domingo, 28 de abril de 2019

ATO DE GESTÃO DA DIREÇÃO DE UMA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. NÃO CABIMENTO DE MANDADO DE SEGURANÇA.

Por Francisco Alves  dos  Santos Júnior

A vigente  Lei do Mandado de Segurança, Lei nº 12.016, de 2009, veda, no § 2º do seu art. 1º, a impetração de mandado de segurança contra ato de gestão dos Dirigentes das Estatais. 
O que vem a ser ato de gestão e o que o diferencia do ato de império, o ato administrativo ou ato de Autoridade que pode ser impugnado por mandado de segurança?
A Judiciário brasileiro vem firmando entendimento a respeito dessa matéria. 
Na sentença que segue, esse assunto é debatido. 
Boa leitura.



PROCESSO Nº: 0816758-44.2018.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: S P DE S DO B LTDA
ADVOGADO: C.C;V.`P
IMPETRADO: CHESF - COMPANHIA HIDRO ELETRICA DO SÃO FRANCISCO
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)


Sentença tipo C, registrada eletronicamente.

Ementa: - MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DE GESTÃO.
Não cabe mandado de segurança contra ato de gestão.
Extinção do processo, sem resolução do mérito.

Vistos, etc.

1. Breve Relatório

S P DE S DO B LTDA - ME, pessoa jurídica qualificada na Inicial, impetrou inicialmente este Mandado de Segurança em face de PREGOEIRA RESPONSÁVEL a Ilmª Sra. V C DA S da COMPANHIA HIDRO-ELÉTRICA DO SÃO FRANCISCO-CHESF e a UNIÃO FEDERAL, na condição de pessoa jurídica. Requereu, em apertada síntese,  autorização judicial liminar para garantir a suspensão dos efeitos do certame editalício,  noticiado nos autos, qual seja, o Edital do Pregão Eletrônico PG-70.2018.6020(anexo), que tem por objeto o Gerenciamento de Frotas com Telemetria e Rastreamento de Veículos.





Decisão, sob id 4058300.8531801, na qual se determinou que o Impetrante completasse sua petição inicial para esclarecer o motivo pelo qual teria incluído a União Federal no polo passivo.
A Impetrante, na petição sob id  4058300.9023102, sustentou que, mesmo que se entendesse pela exclusão da União do polo passivo desta lide, ainda assim esse Juízo seria competente, em virtude de comprovada e pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que cabe writ contra Sociedade de Economia Mista Federal perante a Justiça  Federal.





É o relatório, no essencial.



Passo a decidir.

2. Fundamentação







2.1 - Preliminarmente, a UNIÃO há de ser excluída do polo passivo, porque não tem nenhuma vinculação com a noticiada licitação, promovida por Dirigentes da CHESF, na  gestão das atividades dessa Sociedade de Economia  Mista, sendo, pois, visível a sua ilegitimidade passiva ad causam.
2.2 - Neste Mandado de Segurança, impetrado contra ato que teria  sido praticado pela PREGOEIRA RESPONSÁVEL Sra. V C DA S, na licitação indicada  na  petição inicial, pugnando-se por  provimento judicial que assegure a suspensão dos efeitos do certame previsto no Edital do Pregão Eletrônico PG-70.2018.6020, que tem por objeto o Gerenciamento de Frotas com Telemetria e Rastreamento de Veículos da COMPANHIA HIDRO-ELÉTRICA DO SÃO FRANCISCO-CHESF





Instada a justificar a inclusão da União no polo passivo (Id. 4058300.8531801), a Impetrante  requereu fosse alterado o pedido inicialmente disposto na alínea "c", para que fosse intimada a Procuradoria da COMPANHIA  HIDRO-ELÉTRICA DO SÃO FRANCISCO-CHESF.





Pois bem.



Os atos de gestão, praticados por Dirigentes/Diretores de Estatais, entre as quais as Sociedades de Economia  Mista, como a CHESF, não podem ser impugnados via mandado de segurança. 
Nesse sentido, há regra expressa na Lei nº 12.016, de 2009, verbis:
"Art. 1º - (...).
§ 2o  Não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público. "



A contratação de empresa para fins de "gerenciamento de Frotas com Telemetria e Rastreamento de Veículos", caso destes autos,   envolve atos de gestão dos Dirigentes da mencionada estatal e não ato de império, ato administrativo propriamente dito, ato de Autoridade, praticado por delegação de algum Ente ou Órgão Público Federal, que acarretaria a competência desta Justiça  Federal.  

Na prática atual do direito brasileiro, muitos atos podem ser enquadrados como de império e de gestão, mas alguns são induvidosamente de império e outros induvidosamente de gestão.

Por exemplo, a elaboração final do projeto de Lei do orçamento público, é sem dúvida um ato de império, privativo do Chefe do Poder Executivo. A transformação desse projeto em Lei é um ato de império, exclusivo do Poder Legislativo. A resolução de demandas, envolvendo essa Lei, é um ato de império, exclusivo do Poder Judiciário.

Mas a realização das despesas, decorrentes dessa Lei, quer seja por parte do Poder Executivo, do Poder Legislativo ou do Poder Judiciário, decorrentes de atos de cada um desses Poderes, não tenho dúvidas que se trata de um ato de gestão.

