quarta-feira, 14 de agosto de 2019

DEFICIENTE VISUAL. AQUISIÇÃO DE AUTOMÓVEL COM ISENÇÃO DO IPI.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O deficiente visual, cujo olho bom tenha acuidade igual ou inferior a 20/200, pode comprar certo tipo de automóvel com isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados. Na decisão que segue, uma determinada Deficiente Visual, que preenchia os requisitos legais, teve esse pedido negado na Receita Federal do Brasil, tendo os d. Julgadores administrativos alegado que ela não preencheria requisitos que não estavam e não estão na Lei que trata do assunto, a Lei nº 8.989, de 1995, cuja vigência foi prorrogada para 31 de dezembro de 2021, pela Lei nº 13.146, de 2015.
Boa leitura. 

PROCESSO Nº: 0815048-52.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: K DE O
ADVOGADO: V S
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)


D E C I S Ã O  
 
1. Breve Relatório

K DE O, qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança em face do Ilmo. Sr. Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, vinculado à Secretaria Especial da Delegacia da Receita  Federal do Brasil em Recife. Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita. Aduziu, em síntese, que:  a Impetrante seria deficiente visual, sem percepção luminosa em olho direito e 20/20 em olho esquerdo com melhor correção; seria portadora de Miopia, Astigmatismo, Cegueira em um olho (CID: H52.1 / H52.2 / H54.4); também teria sido diagnosticada com  Nevralgia do Trigêmeo (CID: 10 G50.0), conforme documentação anexa; por conta de tal deficiência e da necessidade premente de aquisição de veículo para constante locomoção, pretenderia seu enquadramento na situação prevista na Lei 8.989/95, a qual disporia sobre a Isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, na aquisição de automóveis para pessoas portadoras de deficiência física; teria sido requerido, junto a Receita Federal dois pedidos para isenção de IPI - Pessoa com Deficiência Física e/ou visual (nº de protocolo: 13000.059435/2019-20 e nº 13000.15469/2019-59), em conjunto com os relatórios médicos e Laudo de Avaliação para Isenção IPI, restando comprovado a deficiência visual da Impetrante; em 10/03/2019, em resposta ao pedido (nº 13000.059435/2019-20), não teria sido reconhecido o direito ao gozo do benefício fiscal pleiteado, alegando que a interessada não teria atendido aos seguintes requisitos legais, pois no campo de observações da CNH (Carteira Nacional de Habilitação) pelo menos uma das letras (C, D, E, F, G, G, I, J, K, L, T, U, X, W), caracterizando, assim, ausência de restrição compatível com a deficiência física apontada; já no segundo pedido (nº 13000.15469/2019-59), junto com os documentos, teria sido realizado o envio a cópia da CNH Especial (Carteira Nacional de Habilitação) já inclusa com as letras (A e X), significando a letra A (uso obrigatório de lentes corretivas) e X (outras restrições), restando assim, comprovado e necessário a isenção requerida; a Impetrante possuiria diversos laudos e relatórios médicos, comprovando sua deficiência visual; mas,  para sua surpresa, o seu pedido para gozo da mencionada isenção tributária fora indeferido novamente, sob o motivo do não preenchimento, porque seria portadora de carteira de habilitação (CNH) valida, situação incompatível com a deficiência indicada, e por não ter localizado o CPF do médico no cadastro de profissionais do Ministério da Saúde;  mesmo de posse de todas esses documentos e informações apresentadas a Impetrante estaria sendo impedida de obter a isenção de IPI para aquisição de veículo, não restando outra alternativa senão bater as portas do judiciário a fim de demonstrar a violação do direito líquido e certo da Impetrante; analisando-se o despacho decisório; seria possível verificar que o indeferimento teria se baseado no disposto  no disposto no § 2º do Art.  da lei federal 8989/95, nos termos ali transcritos; a decisão administrativa não mereceria prosperar, uma vez que, conforme relatório anexo, a deficiência da Impetrante se enquadraria perfeitamente no que dispõe o artigo acima descrito; nem toda deficiência visual seria necessariamente dentre as opções supracitadas de comprometimento funcional, haja vista a Impetrante seria portadora de visão monocular, o que comprometeria somente o olho direito; os condutores de veículos automotores que possuem visão monocular, ou seja, que só enxergam de um olho, só poderiam conduzir veículos das categorias "A" e "B"; portanto, não poderão dirigir caminhões, ônibus e carretas; também seriam considerados inaptos a direção desses veículos, os condutores que possuíssem baixa de visão em um dos olhos, de modo que não atingisse os limites mínimos exigidos pelas normas do CONTRAN; a visão monocular afetaria a visão do indivíduo de diversas maneiras; haveria duas conclusões principais que seriam dirigidas uniformemente e predominantemente pela literatura publicada e pelas autoridades; os dois déficits preliminares seriam a perda da visão binocular estereóptica (visão de profundidade / noção de distância) e redução do campo de visão periférico (visão lateral); a maioria dos sintomas da visão monocular seria um resultado dessas duas deficiências; a Visão Monocular (CID 10 H54-4) seria caracterizada pela capacidade de uma pessoa de conseguir enxergar com apenas um olho, possuindo desse modo, noção de profundidade e sensação tridimensional e visão periférica limitada afetando assim, sua capacidade de atenção e convívio social; por essas limitações, os indivíduos com visão monocular só poderiam conduzir os veículos das categorias "A" e "B", inclusive com recomendações de espelhos retrovisores maiores, dispositivos auxiliares de entrada nas garagens como espelhos nas laterais dos portões e no caso de motocicletas, capacetes com maior abertura lateral, limitando menos o campo de visão; embora a cegueira monocular tenha sido reconhecida como deficiência e doença grave dando o direto a isenção de imposto de renda sobre proventos de aposentadoria e pensão, nos casos de pedido de isenção de IOF - Impostos sobre operações financeiras e IPI - Impostos sobre produtos industrializados na compra de carro novo, o deficiente visual monocular ainda enfrentaria dificuldades e não tem muitas vezes seu direito reconhecido tendo que impetrar ação judicial para garantir o benefício; para que o contribuinte tenha o benefício, seria necessário que é o seu melhor olho também tivesse a visão comprometida, ou seja, acuidade visual igual ou inferior a 20/200 da Tabela Snellen, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20º, ou ocorrência simultânea de ambas as situações, a chamada cegueira legal, como seria o caso da Impetrante; vários estados brasileiros já possuiriam leis classificando a visão monocular como uma deficiência e garantindo aos portadores todos os diretos reservados aos deficientes físicos. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, pela concessão de medida liminar inaudita altera parte, para determinar que a União conceda a Isenção do Imposto sobre produtos Industrializados (IPI) para aquisição de veículo pela Impetrante, conforme entendimento já pacificado nos Tribunais pátrios.
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.

