quarta-feira, 9 de maio de 2012

PORTARIAS DE MINISTROS NÃO PODEM LIMITAR DIREITOS MATERIAIS DOS CONTRIBUINTES


Por Francisco Alves dos Santos Júnior.

Na sentença que segue, discute-se o império do princípio da legalidade no sistema constitucional brasileiro, considerando-se inconstitucional regras de Portaria de Ministros que limitavam a possibilidade do gozo de benefício fiscal pelos Contribuintes.

Boa leitura.




PODER JUDICIÁRIO

                                                          JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

                     Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 0003878-632012.4.05.8300 - Classe 126 – Mandado de Segurança
Impetrante: CBS S/A C B DE S
Adv.: A L – OAB/SP
Impetrado: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE   

Registro nº ..............................................
Certifico que esta Sentença às fls..............
Recife, ........./........../2012.

Sentença Tipo A                                                            

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. BENEFÍCIO LEGAL. LIMITAÇÃO POR ATOS INFRALEGAIS.
- Atos infralegais não podem impor limitações e/ou condições a benefício fiscal concedido por Medida Provisória, que tem força de Lei(artigos 5º, II e 150, I, da Constituição da República).
- Concessão da segurança definitiva.

          Vistos etc.
 CBS S/A C B DE S qualificada na Inicial, impetrou, em 31.01.2012, este Mandado de Segurança, com pedido de concessão de medida liminar inaudita altera parte, contra ato que teria sido praticado pelo Ilmº. Sr. DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE/PE e pelo Ilmo. Sr. SUPERINTENDENTE DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL – 4ª REGIÃO FISCAL, integrantes da União, aduzindo, em síntese, que, por conta de sua atividade empresarial, estaria sujeita ao pagamento do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI; que, em virtude da edição da Medida Provisória nº 470/2009, teria optado pelo pagamento à vista dos débitos tributários vinculados aos Processos Administrativos nº s 13403.000140/2002-67 e 13403.000326/2003-05, relativos a compensações anteriormente efetuadas com a utilização do crédito prêmio do IPI, incentivo setorial previsto no art. 1º do Decreto nº 461/1969; que, para fins de adesão ao pagamento à vista previsto no art. 3º da mencionada Medida Provisória, apresentara à Receita Federal, em 26.11.2009, o “Pedido de Pagamento à Vista de Débitos”, a respectiva “Discriminação dos Débitos a Parcelar” e o “Pedido de Utilização de Créditos Decorrentes de Prejuízo Fiscal ou Base de Cálculo Negativa da CSLL”, ensejando a abertura do Processo Administrativo nº 13403.000366/2009-34; que também teria apresentado as cópias e os pedidos de desistência dos Processos Administrativos nºs 13403.000140/2002-67 e 13403.000326/2003-05, formulados em 02.05.2011; que, em 13.06.2011, teria sido intimada do despacho decisório, por meio do qual fora indeferido o “Pedido de Pagamento à Vista de Débitos”, sob a alegação de que não teria sido observada a formalidade prevista no artigo 7º, caput, da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 0009/2009, eis não teria apresentado o pedido de desistência dos Processos Administrativos nºs 13403.000140/2002-67 e 13403.000326/2003-05, até 30.11.2009; que, em 21.06.2011, teria interposto recurso administrativo contra referida decisão, ao qual foi dado parcial provimento, permitindo o pagamento à vista, nos termos da Medida Provisória em questão, apenas dos débitos vinculados ao Processo Administrativo nº 13403.000326/2003-05. Alegou que a Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 09/2009 teria extrapolado os limites da legalidade, ao estabelecer uma condição para pagamento à vista do parcelamento instituído pela Medida Provisória nº 470/2009 a ser regulada; que a Administração só poderia atuar de acordo com o estabelecido expressamente pela lei; que, ao expedir um ato regulamentar, não poderia a Administração Pública inovar a ordem jurídica, impondo obrigações, condições ou limitações a direito de terceiros; que, nos termos do disposto nos artigos 152, 153 e 155-A do CTN, as condições relativas às moratórias e aos parcelamentos deveriam estar previstas em lei; que, ao realizar sua opção pelo pagamento à vista dos débitos tributários vinculados ao Processo nº 13403.000140/2002-67, com a formalização do Processo Administrativo nº 13403.000366/2009-34, teria promovido a confissão irrevogável e irretratável da dívida questionada; que tal manifestação equivaleria à confissão extrajudicial. Fez outros comentários. Transcreveu algumas decisões judiciais. Requereu a concessão de medida liminar, inaudita altera parte, para assegurar a imediata suspensão da exigibilidade do crédito tributário, consoante o art. 151, IV, do CTN, possibilitando realizar o pagamento dos débitos tributários vinculados ao Processo Administrativo nº 13403.000140/2002-67, nos termos dispostos no art. 3º, caput e § 2º, da Medida Provisória nº 470/2009, sem perquirir quanto à tempestividade do pedido de desistência de impugnações e recursos administrativos, para fins de adesão ao contido na mencionada Medida Provisória. Ao final, requereu: a notificação das Autoridades Coatoras; a ciência da União (Fazenda Nacional); a concessão da segurança definitiva, confirmando a liminar requerida. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com cópia de instrumento de procuração, substabelecimento, documentos e comprovante de recolhimento de custas (fls. 19/249).
Às fls. 251/251-vº, ficou determinado que o pedido de concessão da medida liminar seria apreciado após as informações.
A União manifestou seu interesse no feito (fl. 258).
Notificado, o SUPERINTENDENTE DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DA SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL – 4ª REGIÃO FISCAL apresentou suas Informações, às fls. 260/266, sustentando que o benefício contido no art. 3º da Medida Provisória nº 470/2009, encerraria a hipótese de recolhimento à vista ou de parcelamento com remissão parcial de tributos e anistia total ou parcial de penalidades; que, para a consecução do pagamento à vista ou do parcelamento, o legislador também teria facultado a utilização de saldos de prejuízo fiscal ou de base de cálculo negativa relativa à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL; que caberia ao optante a apresentação de pedido de parcelamento, ou de pagamento à vista, com discriminação dos débitos sujeitos ao benefício em tela; que o Impetrante teria optado pelo pagamento à vista, mediante quitação pela sistemática de utilização do prejuízo fiscal; que um dos processos administrativos, em que o Impetrante pleiteara o ressarcimento e compensação dos supostos créditos-prêmio do IPI, estaria sendo apreciado pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, em sede de recurso voluntário; que, relativamente ao processo administrativo nº 