de Economia Mista, para Empresa Pública; b) apesar dos esforços de gestão da CBTU, não teria conseguido espaço no Quadro de Pessoal em número suficiente para absorver o quantitativo de candidatos do Concurso Público nº 001/2014, na sua totalidade, tampouco obteve autorização para extrapolar o mencionado quadro; c) no caso da CBTU, teria se apresentado a característica da superveniência, materializada pelos termos estabelecidos pelo Ofício Circular SEI nº 170/2015-MP; d) o aumento do percentual da despesa com pessoal em relação à receita corrente líquida poderia decorrer de eventos que poderiam escapar da análise prévia feita pela autoridade competente, como teria sido o caso da crise global ocorrida no final de 2008, que ocasionou a redução drástica de receita em função da queda violenta da arrecadação decorrente da queda de consumo; e) o principio da discricionariedade deveria ser levado em consideração, pois não se pode promover nomeação de pessoal e ultrapassar o limite estabelecido pela Lei; f) a CBTU não poderia realizar a nomeação dos concursados aprovados, pois estaria com as despesas com pessoal acima do limite prudencial e máximo, permanecendo vedada a nomeação dos candidatos, enquanto persistir o quadro fiscal precário, obedecendo a validade do certame, de acordo com o determinando pelo edital; g) não se encontrariam presentes os requisitos necessários para que fosse concedida a antecipação de tutela/liminar; h) a jurisprudência dominante de nossos Tribunais Superiores Pátrios seria uníssona ao afirmar que, enquanto não houver trânsito em julgado da decisão de mérito, não seria possível a nomeação/admissão de candidato aprovado, deferindo-se, em sede de liminar, no máximo, a reserva de vaga quando se tratar de candidato aprovado dentro do quantitativo de vagas previsto no instrumento convocatório, o que não seria o caso dos autos.
Instado a se manifestar acerca do pedido de suspensão processual, o Impetrante pugnou pelo prosseguimento do feito (Id. 4058300.9499640).
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação
2.1. Das preliminares levantadas pela CBTU