Ora, o ato de realizar licitação para os fins acima indicados, por parte do Dirigente de uma Estatal, instituída como Sociedade de Economia Mista,  que tem natureza jurídica de direito privado, sem dúvida nenhuma é ato de gestão, quer seja para atividade fim da Empresa que dirige, quer seja para atividades secundárias, pois estará apenas executando determinada dotação orçamentária aprovada para a Empresa.
Repito, só cabe mandado de segurança contra ato de Dirigente de Sociedade de Economia Mista relativamente aos atos institucionais, que são aqueles tipicos da Administração, entendidos como tais os que são oriundos de clara delegação de competência de Ente ou Órgão do Poder Público Federal.  
No julgamento do mandado de segurança, Processo nº 0005291-48.2011.4.05.8      Classe 126    Impetrante: ENERGIA EMPREENDIMENTOS LTDA,   Impetrado(a): DIRETOR-PRESDENTE DA COMPANHIA HIDRO ELÉTRICA DO SÃO FRANCISCO - CHESF, assim fundamentei a respectiva sentença, em caso aplicável, mutatis mutandis, ao presente:



"3. Embora a CHESF encontre-se constituída como sociedade de economia mista e esse tipo de pessoa jurídica não faça parte do rol do inciso I do art. 109 da Constituição da República, tenho que a Justiça Federal passou a ser competente para apreciar e julgar mandado de segurança praticado por seu Diretor-Presidente por força do art. 2º da Lei nº 12.016, de 07.08.2009, Lei essa que traça as novas regras sobre mandado de segurança.



4. Mas essa nova Lei veda a impetração de mandado de segurança contra atos de gestão(§ 2º do art. 1º dessa Lei) e o ato ora impugnado arvora-se em típico ato de gestão, pois envolve licitação pública, tendente à contratação de prestadora de serviço, para que a CHESF possa alcançar as finalidades do seu estatuto social, situação essa que se caracteriza como impropriedade do meio processual escolhido e que não pode ser aproveitado como o procedimento próprio para a questão em debate, implicando no indeferimento da petição inicial((art. 195-V do Código de Processo Civil), com a conseqüente extinção do processo, sem resolução do mérito(art. 267-I do Código de Processo Civil).



Indeferida a petição inicial de mandado de segurança, ainda que o mérito não seja resolvido, o entendimento doutrinário e jurisprudência reinante é que, nessa situação, o juiz nega a segurança.".


Referida sentença foi mantida pela 2ª Turma do TRF5A, cujo acórdão ficou com a seguinte ementa:



"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ERRO NA MODALIDADE RECURSAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. ART. 244 DO CPC. POSSIBILIDADE. LICITAÇÃO. CONTRATAÇÃO DE PRESTADOR DE SERVIÇOS. ATO DE GESTÃO PRATICADO POR ADMINISTRADOR DE SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. VEDAÇÃO. ART. 1º, PARÁGRAFO 2º DA LEI Nº 12.016/2009. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA PARA IMPUGNAR O ATO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA. PRECEDENTES. APELAÇÃO IMPROVIDA.



1. Apelação interposta contra sentença proferida em sede de mandado de segurança, que extinguiu o processo sem resolução de mérito, reconhecendo a inadequação do remédio constitucional para impugnar ato de gestão de sociedade de economia mista.



2. Nos termos do artigo 244 do Código de Processo Civil, o ato processual somente pode ser considerado nulo e sem efeito se, além de inobservância da forma legal, não tiver alcançado a sua finalidade.  No caso concreto o recurso foi interposto dentro do prazo do apelo e as razões recursais se voltam contra os fundamentos expostos na sentença a quo. Aplica-se no caso o princípio da fungibilidade recursal, por se tratar de hipótese em que o recurso, mesmo não sendo o cabível para atacar a decisão, pode ser considerado válido, uma vez que foram atendidos os demais requisitos objetivos.



3. A Lei nº 12.016/2009 estabelece, em seu artigo 1º, parágrafo 2º, que não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público.



4. Hipótese em que a ação mandamental foi impetrada contra ato de gestor da CHESF - Companhia Hidrelétrica do São Francisco, em Pregão Eletrônico realizado com o fito de contratar um terceiro prestador de serviços, para a realização de obras estruturais. Os serviços a serem realizados, à evidência, não guardam relação direta com a atividade de geração de energia que foi delegada pelo Poder Público à referida Companhia, constituindo-se de ato particular de gestão, que não se confunde com ato de autoridade, requisito necessário para viabilizar seu ataque pela via do mandado de segurança.



5. Ainda que praticado mediante procedimento licitatório, o ato ora impugnado  não pode ser entendido como vinculado à atividade estatal delegada, mas apenas como um mero ato de gestão.



6. Nos termos da súmula nº 333 do C. STJ é cabível o manejo do writ para atacar procedimento licitatório de empresa de economia mista ou empresa pública. Contudo, é pacífico que esse remédio constitucional é cabível contra os atos praticados por dirigentes de tais entidades, desde que tais possam ser reputados como típicos da Administração, entendidos como aqueles oriundos de explícita delegação de competência do Poder Público, o que não se verifica no caso dos autos.



7. Apelação improvida."[1]


Diante do quadro supra, tenho por inapropriado o uso do mandado de segurança para impugnação do mencionado ato, o que caracteriza a situação estabelecida no inciso IV do art. 485 do vigente Código de Processo Civil c/c o mencionado dispositivo da Lei nº 12.016, de 2009, o que impõe a extinção do processo, sem resolução do mérito.



Finalmente, quando o mandado de segurança é extinto, sem resolução do mérito, há precedentes antigos do STF, no sentido de que a segurança deve ser denegada, a respeito do que, data maxima venia, penso diferente, pois a segurança só pode ser denegada se houver apreciação do mérito, e, com a extinção do mandado de segurança, sem julgamento do mérito, a Impetrante pode, pela via processual própria e perante o Juízo competente, renovar o seu pleito.



Logo, haverá a extinção do feito, mas sem qualquer decisão quanto à segurança, porque o seu mérito não será apreciado.