2. Fundamentação
A concessão de medidas liminares em mandados de segurança está atrelada ao disposto no artigo 7º, III, da Lei nº 12.016/09, que possibilita seu deferimento em caso de concomitância da plausibilidade do direito invocado (fundamento relevante) e do risco de perecimento de tal direito face à urgência do pedido (periculum in mora).
A regra legal, mais especificamente, determina que o segundo requisito estará presente quando "do ato impugnado puder resultar ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida".
Pois bem.
Constato, nos documentos acostados sob id nº 4058300.11410132, que, na primeira  r. decisão administrativa, o benefício fiscal foi negado porque a ora Impetrante seria portadora de Carteira CNH, situação essa que seria incompatível com o benefício perseguido(compra de automóvel) e o número do CPF do médico, que assinara o respectivo laudo médico, não constaria do cadastro do Ministério da Saúde.
Já na segunda r. decisão administrativa argumentou o respectivo d. Julgador que o benefício não seria concedido porque não constaria da Carteira CNH da ora Impetrante, na coluna observações, uma das seguintes letras: C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, T, U, X, W.
Ocorre que mencionadas exigências não fazem parte das exigências fixadas na Lei que trata do benefício fiscal em debate. 
Não argumentou, nenhum dos d. Julgadores Administrativos, que a ora Impetrante não preenchia os requisitos legais, descritos no § 2º do art. 1º da Lei nº 8.989, de 24.02.1995, cuja vigência foi estendida para 31.12.2021, pelo art. 126 da Lei nº 13.146, de 2015, o qual tem a seguinte redação:
"§ 2o Para a concessão do benefício previsto no art. 1o é considerada pessoa portadora de deficiência visual aquela que apresenta acuidade visual igual ou menor que 20/200 (tabela de Snellen) no melhor olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20°, ou ocorrência simultânea de ambas as situações." (Incluído pela Lei nº 10.690, de 16.6.2003)
Como está dito na petição inicial e consta do respectivo Laudo Médico, acostado pela Parte Impetrante, sob id 4058300.11409961,  é ela cega de um olho e o olho bom tem acuidade visual de 20/200.
Então, como as exigências dos d. Julgadores Administrativos não estão na referida Lei e a Impetrante comprovou que preenche os requisitos que estão em tal Lei, sobretudo no acima transcrito § 2º do seu art. 1º, tenho que comprovou a existência do fumus boni iuris.
O perículum in mora também se faz presente, porque necessita do automóvel, que pretende comprar com o mencionado benefício fiscal, para locomoção.

3. Dispositivo

Ante o exposto, defiro o pedido de concessão de medida liminar e determino que a DD Autoridade Impetrada tome providências para que a ora Impetrante adquira automóvel com o referido benefício fiscal, consistente na isenção do IPI - Imposto sobre Produtos Industrializados, na forma da Lei indicada na fundamentação supra. 
Outrossim, determino que se notifique a DD. Autoridade Impetrada para prestar as informações legais e a intime para cumprir a decisão supra, sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009.
Determino, ainda, que se dê ciência deste mandado de segurança à representação judicial da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, no caso, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional em Recife, para os fins do inciso II do art. 7º da mencionada Lei.
No momento oportuno, ao Ministério Público Federal para o parecer legal.
Cumpra-se, com urgência.

Recife, 14.08.2019
Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE





CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO POR MUNICÍPIO. NECESSIDADE DE LICITAÇÃO PÚBLICA.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Os Prefeitos não podem contratar advogados ou escritórios de advocacia particulares sem licitação pública. Óbvio que, caso o Município tenha Procuradoria própria, caberá ao respectivo Procurador representar o Município em processos administrativos e principalmente em processos judiciais. E, caso não tenha Procuradoria constituída, o Município poderá contratar advogado ou um escritório de advocacia para tal fim, mas só poderá fazê-lo por meio de licitação, por força de exigência de regras legais. 
E é bom que assim seja, porque privilegia a moralidade pública,  evitando-se que o Sr. Prefeito dê preferência na contratação desse ou daquele advogado e também finda por afastar a possibilidade de corrupção nesse tipo de contratação. 
A decisão que segue trata desse assunto, indicando inclusive precedente da 1ª Seção do Superior Tribuna de Justiça a respeito do assunto. 
Boa leitura.



PROCESSO Nº: 0814242-17.2019.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: MUNICÍPÍO DE SÃO LOURENÇO DA MATA. 
ADVOGADO: P M De M B
RÉU: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL 
2ª VARA FEDERAL - PE


D E C I S Ã O


1. Breve Relatório
Pugna o Município-Autor por provimento jurisdicional que lhe assegure a concessão a tutela de urgência, para determinar-se à União Federal se abstenha de exigir da municipalidade autora o recolhimento à Secretaria da Receita Federal do Brasil do Imposto de Renda Retido na Fonte pelo Município-autor, incidente sobre rendimentos pagos por este a pessoas jurídicas, decorrentes de contratos de fornecimento de bens e/ou serviços, bem como que se abstenha de exigir a declaração na DCTF dos valores relativos ao IRRF incidente sobre rendimentos pagos a qualquer título, bem como as suas Autarquias e Fundações. 
É o relatório, no essencial.
Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Da suspensão do processo
Insta consignar, inicialmente, que a Presidente do STF, Ministra Cármen Lúcia, proferiu decisão na PET n.º 7.001/RS, publicada no DJe de 01.02.2018,  suspendendo os "atos decisórios de mérito de controvérsia constante de todos os processos, individuais ou coletivos, em curso no território nacional, que versem sobre a questão objeto do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas n. 5008835- 44.2017.4.04.0000, admitido no Tribunal Regional Federal da Quarta Região (§ 4o do art. 1.029 do Código de Processo Civil), mantendo-se a possibilidade jurídica de adoção dos atos e das providências necessárias à instrução das causas instauradas ou que vierem a ser ajuizadas e do julgamento dos eventuais pedidos distintos e cumulativos deduzidos", ou seja, em relação aos processos cujo objeto seja a discussão da interpretação do art. 158, inciso I, da Constituição Federal, no âmbito da distribuição das receitas arrecadadas a título de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), incidente sobre valores pagos pelos Municípios, a qualquer título, a pessoas físicas ou jurídicas contratadas para prestação de bens ou serviços.

Diante de tal contexto, tenho que, de fato, as determinações de suspensão em sede de recurso repetitivo não afastam, de regra, a necessidade de analisar pedido de medida liminar ou de tutela provisória de urgência, em face de questão que tenha que ser resolvida de plano, sob pena de restar afrontado o direito fundamental da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF).

Com efeito, é adequada a aplicação por analogia da regra inserta no art. 982, § 2º, do CPC, relativa ao sobrestamento de processos pela admissão de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas ("Durante a suspensão, o pedido de tutela de urgência deverá ser dirigido ao juízo onde tramita o processo suspenso"),  cumulada com a disposição contida no art. 314 do CPC ("Durante a suspensão é vedado praticar qualquer ato processual, podendo o juiz, todavia, determinar a realização de atos urgentes a fim de evitar dano irreparável, salvo no caso de arguição de impedimento e de suspeição").

Entretanto, diante de tal panorama e dos precedentes colacionados na petição inicial, reservo-me a deliberar sobre o pleito antecipatório após o decurso do prazo para a Contestação.

2.2. Da representação do Município
Constato haver fortes indícios de que o Sr. Prefeito contratou Advogados para representação judicial do Município autor sem a devida licitação pública (pelo menos não há nos autos a respectiva prova, tampouco a prova do respectivo contrato).   
Como se sabe, qualquer Unidade da Federação pode ter o Órgão Procuradoria, para a defesa judicial e extrajudicial dos seus interesses e, na ausência desse Órgão, pode contratar Escritório de Advocacia ou Advogado, mas, para tanto, tendo em vista regras constitucionais e legais vigentes, só poderá fazê-lo por licitação pública, uma vez que nessa seara não existe a figura legal denominada de "notória especialização", que poderia dispensar a licitação(inciso II do art. 25 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, e, principalmente, o respectivo § 1º).