Quanto à preliminar de suspensão dos autos em razão do reconhecimento da repercussão geral no RE 960.429, tenho que esta não merece prosperar, porque porque o Tema 992, extraído do referido recurso, discute sobre a "competência para processar e julgar controvérsias nas quais se pleiteiam questões afetas à fase pré-contratual de seleção e de admissão de pessoal e eventual nulidade do certame, em face de pessoa jurídica de direito privado".
Nesse sentido, a suspensão do feito seria medida adequada somente na hipótese em que os critérios para admissão de pessoal e eventual nulidade do certame fossem discutidos, o que não ocorre no presente caso.
O mandamus em questão, por sua vez, tem como objeto o direito subjetivo à nomeação do candidato, ou seja, trata de uma controvérsia posterior à oferta de vagas no edital.
Por conseguinte, afasto a preliminar de suspensão do feito, suscitada pela parte impetrada.
De igual modo, não há que se cogitar a necessidade de intervenção da Advocacia-Geral da União na qualidade de assistente litisconsorcial, uma vez que a CBTU, pessoa jurídica à qual a autoridade apontada como coatora está vinculada, já tomou conhecimento da demanda, consoante dispõe o art. 7º, II, da Lei 12.016/09, não havendo qualquer fundamento jurídico para que este juízo convoque a AGU a comparecer nos autos na qualidade de assistente litisconsorcial.
Afasto, portanto, a preliminar de intervenção da Advocacia-Geral da União na qualidade de assistente litisconsorcial.
Por fim, analiso a preliminar de ausência de interesse de agir.
O interesse processual, ou interesse de agir reporta-se à demonstração da presença do trinômio necessidade/utilidade/adequação - necessidade de recurso às vias judiciais, utilidade do provimento e adequação do pedido.
No caso dos autos, verifico que o impetrante não vai de encontro ao ato convocatório, mas busca a sua efetiva aplicação, de acordo com a interpretação dada pelos tribunais superiores, no que se refere ao direito subjetivo à sua nomeação. Logo, não realizada a nomeação, pode o candidato assegurar seu direito através das vias judiciais, não havendo que se falar em ausência de interesse de agir.
Diante do exposto, afasto também a preliminar de ausência de interesse de agir.
2.2. Do pleito liminar propriamente dito 
O deslinde correto para a controvérsia é extraído do precedente firmado no Supremo Tribunal Federal em razão do julgamento do RE 598.099MS, que constitui o marco jurisprudencial regulatório do direito público subjetivo à nomeação para o candidato classificado dentro do número de vagas ofertadas em edital de concurso público, e também das exceções a esse direito: 
"EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO DE VAGAS EM EDITAL. DIREITO À NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS.
I. DIREITO À NOMEAÇÃO. CANDIDATO APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. Dentro do prazo de validade do concurso, a Administração poderá escolher o momento no qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria nomeação, a qual, de acordo com o edital, passa a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder público. Uma vez publicado o edital do concurso com número específico de vagas, o ato da Administração que declara os candidatos aprovados no certame cria um dever de nomeação para a própria Administração e, portanto, um direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número de vagas.  
II. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. BOA-FÉ. PROTEÇÃO À CONFIANÇA. O dever de boa-fé da Administração Pública exige o respeito incondicional às regras do edital, inclusive quanto à previsão das vagas do concurso público. Isso igualmente decorre de um necessário e incondicional respeito à segurança jurídica como princípio do Estado de Direito. Tem-se, aqui, o princípio da segurança jurídica como princípio de proteção à confiança. Quando a Administração torna público um edital de concurso, convocando todos os cidadãos a participarem de seleção para o preenchimento de determinadas vagas no serviço público, ela impreterivelmente gera uma expectativa quanto ao seu comportamento segundo as regras previstas nesse edital. Aqueles cidadãos que decidem se inscrever e participar do certame público depositam sua confiança no Estado administrador, que deve atuar de forma responsável quanto às normas do edital e observar o princípio da segurança jurídica como guia de comportamento. Isso quer dizer, em outros termos, que o comportamento da Administração Pública no decorrer do concurso público deve se pautar pela boa-fé, tanto no sentido objetivo quanto no aspecto subjetivo de respeito à confiança nela depositada por todos os cidadãos.
III. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO. CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO. Quando se afirma que a Administração Pública tem a obrigação de nomear os aprovados dentro do número de vagas previsto no edital, deve-se levar em consideração a possibilidade de situações excepcionalíssimas que justifiquem soluções diferenciadas, devidamente motivadas de acordo com o interesse público. Não se pode ignorar que determinadas situações excepcionais podem exigir a recusa da Administração Pública de nomear novos servidores. Para justificar o excepcionalíssimo não cumprimento do dever de nomeação por parte da Administração Pública, é necessário que a situação justificadora seja dotada das seguintes características: a) Superveniência: os eventuais fatos ensejadores de uma situação excepcional devem ser necessariamente posteriores à publicação do edital do certame público; b) Imprevisibilidade: a situação deve ser determinada por circunstâncias extraordinárias, imprevisíveis à época da publicação do edital; c) Gravidade: os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis devem ser extremamente graves, implicando onerosidade excessiva, dificuldade ou mesmo impossibilidade de cumprimento efetivo das regras do edital; d) Necessidade: a solução drástica e excepcional de não cumprimento do dever de nomeação deve ser extremamente necessária, de forma que a Administração somente pode adotar tal medida quando absolutamente não existirem outros meios menos gravosos para lidar com a situação excepcional e imprevisível. De toda forma, a recusa de nomear candidato aprovado dentro do número de vagas deve ser devidamente motivada e, dessa forma, passível de controle pelo Poder Judiciário.
IV. FORÇA NORMATIVA DO PRINCÍPIO DO CONCURSO PÚBLICO. Esse entendimento, na medida em que atesta a existência de um direito subjetivo à nomeação, reconhece e preserva da melhor forma a força normativa do princípio do concurso público, que vincula diretamente a Administração. É preciso reconhecer que a efetividade da exigência constitucional do concurso público, como uma incomensurável conquista da cidadania no Brasil, permanece condicionada à observância, pelo Poder Público, de normas de organização e procedimento e, principalmente, de garantias fundamentais que possibilitem o seu pleno exercício pelos cidadãos. O reconhecimento de um direito subjetivo à nomeação deve passar a impor limites à atuação da Administração Pública e dela exigir o estrito cumprimento das normas que regem os certames, com especial observância dos deveres de boa-fé e incondicional respeito à confiança dos cidadãos. O princípio constitucional do concurso público é fortalecido quando o Poder Público assegura e observa as garantias fundamentais que viabilizam a efetividade desse princípio. Ao lado das garantias de publicidade, isonomia, transparência, impessoalidade, entre outras, o direito à nomeação representa também uma garantia fundamental da plena efetividade do princípio do concurso público.
V. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO."
(STF. RE 598099, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 10082011, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-189 DIVULG 30-09-2011 PUBLIC 03-10-2011 EMENT VOL-02599-03 PP-00314 RTJ VOL-00222-01 PP-00521) (sem destaques no original)
No citado precedente, o Supremo Tribunal Federal fixou a compreensão de que, ao lançar edital de concurso, a Administração Pública arregimenta interessados em atender ao quadro funcional estatal, transparecendo haver necessidade de serviço público e de uma certa premência no provimento de cargos, notadamente quando anuncia, desde logo, no instrumento convocatório, a existência de vagas a serem preenchidas, fazendo crer nos interessados que se optarem por inscrever-se no certame e se sagrarem aprovados e bem classificados, aquele contingente de vagas ofertadas será efetivamente preenchido. 
Nessa ordem de ideias, o STF concluiu que, em circunstâncias normais, a Administração Pública tem o dever de submeter a sua discricionariedade ao dever de boa-fé e de proteção da confiança, motivo pelo qual não pode abdicar da obrigação de prover os cargos ofertados, resguardando-se-lhe, contudo, o direito de decidir em que momento a nomeação ocorrerá, dentro do prazo de validade do certame. 