13403.000326/2003-05, os débitos decorrentes da utilização indevida dos supostos créditos-prêmio de IPI da Impetrante teriam sido considerados como insuscetíveis de serem beneficiados pelo disposto na Medida Provisória nº 470/2009, em face da não apresentação de tempestiva declaração  de desistência recursal, em concordância com o disposto no art. 7º da Portaria PGFN/RFB nº 9, de 2009; que a Medida Provisória nº 470/ 2009, autorizaria a fruição do benefício apenas mediante o pagamento ou parcelamento até o dia 30 de novembro de 2009; que, enquanto persistisse alguma das situações descritas no art. 151 do CTN, seria vedado ao sujeito ativo o poder de exigir o adimplemento dos débitos de responsabilidade do contribuinte; que a protocolização de desistência do recurso administrativo em data posterior à preconizada pela norma infralegal, se acatada, representaria a conformação da desigualdade de tratamento entre os contribuintes alcançados pelo benefício fiscal; que o regulamento seria modalidade de ato normativo subordinado à lei, sendo-lhe vedado dispor de forma contrária ao estabelecido no diploma legal referente; que a Constituição vedaria a imposição de obrigações primárias por intermédio de norma de nível inferior à lei; que a estipulação de obrigações secundárias pela via dos atos normativos infralegais afigurar-se-ia perfeitamente possível, desde que tais determinações não se revelassem inadequadas frente às disposições primárias estabelecidas em diploma legal. Teceu outros comentários. Ao final, pugnou pela denegação da segurança.
Notificado, o DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE (PE) apresentou Informações, às fls. 269/274, argumentando que o benefício contido no art. 3º da Medida Provisória nº 470/2009, encerraria a hipótese de recolhimento à vista ou de parcelamento com remissão parcial de tributos e anistia total ou parcial de penalidades; que, para a consecução do pagamento à vista ou do parcelamento, teria sido facultada a utilização de saldos de prejuízo fiscal ou de base de cálculo negativa relativa à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL; que o contribuinte teria optado pelo pagamento à vista, mediante quitação pela sistemática de utilização do prejuízo fiscal; que um dos processos administrativos, em que a Impetrante pleiteara o ressarcimento e compensação dos supostos créditos-prêmio do IPI, estaria sendo apreciado pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais-CARF, em sede de recurso voluntário; que, relativamente ao processo administrativo nº 13403.000326/2003-05, os débitos decorrentes da utilização indevida dos supostos créditos-prêmio de IPI da Impetrante teriam sido considerados insuscetíveis de serem beneficiados pelo disposto na Medida Provisória nº 470/2009, em face da não apresentação de tempestiva declaração de desistência recursal, em concordância com o disposto no art. 7º da Portaria PGFN/RFB nº 9, de 2009; que referida Medida Provisória teria autorizado a fruição do benefício apenas mediante o “pagamento ou parcelamento até o dia 30 de novembro de 2009”; que a protocolização de desistência do recurso administrativo em data posterior à preconizada pela norma infralegal, se acatada, representaria a confirmação de desigualdade de tratamento, em detrimento dos demais contribuintes; que regulamento seria modalidade de ato normativo subordinado à lei, sendo-lhe vedado dispor de forma contrária ao estabelecido no diploma legal; que, no entanto, a estipulação de obrigações secundárias por intermédio de atos normativos infralegais afigurar-se-ia perfeitamente possível, desde que tais determinações não se revelassem inadequadas frente às disposições primárias estabelecidas em diploma legal; que o comando veiculado no caput do art. 7º da Portaria PGFN/RFB nº 9, de 2009, seria pertinente e necessário. Ao final, requereu a denegação da segurança pleiteada.
Às fls. 280/281-vº, restou concedida a liminar.
A Receita Federal informou que o processo 13403.000326/2003-05 teria sido incluído no parcelamento instituído pela Medida Provisória nº 470/2009; que o processo 13403.000140/2002-67 encontrar-se-ia no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), com sede em Brasília; que o CARF ainda não teria devolvido mencionado processo, apesar de assim solicitado (fl. 288). Juntou documentos (fls. 289/294).
À fl. 297, a União noticiou a interposição de Agravo de Instrumento, juntando cópia do referido recurso (fls. 298/307).
Mantida a decisão agravada (fl. 309).
O Ministério Público Federal ofereceu o r. Parecer de fls. 311/312, arguindo, em suma, que, não haveria interesse público, evidenciado pela natureza da lide e pela qualidade da parte, a justificar a intervenção ministerial nestes autos.
Vieram os autos conclusos para julgamento.
 É o Relatório. Passo a decidir.
 Fundamentação.
          1. Preliminarmente, constato que a Secretaria deste juízo não cumpriu, até a presente data, o determinado na alínea “a” da conclusão da decisão de fls. 280-282, no sentido de remeter o feito à Distribuição para autuar a UNIÃO no pólo passivo deste feito, uma vez que esta se integrou na demanda na petição de fl. 258. Logo, para que o feito tramita com regularidade, deve a Secretaria cumpri mencionada determinação, antes da publicação desta sentença.
 2. A questão cinge-se na alegação de ilegalidade do art. 7º da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 9, de 30.10.2009, segundo o qual os contribuintes só poderiam utilizar-se dos benefícios fiscais,  previstos na Medida Provisória nº 470/2009, se desistirem, expressamente e de forma irrevogável, da impugnação ou do recurso administrativo, e, ainda, teriam que renunciar ao direito em que se fundava a ação judicial proposta.
A Medida Provisória nº 470/2009 permitia que os contribuintes pagassem ou parcelassem dívidas tributárias, com inúmeras vantagens, tais como exclusão de multas e de juros, e com utilização de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido próprio.
É o que se verifica na redação do seu art. 3º, verbis:
Art. 3o  Poderão ser pagos ou parcelados, até 30 de novembro de 2009, os débitos decorrentes do aproveitamento indevido do incentivo fiscal setorial instituído pelo art. 1o do Decreto-Lei no 491, de 5 de março de 1969, e os oriundos da aquisição de matérias-primas, material de embalagem e produtos intermediários relacionados na Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados - TIPI, aprovada pelo Decreto no 6.006, de 28 de dezembro de 2006, com incidência de alíquota zero ou como não tributados - NT.
§ 1o  Os débitos de que trata o caput deste artigo poderão ser pagos ou parcelados em até doze prestações mensais com redução de cem por cento das multas de mora e de ofício, de noventa por cento das multas isoladas, de noventa por cento dos juros de mora e de cem por cento do valor do encargo legal.