3. Dispositivo



Posto isso:
3.1 - quanto à UNIÃO, indefiro a petição inicial, em face da sua clara ilegitimidade passiva ad causam,  e dou o processo por extinto, sem resolução do  mérito(art. 330,II c/c art.485, V, todos do CPC);
3.2 - de ofício, reconheço que o ato ora impugnado diz respeito a um ato de gestão, e não ato de Autoridade, e como contra ato de gestão não cabe a impetração de mandado de segurança, dou este processo por extinto, sem resolução do mérito(§ 2º do art. 1º da Lei nº 12.016, de 2009 c/c art. 485, IV do vigente Código de Processo Civil), ressalvando-se o direito de a ora Impetrante, pela via judicial própria(via ordinária), buscar o seu alegado direito, ficando prejudicado o pedido de concessão de medida liminar.



Outrossim, condeno a Impetrante nas custas processuais.



Sem verba honorária(art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009).



Registre-se. Intimem-se.

Recife, 28.04.2019

Francisco Alves  dos Santos Júnior
 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE



(lsc)
________________________________________________________________
[1] Brasil. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. 2ª Turma. Processo  nº 00052914820114058300, AC527173/PE, Relator Desembargador Federal Francisco Barros Dias. Julgamento em 27/09/2011, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 06/10/2011, p. 349.

sábado, 27 de abril de 2019

PROVA EMPRESTADA. DECISÃO.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

A prova emprestada atende aos princípios de economia e de celeridade processuais, encontra-se autorizada no Código de Processo Civil e, sempre que possível, deve ser utilizada pelo Magistrado.  
Na decisão que segue, um exemplo da sua utilização. 


Obs.: decisão minutada pela assessora Patrícia Luna.




PROCESSO Nº: 0802314-74.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: C A O M DE C
ADVOGADO: E G Da S
RÉU: DNIT - DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAEST DE TRANSPORTES e outro
ADVOGADO: J R R G J
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

 
DECISÃO



1. Breve Relatório

Trata-se de Ação de Indenização de Danos Morais e Materiais" proposta por C A O M DE C em face do DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT e do MUNICÍPIO DE PAUDALHO, objetivando a condenação dos Réus DNIT e MUNICÍPIO DE PAUDALHO em danos de ordem  material, decorrentes da desvalorização do imóvel e perca de área para construção de via de acesso para si e demais condôminos que se encontram na mesma situação, e moral, por se encontra a Autora sem ter o devido acesso a sua residência/propriedade.

R. decisão proferida em 08/05/2018 (id. nº 4058300.5005294), na qual foi acolhida a preliminar de litispendência levantada pelo DNIT e, relativamente ao pedido de danos materiais, o processo foi extinto, sem resolução do mérito (art. 485, V, CPC); dada por prejudicada a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam suscitada pelo Município Réu; bem como se determinou a intimação das partes para indicação de provas.

Certificado o decurso de prazo sem manifestação das partes (id. nº 4058300.5633520).  


2. Fundamentação

Intimadas para indicação de provas a produzir, as partes quedaram-se silentes, conforme certificado nos autos (id. nº 4058300.5633520).

No entanto, consultando os autos, verifico que a Parte Autora acostou em sua inicial o Laudo Pericial elaborado nos autos do PJe nº 0802337-25.2013.4.05.8300T, que tramitou perante a 3ª Vara Federal/PE, atualmente em fase de recurso no E. TRF da 5ª Região.

Conforme autorização expressa do art. 372 do CPC, poderá o juiz admitir a utilização de prova produzida em outro processo, com observância do contraditório:

"Art. 372.  O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório." 

Assim, tendo em vista a adequação do laudo pericial acostado pela Parte Autora ao objeto deste feito (id. nº  4058300.1838136, nº 4058300.1838144, nº 4058300.1838155, nº 4058300.1838166, nº 4058300.1838172), devem as partes ser intimadas para se manifestarem sobre o laudo pericial referido, ante a possibilidade de ser utilizado como prova emprestada nestes autos, nos termos do dispositivo supracitado.

3. Dispositivo

Posto isso, intimem-se as partes para manifestação sobre o laudo pericial referido, no prazo de 15 (quinze) dias, conforme fundamentação supra.

Intimem-se.
Recife, 27.04.2019

Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz  Federal, 2a Vara-PE


(mppl)

quinta-feira, 25 de abril de 2019

FORO COMPETENTE PARA JULGAMENTO DE MANDADO DE SEGURANÇA. NOVO ENTENDIMENTO DO STF E DO STJ.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior


O Supremo Tribunal Federal, por sua Segunda Turma, e a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça passaram a adotar o entendimento de que se aplicam ao mandado de segurança as regras constitucionais sobre competência nas demandas contra a Autoridades afetadas à UNIÃO e respectivas Estatais. Antes o foro competente era aquele no qual se encontra sediada a Autoridade apontada como coatora. Não é mais.

Na decisão infra, faz-se um histórico dessa mudança de entendimento e nela se aplica esse novo posicionamento.

Boa leitura. 

Observação: decisão pesquisada e minutada(o Juiz alterou o texto da minuta, mas manteve a sua ideia central) pela Assessora Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques.