Dessa forma, como regra, na situação de concurso público em que haja candidatos aprovados dentro das vagas oferecidas no edital de abertura, o candidato tem o direito de ser nomeado, mas não o de ser nomeado quando achar melhor ou mais conveniente. 
Por outro lado, o debate no Supremo Tribunal Federal não ficou indiferente às vicissitudes da Administração Pública, cuja submissão a princípios como o da legalidade e da moralidade justifica que, apenas em situações excepcionalíssimas e devidamente justificadas, possa furtar-se à observância desse dever. 
Extrai-se, todavia, que o entendimento adotado pelo STF procurou, nessa relação concorrente-Poder Público, robustecer mais a posição do candidato do que a da Administração Pública em si, tanto que as hipóteses nas quais o Poder Público pode fugir ao seu dever devem se caracterizar por serem excepcionalíssimas, ou seja, um grau superlativo que excede a mera excepcionalidade ou vicissitude comum à administração. 
Por essa razão, o Supremo Tribunal Federal estabeleceu quatro vetores hermenêuticos que devem ser analisados e sopesados, somente se afigurando lícita a recusa da Administração Pública quando obrigatoriamente abranger esses quatro vetores hermenêuticos - superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade. 
Para haver recusa à nomeação pela Administração, como visto, obrigatoriamente, deve haver justificativa em motivo de superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade; em outras palavras, quando o fato ensejador dela for superveniente, quando esse fato for também determinado por circunstâncias imprevisíveis, fora do comum e nisso não se inclui a mudança normal das circunstâncias econômicas , quando esse fato ensejador for extremamente grave e implicar onerosidade excessiva (como, por exemplo, uma guerra ou uma calamidade pública), e, por fim, a recusa será admitida apenas quando for extremamente necessária porque não haveria outros meios menos gravosos para lidar com a situação excepcional e imprevisível, de tal maneira que a recusa deve ser a "ultima ratio" da Administração Pública  
Em conclusão: constata-se ter sido o impetrante aprovado dentro de número de vagas previstas no edital do certame e, por outro lado, não havendo qualquer comprovação ou indicação de circunstância que autorize a Administração não cumprir o seu dever de nomeação do candidatado dentro do prazo de validade do certame. 
Após o contraditório, apenas se confirmou estar o impetrante em colocação dentro do número de vagas oferecidas no edital, bem como ter havido a negativa da Administração Pública em nomeá-lo dentro do prazo do concurso, sendo o fundamento do ato restrições orçamentárias.
Como visto, a mera alegação de restrições orçamentárias não atende às condições de imprevisibilidade, gravidade e extrema necessidade para justificar a negativa da Administração Pública em nomear candidato para cargo/emprego público que tenha se posicionado em colocação dentro do número de vagas previsto no edital do concurso, após expirado o prazo de validade deste.  
Nesse sentido, confira-se o precedente que se segue, aplicável mutatis mutandis ao presente caso:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATOS APROVADOS DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS OFERTADAS NO EDITAL. LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. SUPERAÇÃO DOS LIMITES ORÇAMENTÁRIOS IMPOSTOS. NÃO COMPROVAÇÃO. RESPONSABILIZAÇÃO DO ADMINISTRADOR, NÃO DOS CANDIDATOS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE (EXIGIBILIDADE).
1. Embargos infringentes opostos pela COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS - CBTU em face de acórdão, não unânime, do Pleno desta Egrégia Corte Regional que julgou procedente a ação rescisória ajuizada pelos particulares embargados nos termos do voto exarado pelo Desembargador Federal José Maria Lucena.
2. Na espécie, o voto vencido exarado pelo Desembargador Federal Edilson Nobre divergiu do voto vencedor proferido pelo Desembargador Federal José Maria Lucena no tocante ao entendimento de que a simples alegação de que teria sido atingido o limite de contratação previsto no parágrafo único do art. 22 da Lei Complementar nº. 101/2000 - Lei de Responsabilidade Fiscal, seria suficiente para afastar o dever da CBTU de efetivar em seu quadro de pessoal os particulares embargados, devidamente aprovados, dentro do número de vagas, no concurso público realizado por aquela sociedade de economia mista.
3. Por sua vez, o entendimento do voto vencedor foi no sentido de que, considerando a orientação do STF quando do julgamento do RE 598.099/MS, submetido à sistemática da repercussão geral prevista no parágrafo 3º art. 543-B do CPC, no bojo do qual ficou estabelecido que, durante o prazo de validade do concurso público, a Administração Pública tem o dever de nomear todos os aprovados dentro do número de vagas previstas no edital do certame, a CBTU seria obrigada a efetivar os embargados em seu quadro de pessoal, sobretudo quando, nos autos, não há qualquer prova que corrobore a efetiva impossibilidade de nomeação (situação superveniente, imprevisível, grave ou indispensável à organização do orçamento público).
4. O embargante, em suas razões, pugna pela improcedência da ação rescisória ajuizada pelos embargados com base nas alegações de: a) ausência de violação literal ao inciso IV do art. 37 da Constituição Federal, eis que não ocorreu preterição na contratação de aprovado no concurso, esclarecendo que a nomeação não ocorreu por conta de a despesa total com pessoal haver excedido os limites estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal; b) impossibilidade de reexame de provas em sede de ação rescisória; c) impossibilidade de julgamento de ação rescisória com base em mudança de entendimento jurisprudencial em razão da aplicabilidade, ao caso, da inteligência da Súmula nº. 343 do Supremo Tribunal Federal - STF.
5. Afasto a impossibilidade de reexame de provas em sede de ação rescisória, tendo em vista que o acórdão embargado teve como fio condutor a assertiva segundo a qual eventual sobrecarga orçamentária não poderia servir de pretexto para a recusa à nomeação dos candidatos aprovados dentro do número de vagas oferecidas no edital, pois o impacto financeiro deveria ter sido verificado de forma prévia por meio de estudo e avaliação detida do quadro financeiro da entidade contratante.
6. No que concerne à impossibilidade de julgamento de ação rescisória com base em mudança de entendimento jurisprudencial em razão da aplicabilidade, ao caso, da inteligência da Súmula nº. 343 do Supremo Tribunal Federal - STF, tenho que, conforme assentado em firme jurisprudência, "tal enunciado sumular tem incidência apenas quando há interpretação controvertida de lei federal nos tribunais; não, porém, quando se cuida da exegese de preceito constitucional." (AR 199800111310, JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJ DATA:14/06/2004 PG:00153 RDDT VOL.:00107 PG:00126 RSTJ VOL.:00185 PG:00039 ..DTPB:.).
7. Registre-se que o voto dissidente não negou a procedência do direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital do concurso, autorizando entender que tal construção jurisprudencial à época da prolação do acórdão rescindindo já havia se assentado, limitando-se a apontar como empecilho para tal a superação do limite estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal.
8. A superação dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal impõe, em verdade, a responsabilização do administrador público por infringência às normas de direito financeiro, e não dos candidatos, que cumpriram de forma escrupulosa os termos do certame.
9. A não contratação dos ora embargados constituiu, na situação posta, evidente ofensa ao princípio da proporcionalidade, na sua dimensão da exigibilidade (necessidade), pois, para dar cabo ao cumprimento dos limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, evitando a ofensa ao direito subjetivo do candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas disponibilizadas, poderia a embargante promover outras providências saneadoras do desequilíbrio financeiro, de molde a configurar quadro menos gravoso aos concursados, sem descurar da obtenção do mesmo resultado.
10. Embargos infringentes não providos.
(PROCESSO: 0000368132012405000003, DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA, Pleno, JULGAMENTO: 22/07/2015, PUBLICAÇÃO: DJE - Data::04/08/2015 - Página::40) (GN).
Finalmente, registro que a vedação contida nos arts. 1º, parágrafo 3º, da Lei 8.437/92 e 1º da Lei 9.494/97, quanto à concessão de antecipação de tutela contra a Fazenda Pública nos casos de aumento ou extensão de vantagens a servidor público, não se aplica nas hipóteses em que o autor busca sua nomeação e posse em cargo público, em razão da sua aprovação no concurso público" (AgRg no AREsp 373.865/PI, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 21/10/2014).
Sendo assim, a concessão da liminar é medida que se impõe.