§ 2o  As pessoas jurídicas que optarem pelo pagamento ou parcelamento nos termos deste artigo poderão liquidar os valores correspondentes aos débitos, inclusive multas e juros, com a utilização de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido próprios, passíveis de compensação, na forma da legislação vigente, relativos aos períodos de apuração encerrados até a publicação desta Medida Provisória, devidamente declarados à Secretaria da Receita Federal do Brasil.
§ 3o  Na hipótese do § 2o deste artigo, o valor a ser utilizado será determinado mediante a aplicação sobre o montante do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa das alíquotas de vinte e cinco por cento e nove por cento, respectivamente.
§ 4o  A opção pela extinção do crédito tributário na forma deste artigo não exclui a possibilidade de adesão ao parcelamento previsto na Lei no 11.941, de 27 de maio de 2009.
2.1)  Antes de tudo cabe analisar se o pleito administrativo da ora Impetrante encontrava-se sob o pálio da Medida Provisória 470, de 2009[1],  porque o prazo, para tanto, conforme art. 3º desse ato legal, acima transcrito, era 30 de novembro de 2009.
A Impetrante, na peça inicial, alega que protocolou o seu pedido, na via administrativa, em 26.11.2009, pleito esse que teria dado origem ao processo administrativo nº 13403.000.366/2009-34.
Esse fato foi confirmado pela Autoridade apontada como coatora(v. fl. 261 dos autos).
Então, mencionado pleito administrativo teria que ter sido analisado à luz dessa Medida Provisória.
 2.2)  Alega ainda a Impetrante que houvera instruído o pleito com comprovante de cópias e pedido de desistência dos Processos Administrativos nºs 13403.000140/2002-67 e 13403.000326/2003-05.
O fato “pedido de desistência”, que teria instruído o pedido inicial, foi negado por mencionada Autoridade nas suas informações, segundo a qual a Impetrante só formulara esse pedido em 02.05.2011(fl. 261). E, diante dessa situação, continuou a Autoridade apontada como coatora, como esse pedido fora protocolado em data posterior a 30.11.2009, que era o prazo limite fixado no art. 7º da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 9, de 2009, o seu pleito fora indeferido na primeira instância administrativa, mas, na segunda instância, diante de recurso administrativo da ora Impetrante, admitiu-se a quitação da dívida relativa ao processo administrativo nº 13403.000326/2003-05, porque não já se encontrava pendente de análise recursal, mas a decisão de primeira instância fora mantida com relação à dívida do processo nº 13403.000140/2002-67.
A questão principal a ser decidida é se essa exigência da referida Portaria poderia criar mencionada exigência.
Note-se, desde já, que, mesmo não tendo a Impetrante, segundo a Autoridade apontada como coatora, cumprido essa exigência com relação aos dois processos administrativos, o julgador de segundo grau administrativo reconheceu o pleiteado direito da Impetrante relativamente a um dos processos administrativos, numa demonstração cabal de que o “pedido de desistência” não tinha nenhuma importância.  
 3. Não consta da Medida Provisória nº 470, de 13.10.2009, nenhuma regra limitando a utilização do benefício fiscal nela permitido a comprovação de desistência dos processos administrativos nos quais eram pleiteados créditos tributários.       
A única limitação era que o pleito fosse protocolado até 30 de novembro de 2009, limitação essa que, como acima demonstrado, foi rigidamente observada pela ora Impetrante.
Os atos normativos secundários, a exemplo das Portarias expedidas pelo Poder Executivo e por seus Órgãos, devem subordinar-se às Leis (e, no Brasil, Medida Provisória tem força de Lei Ordinária, conforme art. 62 e respectivos parágrafos da Constituição da República, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 32), não podendo extrapolar os limites do poder regulamentar, sob pena de incorrer em flagrante ofensa ao princípio da legalidade.
Como se observa, a aludida Portaria inovou, trazendo regras limitadoras de direitos dos Contribuintes, e não no campo secundário, como alegado pela Autoridade apontada como coatora, mas na essência do direito, porque passou a obrigar o Contribuinte a desistir de processo administrativo, sem que essa exigência estivesse no ato legal, ou seja, na referida Medida Provisória, no que é inconstitucional, porque os Órgãos Administrativos que a expediram não tinham, nem têm competência constitucional para tanto.
A respeito desse assunto disserta CARVALHO FILHO, José dos Santos:
“Poder regulamentar, portanto, é a prerrogativa conferida à Administração Pública de editar atos gerais para complementar as leis e permitir a sua efetiva aplicação. A prerrogativa, registre-se, é apenas para complementar a lei; não pode, pois, a Administração alterá-la a pretexto de estar regulamentando. Se o fizer, cometerá abuso de poder regulamentar, invadindo a competência do Legislativo.[2]
Afinal, sobrepõe-se no nosso ordenamento jurídico, como verdadeiro dogma, o princípio da legalidade, segundo o qual ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de Lei(art. 5º-II da Constituição da República).
O art. 7º da mencionada Portaria, sem dúvida, limita direitos, ou seja, não veicula norma que busca apenas aclarar dispositivos da Lei, como alegado na manifestação da(s) Autoridade(s) Impetrada(s).
Ora, qualquer norma que limita direito finda também por alterar o núcleo obrigacional.
E nenhuma limitação de direito, tampouco alteração do núcleo obrigacional pode ser veiculada em atos normativos secundários, porque, no Brasil, desde nossa primeira Constituição, aquela de 1824, outorgada na época do Império,  Art. 179 - (...). Nenhum cidadão pode ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude da Lei”(mantida a redação originária, no  português da época)[3], regra principiológica essa hoje agasalhado no inciso II do art. 5º e, para o campo tributário, no inciso I do art. 150, todos da vigente Constituição da República Federativa do Brasil, sendo que no primeiro plano como garantia e direito individual constitucional.
Realmente, in casu, não poderia a Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 9, de 30.10.2009, ter imposto limitação ao uso do benefício fiscal veiculado pela Medida Provisória nº 470/2009, até mesmo porque, caso não observada a limitação do noticiado ato administrativo, implicaria em obrigar a Impetrante a pagar os tributos em parcela maior que a admitida pela Medida Provisória, ferindo, assim, outra regra constitucional, o inciso I do art. 150 da vigente Constituição do Brasil, segundo o qual nenhum tributo poderá ser exigido ou majorado, senão por Lei.
E, como vimos, o julgador administrativo de segundo grau, relativamente a um dos processos administrativos, findou por ignorar a exigência em questão dessa Portaria, certamente por ter ciência da acima demonstrada estrutura constitucional do nosso sistema legislativo.
Tem-se, então, que a mencionada regra do referido ato administrativo não é apenas ilegal, mas inconstitucional, porque feriu diretamente regras da Constituição da República.  

          Conclusão:
 POSTO ISSO, incidenter tantum, declaro a inconstitucionalidade do art. 7º da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 9, de 30.10.2009, ratifico a decisão de fls. 280-281vº, na qual se concedeu medida liminar, julgo procedentes os pedidos desta ação mandamental, concedo a segurança definitiva, ficando a ora Impetrante autorizada a quitar suas dívidas tributárias, relativamente ao(s)processo(s) administrativo(s) indicado(s) na Petição Inicial, com os benefícios previstos na Medida Provisória nº 470/2009, e determinando-se que a Autoridade apontada como coatora observe esse direito, sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009.
De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição.
Sem verba honorária (Lei nº 12.016/2009, art. 25[4]).
Dê-se ciência desta sentença à Autoridade apontada como coatora, na forma do art. 13 da Lei nº 12.016, de 2009, e à representação judicial da UNIÃO, encaminhando-lhe estes autos, conforme legislação especial que trata do assunto.  
Com urgência, remeta-se cópia desta sentença para os autos do Agravo de Instrumento noticiado nestes autos, aos cuidados do respectivo Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Relator, para os fins de direito.
 P. R. I.
 Recife, 09 de maio de 2012.

Francisco Alves dos Santos Júnior
               Juiz Federal, 2ª Vara-PE


[1] O prazo de vigência dessa Medida Provisória encerrou-se no dia 23 de março de 2010, mas os atos praticados enquanto vigia têm plena validade.

[2] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris. 10ª ed. 2003, p. 38.

[3] Apud SANTOS JÚNIOR, Francisco Alves dos. Direito Tributário do Brasil: Aspectos Estruturais do Sistema Tributário Brasileiro. Volume I. Edição 2ª, revisada e aumentada, Olinda: Livro Rápido, 2010, p. 69.
[4] “Art. 25.  Não cabem, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé.” 

quinta-feira, 3 de maio de 2012

MUITOS MÉDICOS NÃO QUEREM FAZER PERÍCIA EM PESSOAS POBRES NA JUSTIÇA FEDERAL DE PERNAMBUCO


    Por Francisco Alves dos Santos Júnior

    A Justiça Federal não tem um setor de perícias, de forma que os juízes nomeiam peritos privados. Quando o Autor ou Réu é pobre e necessita de uma perícia, os honorários do Perito são pagos pela Justiça Federal, mediante tabela aprovada pelo Conselho da Justiça Federal - CJF. Como os valores da tabela aprovada por esse Conselho estão sempre abaixo do valor de mercado dos profissionais liberais que são nomeados para realização de perícia, esses profissionais negam-se a realizar a perícia e pedem o cancelamento da sua nomeação. Os médicos, por exemplo, com raras exceções, negam-se a fazer perícia e alguns dizem claramente, como aconteceu no caso que segue, que não vão fazer a perícia porque os honorários fixados por mencionado Conselho estão defasados do mercado. Isso é dramático e tétrico, porque muitas pessoas pobres dependem da perícia, para que o juiz decida, por exemplo, se elas têm ou não direito a uma aposentadoria.

    No caso que segue, desde outubro de 2009 que este magistrado vem tentando um médico-perito para realização de uma perícia em um hemofílico e não vem conseguindo.

    O Conselho Nacional da Justiça-CNJ e/ou o Congresso Nacional têm que fazer alguma coisa, pois como está não pode ficar.

    Boa leitura.


PODER JUDICIÁRIO
                                                                            
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO
                                                                          
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

                                                                       2ª VARA


Processo nº 0005554-51.2009.4.05.8300
Classe:    29 AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO)
AUTOR: R. . DA S.
RÉU: CENTRO DE HEMATOLOGIA E HEMOTERAPIA DE PE - HEMOPE

                                                          C O N C L U S Ã O
                                                                   
Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR
                                                
Recife, 27/04/2012
                               
                                                    
Encarregado(a) do Setor

                                                     D E C I S Ã O

          Breve relatório

          Na decisão de fls. 380/381, datada de 09.10.2009, foi deferida a realização de perícia médica, havendo sido nomeada, como perita judicial, a médica Dra. M. S. C..
         
O Autor requereu a implantação da pensão provisória, arbitrada em seu favor (fl. 385).
         
A FUNDAÇÃO DE HEMATOLOGIA E HEMOTERAPIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO – HEMOPE indicou assistente técnico e apresentou quesitos (fls. 387/389), o mesmo fazendo o Autor na petição de fls. 393-394.
        
A FUNDAÇÃO DE HEMATOLOGIA E HEMOTERAPIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO – HEMOPE requereu, à fl. 397,  a juntada de cópia de documentos (fls. 398/399-vº).
         
Cópia de guias de depósito judicial (fls. 402, 407 e 412).
         
O Autor, à fl. 416,  requereu que os valores devidos, a título de pensão provisória, fossem mensalmente depositados na conta-poupança de titularidade do Autor, mantida na agência nº 0048 da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL.
         
Na r. decisão de fls. 420/421, foi determinado que: a União comprovasse o cumprimento da decisão proferida no AGTR nº 96644-PE; o Autor comprovasse a titularidade da conta bancária indicada à fl. 416 e fossem os autos encaminhados à perícia.
        
O Autor, à fl. 422,  requereu a juntada de cópia de documento (fl. 423).
        
A União noticiou, à fl. 432,  a interposição de Agravo de Instrumento e requereu a juntada de cópia de documentos, que demonstrariam as diligências tomadas (fls. 433/434).
        
Mantida a decisão agravada (fl. 449).
         
A União indicou assistente técnico e apresentou quesitos (fls. 454/457).
           
A FUNDAÇÃO DE HEMATOLOGIA E HEMOTERAPIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO – HEMOPE informou que o E. TRF/5ª Região teria decidido, em sede de agravo de instrumento, que a União deveria suportar por inteiro o pagamento de pensão mensal correspondente a 05 (cinco) salários mínimos ao Autor, havendo a União iniciado tal pagamento em dezembro/2009; que os valores pagos pela FUNDAÇÃO DE HEMATOLOGIA E HEMOTERAPIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO – HEMOPE, a partir de dezembro/2009, teriam sido indevidos. Requereu que a União depositasse os respectivos valores, na proporção de 50% (cinquenta por cento), referentes ao período de dezembro/2009 até o último pagamento constante nos autos (fl. 459). Juntou documentos (fls. 460/488).
        
Como a Sra. Médica Perita, nomeada na decisão de fls. 380/381, datada de 09.10.2009, não aceito o encargo, em face do baixo valor dos honorários periciais pagos pelo Conselho Nacional da Justiça – CNJ(v. manifestação de fl. 489 e certidão de fl. 490, na decisão de fl.  491, datada de 21.03.2011, foi nomeada nova perita judicial, Dra. C. F. de L. V.
         
O Autor requereu que a União promovesse a imediata implantação da pensão provisória no valor correspondente a 05 (cinco) salários mínimos (fls. 493/494).
         
A União, à fl. 496,  requereu a juntada de documentos (fls. 497/500).
        
O Autor informou que a União teria cumprido com a complementação do valor de sua pensão (fl. 507).
        
Documentos juntados pela União, às fls. 514-522.
         
Na decisão de fl. 528, foi determinada a intimação da União para implantar o benefício a favor do Autor.
        
A União requereu, à fl. 531,  a juntada de cópia do Parecer nº 1323/2010-AGU/CONJUR-MS, do Ministério da Saúde e outros documentos (fls. 532/553).
       
A nova perita judicial nomeada, Dra. C. F. de L. V., informou, em 31.03.2011, que não poderia exercer tal função em face das alegações consignadas na petição de fl. fl. 559, na qual requereu afastamento do encargo.
        
Na decisão de fl. 560, datada de 08.07.2011, foram arbitrados novos honorários periciais, sendo determinado fosse remetido ofício ao Ilmo. Sr. Diretor do Hospital Oswaldo Cruz com vistas a indicação de médico infectologista, para realização da perícia, que se concretizou no ofício de fl. 564, datado de 13.07.2011, tendo o mencionado Sr. Diretor recebido referido ofício em 15.07.2011(fl. 567).
         
Como esse Sr. Diretor do Hospital Oswaldo Cruz nem sequer dignou-se a responder ao ofício deste juízo, foi aquele ofício ratificado(fl. 571), por força da decisão de fl. 570, datada de 22.08.2011. Referido Diretor foi intimado do novo ofício em 05.10.2011(fl. 586).
         
Desta vez o referido Médico-Diretor respondeu a este juízo, pelo ofício de fl. 599-599vº, datado de 22.07.2011, encaminhando lista de médicos que poderiam ser nomeados como Perito Judicial.
         
O Autor requereu a juntada de cópia de laudo pericial produzido nos autos da ação ordinária nº 00015796-69.2009.4.05.8300 (fls. 572/584).
        
O Agravo de Instrumento nº 105.918-PE, interposto pela UNIÃO, não foi provido(fls. 588/597, conforme cópia do respectivo acórdão, acostada às fls. 588-597.
        
Na decisão datada de 29.02.2012, à fl. 600, foi nomeada como perita judicial a Dra. M. de M. R., cuja nome constou do rol de médicos apresentado pelo referido Médico-Diretor. Essa Médica, à fl. 607vº, esclareceu que não teria conhecimento específico de hemocomponentes, de modo que não poderia aceitar o encargo, pelo que sua nomeação foi cancelada e no seu lugar, na decisão datada de 11.04.2012(fl. 609), foi nomeado como perito judicial o médico Dr. V. L. V. da C., o qual declarou-se impossibilitado de assumir o encargo de perito, uma vez que não teria certeza se o ora Autor fora seu paciente(fl. 614vº).
         
Fundamentação
             
Extrai-se do acima noticiado que a Justiça Federal necessita, urgentemente, de criar um departamento médico-pericial, pois desde o distante outubro de 2009 que este juízo vem tentando encontrar um(a) médico(a)para realizar uma simples perícia no Autor, de forma remunerada, e não vem conseguindo.

         
A primeira médica nomeada, de forma um tanto desumana e até com uma certa carga  comercial, declarou que não iria fazer a perícia, porque o valor dos honorários pagos pelo Conselho da Justiça Federal-CJF estaria defasado.
        
Dos demais médicos, apenas uma médica fundamentou a sua resposta(não teria conhecimento da matéria), os demais deram desculpas vazias.
         
Não obstante esse quadro um tanto tétrico, como magistrado tenho que continuar tentando uma resposta médica para o caso, pois o julgamento do feito depende do resultado da perícia médica.
         
Conclusão
          
Posto isso, resta-me, pois, determinar:
         
a)                      que se envie cópia desta decisão para o Conselho Regional de Medicina local, para possível instauração de processo ético-profissional contra a Médica, acima identificada,  que se negou a fazer a perícia por simples interesse comercial e contra os demais médicos que deram desculpas desfundamentadas;  
        
b)                     que se remeta cópia desta decisão para a Corregedoria do TRF/5ª, para que esta estude o assunto, com a possibilidade de fazer gestões junto ao Conselho Nacional da Justiça – CNJ para que este tome alguma providência institucional, para que não persista a lamentável situação acima narrada;
        
c)                      que se remeta cópia desta decisão para o Presidente do Congresso Nacional, Presidente do Senado e Presidente da Câmara dos Deputados, na esperança de que tenham alguma iniciativa, com o fito de por fim ao tormento dos Jurisdicionados que necessitam ser submetidos a uma perícia médica na Justiça Federal e não têm condições financeiras de pagar os respectivos honorários.
        
d)                     cancelar a nomeação do médico Dr. V. L. V. da C. e, em seu lugar, nomear, como de fato nomeio, o médico Dr. C. E. R. de C., médico infectologista, indicado pelo Hospital Universitário Oswaldo Cruz, com endereço na Rua Arnóbio Marques, nº 310, Santo Amaro, Recife-PE (Hospital Universitário Oswaldo Cruz), rogando a Deus para que esse novo Médico não rejeite o encargo, como os seus colegas acima identificado o fizeram, senão por amor a profissão, pelos menos por caridade e por amor a Deus, para o que determino que a ele seja encaminhada cópia desta decisão, juntamente com o respectivo mandado de intimação.
        
E para que a Sociedade Pernambucana tome conhecimento dos fatos acima narrados, que esta decisão seja publicada na íntegra.
         
Com a máxima urgência.
         
P. I.
           
Recife, 03 de maio de 2012.
          
Francisco Alves dos Santos Júnior
                 Juiz Federal, 2ª Vara-PE

quarta-feira, 25 de abril de 2012

DECADÊNCIA DO DIREITO DE PEDIR REVISÃO DE BENEFÍCIO CONCEDIDO PELO INSS

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Segue sentença na qual se discute o tormentoso problema da decadência do direito de pedir revisão de benefício concedido pelo Instituto Nacional do Seguro Social-INSS. O Superior Tribunal de Justiça finalmente sedimentou o seu entendimento a respeito do assunto, passando a servir de orientação obrigatória para todos os Magistrados.

Boa leitura.


PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 0017615-70.2011.4.05.8300 - Classe 29 - Ação Ordinária
Autor: R. C. DA C.
Adv.: H. L. S. - OAB/PE
Réu: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Procurador Federal

Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ........./.........../2012

Sentença tipo A
  
EMENTA:- PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RMI. DECADÊNCIA.
A 1ª Seção e a Corte Especial do E. Superior Tribunal de Justiça sedimentaram o entendimento, segundo o qual é de dez anos, a partir da publicação da Medida Provisória 1.523-9, de 27.06.1997, o prazo de decadência para se pleitear revisão da Renda Mensal Inicial-RMI de benefício concedido pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS ou de qualquer alteração do ato de concessão de benefício concedido por essa Autarquia.
Acolhimento da exceção de decadência.
Vistos etc.
R. C. DA C., qualificado na Inicial, ajuizou, em 09.11.2011, a presente “AÇÃO DE REVISÃO DA RMI DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO 42.319.235-3, SEM O TETO LIMITADOR DA LEI 7787/89, BEM COMO A RETROAÇÃO DA DIB para 01.06.1989” contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, requerendo inicialmente prioridade na tramitação do feito por se tratar de pessoa idosa. Aduziu, em síntese, que seria beneficiário da Previdência Social desde 06.02.1991, com o tempo de contribuição de 33 (trinta e três) anos, 03 (três) meses e 21 (vinte e um) dias; que, no cálculo de seu benefício previdenciário, teria havido limitação ao teto na renda mensal inicial; que o INSS, ao efetuar o cálculo do seu benefício, teria calculado sob as 80 (oitenta) maiores contribuições; que, desde 01.06.1989, o Autor teria reunido todos os requisitos suficientes para recebimento do benefício de forma mais vantajosa; que sempre teria contribuído acima de 10 (dez) salários de contribuição; que teria direito adquirido ao benefício sem a limitação do teto, eis que já receberia abono de permanência em serviço; que, como segurado, teria direito à aposentadoria em época anterior ao requerimento do benefício e igualmente anterior à edição da Lei nº 7.787/89; que a renda mensal também não poderia submeter-se ao teto fixado pelo art. 33 da Lei nº 8.213/91; que para a obtenção do benefício a data da RMI deveria ser considerada 01.06.1989. Transcreveu algumas decisões judiciais. Teceu outros comentários. Ao final, requereu: a citação do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS; a procedência dos pedidos, para condenar o INSS a revisar o cálculo da RMI do benefício, considerando o valor das contribuições acima de 10 (dez) salários mínimos, retroagindo a DIB para 01.06.1989, de modo que a renda mensal inicial do benefício do Autor não fosse limitada ao teto de 10 (dez) salários; o pagamento das diferenças vencidas e vincendas, corrigidas monetariamente, desde o respectivo vencimento e acrescidas de juros de mora legais, incidentes até a data do efetivo pagamento. Fez protestos de estilo. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com instrumento de procuração e cópia de documentos (fls. 12/38).
Citado, o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL apresentou Contestação, às fls. 41/54, arguindo, como prejudicial ao exame de mérito, a prescrição quinquenal. Levantou a preliminar de carência de ação. Sustentou que o direito de revisão teria sido alcançado pela decadência. Argumentou que o teto de 10 (dez) salários mínimos para o salário de benefício teria sido determinado pela Lei nº 7.787, de 30.06.1989, anterior à data do requerimento do benefício do Autor; que o fato de o Autor ter atingido o tempo de serviço suficiente ao requerimento do benefício de aposentadoria não constituiria um direito em si mesmo; que, se o Autor pleiteara a concessão do benefício de aposentadoria somente em 14.01.1993, em tal data teria se configurado o “fato idôneo” capaz de ensejar o direito adquirido; que a legislação a ser aplicada no processo de concessão do benefício seria aquela vigente à época; que seria incabível, no recálculo da renda mensal inicial, a utilização dos salários-de-contribuição sobre o teto máximo de 20 (vinte) salários mínimos, eis que tal critério não mais vigoraria quando da concessão do benefício; que a data do início do benefício, para fins de cálculo da RMI e posteriores reajustamentos, seria fixada de acordo com o art. 54 c/c o art. 49 da Lei nº 8.213/91; que o pedido formulado pelo Autor, no sentido de retroagir a DIB violaria tais dispositivos legais, assim como o art. 6º da LICC. Fez outros comentários. Transcreveu algumas decisões judiciais. Requereu o acolhimento das prejudiciais de mérito e da preliminar arguidas, ou, em hipótese contrária, a improcedência dos pedidos da Inicial. Ao final, requereu, que, no caso de haver condenação da parte ré, fossem os juros de mora e correção monetária aplicados conforme a variação da caderneta de poupança, nos termos da Lei nº 8.494/97, alterada pela Lei nº 11.960/09.
O Autor apresentou Réplica, às fls. 58/69, rebatendo os argumentos da Defesa e reiterando os termos da Inicial. Juntou cópia de documentos (fls. 70/82).
Vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
Passo a decidir.
Fundamentação.
 A Exceção de Decadência, levantada na defesa do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, merece ser acolhida, porque esta ação foi proposta em 09.11.2011, quando o prazo para pleitear a alteração do valor da Renda Mensal Inicial findou em 27.06.2002, qual seja, dez anos depois da introdução da regra do art. 103 da Lei nº 8.213, de 1991, pela 9ª(nona)versão da Medida Provisória nº 1.523-9, de 27.06.1997, que, mais tarde, foi transformada na Lei nº 9.528, de 10.12.1997, sem qualquer alteração quanto a esse dispositivo, que tem a seguinte redação:
                
"Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo.”.
                  O E. Superior Tribunal de Justiça, depois de muito titubear quanto à aplicação desse dispositivo legal, findou por sedimentar o seu entendimento na forma acima consignada, conforme se constata no julgado que segue:
            
“Superior Tribunal de Justiça. RECURSO ESPECIAL Nº 1.303.988 - PE (2012/0027526-0). RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE : INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR : PROCURADORIA-GERAL FEDERAL - PGF
RECORRIDO : ALFREDO HONÓRIO PEREIRA E OUTROS
ADVOGADO : MARIA LÚCIA SOARES DE ALBUQUERQUE E OUTRO(S)
EMENTA
PREVIDÊNCIA SOCIAL. REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. PRAZO. ART. 103 DA LEI 8.213/91. BENEFÍCIOS ANTERIORES. DIREITO INTERTEMPORAL.
1. Até o advento da MP 1.523-9/1997 (convertida na Lei 9.528/97), não havia previsão normativa de prazo de decadência do direito ou da ação de revisão do ato concessivo de benefício previdenciário. Todavia, com a nova redação, dada pela referida Medida Provisória, ao art. 103 da Lei 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social), ficou estabelecido que "É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo".
2. Essa disposição normativa não pode ter eficácia retroativa para incidir sobre o tempo transcorrido antes de sua vigência. Assim, relativamente aos benefícios anteriormente concedidos, o termo inicial do prazo de decadência do direito ou da ação visando à sua revisão tem como termo inicial a data em que entrou em vigor a norma fixando o referido prazo decenal (28/06/1997). Precedentes da Corte Especial em situação análoga (v.g.: MS 9.112/DF Min. Eliana Calmon, DJ 14/11/2005; MS 9.115, Min. César Rocha (DJ de 07/08/06, MS 11123, Min. Gilson Dipp, DJ de 05/02/07, MS 9092, Min. Paulo Gallotti, DJ de 06/09/06, MS (AgRg) 9034, Min. Félix Ficher, DL 28/08/06).
3. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin, Napoleão Nunes Maia Filho, Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves, Cesar Asfor Rocha e Francisco Falcão votaram com o Sr. Ministro Relator. Licenciado o Sr. Ministro Arnaldo Esteves Lima. Compareceu à sessão a Dra. LUYSIEN COELHO MARQUES SILVEIRA, pelo INSS.
Documento: 21080798 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJe: 21/03/2012 Brasília, 14 de março de 2012
MINISTRO RELATOR: TEORI ALBINO ZAVASCKI.
            Note-se que se trata de um julgado da sua 1ª Seção desse E. Tribunal, composta de Turmas especializadas na matéria, e no qual se invoca precedentes da sua augusta Corte Especial, que corresponde a sua composição plenária.
 A verba honorária será arbitrada em valor fixo, à luz do § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil, porque, embora o Autor tenha indicado um exagerado valor da causa, não se sabe realmente o valor econômico da demanda.
 Conclusão:
 POSTO ISSO, acolho a exceção de decadência da pretensão do Autor(art. 103 da Lei nº 8.213, de 1991), dou este processo por extinto, com resolução do mérito(art. 269-IV do Código de Processo Civil), e condeno o Autor em verba honorária que, considerando o esforço e dedicação do Patrono do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, arbitro, à luz do § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil, em R$ 2.000,00(dois mil reais), que serão atualizados a partir do mês seguinte ao da publicação desta sentença, pelos índices de correção monetária do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal e acrescidos de juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados estes da data da intimação da execução desta Sentença, na forma preconizada no art. 475-J do Código de Processo Civil,  mas incidentes sobre o valor já monetariamente corrigido.
 P.R.I.
 Recife, 25 de abril de 2012.

          Francisco Alves dos Santos Júnior
     Juiz Federal da 2ª Vara – PE



quarta-feira, 18 de abril de 2012

TEMPO DE ATENDIMENTO EM AGÊNCIA DE BANCO. LEI ESTADUAL COMPETÊNCIA CONCORRENTE.

Por Francisco Alves dod Santos Júnior.


Podem os Estados da Federação legislar sobre horário de Bancos ou apenas os Municípios?
Pode um PROCON estadual multar um banco federal, por descumprimento de Lei estadual que fixa a exigência de senha com horário de chegada na agência bancária, com a finalidade de medir o tempo de espera no atendimento?
Essas e outras questões são discutidas na decisão que segue.
Boa leitura.





PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2ª VARA



Processo nº 0008346-70.2012.4.05.8300

Classe:    29 AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO)

AUTOR: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA

RÉU: ESTADO DE PERNAMBUCO



C O N C L U S Ã O



Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR



Recife, 17/04/2012



Encarregado(a) do Setor



D E C I S Ã O



1-Relatório



A Caixa Econômica Federal – CAIXA, qualificada na Petição Inicial, ajuizou a presente “Ação Anulatória de Autos de Infração c/c Pedido de Liminar” em face do ESTADO DE PERNAMBUCO (PROCON/PE). Alegou, em síntese, que teria sido surpreendida com o recebimento de autos de infração lavrados pelo PROCON/PE em decorrência de procedimentos de fiscalização realizados em suas agências; que teriam sido aplicadas multas em valores exorbitantes; que a autuação lavrada contra si, decorrente da emissão de senha para atendimento dos clientes junto aos caixas, sem apresentar o horário de chegada à agência, estaria assim caracterizada: Auto de Constatação nº 1063/08, Auto de Infração nº 1050/08, Local: Agência Caxangá, Multa aplicada: 60.000 UFIR´s =R$ 63.846,00; que a CAIXA estaria anexando aos autos os documentos pertinentes à referida autuação, todavia, pugna pela juntada pela parte demandada da cópia integral dos processos administrativos em questão; que o Estado de Pernambuco, por meio do PROCON estadual, teria invadido esfera de competência do Município do Recife, já que teria agido embasado na Lei Estadual nº 12.264/2002, que seria inconstitucional; que, portanto, não poderiam ser considerados válidos os atos de fiscalização praticados por esse órgão, muito menos a aplicação da multa; que a Autora seria uma empresa pública federal e, como tal, seria competente para fiscalizar a referida instituição financeira federal, órgão de defesa do consumidor de âmbito federal; que a Constituição da República/88 exigiria, no art. 163, V, Lei Complementar para tratar de matéria atinente à fiscalização das instituições financeiras da administração pública direta e indireta; que, portanto, restaria clara a incompetência do PROCON/PE para fiscalizar e aplicar sanções à CAIXA, visto que a competência seria de órgão federal; que, ademais, a Ag. Caxangá possuiria um gerenciador de atendimento e este sinalizaria como atendimento dentro do esperado (azul) a espera de até 30 (trinta) minutos e, acima disso, o registro da senha passaria a ser evidenciado na tela da CAIXA em vermelho; que os valores das autuações seriam absurdos e inadmissíveis, porque a CAIXA teria realizado a instalação e a reparação dos equipamentos e tais equipamentos estariam em funcionamento nas agências; que a multa aplicada pelo PROCON/PE afrontaria os princípios da proporcionalidade e razoabilidade; que, portanto, as multas deveriam ser excluídas, ou então, reduzidas a, no máximo 5% (cinco por cento) do valor cobrado nos autos de infração. Teceu outros comentários, e requereu, em caráter liminar, a suspensão de quaisquer medidas de cobrança contra a CAIXA, decorrente do Auto de Infração nº 1050/08 e do Auto de Constatação nº 1063/08, do PROCON/PE, tendo em vista a exorbitância dos valores cobrados. Atribuiu valor à causa. Juntou instrumento de procuração e cópias de documentos, fls. 10/44. Custas recolhidas, fl. 11.



2- Fundamentação



2.1- A CAIXA pretende, em caráter liminar, a suspensão de quaisquer medidas de cobrança dos valores consignados no Auto de Infração nº 1050/08 e no Auto de Constatação nº 1063/08, sob os seguintes argumentos básicos: o PROCON estadual não teria competência para aplicar tais multas; a autuação estaria embasada em lei inconstitucional e os valores das multas seriam desproporcionais.

O pedido da Autora será apreciado à luz do §7º[1] do art. 273 do Código de Processo Civil, devendo estar presentes, portanto, para o caso de concessão da providência cautelar pretendida, o fumus boni iuris e o periculum in mora.

2.2- Preambularmente, cumpre observar que não há impedimento para que a CAIXA, empresa pública federal, seja fiscalizada pelo PROCON estadual.

Ao contrário disso, as agências bancárias sediadas no Estado de Pernambuco estão incluídas na esfera de fiscalização do PROCON/PE, conforme se conclui da leitura dos arts. 5º e 9º do Decreto nº 2.181/1997, que dispõe sobre a organização do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor – SNDC e estabelece as normas gerais de aplicação das sanções administrativas previstas na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990, entre outras providências, verbis:

Art. 5º Qualquer entidade ou órgão da Administração Pública, federal, estadual e municipal, destinado à defesa dos interesses e direitos do consumidor, tem, no âmbito de suas respectivas competências, atribuição para apurar e punir infrações a este Decreto e à legislação das relações de consumo.

Parágrafo único. Se instaurado mais de um processo administrativo por pessoas jurídicas de direito público distintas, para apuração de infração decorrente de um mesmo fato imputado ao mesmo fornecedor, eventual conflito de competência será dirimido pelo DPDC, que poderá ouvir a Comissão Nacional Permanente de Defesa do Consumidor - CNPDC, levando sempre em consideração a competência federativa para legislar sobre a respectiva atividade econômica.

Art. 9º A fiscalização das relações de consumo de que tratam a Lei nº 8.078, de 1990, este Decreto e as demais normas de defesa do consumidor será exercida em todo o território nacional pela Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça, por meio do DPDC, pelos órgãos federais integrantes do SNDC, pelos órgãos conveniados com a Secretaria e pelos órgãos de proteção e defesa do consumidor criados pelos Estados, Distrito Federal e Municípios, em suas respectivas áreas de atuação e competência.



Nesse sentido, eis os precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça e do E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que se aplicam, mutatis mutandis, ao presente caso, verbis:



ADMINISTRATIVO. PODER DE POLÍCIA. APLICAÇÃO DE MULTA PELO PROCON À EMPRESA PÚBLICA FEDERAL. POSSIBILIDADE. 1. A proteção da relação de consumo pode e deve ser feita pelo Sistema Nacional de Defesa do Consumidor - SNDC - conforme dispõem os arts. 4º e 5º do CDC, e é de competência do Procon a fiscalização das operações, inclusive financeiras, no tocante às relações de consumo com seus clientes, por incidir o referido diploma legal. 2. Recurso especial não provido.
(RESP 200802452756, MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:06/08/2009



APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CAUTELAR. SFH. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. PROCON. APLICAÇÃO DE MULTA. RELAÇÃO CONSUMEIRISTA. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. LEI N.º 8.078/90. COMPETÊNCIA. Trata-se de Ação Cautelar preparatória, cuja pretensão consiste em impedir liminarmente o Programa Estadual de Orientação e Proteção do Consumidor do Rio Grande do Norte - PROCON-RN a processar e julgar questões afetas ao SFH e obter a suspensão dos efeitos das penas cominadas à autora em processo administrativo. As pessoas jurídicas públicas se enquadram na definição de fornecedor, de acordo com o art 3° do CDC. Desta forma, são abarcadas pelo poder de polícia exercido pelo PROCON, responsável pela fiscalização das relações consumeiristas, inclusive sujeitando-se às sanções cabíveis. A multa fixada pelo PROCON em 5.000 (cinco mil) UFIRs apresenta-se razoável ao dano causado à consumidora e assume, mormente, função de coibir a continuidade de tais atos abusivos, em conformidade ao princípio da proporcionalidade, motivo pelo qual não merece reparo. Precedentes desta Corte. Inversão dos ônus sucumbenciais. Apelação e remessa obrigatória providas.
(AC 200284000074213, Desembargador Federal José Maria Lucena, TRF5 - Primeira Turma, DJ - Data::29/05/2008 - Página::386 - Nº::101



2.3- No caso em análise, consta no Auto de Infração (v. fl. 43) contra o qual se insurge a CAIXA, que a demandante infringiu os seguintes dispositivos legais: art. 4º, II, d, III  e VII, e art. 6º, X da Lei nº 8.078/90 e o art. 2º, parágrafo único da Lei Estadual nº 12.264/02, diante constatação pelo PROCON/PE da seguinte irregularidade:



No ato da fiscalização foi constatado que a chancela que emite a senha para atendimento do cliente junto aos caixas não apresentava o horário de chegada na agência. Fica a autuada sujeita a multa de R$ 63.846,00 (sessenta e três mil, oitocentos e quarenta e seis reais, referente a 60.000 UFIR. G.N. (fl. 43).



 Eis o que dispõe o Parágrafo Único do art. 2º da Lei Estadual nº 12.264/2002 (Lei do Estado de Pernambuco), que embasou a autuação:



Art. 2º Considera-se tempo razoável, para os fins desta lei:

I - até 15 (quinze) minutos, em dias normais;

II - até 30 (trinta) minutos:

a - em véspera ou em dia imediatamente seguinte a feriados;

b - em data de vencimento de tributos;

c - em data de pagamento de vencimentos a servidores públicos.

Parágrafo único. Os períodos de que tratam os incisos I e II deste artigo serão delimitados pelos horários de ingresso e de saída do usuário no recinto onde estão instalados os caixas, registrados mediante chancela mecânica ou eletrônica.(G.N.)



Como se vê, o “tempo razoável” de espera na fila e o modo de aferição desse tempo, foi efetivamente disciplinado por Lei do Estado de Pernambuco.

Será que pelo sistema legislativo brasileiro têm os Estados, na atualidade, competência para legislar a respeito de proteção e defesa dos Consumidores?

Há precedente do C. Supremo Tribunal Federal concluindo que os Municípios gozam dessa competência, verbis: 

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. CONSUMIDOR. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. ATENDIMENTO AO PÚBLICO. FILA. TEMPO DE ESPERA. LEI MUNICIPAL. NORMA DE INTERESSE LOCAL. LEGITIMIDADE. Lei Municipal n. 4.188/01. Banco. Atendimento ao público e tempo máximo de espera na fila. Matéria que não se confunde com a atinente às atividades-fim das instituições bancárias. Matéria de interesse local e de proteção ao consumidor. Competência legislativa do Município. Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE 432789, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Primeira Turma, julgado em 14/06/2005, DJ 07-10-2005 PP-00027 EMENT VOL-02208-04 PP-00852 RTJ VOL-00196-01 PP-00345 LEXSTF v. 27, n. 323, 2005, p. 288-293 RB v. 18, n. 509, 2006, p. 35-36 JC v. 31, n. 107, 2005, p. 254-257

                Embora não conste dessa Ementa desse julgado do C. Supremo Tribunal Federal, tenho que a base constitucional dessa competência municipal está no art. 30-I e no art. 24-VII, todos da Constituição da República. 

A UNIÃO, os Estados e o Distrito Federal também gozam dessa mesma competência, por força do invocado art. 24-VII da Carta Magna.

E se têm competência para legislar, também têm competência para fazer valer as suas Leis.

Logo, prima facie,  não encontro nenhuma inconstitucionalidade na discutida Lei do Estado de Pernambuco, tampouco ilegalidade e/ou inconstitucionalidade no auto de infração ora impugando.

     Quanto ao valor do Auto de Infração, correspondente a 60.000(sessenta mil UFIR’s), também não detecto, de plano, nenhum exagero, porque o valor máximo permitido seria de 3.000.000.000(três milhões)de vezes o valor da UFIR, conforme Parágrafo Único do art. 57 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, aprovado pela Lei nº 8.078, de 11.09.1990, nele introduzido pela Lei nº 8.703, de 06.09.1993.

 Então considerando essa possibilidade, o porte econômico-financeiro da Caixa Econômica Federal-CEF e o grande número de Consumidores)por ela prejudicados em face do fato objeto da autuação: falta de indicação, na senha de atendimento, da hora de chegada na agência bancária, permitindo assim o desrespeito à Lei que fixa o tempo mínimo para atendimento na referida agência, tenho que não se faz presente a verossimilhança exigida pelo art. 273 do Código de Processo Civil para a pretendida suspensão liminar do ato ora impugnado, quer via antecipação de tutela, quer via medida liminar. .



Conclusão



Posto isso, indefiro o pedido de medida liminar suspensiva do ato impugnado e determino que seja o Requerido citado, na forma e para os fins legais.



P. I.



Recife, 18.04.2012.



Francisco Alves dos Santos Júnior

  Juiz Federal, 2ª Vara-PE



[1] Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:


§ 7o Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.