PROCESSO Nº: 0815625-64.2018.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: M A O L
ADVOGADO: C A C B
IMPETRADO: FUNDACAO INSTIT BRAS DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA IBGE
AUTORIDADE COATORA: GERENTE DE RECURSOS HUMANOS/PE DO IBGE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

DECISÃO

1- Relatório

M A O L impetrou este mandado de segurança em 25/10/2018, em face de ato denominado coator que teria sido praticado pelo ILmº Sr. GERENTE DE RECURSOS HUMANOS/PE DA FUNDAÇÃO INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE, pretendendo, a título de liminar, o restabelecimento da pensão por morte instituída por seu falecido genitor na forma da Lei nº 3.373/58.
R. Decisão da lavra da d. Magistrada DANIELLI FARIAS RABELO LEITAO RODRIGUES, na qual foi indeferida a pleiteada medida liminar.
Regularmente notificada, a Ilmª Srª GERENTE DE RECURSOS HUMANOS DA UNIDADE ESTADUAL DA FUNDAÇAÕ IBGE, NO ESTADO DE PERNAMBUCO, arguiu preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, pois, segundo afirma, a competência para administrativa de exoneração no âmbito da Unidade do IBGE em Pernambuco seria do Coordenador de RH do IBGE, com sede na cidade do Rio de Janeiro, o que teria ocorrido pela edição Portaria nº 3.857/2018.
O Ministério Público Federal ofertou r. Parecer no sentido de não intervir nos presentes autos.
Decisão que determinou a intimação da Impetrante para tomar ciência da preliminar de ilegitimidade passiva ad causa arguida pela Autoridade apontada coatora; facultou-se a alteração do passivo pela Impetrante, e que ela indicasse como Autoridade coatora o(a) Coordenador(a) de RH do IBGE ou outra Autoridade que entendesse por pertinente, ou até mesmo insistisse na já indicada e que já prestou informações; e, na hipótese de ser cumprida referida determinação, que fosse renovada a notificação da eventual nova autoridade coatora que viesse a ser indicada, para apresentar as Informações, no prazo legal, nos termos já consignados no despacho sob identificador 4058300.6565399; ou então, no silencia, que os autos retornassem para julgamento (Id. 4058300.9686066).
A Impetrante promoveu a emenda da Petição Inicial e requereu a alteração do polo passivo deste Mandado de Segurança, para que dele passasse a constar o Coordenador de Recursos Humanos do IBGE, Sr. Bruno Taranto Malheiros, como autoridade coatora, e indicou o respectivo endereço, situado na cidade do Rio de Janeiro - RJ, na Av. Franklin Roosevelt, 166/10°andar, Castelo, tel.: (21) 2142-4503. Requereu, ademais, a remessa dos autos ao Juízo competente, conforme enunciado nº 488, do Fórum Permanente de Processualistas Civis.

2- Fundamentação

O §2º do art. 109 da vigente Constituição da República do Brasil prevê quatro foros diferentes nos quais a parte interessada poderá mover uma ação contra a União, Entidade Autárquica ou Empresa Pública Federal, a saber: (1) local em que for domiciliado o Autor, (2) local onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda, (3) local onde esteja situada a coisa, ou, (4) no Distrito Federal.
Os Tribunais entendiam que o mandado de segurança era submetido à  regra própria e que o foro competente para a tramitação do mandado de segurança era a sede da Autoridade apontada como coatora.
No entanto, esse entendimento mudou.
A partir do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 509.442, os Ministros da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal passaram a entender que a previsão constitucional que permite o ajuizamento de ações contra a União no foro federal do domicílio do Autor é aplicável também ao rito especial do mandado de segurança, verbis:
"CONSTITUCIONAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. JURISDIÇÃO E COMPETÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. UNIÃO. FORO DE DOMICILIO DO AUTOR. APLICAÇÃO DO ART. 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está pacificada no sentido de que as causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal.
2. Agravo regimental improvido."[1]
Nesse mesmo sentido, recentemente, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça realinhou sua jurisprudência a esse entendimento, sedimentando a jurisprudência no sentido de que deve prevalecer, também no mandado de segurança, mencionadas regras constitucionais, podendo o Impetrante optar pelo foro do seu domicílio, verbis:
"CONFLITO DE COMPETÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL NO RIO DE JANEIRO. ARTIGO 109, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO NO DOMICÍLIO DO AUTOR. FACULDADE CONFERIDA AO IMPETRANTE. PRECEDENTES.


1. No caso, a decisão ora agravada amparou-se em precedentes desta Corte Superior de Justiça, elemento que autoriza o Relator a dar ou a negar provimento ao recurso, por decisão singular, haja vista a existência de jurisprudência dominante acerca do tema, nos termos da Súmula n. 568/STJ (Corte Especial, DJe 17/3/2016). Nesse sentido: AgInt no CC 152.027/MG, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, DJe 03/10/2017.


2. "Tratando-se de mandado de segurança impetrado contra autoridade pública federal, o que abrange a União e respectivas autarquias, o Superior Tribunal de Justiça realinhou a sua jurisprudência para adequar-se ao entendimento do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria, admitindo que seja aplicada a regra contida no art. 109, § 2º, da CF, a fim de permitir o ajuizamento da demanda no domicílio do autor, tendo em vista o objetivo de facilitar o acesso à Justiça" (AgInt no CC 154.470/DF, Rel. Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, DJe 18/04/2018).
3. Nessa mesma linha: AgInt no CC 153.724/DF, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, DJe 16/02/2018, e AgInt no CC 148.082/DF, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, DJe 19/12/2017.