3. Dispositivo

Diante de todo o exposto, rejeito as preliminares levantadas pela autoridade coatora e defiro o pleito de  concessão da medida liminar e determino que a DD Autoridade Impetrada tome imediatas providências no sentido de proceder com a imediata convocação do impetrante para nomeação e posse  ao cargo de ANT - ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO,  ficando na condição sub judice até o transito em julgado do presente mandamus, sob pena de pagamento de multa mensal a favor do Impetrante, no valor do vencimento bruto que tem a receber no mencionado cargo, sem prejuízo da responsabilização civil, administrativa e criminal da referida Autoridade Impetrada e também sem prejuízo das penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009.
Uma vez que já houve apresentação das Informações, após a notificação pessoal da mencionada Autoridade desta Decisão, determino que os autos sejam remetidos para MPF para parecer legal.
Sucessivamente, voltem-me os autos conclusos para julgamento.
Cumpra-se. Intimem-se.
Recife, 18.12.2018
Francisco Alves dos Santos Jr.
Juiz Federal, 2a Vara Federal-PE.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

UNIÃO ESTÁVEL. DIREITO À PENSÃO PREVIDENCIÁRIA QUANDO UM(A) DOS(AS) COMPANHEIRO(A) FALECE. MOMENTO DA AFERIÇÃO DA QUALIDADE DE DEPENDENTE. ENTENDIMENTO DO STJ.

Por Francisco Alves dos Santos Jr. 

O companheiro ou companheira de Segurado ou de Segurada falecido(a) do INSS, sem provar que deste era dependente quando do seu falecimento,  não faz jus à respectiva Pensão Previdenciária. 
Na bem alinhavada decisão infra, minutada e pesquisada pela competente Assessora abaixo indicada, com pequenas alterações feitas pelo Juiz, esse assunto é detalhadamente debatido, inclusive com transcrição do famoso precedente do Plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a união estável homo afetiva e o entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto ao momento em que se apura a existência da dependência para gerar o direito à Pensão Previdenciária. 
Boa leitura. 

Observação: decisão pesquisada e minutada pela Assessora Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques.


PROCESSO Nº: 0816986-19.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: J D C
ADVOGADO: A N C Da S B
ADVOGADO: M D L L De P
ADVOGADO: S D M Da R E
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

D E C I S Ã O

1-Relatório


J D C, qualificada na Petição Inicial, ajuizou em 27/11/2018 esta ação em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL pretendendo, a título de tutela provisória de urgência, a imediata concessão do benefício de pensão por morte em razão do óbito da Srª M das N C L, que teria sido sua companheira até a data do óbito em 06/09/2014. Alegou, em síntese, que: teria convivido em união estável, pública e duradoura, com a Srª M das N C L; a união teria perdurado por mais de 40 anos, até a data do óbito da referida senhora, ocorrido em 06/09/2014; o INSS teria indeferido o seu pedido administrativo de concessão de pensão, embora a Autora tivesse comprovado a existência de união estável com a falecida segurada, com provas que seriam contemporâneas à união estável; a união estável teria sido reconhecida judicialmente na ação de reconhecimento de união estável que teria tramitado na 4º Vara de Família da Capital, no processo tombado sob o nº 049512-76.2015.8.17.0001; além disso, a Autora teria sido considerada Inventariante e única herdeira legal da de Cujus, nos autos do processo de Inventário , tombado sob o nº 0012370-38.2015.8.17.0001, em curso na 1ª Vara de Sucessões da Capital; teceu outros comentários e afirmou que teria preenchido os requisitos legais para a concessão do benefício; processualmente, requereu o gozo do benefício da assistência judiciária gratuita e a tramitação prioritária do processo e, ainda, a concessão da tutela antecipada a fim de ser determinada a imediata implantação da pensão; a procedência do pedido para "compelir o INSS a conceder e implantar definitivamente, O BENEFÍCIO DA PENSÃO POR MORTE A QUE FAZ JUS A AUTORA, A PARTIR DA DATA EM QUE FOI CESSADO ADMINISTRATIVAMENTE, DATA DO ÓBITO DA DE CUJUS, MARIA DAS NEVES COUCEIRO LINS, DEVENDO O PAGAMENTO DAS PARCELAS EM ATRASO SER DEVIDAMENTE CORRIGIDOS E PAGAS À AUTORA, NA FORMA DA LEI, DETERMINANDO AINDA QUE A FUNCEF também COMPLEMENTE O VALOR DO PAGAMENTO DA PENSÃO POR MORTE, PAGOS PELO INSS À AUTORA, QUE SE ENCONTRAM EM ATRASO, COMO É DE SUA OBRIGAÇÃO;" Juntou instrumento de procuração e documentos.


2. Fundamentação

2.1. Dos benefícios da Justiça Gratuita e de prioridade de tramitação

 Inicialmente, merece ser concedido à parte autora, provisoriamente,  o benefício da justiça gratuita, porque presentes os requisitos legais, mas com as ressalvas da legislação criminal pertinente, no sentido de que se, mais tarde, ficar comprovado que declarou falsamente ser pobre, ficará obrigada ao pagamento das custas e responderá criminalmente (art. 5º, LXXXIV da Constituição da República e art. 98 do CPC).

Outrossim, o benefício ora concedido não abrange as prerrogativas previstas no § 5º, art. 5º da Lei nº 1.060/50, porque a parte Autora não é assistida por Defensor Público

No que se refere ao pedido de prioridade de tramitação, nos termos do art. 1.048, I do CPC, há igualmente de ser deferido, uma vez que preenchido o requisito etário para a concessão do benefício.

2.2. Do pedido de tutela de urgência

2.2.1 - Da norma contida no artigo 300 do Código de Processo Civil, colhem-se os pressupostos de concessão da tutela de urgência, das quais são espécie a tutela antecipada e a tutela cautelar.