A Revista CONJUR, de 17.12.2017, noticiou que o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco - TCE/PE já se posicionara, em julgado pioneiro, sobre esse assunto e não afastou a necessidade de licitação, exceto para contratação de jurista de notório saber jurídico.

Obviamente, como está na Lei e como já decidiu o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco - TCE/PE, para casos muito especiais, o Município poderá contratar, sem licitação, mas por meio do processo administrativo próprio, jurista de notória especialidade para um parecer ou até mesmo para funcionar como advogado, mas essa notória especialidade tem que ser clara e sem necessidade de delongas para a sua comprovação, o que não parece ser o caso dos autos.

Aliás, o Estado de Pernambuco teve a sua Constituição alterada pela Emenda Constitucional nº 45, de 130.502019, com inclusão de dispositivo tratando especificamente desse assunto, verbis:

"Art. 81-A. No âmbito dos Municípios, bem como de suas autarquias e fundações públicas, o assessoramento e a consultoria jurídica, bem como a representação judicial e extrajudicial, serão realizadas pela Procuradoria Municipal. (AC)
§ 1º As atribuições da Procuradoria Municipal poderão ser exercidas, isolada ou concomitantemente, através da instituição de quadro de pessoal composto por procuradores em cargos permanentes efetivos ou da contratação de advogados ou sociedades de advogados. (AC)
§ 2º No caso de opção pela instituição de quadro de pessoal serão observadas as seguintes regras: (AC)
I - os procuradores municipais serão organizados em carreira, cujo ingresso dependerá de aprovação em concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases; e, (AC)
II - A Procuradoria Municipal terá por chefe o Procurador-Geral do Município, cuja forma e requisitos de investidura serão definidos em lei municipal. (AC)
§ 3º A contratação de advogados ou sociedades de advogados pelos entes municipais obedecerá aos ditames da legislação federal que disciplina as normas para licitações e contratos da Administração Pública. (AC)
§ 4º As Câmaras Municipais poderão instituir Procuradorias Legislativas, nos moldes previstos no § 1º, para o desempenho das funções de assessoramento e consultoria jurídica, bem como p ara a representação judicial e extrajudicial. (AC)
§ 5º A representação judicial da Câmara Municipal pela Procuradoria Legislativa ocorrerá nos casos em que seja necessário praticar em juízo, em nome próprio, atos processuais na defesa de sua autonomia e independência frente aos demais Poderes e órgãos constitucionais." (AC)”.
O assunto não é desconhecido do Superior Tribunal de Justiça, cuja 2ª Turma teve oportunidade de decidir a respeito do assunto, no qual determinado Prefeito e determinado Advogado foram enquadrados no art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429, de 1992), porque o primeiro contratou o segundo para representar judicialmente o Município sem licitação pública, para serviços advocatícios que não se enquadravam na denominada "notória especialidade", com a agravante de que o Município tinha o Órgão Procuradoria Jurídico-Judicial.[1].

Mais recentemente a 1ª Seção dessa Corte Superior manteve mencionado entendimento, no sentido de que Município não pode contratar escritório de advogado particular, tampouco advogado particular, sem a devida  licitação pública[2].

É verdade que o assunto encontra-se sob repercussão geral no  Supremo Tribunal Federal, nos autos do RE 656.558, cujo julgamento (ainda não concluído) teve início no dia 14/06/2017.

Então, enquanto a Suprema Corte não decidir a matéria, prevalecem os acima invocados julgados do Superior Tribunal de Justiça, especialmente o último, que é da sua 1ª Seção.

E, enquanto isso, os Senhores  Prefeitos devem privilegiar a moralidade pública, não contratando advogados ou escritórios de advocacia particulares sem licitação pública, tenha o Município, ou não, Procuradoria devidamente constituída.

Registro que inúmeros fatos como este foram comunicados ao Ministério Público Federal, em outras ações, e este opinou, no Declínio de Atribuições nº 35/2017/PRM/STA, Ref. N.F n] 1.26.003.000107/2017-12, com base nos Enunciados nºs 2 e 4 da 1ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, que, doravante, a comunicação deveria ser feita aos mencionados Órgãos Estaduais, aos quais competem as providências supra.

Registro ainda que em um  dos  inúmeros casos que comuniquei ao Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco - TCE/PE, recebi da d. Procurador-Geral do Ministério Público de Contas de Pernambuco, DD Dra. GERMANA GALVÃO CAVALCANTI AUREANO, o Ofício TCMPCO-MP 631/2018, informando-me que fora expedido “Alerta de Responsabilização” à Prefeitura do Município de Brejão, pelo Relator das contas, d. Conselheiro Ranilson Brandão Ramos, via Ofício TC/GC02 nº 00188/2018.

Mencionado Ofício chegou-me com cópia de todo o procedimento, inclusive, inclusive do referido “Alerta de Responsabilização”, do qual destaco o seguinte trecho:

“Frente ao exposto, urge a necessidade de promover a regularização da representação processual do Município nos autos da aludida Ação Ordinária, Processo nº 0807193-58.2018.4.05.8300, dada a notícia extraída do Ofício 091/2018-GAB, enviado a este Órgão Ministerial e subscrito pela Prefeita, da existência de, ao menos, um procurador nos quadros do Município de Brejão, alertando para as consequências oriundas da não adoção da medida ora determinada, ficando V. Exa exortada da responsabilização por possíveis danos ao erário municipal, ressalvando que este Tribunal não acolherá alegações de desconhecimento dos fatos consignados pelo Ministério Público de Contas, quando da eventual apresentação de defesa.”.

Nessa situação, tenho que este feito deve ficar suspenso até que essa questão seja devidamente esclarecida pelo Município, ora Autor.

3. Dispositivo
Posto isso:
Diante de todo o exposto:
a)     determino que a Secretaria remeta cópia desta decisão, instruída com a petição inicial, procuração, diploma de Prefeito e Termo de Posse do Prefeito na respectiva Prefeitura, para o Tribunal de Constas do Estado de Pernambuco - TCE/PE e para o Ministério Público do mesmo Estado, para os fins acima indicados, e que mencionados Órgãos Estaduais encaminhem, posteriormente, para este Juízo, para juntada nestes autos, cópia das providências que venham a tomar;
b)      suspendo o andamento do feito até que sejam dadas as explicações necessárias sobre o consignado  no subitem 2.2 da fundamentação supra.
Cumpra-se.
Intimem-se.

Recife, 12.08.2019

Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE.