4. Agravo interno não provido."[2]) (G.N.)
 2.1 - Caso concreto
À luz dos precedentes acima transcritos, é direito da parte autora/impetrante escolher onde litigar contra Ente Federal, devendo, para tal desiderato, observar as regras do § 2º do art. 109 da vigente Constituição republicana, e escolher entre a Seção Judiciária de seu domicilio, ou aquela onde houver ocorrido o ato ou o fato que originou a demanda, ou onde estiver situada a coisa ou, ainda o Distrito Federal (foro supletivo).
Diante da arguição de ilegitimidade passiva ad causam, levantada pela DD Autoridade apontada coatora, a Impetrante foi regularmente intimada para emendar a Petição Inicial para a correção do polo passivo, e requereu a remessa dos autos ao Juízo competente, situado no Rio de Janeiro, com fundamento no enunciado nº 488, do Fórum Permanente de Processualistas Civis, do seguinte teor:
"Enunciado 488: "(art. 64, §§ 3º e 4º; art. 968, § 5º; art. 4º; Lei 12.016/2009) No mandado de segurança, havendo equivocada indicação da autoridade coatora, o impetrante deve ser intimado para emendar a petição inicial e, caso haja alteração de competência, o juiz remeterá os autos ao juízo competente. (Grupo: Impacto do novo CPC e os processos da Fazenda Pública[3])."
No presente caso, a Impetrante tem domicílio no Estado de São Paulo, consoante informado na Petição Inicial e no instrumento de Procuração; e o Coordenador de Recursos Humanos do IBGE, a quem fora imputado o ato ilegal ou coator, situa-se no Rio de Janeiro.
Ora, se a Impetrante não tem domicílio neste Estado de Pernambuco e o ato administrativo contra o qual se insurge também não foi praticado neste Estado, é o caso de reconhecer, de ofício, a incompetência absoluta deste Juízo, e o faço com fundamento no § 2º do art. 109 da mencionada Carta Magna, bem como no §1º do art. 64 do vigente Código de Processo Civil.
Outrossim, tendo em vista que a Impetrante, ao emendar a Petição Inicial, corrigiu o polo passivo da ação e requereu a remessa dos autos ao Juízo competente situado no Rio de Janeiro, é o caso de deferir o requerimento da Impetrante de remessa dos autos ao Rio de Janeiro, local em que praticado o ato contra o qual se insurge, hipótese prevista no § 2º do art. 109 da referida Carta.

3 - Conclusão

Diante do exposto, declaro-me absolutamente incompetente para apreciar e julgar este mandamus e a declino para um dos Juízes Federais do Rio da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, ao qual couber por distribuição, para onde determino a remessa destes autos, após baixa regular, observadas as respectivas regras administraitvo-processuais.
Intimem-se.
Após o trânsito em julgado, cumpra-se, com urgência.
Recife, 25.04.2019
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara/PE
(rmc)










[1] - Brasil. Supremo Tribunal Federal. Segunda Turma. Recurso Extraordinário nº  509.442 AgR, Relatora Ministra Ellen Gracie, julgado em 03/08/2010, in Diário Judicial Eletrônico-DJe, nº 154, divulgado em 19-08-2010, publicado em 20-08-2010.  EMENT VOL-02411-05 PP-01046 RT v. 99, n. 901, 2010, p. 142-144.
Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=613623
Acesso em 24.04.2019.

[2] BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Primeira Seção. AgInt no CC 158.943/SP, Relator Ministro Sérgio Kukina, julgado em 12/12/2018, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 17/12/2018
Disponível em:  https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=201801354070&dt_publicacao=17/12/2018
Acesso: 24/04/2019


[3] Disponível em: http://civileimobiliario.web971.uni5.net/wp-content/uploads/2017/07/Carta-de-Florian%C3%B3polis.pdf Consulta em: 24/04/2019

segunda-feira, 15 de abril de 2019

PROCESSO ADMINISTRATIVO: OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DO APROVEITAMENTO MÁXIMO DAS PROVAS, DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA E DO INFORMALISMO



Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O processo civil passou por grandes transformações na última década, com quebra da rigidez do formalismo, incorporando, nas respectivas Leis, princípios que objetivam a resolução do mérito da causa. 
Com muito mais razão essa prática tem que ser adotada na via administrativa, na qual a tônica sempre foi o informalismo. 
Na decisão que segue, essas questões foram debatidas. 
Boa Leitura. 

Obs.: decisão pesquisada e minutada pela Assessora Luciana Simões Correa Albuquerque. 


PROCESSO Nº: 0814820-14.2018.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: V. M. LTDA
ADVOGADO: A P L De F
IMPETRADO: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
AUTORIDADE COATORA: SUPERINTENDENTE REGIONAL DO TRABALHO E EMPREGO EM PE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)


D E C I S Ã O
1.Breve Relatório

V. M. LTDA., pessoa jurídica qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança em face do Senhor Chefe da Seção de Multas e Recursos, Sr. D. O. P., que por delegação de competência publicada na Portaria GM/MTE nº 960, de 03/07/2014, representaria o Ilmo. Superintendente Regional do Trabalho e Emprego em PE. Aduziu, em síntese, que: a Impetrante teria sido notificada de débito do Fundo de Garantia e da Contribuição Social - NDFC, nº 200.382.063 por, supostamente, deixar de recolher valores mensais e rescisórios de funcionários, capitulando a cobrança nos art. 15 e 18, da Lei nº 8.036, de 11/05/1990 e arts. 1º e 2º, da Lei Complementar nº 110, de 29/06/2001; no segundo semestre de 2014, a empresa teria passado por fiscalização, relativas a mesma matéria, tendo apresentado defesas administrativas nos autos de infração nº 20.503.206-1; 20.503.205-2; 20.530.207-9 e 20.501.124-1, cópias em anexo; em virtude disto, a impetrante, tempestivamente, teria apresentado o Recurso Administrativo, contra a decisão, formando o processo de nº 46213.013733/2015-02, no qual, além dos fundamentos ali descritos, teria pedido que fosse julgada infundada e insubsistente na sua formalidade;  na Análise do recurso, o Auditor Fiscal Analista, preliminarmente, sequer teria recebido o Recurso, sob a alegação de que a Impetrante não cumprira requisitos de admissibilidade formal, posto que a empresa havia feito a juntada de documentos através de cópias não autenticadas, nos termos ali transcritos; teria sido mencionado que o Impetrante teria infringido o disposto no Art. 29, §§ 3º, 6º, 7º e 8º, da Portaria nº 854, de 25 de junho de 2015, para concluir que, mesmo sendo facultado ao advogado, não teria havido a declaração de autenticidade, o que teria levado ao não conhecimento da representação da personalidade jurídica da Impetrante, com fundamento na aplicação supletiva do Art. 45 do Código Civil Brasileiro e o Precedente nº 74 do MTE; esse entendimento teria sido seguido na análise do Recurso interposto da referida decisão, pelo Excelentíssimo Senhor Chefe da Seção de Multas e Recursos, Sr. DANIEL OLIVEIRA PESSOA, substituindo o Superintendente Regional do Trabalho e Emprego, por delegação de competência que, pautado no mesmo fundamento, teria deixado de conhecer  o recurso e teria proferido decisão julgando procedente o auto de infração e determinando a aplicação da multa, caracterizando o cerceamento do direito de defesa do Impetrante; com relação à alegação de irregularidade das peças apresentadas, em vista de falta de autenticação do contrato social da Impetrante, também seguindo o entendimento do Chefe da Seção de Multas do MTE/PE, haveria claro ultraje  ao art. 5º, LV, da Carta Magna; as disposições da Portaria 148/1996, em seu art. 24, § 3º disporia que  "as irregularidades verificadas nos documentos de que tratam os parágrafos anteriores seriam, a critério da autoridade regional, notificadas ao interessado para querendo, saneá-las no prazo de 10 (dez) dias";  a autoridade possuiria o arbítrio de notificar o autuado; a decisão objurgada teria sido proferida na vigência do Novel CPC que adotou expressamente o Princípio da Cooperação, em seu Art. 6º; a Portaria PORTARIA MTE Nº 854 DE 25.06.2015, em vigor, permitiria que AS CÓPIAS SIMPLES APRESENTADAS fossem ANALISADAS COMO "ELEMENTOS INFORMATIVOS" e haveria uma tendência entre doutrinadores, no sentido de uma lei nova poder retroagir alcançando o direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada, em especial em relação a normas de ordem públicas consagradas pela nova lei, sendo necessário a anotação relativa ao art. 29, do referida Portaria, que iria além e, no caso de cópias simples, permitiria que fossem analisadas como elementos informativo; o excesso de formalismo extraído de um normativo cujas disposições processuais não corresponderiam à atualização dos parâmetros legais idênticos, atualmente instituídos, a exemplo do Decreto 70.235/72, que disporia acerca dos procedimentos administrativos fiscais e estabeleceria prazo para apresentação de documentos que considerar necessário, privilegiando o Princípio da ampla defesa, acima anotado; a Lei n.  9.784/99, que regularia o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, disporia, em seu art. 22; ainda que houvesse a declaração de autenticidade pelo advogado, se a parte contrária impugnasse (total ou parcialmente) as cópias simples apresentadas, a parte que as produziu seria intimada para apresentar cópias devidamente autenticadas ou o original; restaria latente a  a arbitrariedade, cometida pela autoridade competente, sendo importante também apontar a Constituição Federal, em seu Art. 5º, LV; diferente do que argumenta a autoridade coatora, em se ter verificado qualquer eventual irregularidade do recurso apresentado, deveria ter intimado a empresa a fim de que a sanasse; apesar de a interpretação gramatical da portaria ministerial ser no sentido de que não se constitui um dever, mas sim uma faculdade, tal interpretação não seria mais correta com o sistema constitucional vigente, uma vez que se assim se admitisse, estaria o Auditor violando o direito constitucional de defesa do ora impetrante;  seria justo e translúcido que o Auditor fiscal concedesse prazo para que o impetrante apresentasse oportunamente os apontados documentos na forma autenticada e substituísse o substabelecimento, sendo abrupta a decisão de não conhecer o recurso, sob a alegação de que o impetrante não teria cumprido   um dos requisitos de admissibilidade formal; tal conduta cercearia o direito de defesa da impetrante pois sequer teria sido concedido  prazo para a empresa apresentar os aludidos documentos. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, pela concessão de antecipação de tutela, nos termos do art. 303 do CPC, para a imediata suspensão do ato impugnado e que que fosse deferida a LIMINAR INAUDITA ALTERA PARTE, com o imediato acolhimento do Recurso apresentado, ante a ofensa ao direito líquido e certo, de conhecimento da defesa administrativa produzida pela Impetrante no Processo administrativo nº 46213.024329.2014-75 e, posteriormente, fosse confirmada a liminar em definitivo, por julgamento de mérito do presente. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.
Determinada a notificação (Id. 4058300.9029320).
Certificado o decurso de prazo (Id. 4058300.9781637).
Determinada a certificação de decurso de prazo com relação à União (Id. 4058300.9931414).
A União manifestou seu interesse no feito (Id. 4058300.10022246). Inicialmente, registrou que, não tendo encontrado nos autos eletrônicos, pugnou pela juntada das informações elaboradas pela autoridade coatora, desde 24.12.2018, as quais teriam sido remetidas ao email direcao02@jfpe.jus.br, sendo certo que não teria havido qualquer inércia da parte do Superintendente Regional do Trabalho em Pernambuco. Ainda preliminarmente, alegou a União que o feito deveria ser extinto sem julgamento de mérito por ausência de correta identificação dos arquivos, notadamente o ato coator. No mérito, alegou que o cerne da presente ação consistiria na discussão sobre a ilegalidade da Portaria MTE nº 854/2015, a qual estipularia que a obrigatoriedade de observância de requisitos referentes à legitimidade e representação dos interessados, no âmbito dos processos administrativos em curso no âmbito do (extinto) Ministério do Trabalho; ao contrário do que afirma a parte impetrante, não teria sido a falta de autenticidade de documentos que teria levado ao indeferimento do seu recurso;  a irregularidade insanável constatada seria resumida ao fato  de que "o instrumento de procuração concessivo de poderes de representação da Recorrente não teria trazido a devida identificação e qualificação do representante legal que o assinou; na verdade constaria uma mera assinatura de difícil identificação, tornando invalido tal documento, a macular, por conseguinte, o substabelecimento que dela deriva"; teria restado inviável averiguar a regularidade da representação da empresa no recurso interposto, tendo em vista que não teria sido possível  identificar quem assina o instrumento de procuração da empresa Viação Mirim (recurso administrativo, pagina 10, em anexo), de maneira que se reputariam inválidos todos os atos posteriores que a ele estariam  vinculados, como é o caso do substabelecimento conferido à advogada Ana Patricia Lopes de farias; a Portaria MTE 854/2015 estaria absolutamente de acordo com as balizas prescritas pelo Código Civil, sobre mandato (artigos 654 e seguintes), de tal sorte que não haveria de se falar em ilegalidade ou abuso de poder por parte do Superintende Regional do Trabalho em Pernambuco, o qual teria atuado estritamente dentro do que determina o princípio da legalidade; não havendo exorbitância pelo órgão administrativo, descaberia falar em necessidade de atuação do Poder Judiciário, sob pena de afronta ao princípio fundamental da independência e harmonia entre os Poderes Judiciário e Executivo, conforme estabelecido nos arts. 2º, 60, § 4º, III, e 84, II e VI, da Constituição Federal de 1988. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela denegação da segurança.
Foi requerida a juntada de Informações, dentre as quais, defendeu-se que a a Administração, ao negar conhecimento ao recurso apresentado, teria agido pautada na legislação e que, mesmo considerando o seu teor como elemento informativo, como preceitua a Portaria MTE n. 845 - art. 29, §5, este não teria sido capaz de desconfigurar o débito (Id. 4058300.10022247).
É o relatório, no essencial.
Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Do requerimento de extinção do processo sem julgamento do mérito
Quanto ao pretenso descumprimento das determinações constantes na decisão sob identificador 4058300.9029320, tenho que algumas considerações mereçam ser tecidas.
A despeito de não constar dentre os anexos à Inicial o documento dito coator, houve apresentação daquele quando das Informações, o que supre a alegada irregularidade.
Assim, não merece acolhida o pleito atinente à extinção do processo conforme requerido pela União na petição sob identificador 4058300.10022246, tendo em conta o princípio do máximo aproveitamento dos atos processuais e da instrumentalidade das formas.