Dispõe o aludido artigo, em seu "caput", que a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Assim, além de a tutela de urgência submeter a parte interessada à demonstração da probabilidade do direito, convencendo o magistrado da veracidade de suas alegações, deve demonstrar a existência de risco iminente para o autor, de dano irreparável ou de difícil reparação.

Concomitante com estes requisitos extraídos do "caput" do art. 300, urge que a providência antecipatória não produza efeitos irreversíveis, ou seja, resultados de ordem que torne impossível a devolução da situação ao estado anterior (art. 300, § 3º, do CPC). É preciso, portanto, que o quadro fático, alterado pela tutela de urgência, tenha possibilidade de ser recomposto.

Somente a concorrência destes requisitos é que permite a concessão da tutela de urgência, liminarmente ou após justificação prévia (art. 300, §2º, CPC).

2.2.2 - Pois bem, à luz do disposto no art. 74 da Lei nº 8.213/91, são três os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte: a) o óbito (ou morte presumida); b) a qualidade de segurada da pessoa falecida; c) a existência de dependentes, na forma prevista no art. 16 da Lei nº 8.213/1991.

 O (a) companheiro (a) do (a) segurado (a) figura no rol dos dependentes para fins de recebimento da pensão por morte:
"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave; "
No que concerne à qualidade de companheira, a Constituição da República vigente, de 1988,  reconhece, no seu art. 226 e respectivo §3º,  a união estável entre homem e mulher, como entidade familiar, para efeito de proteção do Estado, e o referido dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei nº 9.278/96, que assim dispõe:
"Art. 1º É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida como objetivo de constituição da família.".
Por seu turno, no âmbito do RGPS, a Lei 8.213/91 assim define o (a) companheiro (a): 
"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
(...)

§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal. ".
Note-se que mencionada Lei não faz referência à união estável entre "homem e mulher", mas apenas à união estável "com o segurado ou com a segurada", mas se reporta ao referido § 3º do art. 226 da Constituição. 
Todavia, interpretando o art. 1.732 do Código Civil do Brasil conforme com a vigente Constituição da República, o Plenário do Suprem Tribunal Federal consolidou o entendimento de que pessoas do mesmo sexo podem constituir união estável, verbis:
"Ementa: 1. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). PERDA PARCIAL DE OBJETO. RECEBIMENTO, NA PARTE REMANESCENTE, COMO AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. UNIÃO HOMOAFETIVA E SEU RECONHECIMENTO COMO INSTITUTO JURÍDICO. CONVERGÊNCIA DE OBJETOS ENTRE AÇÕES DE NATUREZA ABSTRATA. JULGAMENTO CONJUNTO.
1. Encampação dos fundamentos da ADPF nº 132-RJ pela ADI nº 4.277-DF, com a finalidade de conferir "interpretação conforme à Constituição" ao art. 1.723 do Código Civil. Atendimento das condições da ação.
2. PROIBIÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO DAS PESSOAS EM RAZÃO DO SEXO, SEJA NO PLANO DA DICOTOMIA HOMEM/MULHER (GÊNERO), SEJA NO PLANO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL DE CADA QUAL DELES. A PROIBIÇÃO DO PRECONCEITO COMO CAPÍTULO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. HOMENAGEM AO PLURALISMO COMO VALOR SÓCIO-POLÍTICO-CULTURAL. LIBERDADE PARA DISPOR DA PRÓPRIA SEXUALIDADE, INSERIDA NA CATEGORIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DO INDIVÍDUO, EXPRESSÃO QUE É DA AUTONOMIA DE VONTADE. DIREITO À INTIMIDADE E À VIDA PRIVADA. CLÁUSULA PÉTREA. O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da Constituição Federal, por colidir frontalmente com o objetivo constitucional de "promover o bem de todos". Silêncio normativo da Carta Magna a respeito do concreto uso do sexo dos indivíduos como saque da kelseniana "norma geral negativa", segundo a qual "o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido". Reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da "dignidade da pessoa humana": direito a auto-estima no mais elevado ponto da consciência do indivíduo. Direito à busca da felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade das pessoas naturais. Empírico uso da sexualidade nos planos da intimidade e da privacidade constitucionalmente tuteladas. Autonomia da vontade. Cláusula pétrea.
3. TRATAMENTO CONSTITUCIONAL DA INSTITUIÇÃO DA FAMÍLIA. RECONHECIMENTO DE QUE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO EMPRESTA AO SUBSTANTIVO "FAMÍLIA" NENHUM SIGNIFICADO ORTODOXO OU DA PRÓPRIA TÉCNICA JURÍDICA. A FAMÍLIA COMO CATEGORIA SÓCIO-CULTURAL E PRINCÍPIO ESPIRITUAL. DIREITO SUBJETIVO DE CONSTITUIR FAMÍLIA. INTERPRETAÇÃO NÃO-REDUCIONISTA. O caput do art. 226 confere à família, base da sociedade, especial proteção do Estado. Ênfase constitucional à instituição da família. Família em seu coloquial ou proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou informalmente constituída, ou se integrada por casais heteroafetivos ou por pares homoafetivos. A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão "família", não limita sua formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. Família como instituição privada que, voluntariamente constituída entre pessoas adultas, mantém com o Estado e a sociedade civil uma necessária relação tricotômica. Núcleo familiar que é o principal lócus institucional de concreção dos direitos fundamentais que a própria Constituição designa por "intimidade e vida privada" (inciso X do art. 5º). Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos que somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família. Família como figura central ou continente, de que tudo o mais é conteúdo. Imperiosidade da interpretação não-reducionista do conceito de família como instituição que também se forma por vias distintas do casamento civil. Avanço da Constituição Federal de 1988 no plano dos costumes. Caminhada na direção do pluralismo como categoria sócio-político-cultural. Competência do Supremo Tribunal Federal para manter, interpretativamente, o Texto Magno na posse do seu fundamental atributo da coerência, o que passa pela eliminação de preconceito quanto à orientação sexual das pessoas.
4. UNIÃO ESTÁVEL. NORMAÇÃO CONSTITUCIONAL REFERIDA A HOMEM E MULHER, MAS APENAS PARA ESPECIAL PROTEÇÃO DESTA ÚLTIMA. FOCADO PROPÓSITO CONSTITUCIONAL DE ESTABELECER RELAÇÕES JURÍDICAS HORIZONTAIS OU SEM HIERARQUIA ENTRE AS DUAS TIPOLOGIAS DO GÊNERO HUMANO. IDENTIDADE CONSTITUCIONAL DOS CONCEITOS DE "ENTIDADE FAMILIAR" E "FAMÍLIA". A referência constitucional à dualidade básica homem/mulher, no §3º do seu art. 226, deve-se ao centrado intuito de não se perder a menor oportunidade para favorecer relações jurídicas horizontais ou sem hierarquia no âmbito das sociedades domésticas. Reforço normativo a um mais eficiente combate à renitência patriarcal dos costumes brasileiros. Impossibilidade de uso da letra da Constituição para ressuscitar o art. 175 da Carta de 1967/1969. Não há como fazer rolar a cabeça do art. 226 no patíbulo do seu parágrafo terceiro. Dispositivo que, ao utilizar da terminologia "entidade familiar", não pretendeu diferenciá-la da "família". Inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica entre as duas formas de constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico. Emprego do fraseado "entidade familiar" como sinônimo perfeito de família. A Constituição não interdita a formação de família por pessoas do mesmo sexo. Consagração do juízo de que não se proíbe nada a ninguém senão em face de um direito ou de proteção de um legítimo interesse de outrem, ou de toda a sociedade, o que não se dá na hipótese sub judice. Inexistência do direito dos indivíduos heteroafetivos à sua não-equiparação jurídica com os indivíduos homoafetivos. Aplicabilidade do §2º do art. 5º da Constituição Federal, a evidenciar que outros direitos e garantias, não expressamente listados na Constituição, emergem "do regime e dos princípios por ela adotados", verbis: "Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte". 5. DIVERGÊNCIAS LATERAIS QUANTO À FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO. Anotação de que os Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Cezar Peluso convergiram no particular entendimento da impossibilidade de ortodoxo enquadramento da união homoafetiva nas espécies de família constitucionalmente estabelecidas. Sem embargo, reconheceram a união entre parceiros do mesmo sexo como uma nova forma de entidade familiar. Matéria aberta à conformação legislativa, sem prejuízo do reconhecimento da imediata auto-aplicabilidade da Constituição. 6. INTERPRETAÇÃO DO ART. 1.723 DO CÓDIGO CIVIL EM CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL (TÉCNICA DA "INTERPRETAÇÃO CONFORME"). RECONHECIMENTO DA UNIÃO HOMOAFETIVA COMO FAMÍLIA. PROCEDÊNCIA DAS AÇÕES. Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723 do Código Civil, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica de "interpretação conforme à Constituição". Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva. ".
(ADPF 132, Relator(a):  Min. AYRES BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 05/05/2011, DJe-198 DIVULG 13-10-2011 PUBLIC 14-10-2011 EMENT VOL-02607-01 PP-00001[1]) (Grifei).
2.2.3 - Tecidas essas premissas gerais, passo ao exame do pedido de tutela de urgência.