[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 2ª Turma. Relator Ministro Humberto Martins. Recurso Especial - REsp nº 1..368.129/GO, julgado em 27/10/2015, publicado no Diário da Justiça Eletrônico - DJe de 12/02/2016).
[2] __________________________. 1ª Seção. Embargos de Divergência no REsp nº 1.192.186 - PR (2009/0096181-3). Relator para o Acórdão Ministro Og Fernandes. Julgado em 26.06.2019, in Diário Justiça Eletrônico – DJe de 10.08.2019.

sábado, 10 de agosto de 2019

CUSTAS JUDICIAIS. NÃO RECOLHIMENTO. PARTE AUTORA INTIMADA PELO ADVOGADO. DESNECESSIDADE DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA PARTE AUTORA. PRECENTE DO STJ

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Desde quando vigente o Código de  Processo  Civil de 1973 que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o Juízo deve intimar a Parte Autora por meio  do seu advogado, na forma  legal vigente, para o recolhimento das custas judiciais, sendo dispensada a intimação pessoal da Parte Autora e, na hipótese de não recolhimento, cabe o cancelamento da distribuição, com a consequente extinção do processo,  sem  resolução do mérito. 
Trata-se desse  assunto na sentença que segue. 
Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0800726-27.2019.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR:  SESST - EPP
ADVOGADO: A J R J
RÉU: CONSELHO REGIONAL DE ENG ARQUITETURA E AGRONOMIA-PE.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

 
Sentença tipo C registrada eletronicamente

Vistos, etc. 

EMENTA:- PROCESSUAL CIVIL. NÃO RECOLHIMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS.

O não recolhimento das custas processuais inviabiliza o regular andamento do processo, provocando o respectivo cancelamento na distribuição e extinção do feito, sem resolução do mérito.
Intimação da Parte pelo Advogado, desnecessária a sua intimação  pessoal(precedente do STJ).


1. Relatório

S E S S T - SESST, qualificada na petição inicial, ajuizou esta "Ação Ordinária de Obrigação de Fazer c/c Pedido de Tutela de Urgência Inaldita Altera Pars", em face do CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DE PERNAMBUCO, objetivando em sede de tutela de urgência, inaudita altera parte, "para que seja reconhecido o ato ilegal do Demandado, que sobrestou o processo administrativo de cadastro do curso superior de Tecnólogo de Construção de Edifícios da Autora, sob um pedido impossível e por tal motivo vem indeferindo o registro profissional provisório dos alunos egressos da IES, devendo ser determinada a suspensão imediata do impedimento em debate, a saber, a suposta ausência de documento que comprove a homologação pelo MEC do reconhecimento do curso superior da IES e, por corolário, requer que seja determinado o cadastro do curso com o título de Tecnólogo (a) em Construção Civil - Edifícios, código 1120101, concedendo aos egressos o registro profissional e as atribuições previstas nos Artigos 3º e 4º da Resolução n.º 303/86, do Confea no âmbito das edificações". Atribuiu valor à causa. Inicial instruída com procuração e documentos.

Decisão exarada em 02/02/2019 (id. nº 4058300.9755835), na qual se determinou a intimação da Parte Autora para comprovar o recolhimento das custas iniciais, sob pena do cancelamento da distribuição deste feito (art. 290 do CPC).

Certificado o decurso de prazo sem manifestação da Parte Autora (id. nº 0800726-27.2019.4.05.8300T).

Vieram-me os autos conclusos.
Fundamento e Decido.

2. Fundamentação

A Parte Autora foi regularmente intimada, por seu Advogado,   para comprovar o recolhimento das custas processuais, todavia não tomou essa providência, pois, segundo certificado nos autos (id. nº 0800726-27.2019.4.05.8300T), transcorreu e findou o prazo sem a comprovação do recolhimento.
No REsp 1.024.308/RJ, julgado em 19.03.2009, in DJe de 30.03.2009, concluiu-se que nesse tipo de situação, que teria que ser atendida pelo Advogado, não há necessidade de intimação pessoal da Parte Autora, como exigido pelo § do art. 485 do vigente CPC, que tinha correspondência no CPC de 1973, vigente na época do advento do mencionado d. julgado. .

As custas judiciais gozam de natureza tributária, modalidade taxa, e objetivam remunerar o serviço jurisdicional prestado pelo Estado.

Não sendo as custas processuais pagas no seu valor devido, o serviço público jurisdicional não pode ser prestado, sob pena de locupletamento ilícito da Jurisdicionada,ora Autora.

A ausência de recolhimento do valor devido a título de custas judiciais caracteriza insuficiência de preparo e determina o cancelamento da distribuição do feito (art. 290, CPC) e a extinção do processo, sem resolução do mérito, por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular (art. 485 - IV do CPC).

3. Dispositivo

Posto isso, ante o não recolhimento das custas processuais, determino o cancelamento da distribuição (art. 290, CPC) e dou este processo por extinto, sem resolução do mérito (art. 485, IV do CPC).

Custas pela Parte Autora.

Sem honorários advocatícios, face à ausência da triangulação processual.

No momento oportuno, dê-se baixa e arquive-se.

Registre-se. Intime(m)-se.
Recife, 10.08.2019
Francisco Alves dos Santos Jr
 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE.

quarta-feira, 31 de julho de 2019

SENTENÇA ANTES DA CITAÇÃO DA PARTE REQUERIDA. FGTS E AS RAZÕES JURÍDICO-ECONÔMICAS DA SUA INSTITUIÇÃO. ÍNDICES DE ATUALIZAÇÃO

Por Francisco Alves dos  Santos Júnior

Na sentença que segue, aplica-se regra do vigente Código de  Processo Civil, que já existia no diploma  processual de 1973, a qual permite o julgamento do mérito antes da citação da Parte Requerida.  E também faz-se um rigoroso histórico legal do FGTS e das razões jurídico-econômicas que lhe deram origem no ano de 1966, bem como sobre os  índices de atualização que se aplicam aos respectivos ativos, segundo julgado de efeito repetitivo da Primeira Seção do Superior Tribunal de  Justiça. .  
Boa  leitura. 


PROCESSO Nº: 0813341-49.2019.4.05.8300 - OUTROS PROCEDIMENTOS DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
REQUERENTE: M R DA S
ADVOGADO: A A G S
REQUERIDO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL - CAIXA
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

 
SENTENÇA TIPO B

Sentença registrada eletronicamente 

Ementa: - Direito Econômico. FGTS. Atualização
- Julgamento antecipado, antes da citação da Parte Requerida, com base no inciso II do art. 332 do vigente CPC.
-O FGTS tem natureza jurídica de salário, com poupança compulsória, mas o STJ firmou o entendimento de que não teria natureza contratual.
-Enquanto o Trabalhador não puder levantar a quantia que lhe pertence, depositada no FGTS, o Poder Público, com base em Lei, dele se apropria para realização de finalidades ditas sociais, estabelecidas no  art. 9º da Lei nº 8.036, de 1990, de forma que os índices de correção monetária e de rendimento, segundo a 1ª Seção do STJ, em julgado de efeito repetitivo, de aplicação obrigatória pelos demais Órgãos do Poder Judiciário, só podem ser fixados por Lei, e por isso não podem ser alterados pelo Poder Judiciário, que não tem função legislativa.
-Improcedência.

Vistos etc.

1. Relatório

M R DA S, qualificado na petição inicial, propôs esta ação revisional do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), com pedido de tutela antecipada em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA, pretendendo a substituição do índice de correção monetária de conta vinculada ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, ao argumento de que a aplicação da Taxa Referencial, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal, não se mostraria suficiente para repor as perdas inflacionárias. Acompanham a inicial procuração e documentos.
É o breve relatório.

Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Justiça Gratuita
Concedo a parte Autora o benefício da Justiça Gratuita. (art. 99, § 3º do CPC), não se lhe aplicando o prazo em dobro nem intimação pessoal, porque o(a) seu(sua) advogado(a) não é defensor(a) público ou titular de cargo equivalente, como exigido na Lei nº 1.060, de 1950.

2.1.1. Julgamento antes da citação da Parte Ré

Julgo este feito de plano, liminarmente, antes da citação da Parte Requerida e o faço à luz do inciso II do art. 332 do vigente Código de Processo Civil, porque a matéria em debate já foi objeto de julgamento pela Seção do Superior Tribunal de Justiça - STJ, em recurso especial de efeito repetitivo, em sentido contrário à pretensão autoral.

2.2. A Questão de Fundo

2.2.1. Quanto aos fins econômico-sociais do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, imperioso registrar que este foi criado no ano de 1966, pela Lei nº 5.107, de 13 de setembro do mencionado ano, como opção ao trabalhador em substituição à indenização à qual fazia jus, após dez anos de trabalho, correspondente a um salário atual por cada ano trabalhado, em dobro, uma vez que depois desses dez anos de atividade na mesma Empresa adquiria a estabilidade decenal no emprego, quando então, só não faria jus a essa indenização, correspondente a 20 (vinte) vezes o seu salário da data da demissão sem justa causa, se viesse a ser demitido por justa causa. Mencionada opção, por um dos regimes, não existia na prática. O Empregado, no início da relação empregatícia, sempre era obrigado a fazer a "opção", sob pena de não ser empregado.

Depois da Constituição de 1988, essa "falsa" opção deixou de existir e a submissão ao regime do FGTS passou a ser obrigatória, porque passou a ser "um direito" do trabalhador (art. 7º, III).

Tenho que a instituição do FGTS foi uma exigência de Empresas Multinacionais, especialmente as do setor de automóveis, na década de sessenta do século XX, para abrirem filiais no Brasil, uma vez que a antiga estabilidade decenal, fixada na CLT, era, na visão empresarial, demasiadamente onerosa.

Na época, o Governo de então alegou que o sistema da estabilidade decenal estava esgotado e que o FGTS tinha por escopo salvaguardar o Empregado, em determinadas situações, precipuamente nos casos de demissões sem justa causa, vale dizer, de desemprego.

Então, foi estabelecida, pelo art. 2º da Lei 5.107/66, a obrigatoriedade do Empregador depositar, mensalmente, a importância de 8% da remuneração recebida pelo Empregado, em conta bancária vinculada, em nome do trabalhador, mas que ele só poderia sacar se demitido sem justa causa e em outras poucas situações fixadas na Lei.

Ou seja, o Empregado passou a custear os efeitos futuros de eventual desemprego, quando demitido sem justa causa por seu Empregador, pois 8%(oito por cento) do seu salário passou a ser destacado para depósito no FGTS, dinheiro esse que, embora sendo seu, só poderá sacar no caso de desemprego ou em algumas outras poucas hipóteses, hoje relacionadas no art. 20 da Lei nº 8.036, de 1990, atual regra legal que trata do assunto.

O Empregador ficou livre do ônus da antiga indenização, acima tratada, e ainda passou a pousar de "benemérito", como se o valor do depósito saísse dos seus cofres.

Coisa do então Ministro do Planejamento, Roberto Campos, e por isso apelidado de "Bob Field", graças a essa sua camaradagem com as multinacionais norte-americanas que então se estabeleciam no Brasil.

Diante desse quadro, o jurista Amaury Mascaro Nascimento (USP), com razão, sempre sustentou que a natureza jurídica de valor era salarial e de poupança compulsória[1].

Antes cabia ao Empregador escolher a Instituição Financeira na qual faria o depósito do valor do FGTS e isso gerou uma total falta de controle, pelo que adveio a  Lei nº 8.036, de 1990, centralizando esses depósitos na CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, conforme o seu art. 7º, a qual deve destinar o respectivo montante às finalidades "sociais" indicadas no seu art. 9º.

A atualização do valor desses depósitos sempre foi em percentuais baixíssimos, fixados em Lei Federal.

2.2.2. Com o advento da Lei 8.036/90, houve a vinculação do reajuste aos índices de atualização das cadernetas de poupança, regra geral, o mais baixo do mercado.

Eis o texto do art. 13 dessa Lei, in litteris:

"Art. 13. Os depósitos efetuados nas contas vinculadas serão corrigidos monetariamente com base nos parâmetros fixados para atualização dos saldos dos depósitos de poupança e capitalização juros de (três) por cento ao ano.".

E a aplicação da correção monetária pelo índice da TR - Taxa Referencial aos depósitos das cadernetas de poupança decorre do art. 7º da Lei nº 8.660, de 28.05.1993, Lei essa que criou novos critérios para apuração desse índice.

Os Trabalhadores Empregados, por suas Entidades Representativas, ou isoladamente, propuseram inúmeras ações judiciais para desvincular a correção monetária dos depósitos do FGTS do índice Taxa Referencial - TR, pelo qual se corrigem os depósitos das cadernetas de poupança, em face da pouca rentabilidade destas.

Os Trabalhadores sentem-se prejudicados, e claramente estão sendo, porque esse índice de atualização, a TR, mais 0,5%(meio por cento) de juros como rendimento, somados, ficam, não poucas vezes, abaixo até mesmo do índice da inflação, e muito abaixo de outros índices utilizados pelas Instituições Financeiras para atualização (correção monetária e juros de mora) dos valores que emprestam para seus Clientes.

Então, buscaram no Judiciário a aplicação de índice que pelo menos acompanhasse os resultados da inflação.

Mas, como já dito, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça - STJ, que se autodenomina de Tribunal da Cidadania,  decidiu, em julgado de efeito repetitivo, que a mudança desse índice não pode ser feita pelo Poder Judiciário, mas apenas pelo Parlamento, por meio de Lei, porque o FGTS não teria natureza contratual e os seus depósitos seriam destinados a "finalidades sociais".

Convém transcrever, para maior clareza, a ementa desse julgado:

"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 731. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO - FGTS. SUBSTITUIÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) COMO FATOR DE CORREÇÃO MONETÁRIA DOS VALORES DEPOSITADOS POR ÍNDICE QUE MELHOR REPONHA AS PERDAS DECORRENTES DO PROCESSO INFLACIONÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. FGTS QUE NÃO OSTENTA NATUREZA CONTRATUAL. REGRAMENTO ESTABELECIDO PELO ART. 17 DA LEI N. 8.177/1991 COMBINADO COM OS ARTS. 2º E 7º DA LEI N. 8.660/1993.

1. Para os fins de aplicação do artigo 1.036 do CPC/2015, é mister delimitar o âmbito da tese a ser sufragada neste recurso especial representativo de controvérsia: discute-se a possibilidade, ou não, de a TR ser substituída como índice de correção monetária dos saldos das contas vinculadas ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS.

2. O recorrente assevera que "[...] a TR deixou de refletir, a partir de 1999, as taxas de inflação do mercado financeiro, e, por conseguinte, o FGTS também deixou de remunerar corretamente os depósitos vinculados a cada trabalhador" (fl. 507). Defende a aplicação do INPC ou IPCA ou, ainda, de outro índice que melhor reponha as perdas decorrentes da inflação.