2.2. Do pleito liminar propriamente dito
A despeito de o Impetrante ter formulado pedido de concessão de antecipação de tutela, nos termos do art. 303 do CPC, hão de ser aplicados os requisitos para a concessão de liminar nos termos da Lei  12.016/2009, por se tratar de norma específica.
Assim, a concessão da liminar exige a presença simultânea dos dois pressupostos estabelecidos no inciso III do artigo 7º da Lei nº 12.016/2009, quais sejam, demonstração da relevância do fundamento (fumus boni iuris) e perigo da demora (periculum in mora).
Trata-se de mandado de segurança impetrado por VIACAO MIRIM LTDA, tendo por autoridade coatora o Superintendente Regional do Trabalho e Emprego em PE, por meio do qual busca a nulidade do ato que não conheceu de recurso administrativo apresentado pela empresa nos autos do Processo Administrativo nº 46213.024329.2014-75, por mera formalidade, sem dar à ora Impetrante chance para a devida complementação, e, finalmente,  julgou procedente auto de infração impugnado no referido procedimento administrativo, sem análise do mérito da sua defesa/recurso administrativa.
Para tanto, alega que teria havido cerceamento de defesa e excesso de formalismo por parte da autoridade coatora no indeferimento do seu recurso, tendo em vista que a irregularidade apontada diria respeito à mera ausência de autenticação de cópias de documentos.
A União, em petição sob identificador 4058300.10022246,  esclareceu que, ao contrário do que afirmou o  impetrante, não teria sido a mera falta de autenticidade de documentos que levou ao indeferimento do seu recurso.
Com efeito, alegou a União que teria constado  a informação de que "o instrumento de procuração concessivo de poderes de representação da Recorrente não trouxe a devida identificação e qualificação do representante legal que o assinou, na verdade consta uma mera assinatura de difícil identificação, tornando invalido tal documento, a macular, por conseguinte, o substabelecimento que dela deriva".
Desta feita, noticiou a União que teria restado inviável averiguar a regularidade da representação da empresa no recurso interposto, tendo em vista que não teria sido possível identificar quem assina o instrumento de procuração da empresa Viação Mirim (recurso administrativo, pagina 10, em anexo), de maneira que se reputariam inválidos todos os atos posteriores que a ele estariam vinculados, como seria o caso do substabelecimento conferido à advogada Ana Patricia Lopes de Farias.
Pois bem.
Vê-se que o dispositivo invocado pela autoridade coatora para fundamentar o indeferimento do recurso foi o art. 28 da Portaria MTE nº 854/2015, verbis:
"Art. 28. A defesa, formalizada por escrito e instruída com documentos que a fundamentarem, será apresentada no endereço indicado no auto de infração ou notificação de débito, no prazo de 10 (dez) dias, contados do recebimento do auto de infração ou da notificação de débito.(...)§ 3º Não será conhecido pela autoridade a defesa que não atenda aos requisitos:
I - tempestividade;
 II - legitimidade e representação.Art. 29. A defesa mencionará:I - a autoridade a quem é dirigida;II - a qualificação do interessado;(...). § 3º As provas e documentos, se apresentadas por cópia, deverão ser autenticadas.  § 4º O documento em cópia oferecido para prova poderá ser declarado autêntico pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal. § 5º No caso de apresentação de cópias simples estas serão analisadas como elementos informativos. § 6º A defesa deverá ser assinada e indicar o número do auto de infração ou notificação de débito a que se refere, fazendo-se acompanhar de documentos que comprovem a legitimidade do signatário. Quando assinada por procurador legalmente constituído, será acompanhada também da respectiva procuração, que, por sua vez, se particular, deverá conter os requisitos estabelecidos no art. 654 do Código Civil. § 7º No caso do mandante ser pessoa jurídica é necessário que esta apresente nos autos documentação a fim de comprovar tal qualidade. § 8º O não atendimento às formalidades de que tratam os §§ 6º e 7º deste artigo resultará no não conhecimento da defesa, equivalendo à sua não apresentação."[Negritei].
Entretanto, como sabido, o processo administrativo é regido pelo princípio do informalismo procedimental. Nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho [1], "o princípio do informalismo procedimental significa que, no silêncio da lei ou de ato regulamentares, não há para o administrador a obrigação de adotar excessivo rigor na tramitação dos processos administrativos, tal como ocorre, por exemplo, nos processos judiciais. Ao administrador caberá seguir um procedimento que seja adequado ao objeto específico a que se destinar o processo".
O princípio da informalidade significa, pois, que devem ser observadas as formalidades estritamente necessárias à obtenção da certeza e da segurança jurídicas ao atendimento dos fins almejados pelo sistema normativo.
Deve-se dar, pois, maior prestígio ao espírito da lei que à sua literalidade.
Até mesmo no Judiciário, quando se detecta falhas sanáveis em documentos que instruem a petição inicial, o Juiz concede prazo para que a Parte Autora faça o devido  reparo, só não conhecendo da mencionada peça quando, não obstante esse novo prazo, a Parte Autora silencia.
Eis o que estabelece o art. 76 do vigente Código de Processo  Civil:
"Art. 76.  Verificada a incapacidade processual ou a irregularidade da representação da parte, o juiz suspenderá o processo e designará prazo razoável para que seja sanado o vício.
II - determinará o desentranhamento das contrarrazões, se a providência couber ao recorrido.I - não conhecerá do recurso, se a providência couber ao recorrente;§ 2º Descumprida a determinação em fase recursal perante tribunal de justiça, tribunal regional federal ou tribunal superior, o relator:§ 1º Descumprida a determinação, caso o processo esteja na instância originária:III - o terceiro será considerado revel ou excluído do processo, dependendo do polo em que se encontre.I - o processo será extinto, se a providência couber ao autor;II - o réu será considerado revel, se a providência lhe couber;".
 