Cumpre verificar a satisfação dos requisitos legais pela parte autora. 

O evento morte de Maria das Neves Couceiro Lins ocorrido em 06/09/2014 está comprovado pela certidão de óbito (Id. 4058300.8830679).

A qualidade de segurada de Maria das Neves Couceiro Lins está demonstrada, pois a falecida era titular de benefício previdenciário de Aposentadoria por Tempo de Contribuição (Id. 4058300.8830703).

A controvérsia versa sobre a existência de união estável entre a parte autora e a falecida até a data do óbito.

Com a finalidade de comprovar a união estável com a falecida, a parte autora apresentou documentos, dentre os quais destaco:
 1-  Conta conjunta em nome de Maria das Neves Couceiro Lins e/ou Jaira Dourado Cavalcanti aberta em 02/07/1985 com registro de movimentação em julho de 1987;

2-  Maria das Neves Couceiro Lins figurou como responsável por despesas médicas referentes a atendimentos médicos prestados a Jaira Dourado Cavalcanti em 12/03/2014; e

3-  Sentença que declarou a união estável entre a Autora e Maria das Neves Couceiro Lins, proferida nos autos processo tombado sob o nº 049512-76.2015.8.17.0001, que tramitou perante 4º Vara de Família da Capital, e que foi confirmada pelo E. TJPE em sede de recurso de Apelação.
Pois bem, dos documentos trazidos aos autos há fortes indícios da relação de união estável havida entre a Autora e a Srª Maria das Neves Couceiro Lins, entretanto, não se pode concluir da prova documental que a união estável tenha perdurado até a data do óbito; afinal, a jurisprudência do E. STJ é firme no sentido de que a aferição da qualidade de dependente ao benefício de pensão por morte deve ser aferida no momento do óbito, verbis:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. DEPENDENTE FILHA MAIOR INVÁLIDA. INCAPACIDADE. AFERIÇÃO NO MOMENTO DO ÓBITO. JURISPRUDÊNCIA REMANSOSA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. A jurisprudência do STJ é firme no sentido de que a aferição da qualidade de dependente do postulante ao benefício pensão por morte deve ser aferida no momento do óbito.

2. O Tribunal de origem, soberano na análise das provas, consignou que a invalidez é anterior ao óbito do instituidor da pensão por morte.

3. Nesse sentido, os argumentos utilizados para fundamentar a pretensão trazida no recurso especial somente poderiam ter sua procedência verificada mediante o reexame de matéria fática, o que é vedado ante o óbice da Súmula 7/STJ.

4.. Agravo regimental não provido.".

(AgRg nos EDcl no AREsp 821.543/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/04/2016, DJe 26/04/2016[2])
 Saliento que, embora a coabitação não seja um requisito para o reconhecimento da união estável, pode constituir um relevante indício, o que, pela leitura da r. Sentença e do v. Acórdão, não ocorria com a Autora e a falecida Maria das Neves Couceiro Lins, o que poderá ser esclarecido durante a fase instrutória, sobretudo na audiência de instrução a ser realizada no momento oportuno.