3. Por seu turno, o recorrido alega que a lei obriga a aplicação da TR como fator de correção de monetária, na medida em que o FGTS não tem natureza contratual, tendo em vista que decorre de lei todo o seu disciplinamento, inclusive a correção monetária que lhe remunera.

4. A evolução legislativa respeitante às regras de correção monetária dos depósitos vinculados ao FGTS está delineada da seguinte forma: (i) o art. 3º da Lei n. 5.107/1966 previra que a correção monetária das contas fundiárias respeitaria a legislação especifica; (ii) posteriormente, a Lei n. 5.107/1966 foi alterada pelo Decreto-Lei n. 20/1966, e o art. 3º supra passou a prever que os depósitos estariam sujeitos à correção monetária na forma e pelos critérios adotados pelo Sistema Financeiro da Habitação e capitalizariam juros segundo o disposto no artigo 4º; (iii) em 1989, foi editada a Lei n. 7.839, que passou a disciplinar o FGTS e previu, em seu art. 11, que a correção monetária observaria os parâmetros fixados para atualização dos saldos de depósitos de poupança; (iv) a Lei n. 8.036/1990, ainda em vigor, dispõe, em seu art. 13, a correção monetária dos depósitos vinculados ao FGTS com parâmetro nos índices de atualização da caderneta de poupança; (v) a Lei n. 8.177/1991 estabeleceu regras de desindexação da economia, vindo a estipular, em seu art. 17, que os saldos das contas do FGTS deveriam ser remunerados, e não mais corrigidos, pela taxa aplicável à remuneração básica da poupança; e (vi) a partir da edição da Lei n. 8.660/1993, precisamente em seus arts. 2º e 7º, a Taxa Referencial.

5. O FGTS não tem natureza contratual, na medida em que decorre de lei todo o seu disciplinamento. Precedentes RE 248.188, Relator Ministro Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, DJ 1/6/2001; e RE 226.855/RS, Relator Ministro Moreira Alves, Tribunal Pleno, DJ 13/10/2000.

6. É vedado ao Poder Judiciário substituir índice de correção monetária estabelecido em lei. Precedentes: RE 442634 AgR, Relator Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ 30/11/2007; e RE 200.844 AgR, Relator: Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJ 16/08/2002.

7. O FGTS é fundo de natureza financeira e que ostenta característica de multiplicidade, pois, além de servir de indenização aos trabalhadores, possui a finalidade de fomentar políticas públicas, conforme dispõe o art. 6º da Lei 8.036/1990. TESE PARA FINS DO ART. 1.036 DO CPC/2015

8. A remuneração das contas vinculadas ao FGTS tem disciplina própria, ditada por lei, que estabelece a TR como forma de atualização monetária, sendo vedado, portanto, ao Poder Judiciário substituir o mencionado índice.

9. Recurso especial não provido. Acórdão submetido à sistemática do artigo 1.036 do CPC/2015."

Nota - Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Seção. Recurso Especial - REsp nº 1.614.874/SC, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, julgado em 11/04/2018, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 15/05/2018.

2.2.3. No que tange às decisões das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4.357, 4.425, e do RE 870.947/SE, não se aplicam ao FGTS, pois não trataram da inconstitucionalidade, per si, da TR, mas sim de sua utilização na atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, ante a discriminação entre os índices de correção utilizados quando o poder público é credor e devedor.

Aliás, como se sabe, até a presente data referidos julgados da Suprema Corte não estão podendo ser aplicados, nem mesmo para as verbas nele tratadas, quais sejam, verbas não tributárias devidas judicialmente pela Fazenda Pública aos Administrados, pois ainda sub judice e nesse sentido há recente decisão monocrática do Ministro Luiz Fux, relator de tais ações. Logo, tais julgados da Suprema Corte não se aplicam ao presente caso.

2.2.4. No que diz respeito à aplicação do precedente da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça - STJ, cuja ementa foi acima transcrita (REsp 1.614.874/SC), em sede de recurso repetitivo, antes do trânsito em julgado do acórdão, a jurisprudência das Cortes Superiores é pacífica quanto a essa possibilidade. Nesse sentido, veja-se recente julgamento proferido no AgInt no REsp 1.404.735/RN.

Por outro lado, com o advento do Código de Processo Civil de 2015, mencionada aplicação pelos Juízes de primeira instância e Tribunais inferiores passou a ser obrigatória, conforme regra do inciso III do seu art. 927.

Desta feita, não assiste razão ao(s) Autor(es).

2.3 - Da Verba Sucumbencial e da sua submissão à Condição Suspensiva pelo prazo de 05 (cinco) anos

Não há que se falar em condenação da Parte Autora em verba honorária, porque não se firmou a relação processual.


3. Dispositivo

Posto isso:

3.1) de plano e antes da citação da Parte Requerida, pelas razões consignadas no subtópico 2.1 da fundamentação supra, julgo improcedentes os pedidos desta ação, dando o processo por extinto, com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC/15);

3.2) sem verba honorária, porque não se perfez a relação processual.

3.3) sem condenação em custas, porque a Parte Autora é beneficiária da justiça gratuita.


Sentença não sujeita ao reexame necessário.

Registrada, intime-se.
Recife, 31.07.2019
Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE.

mef




[1] AMAURY MASCARO NASCIMENTO, Curso de Direito do Trabalho, 2º Volume. Ed. 2ª, São Paulo: Saraiva, 1981, p. 131, que também adota a tese do salário diferido, com depósito compulsório.

segunda-feira, 29 de julho de 2019

PLANO DE SAÚDE. A QUALIDADE DE DEPENDENTE IDOSA NÃO PODE FICAR VINCULADA AOS PADRÕES DA DECLARAÇÃO DO IR, PORQUE FERE REGRAS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS DE AMPARO AO IDOSO

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Pode uma regra administrativa de um Plano de Saúde de Servidores da Administração Pública criar critério de enquadramento de uma Mãe como Dependente do filho-Servidor, de forma contrária às regras da Constituição da República e da Lei do Estatuto do Idoso quanto à manutenção ou ampliação do amparo ao idoso? 
Na sentença que segue, esse assunto é amplamente debatido. 
Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0806384-66.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: R S C DE O e Outra ADVOGADO: E L S ADVOGADO: P S C De ORÉUS: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO. e OUTRO  2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



Sentença Tipo A, registrada eletronicamente. 




Vistos, etc.

EMENTA: - PLANO DE SAÚDE. DEPENDENTE. RENDA. EXCLUSÃO. NÃO CABIMENTO.
Se a Dependente de Segurado de Plano de Saúde, atualmente com mais de 80(oitenta) anos de idade,  não tem benefícios previdenciários com reajustes vinculados aos índices de atualização da Tabela do IRPF, tampouco o rendimento do próprio Segurado, e se a referida Tabela não é reajustada pelo índice de reajuste do benefício previdenciário da mencionada Dependente, tampouco pelo índice de reajuste dos vencimentos do seu Filho, o Segurado, não pode a sua(da Segunda Autora) qualidade de Dependente ficar vinculada a valor enquadrável no rol de dependentes do IRPF, porque fere a lógica do sistema e contraria regras da Constituição da República e da Lei do Estatuto do Idoso, as quais orientam no sentido do mais completo amparo ao idoso, com alargamento dos benefícios ao passo que a sua idade aumenta.
Procedência.