A sua aplicação na área administrativa impõe-se. 
Aliás, acerca do tema, registro que essa questão já foi apreciada no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais que, em sede de Procedimento Administrativo Fiscal, exarou a seguinte decisão: 
"Falta de instrumento de procuração - Duplo grau de jurisdição administrativa. O próprio sujeito passivo, em processo administrativo, ao contrário do judicial, pode subscrever impugnações e recursos. O fazendo através de Advogado, deverá ser anexado instrumento de procuração. Não estando o processo devidamente instruído com a mesma, deverá a autoridade julgadora a quo saneando o processo nos termos do art. 13 do CPC, intimar o contribuinte para anexá-la. Decisão que não conheça do recurso por falta de instrumento de procuração, sem antes intimá-lo nos termos supra, será nula por afetar o direito de defesa do contribuinte. Não sendo válida a decisão a quo, será nula a decisão de órgão julgador recursal enquanto pendente aquela, pois seria suprimida uma instância julgadora, o que feriria o princípio do devido processo legal. Processo anulado a partir da decisão de primeira instância, inclusive para que outra seja prolatada atacando o mérito. (Acórdão n.º 201-70.652, DOU de 22/09/1997)."[2]. [Negritei].
Diante de tal contexto, tenho que a Administração, sob pena de afetar o direito de ampla defesa do contribuinte, deva oferecer-lhe a oportunidade de suprir a falha, possibilitando o saneamento da(s) irregularidade(s) na representação processual e, se for o caso,  para exibição dos originais  de outros documentos para que o órgão próprio da Administração faça a devida autenticação,
Não se pode deixar de mencionar, finalmente, que o ato dito coator ocorreu quando já inserido o princípio da cooperação no atual Código de Processo Civil, que preconiza, em seu art. 6º, que "todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.", o que apenas reforça o entendimento ora adotado.
Diante de tal panorama, tenho que o pleito liminar deva ser deferido, no sentido de condicionar o conhecimento e processamento da defesa administrativa produzida pela Impetrante no Processo administrativo nº 46213.024329.2014-75 à regularização da representação processual, no termo a ser aprazado pela autoridade administrativa.

3. Dispositivo

Diante de todo o exposto:
a) certifique a Secretaria quanto às alegações constantes no item II da petição sob identificador 4058300.10022246;
b) concedo parcialmente a medida liminar e suspendo os efeitos dos noticiados  atos administrativos decisórios(de primeira  e de segunda  instância) e determino que a DD Autoridade apontada como coatora chame o processo administrativo nº 46213.024329.2014-75 à ordem e conceda à ora  Impetrante  prazo razoável para que regularize a mencionada documentação, sob pena de não conhecimento da petição inicial da defesa administrativa e caso a ora Impetrante atenda, que o andamento do referido pleito administrativo retome o seu regular andamento;
c) no momento oportuno, encaminhem-se os autos ao MPF para parecer legal.
d) Sucessivamente, voltem-me os autos conclusos para julgamento.
Intimem-se.

Recife, 15.04.2019.

Francisco Alves dos Santos Júnior.
   Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE

(lsc)

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[1] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo, 11ª Edição. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p. 814
[2] Disponível em http://carf.fazenda.gov.br/sincon/public/pages/ConsultarJurisprudencia/consultarJurisprudenciaCarf.jsf. Acesso em 11/04/2019.