Com essas considerações, reputo ausente, neste momento processual, o requisito da probabilidade do direito alegado, pois, embora os documentos trazidos pela Autora sirvam de início de prova material, e apesar de os argumentos explanados mostrarem-se relevantes, a constatação da união estável e que a dita união perdurou até a data do óbito  requer dilação probatória a fim de se proceder a uma análise mais acurada dos fatos, não comportando decisão in limine

3. Dispositivo

Diante de todo o exposto:

3.1- concedo à parte autora, provisoriamente, os benefícios da Justiça Gratuita e a prioridade de tramitação processual por ser idosa;

3.2 - indefiro o pedido de tutela de urgência;

3.3 - cite-se o INSS e o intime para apresentar a íntegra do processo administrativo de concessão de pensão da Autora, bem como para informar acerca de dependente habilitado à pensão deixada pela falecida Maria das Neves Couceiro Lins.

Int.

Recife, 10.12.2018


Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

(rmc)

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Médica Especialista Latu Sensu em Medicina do Trabalho x Médica Especialista em Medicina do Trabalho, à luz das Resoluções do Conselho Federal de Medicina.

Por Francisco Alves dos Santos Jr. 


Na decisão que segue, após acurado estudo de Normas do Conselho Federal de Medicina do Trabalho, realizado pela competente Assessora abaixo identificada e aprovado pelo Juiz da causa, chegou-se à conclusão que a Especialização latu sensu em medicina do trabalho não corresponde à Especialização em Medicina do Trabalho, obtida perante Entidade própria, para poder exercer esse importante ramo da medicina, que exige muita responsabilidade e exímia competência desse tipo de Profissional. 
Boa leitura. 


Texto pesquisado e minutado pela Assessora MARIA PATRICIA PESSOA DE LUNA.



PROCESSO Nº: 0817157-73.2018.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: T A C
ADVOGADO: J D C De S J
IMPETRADO: CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE PERNAMBUCO - CREMEPE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

 
DECISÃO

1. Relatório


T A C, qualificada na inicial, impetrou este "MANDADO DE SEGURANÇA" em face de ato atribuído ao Ilmo. Sr. Dr. Presidente do Conselho Regional de Medicina de Pernambuco. Aduziu, em síntese, que: a Autoridade Impetrada teria negado a expedição de título de especialista em Medicina do Trabalho à Impetrante, com base nas Resoluções do CFM n° 1634/2002 (já revogada), 1799/2006 e 1960/2010 (dispõe sobre o Registro de Qualificação de Especialidade Médica em virtude de documentos e condições anteriores a 15 de abril de 1989); a Impetrante seria detentora de certificado de diploma de Pós-Graduação Lato Sensu / Especialização em Medicina do Trabalho, e devidamente inscrita do Conselho Regional de Medicina de Pernambuco (CREMEPE), de acordo com o art. 17 da Lei 3268/57; viria exercendo tal especialidade, sem qualquer oposição do Conselho, durante o período de 03/11/2008 a 02/01/2009, junto ao Centro Médico Otávio de Freitas, e, desde 15/01/2014, estaria exercendo junto às Indústrias Reunidas Raymundo da Fonte S/A, sendo Médica Coordenadora do PCMSO (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional) desde 07/08/2014 e a responsável técnica do Ambulatório para todos os efeitos legais desde 14/04/2017; a partir de Dezembro do corrente ano, passaria a viger nova norma regulamentadora (portaria Mtb n. 2018/2014 (nova NR-4)), emitida pelo Ministério do Trabalho, cujo teor vai de encontro ao mencionado art. 17, tendo em vista que passará a exigir Registro de qualificação de especialista em Medicina do Trabalho aos médicos com função de coordenar PCMSOs, por exemplo, função esta exercida pela Impetrante; a Impetrante, por vir exercendo a especialidade de Medicina do Trabalho haveria uma década faria jus ao registro dessa especialidade perante o Conselho Regional de Medicina, de forma a garantir o exercício de sua atual função - a qual exerceria legalmente desde 2014 - não obstante a referida nova exigência da Portaria do Ministério do Trabalho.Teceu outros comentários. Transcreveu dispositivos legais e ementas de decisões judiciais. Pugnou, ao final: "a) A concessão do pedido de TUTELA DE URGÊNCIA, em favor da impetrante, inaudita altera parte, a fim de conceder, desde já, a segurança no sentido de determinar que a autoridade coatora realize a expedição de título de especialista da impetrante em Medicina do Trabalho, evitando a consumação do dano". Deu valor à causa. Inicial instruída com procuração e documentos.

É o relatório, no essencial.

Passo a fundamentar e a decidir.


2. Fundamentação


2.1 Do pedido de medida liminar

A concessão de medida liminar em mandado de segurança exige a concorrência dos dois pressupostos legais: a relevância do fundamento (fumus boni juris) e  o perigo de um prejuízo se do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida caso, ao final, seja deferida (periculum in mora).

O presente mandado de segurança objetiva que a Autoridade apontada como coatora "realize a expedição de título de especialista da impetrante em Medicina do Trabalho" no Conselho Regional de Medicina.

No caso concreto, tenho por não caracterizada a presença do fumus boni juris, eis que, prima facie, não se reveste de ilegalidade o ato apontado como coator do Ilmo. Sr. Dr. Presidente do CREMEPE, que indeferiu o pedido da Impetrante para fins de registro da especialidade em Medicina do Trabalho naquele Conselho Regional de Medicina, decisão essa calcada nas resoluções do Conselho Federal de Medicina (CFM n° 1634/2002, 1799/2006 e 1960/2010), uma vez que não compete aos Conselhos Regionais de Medicina registrarem o certificado de conclusão de curso de especialização em Medicina do Trabalho, em nível de pós-graduação lato sensu.