1. Relatório

R S C DE O e N C DE O, qualificados na inicial, ajuizaram a presente AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA em face da UNIÃO FEDERAL e do CONSELHO GESTOR DO PROGRAMA DE SAÚDE E ASSISTÊNCIA SOCIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO. Requereram preliminarmente, a prioridade na tramitação do feito. Aduziram, em síntese que: a) o primeiro demandante seria técnico administrativo do Ministério Público da União e teria inserido sua mãe, segunda demandante, no Programa de Saúde e Assistência Social - Plan-Assiste, desde 26/10/2006, porque recebia apenas 02 salários mínimos de aposentadoria/pensão e seria sua dependente economicamente; b) em 2007, a segunda demandante teria sido diagnosticada com Câncer no ovário, atualmente em estágio IV, com metástase; c) no corrente ano, o primeiro demandante, ao receber da segunda demandante os comprovantes de rendimento, para fins de declaração do Imposto de Renda, constatou que os valores auferidos em 2017 teriam excedido o teto fixado pela Receita Federal para fins de inclusão de dependente, no total de R$ 22.847,86; d) o primeiro demandante teria  procurado a ajuda da ADUSEPS - Associação de Defesa dos Usuários de Seguros, Planos e Sistemas de Saúde, a qual enviou um Ofício ao Plan-Assiste, em 25 de abril de 2018, levando ao conhecimento do Plano de Saúde Réu os fatos específicos da segunda demandante, no intuito de evitar o corte no resectivo serviço de assistência à saúde; e) em 02 de maio de 2018, o Diretor de Assistência e Benefícios Sociais do Plan-Assiste/MPF, proferiu despacho negando o pleito de permanência da segunda demandante no plano. Fundamentou seu pedido citando textos de lei e da jurisprudência pátria, anexou documentos e ao final requereu o deferimento do pedido de Tutela Provisória de Urgência, no sentido de que fosse determinada a permanência da segunda demandante, Sra. N C DE O, no Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União - PLAN-ASSISTE, independentemente de comprovação de que ela seja dependente do seu filho, primeiro demandante, para fins de Imposto de Renda.
R. Decisão proferida sob identificador nº 4058300.5367567,  pela qual foi deferida a tutela provisória de urgência e determinado que a União e o Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União mantivessem a Autora, N C DE O, no Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União -PLAN-ASSISTE, como dependente do Autor, R S C DE O, independentemente da comprovação de ser ela dependente para fins de Imposto de Renda.
Devidamente citada, a União apresentou contestação sob identificador nº 4058300.5696785 requerendo a improcedência dos pedidos.
O Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União foi citado por meio de Carta Precatória anexada sob identificador nº 4058300.5955608 e deixou transcorrer o prazo sem apresentar contestação, conforme certidão de Id. 4058300.9857658.
A Parte Autora apresentou réplica à contestação requerendo a procedência dos pedidos formulados na exordial.
Pelas peças anexadas sob identificadores nªs 4058300.14791747 e 4058300.15328530 é possível constatar que a União interpôs Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, autuado no TRF 5ª Região sob o nº 0810227-10.2018.4.05.8300, contra decisão que deferiu o pedido de tutela de urgência. Consultando a movimentação processual comprova-se que o pedido de efeito suspensivo foi indeferido liminarmente (Id. 4050000.11666348) e na sequência, conforme acórdão proferido pela Terceira Turma, foi negado provimento ao Agravo de Instrumento (Id. 4050000.13040746).
 Vieram os autos conclusos.
É o breve relatório. 
Fundamento e decido. 


2. Fundamental

2.1 - Preliminarmente,  cabe a decretação da revelia do Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União, sem os respectivo efeitos, quer pelo fato de que a UNIÃO apresentou contestação, quer tendo em vista que se trata de pessoa jurídica de direito público, cujos bens  são indisponíveis(incisos I e II,  respectivamente, do art. 344 CPC).
2.2 - Nos presentes autos, a controvérsia consiste em saber se a Autora Necy Carvalho de Oliveira pode permanecer na qualidade de dependente no plano de saúde de titularidade de seu filho, independentemente da comprovação de sua dependência para fins de Imposto de Renda.

Por meio da decisão inicial, proferida pela d. Juíza Federal Substituta desta 2ª Vara/PE, Dra. DANIELLI FARIAS RABÊLO LEITÃO RODRIGUES, a Tutela Provisória de Urgência foi concedida com a determinação de que a União e o Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União mantivessem a Autora, N C DE O, no Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União -PLAN-ASSISTE, como dependente do Autor, R S C DE O, independentemente da comprovação de ser ela enquadrável como dependente para fins de Imposto de Renda.

Apresentada contestação por parte da União e com o silêncio do Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do MPU, nada de novo foi apresentado no sentido de desconstituir os argumentos expostos na fundamentação daquela r. Decisão.

E, consta, também, nos autos que em sede de agravo de instrumento, interposto pela União, a Egrégia Terceira Turma do TRF 5ª Região negou provimento ao recurso e manteve a decisão agravada.

Sendo assim, adentrando no mérito, tenho que merece ser ratificada a mencionada r. Decisão, proferida pela MM. Juíza Federal Substituta da 2ª Vara/PE, Dra. DANIELLI FARIAS RABELO LEITÃO RODRIGUES, da qual transcrevo alguns trechos da sua d. fundamentação: verbis:
"2. Fundamentação 
2.1 (...).

2.2. Da tutela provisória de urgência

 (...).
Nos presentes autos, pretende-se a título tutela de urgência seja determinado aos Réus a permanência da Autora N C de O, como dependente no plano de saúde de titularidade de seu filho, independentemente da comprovação de sua dependência para fins de Imposto de Renda.

Pelo que se depreende da documentação anexada aos autos, a segunda Autora, N C de O é uma pessoa idosa, com 81 anos, e com grave problema de saúde (câncer no ovário, atualmente com metástase) e desde o ano de 2006 é dependente do seu filho, o primeiro Autor, R S de C de O, no Plan-Assiste.
De acordo com o Regulamento Geral do Plan-Assiste, à época de sua inclusão (Id. 4058300.5360409):

  "II - dependentes econômicos:
   (....)
  (...)
 c) os pais, inclusive adotantes, o padrasto ou a madrasta com renda familiar de até três salários mínimos que constem como dependentes na Declaração de Imposto de Renda do titular.".

E foi em face desse regulamento que a segunda Autora foi inscrita, aprovada e vinculada como dependente no PLAN-ASSISTE, tendo em vista ser mãe com renda familiar de até três salários mínimos e constar na declaração de imposto de renda do seu filho como dependente.


O rendimento auferido pela segunda Autora ao longo de 2017, incluído o 13º salário, atingiu a cifra de R$ 24.205,00, quando o teto fixado pela Receita Federal, para fins de inclusão de dependentes no Imposto de Renda, naquele ano, era de R$ 22.847,86, desde 2015. Com isso, a segunda Autora não pôde ser incluída como dependente do seu filho na declaração do IR 2017/2018.


Atualmente, a Norma Complementar nº 13/2017, estabelece em seu art. 1º, inciso II, alínea "c":


    "Art. 1º São beneficiários do PLAN-ASSISTE, na condição de:
    (...)
    II - dependentes:
    (c) o pai ou o padrasto e a mãe ou a madrasta que constem como dependentes ou pensionistas na declaração de imposto de renda do titular.;
    (...)"