Dispõe a Resolução CFM nº 1799/2006, verbis:

"O Conselho Federal de Medicina, no uso das atribuições conferidas pela Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958, e pela Lei nº 11.000, de 15 de dezembro de 2004, e

CONSIDERANDO a Lei n° 3.268, de 1957, que prevê que os médicos devem registrar seus títulos de especialistas nos CRMs;

CONSIDERANDO a Norma Regulamentadora n° 4 do Ministério do Trabalho, com redação dada pela Portaria Tem/SST n° 11, de 17 de setembro de 1990, que em seu item 4.4.1, alínea b, dispõe: "4.4.1 Para fins desta Norma Regulamentadora, as empresas obrigadas a constituir Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho deverão exigir dos profissionais que os integram, comprovação de que satisfazem os seguintes requisitos: (...), b) Médico do Trabalho - médico portador de certificado de conclusão de curso de especialização em Medicina do Trabalho, em nível de pós-graduação, ou portador de certificado de residência médica em área de concentração em saúde do trabalhador ou denominação equivalente, reconhecida pela Comissão Nacional de Residência Médica, do Ministério da Educação, ambos ministrados por universidade ou faculdade que mantenha curso de graduação em medicina";

CONSIDERANDO o Convênio Associação Médica Brasileira/Conselho Federal de Medicina/Comissão Nacional de Residência Médica, publicado em 8 de maio de 2002 e regulamentado pelo art. 1° da Resolução CFM n° 1.634, de 29 de abril de 2002, que estabelece critérios para o reconhecimento e denominação de especialidades e áreas de atuação na Medicina, e a forma de concessão e registro de títulos;

CONSIDERANDO ser vedada ao médico a divulgação de especialidade ou área de atuação não reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina ou pela Comissão Mista de Especialidades, conforme determina o art. 4° da Resolução CFM n° 1.634, de 2002;

CONSIDERANDO, finalmente, o decidido em sessão plenária do dia 11 de agosto de 2006;

RESOLVE:
Art. 1° Não compete aos Conselhos Regionais de Medicina registrarem o certificado de conclusão de curso de especialização em Medicina do Trabalho, em nível de pós-graduação, definido na 1ª parte, alínea "b" do item 4.4.1 da NR-4, haja vista este certificado não conferir ao médico o título de especialista em Medicina do Trabalho.

Art. 2° Os médicos que atenderem as normas do Convênio AMB/CFM/CNRM terão seus títulos de especialista em Medicina do Trabalho registrados nos Conselhos Regionais de Medicina. Art. 3º Esta resolução entrará em vigor na data de sua publicação.".(G.N.)

Por sua vez, o convênio de reconhecimento de especialidades médicas firmado entre o Conselho Federal de Medicina (CFM), a Associação Médica Brasileira (AMB) e a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), firmado nos termos da acima referida Resolução CFM nº 1.634/2002, alterada pela Resolução CFM nº 1.970/2011, estabelece que o título de especialista deve ser obtido por meio das sociedades das respectivas especialidades, filiadas à Associação Médica Brasileira - AMB:

"O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso das atribuições conferidas pela Lei nº 3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto nº 44.045, de 19 de julho de 1958, e a Lei nº 11.000, de 15 de dezembro de 2004, que altera Lei nº 3.268/57, e,

CONSIDERANDO que o objeto deste convênio visa disciplinar e uniformizar a nomenclatura de especialidades médicas e suas áreas de atuação;

CONSIDERANDO que são polos distintos a conferir os certificados, um deles decorrente da competência da Comissão Nacional de Residência Médica do MEC e outro da Associação Médica Brasileira e seus departamentos (sociedades) de especialidade;

CONSIDERANDO que tais competências não se confundem quer quanto às estratégias de formação quer quanto à forma de avaliação e outorga do certificado;

CONSIDERANDO, finalmente, o decidido na sessão plenária realizada em 8 de junho de 2011,

RESOLVE:

Art. 1º O artigo 3º da Resolução CFM nº 1.634, de 11 de abril de 2002, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 3º Fica vedada ao médico a divulgação de especialidade ou área de atuação que não for reconhecida pelo Conselho Federal de Medicina".

Art. 2º As alíneas "a", "b" e "c" da Cláusula Primeira, do Objeto, do Convênio AMB/CFM celebrado na Resolução CFM nº 1.634, de 11 de abril de 2002, passa a vigorar com a seguinte redação:

a.    CNRM - Credenciar, autorizar, avaliar e fiscalizar o funcionamento dos programas de Residência Médica, conferindo seus certificados;

b.    AMB - Orientar as suas sociedades de especialidade e fiscalizar a forma de concessão de títulos e certificados emitidos pelas mesmas e em conformidade com este convênio;

c.    CFM - Registrar os títulos e certificados emitidos na forma da lei e deste convênio.".(G.N.)

Da análise dos documentos acostados à inicial, observo que a Impetrante, apesar de comprovar ter concluído o curso de Pós-graduação Lato Sensu / Especialização em Medicina do Trabalho no ano de 2009 (id. nº 4058300.8902421), não faz prova de que tenha apresentado para fins de registro no CREMEPE, ora Impetrado, o "título de especialista", nos termos das supratranscritas resoluções do CFM.

Especialização latu sensu, prima facie, não corresponde ao título de especialista, na forma das regras acima transcritas das Resoluções do  referido Conselho Federal de Medicina.
Essa situação afasta, a existência do fumus boni iuris e, consequentemente, a possibilidade de conceder-se a pretendida medida liminar. Ausente esse pressuposto  desnecessária a análise da presença do periculum in mora, tendo em vista que a concessão do provimento demanda a concomitância desses pressupostos.


3. Dispositivo


Posto isso:

3.1 - Indefiro o pedido de medida liminar.

3.2 - Notifique-se a DD Autoridade apontada como coatora, na forma e para os fins do  inciso I do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009.

3.3 - Outrossim, determino que o Órgão de representação judicial do mencionado Conselho seja cientificado desta decisão, para os fins do inciso II do art. 7º da mencionada Lei.

3.4 - No momento oportuno, ao Ministério Público Federal - MPF para, querendo, apresentar o r. parecer legal.
Cumpra-se.

Intime-se.

Recife, 03.12.2018.
Francisco Alves dos Santos Jr.
Juiz Federal, 2a Vara-PE.

MPPL


(PL)