Numa interpretação restritiva da regra acima, considerou-se que a segunda Autora deixara de cumprir um dos requisitos para a sua configuração como dependente econômica do titular do plano (figurar como dependente na declaração do Imposto de Renda), o que levou à sua exclusão do plano de assistência à saúde.


Em face da questão posta, vislumbro o preenchimento dos requisitos para a concessão da tutela de urgência, invocada pelos Autores.


Primeiramente, cumpre consignar o que está disposto na Constituição da República sobre o direito dos idosos:

"Art. 1o É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.

Art. 2o O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.
Art. 3o É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.". 
No caso dos autos, a Autora é uma pessoa idosa, com mais de 80 anos e com graves problemas de saúde, sendo obrigação da sociedade assegurar-lhe o direito à vida e à saúde, conforme disposição constitucional. Tal direito não pode ser restringido por norma infra legal.


Com efeito, a segunda Autora continua recebendo mensalmente parcos rendimentos, tendo ultrapassado por muito pouco o limite para inclusão como dependente no Imposto de Renda do seu filho."
E isso só ocorreu porque a UNIÃO não cumpriu com o seu dever social e moral de atualizar a tabela do IRPF, a qual, inexplicavelmente, encontra-se  congelada desde 2015, quando o benefício previdenciário da autora gozou de atualização, embora meramente monetária e abaixo do reajuste do salário mínimo, findou por ultrapassar o mínimo para ser considerada dependente perante o IRPF, por conta da referida imoralidade: falta de atualização dos valores da tabela do IRPF.
O equilíbrio econômico-financeira das obrigações das duas Partes exigiria que a referida Tabela fosse atualizada, pelo menos pelo mesmo índice de reajuste do beneficio da referida Dependente, a ora Segunda Autora, ou pelo mesmo índice de reajuste de vencimentos do seu Filho, o Segurado e ora Primeiro Autor. 
Note-se que não existe mais o requisito cumulativo de que o ascendente aufira menos de 3 (três) salários mínimos para sua inclusão como dependente no plano de saúde, assim como acontecia quando da inserção da segunda Autora no Plan-Assiste, há 12 anos.
Então, as regras não poderiam ser mudadas unilateralmente, porque os Autores têm direito adquirido a esse requisito, especialmente a Dependente, a Segunda Autora, por conta da proteção constitucional e legal a que faz jus, conforme já demonstrado e ao que retornaremos abaixo.

Por outro lado, o valor do benefício da Autora, sempre reajustado por índice inferior ao de um salário mínimo, nunca ultrapassou o patamar de três salários mínimos e só ultrapassa o mínimo da referida Tabela do IRPF, na declaração do IR do seu Filho, o Primeiro Autor, pelas razões já expostas: a falta de atualização da famigerada Tabela do IRPF, no mínimo pelos índices de reajuste do benefício da Segunda Autora. 

Ora, se o poder aquisitivo da Segunda Autora, frente ao valor do salário mínimo,  cai, ano a ano, porque o valor do seu benefício é reajustado por índice inferior ao do reajuste do salário mínimo, não pode ser punida com a exclusão do rol de dependentes do seu Filho perante a Entidade de Plano de Saúde do  Emprego Público deste, em face da culpa única e exclusiva da UNIÃO, na qual encontra-se no rol de Órgãos o Ministério Público Federal, onde trabalha o seu Filho, o Primeiro Autor.

Princípios de Justiça orientam de que, nessa situação, deve-se manter os parâmetros de quando a Sra. Mãe do Primeiro Autor, a Segunda Autora, foi admitida no referido Plano de Saúde, uma vez que o descompasso, meramente financeiro, decorre de, repito, culpa única e exclusiva da UNIÃO, a qual, de forma imoral, não atualiza a referida Tabela do IRPF. 

Por outro lado, a mencionada regra do referido Plano de Saúde, de vincular a renda do Dependente a valor fixado para cada Dependente na declaração do IRPF do Servidor Segurado, não se mostra razoável, pois o que tem a ver mencionado Plano com o IR dos Beneficiários?

Os  Parâmetros que gozariam de um equilíbrio justo mínimo seriam os que já adiantei: 1) atualização da Tabela do IRPF pelo mesmo índice de atualização do valor do benefício da Segunda Autora e dos vencimentos do Primeiro Autor; ou,  2) aquele da renda da data da inclusão da Dependente, ora Segunda Autora, isto é, vinculação da sua renda, naquela data, à luz do total de salários mínimos que ganhava quando da sua inclusão: tome-se o valor total da renda da ora Segunda Autora, na data em que foi incluída como dependente, e divida pela valor de um
salário mínimo, e chegue ao total de salários mínimos que a Segunda Autora ganhava naquela época, sem dúvida alguma, constatar-se-á que ganha, hoje,  um número de salários mínimos bem menor do que ganhava naquela época. E isso decorre do fato, já dito: aqueles que se aposentaram ganhando mais de um salário mínimo, perdem ano a ano frente ao valor do salário mínimo, porque o total de tais benefícios é reajustado por índice inferior ao do reajuste do salário mínimo.

O mencionado arcabouço jurídico constitucional e legal não admite que norma infra legal elimine o mencionado direito de uma idosa, que já conta com mais de 80(oitenta) primaveras, sem descurar que o Primeiro Autor vem pagando, religiosamente, o valor do mencionado Plano de Saúde há mais de 12(doze)anos.
Não pode, exatamente agora quando a sua Mãe já com mais de 80(oitenta)anos de idade e mais necessita de utilizar-se dos recursos do Plano de Saúde, vê-la dele excluída, porque há uma singela e ilógica norma administrativa, que fere todo o mencionado conjunto de regras constitucionais e legais, asseguradoras dos direitos dos idosos e que, ao invés de ser reduzidos,  devem é ser ampliados com o passar do tempo.

Não, isso não é aceitável, não pode acontecer.

Nessa situação, sem maiores delongas, a decretação da procedência dos pedidos é medida que se impõe.


3. Dispositivo

POSTO ISSO, ratifico a mencionada r. Decisão Inicial, na  qual se deferiu o pedido de tutela provisória de urgência de antecipação, julgo procedentes os pedidos, tornando definitiva a determinação constante na  mencionada r. Decisão, para todos  os fins de direito, e dou este processo por extinto, com resolução do mérito(art. 487, I, CPC).

Outrossim, condeno às Rés, pro rata, ao ressarcimento do valor atualizado das custas desembolsadas pelos Autores, com atualização pelos índices da tabela SELIC, por ser um tributo, a partir do mês seguinte ao do efetivo desembolso,  e a pagar ao(à,s) Patrono(a,s) dos Autores verba honorária advocatícia, a qual, à luz dos §§ 2º e 8º do art. 85 do vigente Código de Processo Civil,  arbitro em R$ 3.000,00 (três mil reais), que serão atualizados(correção monetária e juros de mora) pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, vigentes na data da execução, sendo que os juros de mora incidirão sobre o valor já monetariamente corrigido, mas somente a partir do trânsito em julgado desta sentença ou de acórdão que venha a substituí-la(§ 19 do art. 85, CPC).

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição (art. 496, I do CPC).

Registre-se. Intimem-se.


Recife, 20.07.2019

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE.