quinta-feira, 22 de agosto de 2013

EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. IMPUGNAÇÃO TARDIA DA MEMÓRIA DE CÁLCULO APRESENTADA PELA PARTE EXEQUENTE. NÃO CABIMENTO.


     Por Francisco Alves dos Santos Júnior
 
     Na decisão que segue, indefere-se, à luz de princípios constitucionais e regras de Lei,  tardia tentativa do INSS de barrar execução judicial de julgado, já na fase de percepção dos valores dos requisitórios. Busca-se também responsabilizar, regressivamente, o Servidor ou Servidores da Autarquia que deixou ou deixaram transcorrer in albis o prazo para interposição dos necessários Embargos à Execução do Julgado.
 
 

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2ª VARA

 

Processo nº 0015382-62.1995.4.05.8300

Classe:    206 EXECUÇÃO DE SENTENÇA CONTRA FAZENDA PÚBLICA 

EXEQUENTE: A C DA M e outros

EXECUTADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

C O N C L U S Ã O

 

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

 

Recife, 21/08/2013

 

 

Encarregado(a) do Setor

 

D E C I S Ã O

          Relatório

O INSS foi citado em 25.02.2013(fl. 759vº)para os fins do art. 730 do CPC.  Relativamente aos cálculos apresentados pelo Exeqüente A L CAVALCANTI, e deixou transcorrer in albis o prazo para interposição de embargos à execução (v. certidão de fl. 794), pelo que, na decisão de fl. 795,   homologou-se o valor apresentado pelo Exeqüente e determinou-se a expedição dos requisitórios correspondentes (fl. 795).

O INSS manifestou-se em 08.08.2013, na petição de fls. 800/884, alegando erro material nos cálculos homologados, concluindo que o valor a ser executado seria de R$ 67.851,91 (sessenta e sete mil, oitocentos e cinqüenta e um reais e noventa e um centavos). Requereu, ao final, a retificação dos requisitórios e remessa dos autos à contadoria para verificação do alegado.

Passo a decidir:

         Fundamentação

De acordo com o disposto no inciso I do art. 730 do CPC, com as alterações advindas pela Lei nº 9.528, de 10.12.1997, na execução por quantia certa, a pessoa jurídica de direito publicado executada é citada para opor embargos à execução do julgado, no prazo de 30(trinta)dias e, se não os opuser, o Juiz automaticamente homologa a conta apresentada pela Parte Exequente e manda expedir o requisitório constitucional e legal(precatório e/ou requisição de pequeno valor-RPV). .

Ora, o INSS foi citado em 25/02/2013, para os fins do art. 730 do código de processo civil(fls. 759-759vº),  e apenas em 08/08/2013, mais de cinco meses após a citação, é que manifestou-se nos autos, conforme se vê às fls. 800/884, impugnando os cálculos apresentados pela Parte Exequente.

Vale lembrar ao ilustre Procurador do INSS que dormientibus non sucurrit jus (o direito não socorre os que dormem) e que o processo tem etapas, que fluem sempre para frente, sob pena de eternizar-se, eternização essa vedada, atualmente, pelos princípios constitucionais da celeridade, eficiência e duração razoável do processo.

Se, pela inércia do Órgão próprio do INSS, que não impugnou a tempo e modo os cálculos apresentados pela Parte Exequente, essa Autarquia sofreu ou vai sofrer algum prejuízo, que o(s) seu(s) Servidor(es) responsável(eis)seja(m)internamente  responsabilizo(s) por essa omissão.

O que não pode é o INSS querer eternizar o andamento do feito, desrespeitando sacramentadas regras constitucionais e legais, por conta da irresponsabilidade de seu(s) Servidor(es).
  
   Conclusão

   Posto isso, indefiro a tardia e informal impugnação dos cálculos apresentada pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, consignada na noticiada petição de fls. 800/884, e determino que se dê ciência dos lamentáveis fatos acima narrados ao Ministério Público Federal, para tomar as medidas judiciais pertinentes no campo administrativo(improbidade administrativa) e criminal, relativamente a tais fatos,  bem como para fiscalizar os necessários e futuros atos do próprio Instituto Nacional do Seguro Social – INSS tendentes a buscar o ressarcimento financeiro perante a pessoa ou pessoas dos seus quadros que não cumpriram com o respectivo poder-dever legal de interpor a tempo e modo os acima referidos Embargos à Execução do julgado, relativamente a eventual parcela que essa Autarquia tenha pago ou venha a pagar acima do que realmente deveria pagar.


P. I.


Recife, 22 de agosto de 2013.


Francisco Alves dos Santos Júnior
                 Juiz Federal, 2ª Vara-PE

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

O PAPAGAIO, SUA PROPRIETÁRIA, O IBAMA E A JUSTIÇA FEDERAL: UMA QUESTÃO DEMASIADAMENTE HUMANA E COM FINAL MUITO TRISTE

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


   Segue uma decisão envolvendo uma interessante questão ambiental e humana.

   A decisão foi minutada pela Assessora Luciana Simões Correa de Albuquerque, sendo que sua minuta foi modificada pelo juiz apenas quanto à guarda, que a Assesora queria definitiva, mas o juiz a concedeu apenas provisoriamente.

    Boa leitura.


Processo Judicial Eletrônico:

Número do processo: 0802510-49.2013.4.05.8300


1. RELATÓRIO


G. V. F., qualificada na Inicial, propôs a presente ação ordinária, com pedido de tutela antecipada em face do INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA. Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita, bem como a observância das prerrogativas inerentes à Defensoria Pública da União. Aduziu a autora, em síntese, que: teria criado, durante 8 (oito) anos, aproximadamente, um papagaio em sua residência, desenvolvendo um profundo vínculo afetivo com o referido animal e tratando-o como a um filho, visto que o mesmo era, praticamente, a sua única companhia; em março de 2013, o IBAMA teria realizado uma fiscalização no bairro da Bomba do Hemetério, no qual reside a Autora e, durante a diligência, o referido animal fora apreendido pelos funcionários da Autarquia; teria ficado inconformada com tal preensão, na medida em que o papagaio recebia todos os cuidados devidos em sua residência, sendo bem alimentado e dispondo de bastante espaço para se locomover; forneceria ao animal uma alimentação adequada, com frutas e sementes, bem como que nunca teria maltratado o mesmo; a desnutrição alegada pelo IBAMA, poderia ter sido ocasionada pelo desconhecimento da Autora quanto a eventuais dosagens dos alimentos que deveriam ser ministradas ao papagaio; como seria de conhecimento notório, diversos criadores de animais cortam as asas dos mesmos e tais cortes, quando realizados corretamente, não causam lesões aos bichos; a autora, dessa forma, por falta de conhecimento técnico teria realizado incorretamente o corte das asas do seu papagaio; todavia, não teria havido qualquer intenção da demandante de machucar seu animal de estimação, nem de lhe causar qualquer espécie de sofrimento, mas apenas preocupação com sua própria segurança; tais fatos, assim, não seriam suficientes para impedir que a demandante recebesse a guarda do referido animal, uma vez que a mesma já teria assinado compromisso de seguir rigorosamente os requisitos impostos pelo IBAMA para o adequado tratamento do animal; a Autora possuiria um forte laço de afeto com o seu papagaio, sendo este como um filho para a mesma; a sua apreensão pelo IBAMA teria causado sérios abalos emocionais na autora, que não conseguia dormir nem se alimentar devidamente; por tal motivo, a mesma fora orientada pelos médicos a tomar remédios antidepressivos e a buscar tratamento psicológico, uma vez que estaria acometida de depressão; o animal também teria desenvolvido um vínculo com sua dona, estando habituado a receber dela os cuidados necessários para sua sobrevivência; em decorrência desse afeto mútuo que existe entre os dois, a Autora buscaria visitar seu papagaio no IBAMA regularmente; segundo relatos da mesma, o animal estaria ainda hoje na gaiola por ela adquirida (objeto este também apreendido pelo IBAMA), isolado de outros animais e só demonstrando interação com pessoas quando a demandante o visita; diante de tais fatos, a Autora teria requerido Administrativamente a guarda do papagaio, comprometendo-se a seguir as normas impostas pelo IBAMA quanto ao tratamento que deveria ser dado ao referido animal, bem como permitir a regular fiscalização por parte daquela entidade; a ré, contudo, teria se negado a conceder a guarda do animal à Autora, alegando que o mesmo deveria ser entregue a um criador devidamente cadastrado nesta condição, "para que o seja cuidado adequadamente"; a Defensoria Pública, atuando em nome da Autora, teria encaminhou ofício ao IBAMA requerendo informação quanto ao tratamento que deveria ser dado ao papagaio, com os requisitos para o manejo, ambientação e alimentação do mesmo; diante dos esclarecimentos prestados, a Autora teria se comprometido a seguir estritamente todas as orientações quanto à forma de tratar e alimentar o papagaio, bem como a permitir a regular fiscalização por parte do ente autárquico e, assim, foi reiterado o pedido de guarda do animal em seu favor, conforme demonstram os ofícios enviados pela DPU, em anexo; o IBAMA, porém, teria desconsiderado o compromisso realizado pela ora demandante e tornou a afirmar que a mesma não poderia receber a guarda do animal, uma vez que o procedimento administrativo já teria sido concluído com o anterior indeferimento do pleito; até o presente momento, não haveria notícia de que algum criador devidamente cadastrado no IBAMA tenha demonstrado interesse em adotar o papagaio, estando o mesmo ainda em posse do réu; diante do forte vinculo afetivo que a Autora possui com o animal, do seu enorme desejo de tê-lo sob seus cuidados novamente, bem como das negativas do IBAMA de autorizar a adoção, não teria restado à Autora outra saída que não fosse ajuizar a presente demanda; no caso em tela, não se vislumbraria que a manutenção do papagaio com a demandante pudesse, efetivamente, causar risco à espécie ou ao ecossistema; a própria lei do Meio Ambiente (9.605/98) relativiza esse tipo de conduta, quando, no art. 29, § 2º, estabelece o chamado perdão judicial, conferindo ao Juiz o poder de não aplicar a pena no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não ameaçada de extinção; em que pese a Autora não ter a autorização para criação de papagaios em sua residência, seria necessário considerar o tempo de convívio desse animal em cativeiro; seria fato notório que, depois de 8 anos de convivência, tenha se estabelecido vínculo de afeição entre a demandante e o animal, coberto de regalos e que nunca teria esboçado reação de fuga, permanecendo na companhia do demandante; a própria demanda judicial com vistas a reaver a ave deixaria patente a afeição que a autora nutre pelo papagaio; a própria autarquia estaria entendendo que o animal deveria ser adotado , uma vez que o mesmo não disporia de condições para ser reinserido no seu habitat natural, sendo o parecer do Procurador Federal que analisou o caso no sentido de entregar o papagaio a um criador amador; até a presente data não haveria notícia da manifestação de nenhum criador amador tenha demonstrado interesse de adotá-lo; sendo assim, permaneceria o animal sob os cuidados do IBAMA, isolado do convívio com demais seres vivos, em condições propensas, assim, a torná-lo estressado e depressivo; seria imperiosa a autorização da adoção do animal pela Autora na medida em que esta já possui um vínculo afetivo com o mesmo, bem como se encontraria disposta a cumprir com todas as exigências legais formuladas pela entidade autárquica; a escolha de um terceiro sem qualquer vínculo com o animal se mostraria como medida que viola o princípio da razoabilidade, na medida em que a Autora está disposta a seguir estritamente as exigências do IBAMA, não havendo qualquer prejuízo ao animal ou ao meio ambiente em decorrência da concessão de sua guarda à demandante Teceu outros comentários. Transcreveu legislação e jurisprudência. Pugnou, ao final, pela concessão de antecipação de tutela para a suspensão dos efeitos do ato de Processo Judicial Eletrônico de apreensão do papagaio, com a devolução imediata da ave à demandante, tendo em vista a comprovação dos requisitos do art. 273, CPC, a fim de remediar a situação aflitiva em que a mesma se encontra, decorrente da separação, bem como evitar o óbito do animal pela ausência da dona. Inicial instruída com procuração e documentos.


2. Fundamentação


2.1. Dos benefícios da Justiça Gratuita


Merece ser concedido à Autora o benefício da justiça gratuita, porque presentes os requisitos legais, mas com as ressalvas da legislação criminal pertinente, no sentido de que se, mais tarde, ficar comprovado que declarou falsamente ser pobre, ficará obrigada ao pagamento das custas e responderá criminalmente(art. 5º, LXXXIV da Constituição da República e Lei nº 1.060, de 1950).

Outrossim, o benefício ora concedido abrange as prerrogativas previstas no § 5º, art. 5º da Lei nº 1.060/50, pois a Autora está sendo assistida pela Defensoria Pública da União.


2.2. Do pedido de tutela antecipada


Volta-se a Autora contra medida repressiva praticada pelo IBAMA, que apreendeu seu papagaio de estimação, objetivando, em sede de tutela antecipada, o retorno da ave ao criadouro doméstico.

No caso dos autos, a ave foi aprendida em março de 2013, em fiscalização realizada pelo IBAMA, no bairro da Bomba do Hemetério, no qual reside a Autora. A Autora, assistida pela Defensoria Pública da União e no curso da petição inicial, reconhece que, por falta de conhecimento técnico realizou incorretamente o corte das asas do seu papagaio e que não teria havido qualquer intenção da demandante de machucar seu animal de estimação, nem de lhe causar qualquer espécie de sofrimento, mas apenas preocupação com sua própria segurança.

Com efeito, constam documentos dos autos de que a ave foi submetida a exame clínico veterinário em 04 de abril de 2013, no qual a Analista Ambiental do IBAMA, Sra. C. F. F. concluiu: "(..) devido às sequelas descritas acima, o animal é enquadrado como mutilado e poderá ser disponibilizado à adoção por pessoa que ofereça condições adequadas para a espécie, considerando, inclusive o fator nutricional, o que não foi atendido por parte da interessada neste processo."

Em 10/04/13, a Autora formulou pedido administrativo de guarda animal, ponderando, dentre outros aspectos, que nunca teria tido qualquer atividade ligada à venda de animais e que o papagaio fora um presente do seu irmão, residente em Pauferro/PE, cidade do interior, onde o papagaio fora encontrado no chão do quintal dele, devido ao problema da perna.

O Procurador Federal E. de S. O. N., Procurador Federal, subscritor da cota nº 642/2013/PFE-IBAMA PE, asseverou: "A questão poderá ser resolvida entregando-se a ave para um Criador Amador de Passeriformes, nos termos que dispõe a Instrução Normativa nº 15, de 22 de dezembro de 2010. Em razão dos maus tratos sofridos pelo animal e a vedação contida no art. 134 do Decreto nº 6.514/2008, o animal não deve retornar para a interessada, a Senhora Gedália Valentin. Assim é imperioso(sic) a destinação do animal a um criador devidamente cadastrado nesta condição, para que o animal seja cuidado adequadamente".

Diante de tal circunstância, a Defensoria Pública da União encaminhou, em 10 de junho de 2013, solicitação de informações acerca da adoção de animal afirmando que assistida teria um forte vínculo afetivo com o animal de estimação, cuidando do mesmo por 8 (oito) anos e sendo este a sua única companhia. Assim, requereu a Defensoria Pública da União que fossem fornecidas informações acerca do correto tratamento do animal, especificando-se qual a alimentação correta e cuidados pertinentes, a fim de possibilitar o ajustamento de conduta com vistas à adoção do animal pela assistida, com regulamentação de comparecimento periódico ao IBAMA para prestar informações acerca das condições do animal, caso necessário.

O IBAMA findou por encaminhar o OF 02019.001254/2013-02-PE/GABIN/IBAMA, em 21 de junho de 2013, contendo informações quanto ao manejo e ambientação, nutrição e acompanhamento veterinário do animal. Entretanto, quando ao pedido de adoção, concluiu a autarquia que "o processo em nome da Sra. Gedália Valentin Ferreira (n. 02019.000239/2013-39), já teria sua tramitação concluída, com manifestações dos setores competentes e consequentemente indeferimento do pleito da Defensoria Pública". (PF 02019.001370/2013-13 PE/GABIN/IBAMA, datado de 25 de julho de 2013).

No caso concreto, observo que a despeito do indeferimento administrativo por parte do IBAMA, existem particularidades que precisam ser sopesadas, a saber: embora não existam documentos comprovando que o animal já se encontra com a Autora há cerca de oito anos, denota-se da própria interposição da ação judicial a

grande ligação sentimental dos requerentes com o animal.

Merece registro o fato de Autora ter reconhecido que, por falta de conhecimento técnico, teria realizado incorretamente o corte das asas do seu papagaio e que o problema da perna da ave foi preexistente à "aquisição" do animal, o qual foi dado como presente por irmão residente no interior do estado.

Merece destaque, ainda, a iniciativa da Autora que, por intermédio da Defensoria Pública da União, solicitou formalmente, encaminhamento de informações acerca do Processo Judicial Eletrônico: correto tratamento do animal, especificando-se qual a alimentação correta e cuidados pertinentes, a fim de possibilitar o ajustamento de conduta com vistas à adoção do animal pela assistida, com regulamentação de comparecimento periódico ao IBAMA para prestar informações acerca das condições do animal, caso fosse necessário.

A autora também comprovou estar padecendo de depressão, eis que anexou ficha de encaminhamento proveniente da Unidade de Saúde-Mangabeira, datada de 07/05/2013, na qual se indicou a especialidade de psiquiatria, bem como ter-lhe sido prescrita a medicação Fluoxetina, indicada no tratamento de ansiedade.

Diante de todo o narrado, cabe-me sugerir os seguintes questionamentos: Qual seria o melhor tratamento dado ao papagaio? Ficar nas dependências do IBAMA, aguardando, desde março do ano presente, incerta doação a um terceiro ou ser devolvido à antiga dona, a qual sinalizou amplamente a intenção de adequar-se aos parâmetros ideais de manejo, inclusive se predispondo a submeter-se a vistorias por parte do órgão de fiscalização? Certamente o retorno para a casa da autora é a melhor solução, que demonstra sensibilidade à vida do animal e de seus proprietários/familiares.

Não se diga que o retorno do animal à antiga proprietária estaria quebrando o disposto na legislação ambiental, lei 9605/98 já que se acaso estivéssemos em sede de juízo criminal estariam presentes atenuantes ao eventual infrator que demonstrariam que a simples posse da ave não é capaz de atrair uma carga de ilicitude que sobreponha as características da relação existente entre a autora e o papagaio.

Para ilustrar o entendimento acima, colaciono o seguinte precedente:

"AMBIENTAL. ADMINISTRATIVO. APREENSÃO DE ANIMAL SILVESTRE EM CATIVEIRO. PAPAGAIO DE ESTIMAÇÃO EM CONVÍVIO COM OS DONOS HÁ MAIS DE 14 ANOS. ESPÉCIE NÃO AMEAÇADA DE EXTINÇÃO. BONS TRATOS. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DA POSSE COM OS DONOS.

1. Apelação interposta pelo IBAMA em face da sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para assegurar ao autor a posse de seu papagaio, bem como determinou ao IBAMA que procedesse às providências necessárias para regularização da guarda doméstica do animal pelo autor.

2. A legislação ambiental (art. 29 da Lei nº 9.605/98 e o art. 24, parágrafo 3º, III, do Decreto n. 6.514/2008) prevê a ocorrência de crime ambiental e infração administrativa no caso de guarda de animal silvestre sem a devida autorização do órgão ambiental competente.

3. O objetivo da legislação ambiental é a busca da efetiva proteção dos animais, devendo a intenção do legislador guiar a interpretação do julgador nos casos em que se discute questão ambiental. Todavia, devem ser consideradas as suas peculiaridades: animal não está ameaçado de extinção; longo tempo de convivência com seus donos; bons tratos. Interpretação da norma ambiental de acordo com o princípio da razoabilidade, mantendo-se a guarda do animal com os seus donos ante as especificidades do caso concreto.

4. Apelação não provida.

(PROCESSO: 00075004220104058100, AC556507/CE, RELATOR:
DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO NAVARRO, Terceira Turma, JULGAMENTO: 06/06/2013, PUBLICAÇÃO: DJE 11/06/2013 - Página 363) (original sem grifos)."


3. No entanto, tenho que estamos diante da possibilidade de concessão de medida cautelar, liminarmente, e não de antecipação da tutela, porque há ainda a necessidade de ouvir-se o IBAMA e análise da documentação que irá apresentar, no sentido de dar-se à Autora apenas a guarda provisória do papagaio, ficando passível de visitas surpresas de fiscais do IBAMA, para examinar se o animal passou a ser tratado corretamente, até ulterior decisão judicial.


3. Conclusão


Diante de todo o exposto,

a) concedo à autora o benefício da Justiça Gratuita, com as ressalvas consignadas no item 2.1. supra;

b) à luz do § 7º do art. 273, tenho por presentes, no acima delineado, os requisitos do fumus boni iuris e do periculum in mora, pelo que, liminarmente, concedo à Autora medida cautelar, concedendo-lhe a guarda provisória do papagaio, até ulterior decisão judicial, suspendendo os procedimentos do IBAMA tendentes a doar o papagaio para uma terceira pessoa, ficando o IBAMA autorizado a determinar que seus agentes de fiscalização façam visitas surpresas na residência da ora Autora, para verificar se ela está dando tratamento adequado ao papagaio e, se for o caso, para passar-lhe orientação do correto manejo do animal, enquanto a Autora estiver com a guarda provisória, e que traga para os autos, com a contestação, relatórios sobre essas visitas, tudo sob as penas da Lei.

c) Cite-se o IBAMA, na forma e para os fins legais, e o intime para cumprir a decisão supra, sob as penas da Lei.

d) Atente a Secretaria quanto às prerrogativas legais, eis que a Autora está sendo assistida pela Defensoria Pública da União.

Com urgência.

Int.

Assinado eletronicamente.
A Certificação Digital pertence a:
Francisco Alves dos Santos Júnior, juiz federal titular da 2º Vara Federal de Pernambuco, Brasil.

https://pje.jfpe.jus.br/pje/Processo/ConsultaDocumento

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Processo Judicial Eletrônico: https://pje.jfpe.jus.br/pje/Painel/painel_usuario/documentoHTML.seam...

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CONTINUAÇÃO


Poucos dias depois da decisão acima, a Autora foi ao IBAMA, acompanhada de uma Defensora Pública da União, para receber o Papagaio e levá-lo de volta para sua casa, quando então tomou conhecimento de que ele falecera desde 10 de junho de 2013, fato esse que foi objeto de vasta cobertura na imprensa escrita, falada e televisada.

Então, a Defensoria Pública da União pediu a conversão do pedido da restituição do Papagaio(obrigação de fazer)em indenização por perdas e danos morais(obrigação de dar).

O IBAMA manifestou-se contra essa modificação do pedido inicial.

Eis o que foi decidido(decisão minutada pela Assessora Luciana Simões Correa de Albuquerque):



PROCESSO Nº: 0802510-49.2013.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTOR: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO (e outro)
RÉU: INSTITUTO BRASILEIRO DE MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR




1. Breve Relatório

Em decisão datada de 09/08/13, foram concedidos os benefícios da Justiça gratuita, bem como deferido o pedido de antecipação de tutela, no sentido de conceder a guarda provisória do animal apreendido pelo IBAMA.

A Defensoria Pública da União, em petição datada de 16/08/13, aduziu que:  conforme amplamente noticiado pela imprensa local e declarado no laudo fornecido pelo IBAMA, em anexo, no dia 10 de julho de 2013, o papagaio, cuja restituição se pretendia nesta ação, teria falecido supostamente em decorrência de uma infecção, enquanto estava sob os cuidados da Autarquia federal; no dia 15 de julho do corrente ano a Defensoria Pública da União, atuando nos interesses da Autora, teria enviado ofício ao IBAMA reiterando o pedido de guarda do papagaio, bem como declarando que a mesma se comprometia a seguir todas as imposições da Autarquia quanto aos cuidados que deveriam ser prestados ao animal e a Ré teria respondido ao supramencionado ofício no dia 25 de julho de 2013, ou seja, quinze dias após o falecimento do animal, informando apenas que a adoção não seria concedida pela Autarquia, uma vez que a tramitação do procedimento administrativo já estaria concluída; em momento algum o IBAMA teria mencionado a morte do papagaio, que ocorrera há mais de um mês, ferindo o dever de moralidade e publicidade, norteadores da administração pública, nos termos do art. 37 da CR; dessa forma, a Autora, ainda desconhecendo o falecimento do seu animal de estimação, "Meu Lourinho", sua companhia durante oito anos, teria ajuizado  a demanda pleiteando a devolução dele; em virtude da liminar concedida em favor da autora no processo em epígrafe, a Sra. Gedália teria  se dirigido ao IBAMA, no dia 15 de agosto de 2013, em companhia de uma Defensora Pública da União, para receber o seu animal de volta, conforme houvera sido decidido por esse MM Juízo; o momento que deveria ser de extrema alegria para a Autora, que há meses ansiava pelo reencontro com o seu papagaio, teria se transformado num momento de extrema dor, decepção e revolta, eis que, ao chegar à sede regional da Autarquia, a Sra. Gedália fora informada pela veterinária da entidade que o seu animal de estimação (o seu "lourinho") havia falecido há mais de um mês sem que qualquer comunicação lhe fosse prestada; depois de oito anos vivendo em sua companhia, o animal teria morrido em menos de quatro meses após ser apreendido pela parte Autarquia,ora Ré; a Sra Gedália, diante de tamanho abalo psicológico, teria passado mal, chorando compulsivamente diante da perda do seu companheiro de tantos anos, em especial diante das infundadas insinuações de que ela seria de alguma forma culpada por tal fato; dessa forma, a Autora teria passado por um profundo constrangimento, conforme atestado pelas reportagens divulgadas em sites e televisão, matérias estas que demonstrariam  o desespero e a dor que acometeram a Sra. Gedália após a notícia;  a pretensão buscada pela Autora por meio da presente demanda, qual seja, a de obter de volta a guarda de sua ave, acabou não ocorrendo devido ao falecimento do animal na sede do IBAMA; o perecimento do objeto do processo tornaria impossível a concessão da tutela específica, consistente na concessão da guarda definitiva do animal; considerado o profundo vínculo afetivo, também se apresentaria impossível a obtenção de algum resultado prático equivalente; dessa forma, seria manifesto o cabimento da conversão da obrigação em perdas e danos, nos termos do que dispõe o §1º do art. 461 do Código de Processo Civil; como seria cediço, para a caracterização da obrigação de indenizar seria exigível a presença do o fato lesivo; da causalidade material entre o eventus damnie;  o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público (nexo de causalidade) e o dano; o fato lesivo estaria comprovado pelo laudo de necropsia em anexo, que comprovaria o óbito do animal; o nexo de causalidade estaria comprovado, uma vez que a parte ré estaria com o animal sob sua guarda e responsabilidade há quatro meses, de modo que eventual contração ou agravamento de infecção teria se dado  notoriamente na sede da autarquia e não durante os oito anos em que o animal permaneceu com a parte autora; o dano seria comprovado pelo grave abalo psicológico sofrido pela Autora, conforme amplamente noticiado pela imprensa, além do atestado médico já acostado que certificaria seu quadro depressivo após a data de apreensão do papagaio; teria havido  culpa in vigilando por parte do IBAMA. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, fosse aplicado o art. 461, §1º, CPC, de forma que a obrigação de fazer pretendida fosse convertida em perdas e danos, em importe a ser arbitrado por V. Exa. que refletisse a conduta omissiva da Ré causadora de profundo abalo psíquico à Autora, bem como seu caráter pedagógico e punitivo. Requereu, ainda, fosse expedido ofício ao Ministério Público Federal, a fim de que este, caso entendesse cabível, instaurasse procedimento para averiguar as condições de guarda dos animais no IBAMA. Juntou documentos.

Laudo de necropsia juntado em 16/08/13.

O IBAMA, em 30/08/13, apresentou Contestação, na qual aduziu, prefacialmente, que  a morte do animal teria se dado em razão de baixa imunidade decorrente de seu estdo de saúde fragilizado. Suscitou, preliminarmente, a perda do objeto, eis que morto o animal, seria absolutamente impossível o acolhimento do pedido ou o cumprimento da obrigação de fazer, caso a ação viesse a ser julgada procedente. Ao final, impugnou a alteração do pedido autoral, formulado, segundo alegou, após a citação. Em homenagem ao princípio da causalidade, aduziu, em apertada síntese, que ao contrário do que teria sustentado a Autora, não seria lícito nem possível permitir que particulares mantivessem animais silvestres em cativeiro doméstico, cabendo ao Judiciário, coibir tal prática. Protestou, ainda, pela produção de prova pericial.

Em petição datada de 18/09/13, a Autora, assisitida pela DPU, reiterou o pedido anteriormente requerido, pugnando-se pela aplicação do art. 461, § 1º, do Código de Processo Civil, para que a obrigação de fazer inicialmente pleiteada fosse convertida em obrigação de indenizar a autora por perdas e danos.

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Matéria Preliminar

Confome se vê acima, ao clicar "inserir auto cabeçalho", surgem as informações do cabelho supra, dando como Autora a Defensoria Pública da União e outro, quando deveria constar como Autora apenas GEDÁLIA VALENTIM FERREIRA, uma vez que aquele Órgão da União funciona apenas como patrocinadora, advogada, dessa Autora.

Deve, pois, a Secretaria deste juízo fazer gestões junto à Distribuição ou ao Setor Eletrônico próprio para a respectiva retificação da autuação, deixando no pólo ativo apenas GEDÁLIA VALENTIM FERREIRA, patrocinada pela Defensoria Pública da União.

2.2. Do pedido de conversão em perdas e danos

A conversão da tutela específica de fazer ou não fazer em obrigação de pagar quantia certa é relegada a absoluta excepcionalidade: só haverá conversão em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, consoante determina o disposto pelo artigo 461, § 1o, do Código de Processo Civil, verbis:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido,determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. (Redação dada pela Lei no 8.952, de 13.12.1994)
§ 1o A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente. (Parágrafo acrescentado pela Lei no 8.952, de 13.12.1994)

Então, verificada a impossibilidade da tutela específica e do resultado correspondente, o juiz, a pedido da Parte Autora ou de ofício, poderá proceder à conversão. Por outro lado, o requerimento de conversão em perdas e danos pelo Autor independe de concordância da Parte Ré, por se tratar de direito assegurado à Parte Autora pelo o ordenamento jurídico, não tendo, por conseguinte, qualquer valia a impugnação do IBAMA quanto a este ponto.

Além disso, existem precedentes jurisprudenciais que abarcam o raciocínio desenvolvido pela Autora, nos quais se afastam as alegações de julgamento ultra petita em sentenças cujos magistrados convertem a obrigação em perdas e danos ante a inviabilidade do desfazimento do ato impugnado.

Nesse sentido, confira-se a ementa a seguir transcrita, aplicável mutatis muitandis ao presente caso.

CIVIL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO. INDENIZAÇÃO. PERDAS E DANOS.  POSSIBILIDADE. SENTENÇA ULTRA PETITA. INOCORRÊNCIA.
1. A jurisprudência pátria é assente no sentido de que, reconhecida a inviabilidade da anulação do contrato, a conversão em perdas e danos não implica a nulidade do julgamento.
2. No caso dos autos, não há falar em sentença ultra petita, uma vez que o magistrado sentenciante reconheceu a inviabilidade de desfazimento do contrato de compra e venda celebrado, resguardando o direito do adquirente de boa-fé, e determinou o pagamento da indenização por perdas e danos, observando a culpabilidade de cada um dos envolvidos.
3. Apelação improvida. (PROCESSO: 200585000056020, AC517516/SE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO NAVARRO, Terceira Turma, JULGAMENTO: 30/04/2013, PUBLICAÇÃO: DJE 07/05/2013 - Página 166) 

    Diante do exposto, há de ser deferido o pedido formulado pela Defensoria Pública da União no sentido de se aplicar o art. 461, § 1º, do Código de Processo Civil, para que a obrigação de fazer inicialmente pleiteada seja convertida em obrigação de indenizar a Autora, por perdas e danos de cunho moral.

2.3.  Da necessidade de realização de perícia

Ultrapassada a questão acima, necessário se faz adentrar ao aspecto meritório da indenização, notadamente quanto à apuração das circunstâncias do óbito do papagaio apreendido, bem como efetiva responsabilidade da Autarquia no que se refere à contração ou agravamento da infecção que o acometeu.

Com efeito, impende registrar ainda que, em sede de Contestação, protestou o IBAMA, suscitando questões ambientais mais amplas,  pela produção de prova pericial, a ser feita não por médico veterinário, mas sim por profissional com formação superior em Biologia e com especialização ou área de atuação em Etologia (comportamento animal), de forma a se apurar a perfeita capacidade de readaptação de papagaios domésticos à vida selvagem.

Diante de tal panorama, entendo por bem, antes de designar perícia e fixar seus parâmetros, intimar a Defensoria Pública da União para manifestar-se sobre eventual prova que pretenda produzir, posicionando-se, ainda, quanto ao requerimento formulado pelo IBAMA acerca da perícia mencionada no parágrafo acima.

3. Conclusão

Diante de todo o exposto:

a)  Preliminarmente, providencie a Secretaria deste Juízo, junto à Distribuição, a retificação da autuação do polo ativo, deixando como Autora apenas GEDALIA VALENTIM FERREIRA, patrocinada pela Defensoria Pública da União

b) Defiro o pedido formulado pela Defensoria Pública da União e determino a aplicação do art. 461, § 1º, do Código de Processo Civil, para que a obrigação de fazer inicialmente pleiteada, diante da sua superveninente impossibilidade decorrente de ato alheio à vontade da Autora, seja convertida em obrigação de dar, consistente em indenizar a autora por perdas e danos morais.

c)     Concedo à Parte Autora o prazo de 10(dez)dias para, querendo, manifestar-se, por intermédio da Defensoria Pública da União, acerca das provas que pretende produzir, bem como sobre o pedido de realização de perícia, nos termos requeridos pelo IBAMA;

d) Após o prazo indicado na alínea anterior, oficie-se ao Ministério Público Federal, a fim de que este, caso entenda cabível, instaure procedimento para averiguar as condições de guarda dos animais no IBAMA, bem como do tratamento que foi dado ao Papagaio noticiado na petição inicial e em que circunstâncias faleceu, devendo, ao final, se for o caso, tomar as medidas funcionais e criminais pertinentes.

P.I.

Recife, 01.10.2013

Francisco Alves dos Santos Jr

  Juiz Federal, 2ª Vara-PE


INFORMAÇÃO IMPORTANTE:

A Ação que deu origem à decisão supra foi transformação em Ação de Indenização por Danos Morais e foi julgada em julho de 2014, tendo a respectiva sentença sido publicada, neste blog, no dia 03.07.2014.

Eis o texto dessa Sentença:


PODER JUDICIÁRIO FEDERAL

2ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO

PROCESSO Nº: 0802510-49.2013.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTORA: GEDÁLIA VALENTIM FERREIRA

Adv.: Defensoria Pública da União
REQUERIDO: INSTITUTO BRASILEIRO DE MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS - IBAMA
 

SENTENÇA TIPO A, REGISTRADA ELETRONICAMENTE


EMENTA: - DIREITO AMBIENTAL. PAPAGAIO. APREENSÃO E MORTE NO IBAMA. DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. 

Princípios da Razoabilidade(Proporcionalidade) e Moralidade. Urbanidade e Regras Comportamentais do Servidor Público.

-Não é razoável apreender papagaio que vive há oito anos com uma senhora idosa, sem que haja qualquer sinal de que o pássaro esteja sendo maltratado, quando os próprios Agentes do IBAMA poderiam orientar a Senhora para regularizar a guarda do pássaro perante mencionada Autarquia. 

-O tratamento grosseiro, dispensado à mencionada Senhora, na sede do IBAMA-PE, feriu regra legal, segundo a qual o Servidor Público tem que tratar com urbanidade todo e qualquer cidadão, seja de que classe social for.

 -Os Servidores do IBAMA-PE feriram o princípio da moralidade, quando esconderam da mencionada Senhora a morte do animal, ocorrida nos seus viveiros.

-Reportagem da TV Justiça sobre o caso(http://www.youtube.com/watch?v=k-fJ98P_gNg)trouxe à tona a falta de estrutra nos viveiros do IBAMA-PE, onde os animais apreendidos são colocados em gaiolas impróprias para a quantidade e tamanho do animal, sem a menor condição física, sendo que nessa reportagem Dirigente da mencionada Autarquia confessa a falta de estrutura e de verbas para manutenção digna dos animais no local.

-O Ente público tem,perante os Administrados, responsabilidade civil objetiva pelos danos que os seus Servidores causam a estes(§ 6º do art. 37 da Constituição da República)..
-Procedência.

Vistos, etc.

1. RELATÓRIO

GEDALIA VALENTIM FERREIRA, qualificada na Inicial, propôs a presente ação ordinária, com pedido de tutela antecipada em face do INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA. Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita, bem como a observância das prerrogativas inerentes à Defensoria Pública da União. Aduziu a Autora, em síntese, que:   teria criado, durante 8 (oito) anos, aproximadamente, um papagaio em sua residência, desenvolvendo um profundo vínculo afetivo com o referido animal e tratando-o como a um filho, visto que o mesmo era, praticamente, a sua única companhia; em março de 2013, Agentes Fiscais do IBAMA teriam realizado uma fiscalização no bairro da Bomba do Hemetério, no qual reside a Autora e, durante a diligência, o referido animal fora apreendido pelos funcionários da Autarquia;  teria ficado inconformada com tal apreensão, na medida em que o papagaio recebia todos os cuidados devidos em sua residência, sendo bem alimentado e dispondo de bastante espaço para se locomover; forneceria ao animal uma alimentação adequada, com frutas e sementes, e nunca o teria maltratado; a desnutrição alegada pelo IBAMA, poderia ter sido ocasionada pelo desconhecimento da Autora quanto a eventuais dosagens dos alimentos que deveriam ser ministradas ao papagaio;  como seria de conhecimento notório, diversos criadores de animais cortam as respectivas asas e tais cortes, quando realizados corretamente, não causam lesões aos bichos;  a autora, dessa forma, por falta de conhecimento técnico, teria realizado incorretamente o corte das asas do seu papagaio; todavia, não teria havido qualquer intenção da demandante de machucar seu animal de estimação, nem de lhe causar qualquer espécie de sofrimento, mas apenas preocupação com sua própria segurança; tais fatos, assim, não seriam suficientes para impedir que a Autora  recebesse a guarda do referido animal, uma vez que já teria assinado compromisso de seguir rigorosamente os requisitos impostos pelo IBAMA para o adequado tratamento do animal; a Autora possuiria um forte laço de afeto com o seu papagaio, sendo ele como um filho para a Autora; que a sua apreensão pelo IBAMA teria causado sérios abalos emocionais na Autora, que não estaria mais conseguindo dormir, nem se alimentar devidamente; por tal motivo, a Autora fora orientada pelos médicos a tomar remédios antidepressivos e a buscar tratamento psicológico, uma vez que estaria acometida de depressão; o animal também teria desenvolvido um vínculo com sua dona, estando habituado a receber dela os cuidados necessários para sua sobrevivência;  em decorrência desse afeto mútuo que existe entre os dois, a Autora buscara visitar seu papagaio no IBAMA regularmente;  que o animal estaria ainda hoje na gaiola por ela adquirida(objeto este também apreendido pelos Agentes do IBAMA), isolado de outros animais e só demonstrando interação com pessoas quando a Autora o visita; diante de tais fatos, a Autora teria requerido Administrativamente a guarda do papagaio, comprometendo-se a seguir as normas impostas pelo IBAMA quanto ao tratamento que deveria ser dado ao referido animal, bem como permitir a regular fiscalização por parte daquela entidade, pleito esse que lhe teria sido negado, sob o fundamento de que o Papagaio deveria ser entregue a um criador devidamente cadastrado, "para que o seja cuidado adequadamente"; a Defensoria Pública, atuando em nome da Autora, teria encaminhou ofício ao IBAMA requerendo informação quanto ao tratamento que deveria ser dado ao papagaio, com os requisitos para o manejo, ambientação e alimentação; diante dos esclarecimentos prestados, a Autora teria se comprometido a seguir estritamente todas as orientações quanto à forma de tratar e alimentar o papagaio, bem como a permitir a regular fiscalização por parte do Ente autárquico e, assim, foi reiterado o pedido de guarda do animal em seu favor, conforme demonstram os ofícios enviados pela DPU, em anexo; o IBAMA, porém, teria desconsiderado o compromisso realizado pela Autora e tornou a afirmar que Ela não poderia receber a guarda do animal, uma vez que o procedimento administrativo já teria sido concluído com o anterior indeferimento do pleito; até o presente momento, não haveria notícia de que algum criador devidamente cadastrado no IBAMA tenha demonstrado interesse em adotar o papagaio, estando o animal ainda em posse do IBAMA; diante do forte vinculo afetivo que a Autora possuiria com o animal, do seu enorme desejo de tê-lo sob seus cuidados novamente, bem como das negativas do IBAMA de autorizar a adoção, não teria restado à Autora outra saída que não fosse ajuizar a presente demanda; no caso em tela, não se vislumbraria que a manutenção do papagaio com a Autora pudesse, efetivamente, causar risco à espécie ou ao ecossistema;  a própria lei do Meio Ambiente (9.605/98) relativizaria esse tipo de conduta, quando, no art. 29, § 2º, estabelece o chamado perdão judicial, conferindo ao Juiz o poder de não aplicar a pena no caso de guarda doméstica de espécie silvestre não ameaçada de extinção; em que pese a Autora não ter a autorização para criação de papagaios em sua residência, seria necessário considerar o tempo de convívio desse animal em cativeiro; seria fato notório que, depois de 8(oito)anos de convivência, tenha se estabelecido vínculo de afeição entre a Autora e o Papagauio, coberto de regalos e que nunca teria esboçado reação de fuga, permanecendo na companhia do Autora; a própria demanda judicial com vistas a reaver a ave deixaria patente a afeição que a Autora nutre pelo Papagaio; a própria Autarquia estaria entendendo que o animal deveria ser adotado , uma vez que não disporia de condições para ser reinserido no seu habitat natural, sendo o parecer do Procurador Federal que analisou o caso no sentido de entregar o Papagaio a um criador amador; até a presente data não haveria notícia da manifestação de nenhum criador amador com interesse de adotá-lo;  sendo assim, permaneceria o animal sob os cuidados do IBAMA, isolado do convívio com demais seres vivos, em condições propensas, assim, a torná-lo estressado e depressivo; seria imperiosa a autorização da adoção do animal pela Autora na medida em que esta já possui um vínculo afetivo com o mesmo, bem como se encontraria disposta a cumprir com todas as exigências legais formuladas pela entidade autárquica; a escolha de um terceiro sem qualquer vínculo com o animal se mostraria como medida que viola o princípio da razoabilidade, na medida em que a Autora está disposta a seguir estritamente as exigências do IBAMA, não havendo qualquer prejuízo ao animal ou ao meio ambiente em decorrência da concessão de sua guarda à demandante Teceu outros comentários. Transcreveu legislação e jurisprudência. Pugnou, ao final, pela concessão de antecipação de tutela para a suspensão dos efeitos do ato de apreensão do papagaio, com a devolução imediata da ave à demandante, tendo em vista a comprovação dos requisitos do art. 273, CPC, a fim de remediar a situação aflitiva em que a mesma se encontra, decorrente da separação, bem como evitar o óbito do animal pela ausência da dona. Inicial instruída com procuração e documentos.

Em 09/08/2013, foi exarada decisão concedendo à Autora os benefícios da Justiça Gratuita e deferindo o pleito liminar.

A Defensoria Pública da União, em petição datada de 16/08/13, aduziu que:  conforme amplamente noticiado pela imprensa local e declarado no laudo fornecido pelo IBAMA, em anexo, no dia 10 de julho de 2013, o papagaio, cuja restituição se pretendia nesta ação, teria falecido supostamente em decorrência de uma infecção, enquanto estava sob os cuidados da Autarquia federal; no dia 15 de julho do corrente ano a Defensoria Pública da União, atuando nos interesses da Autora, teria enviado ofício ao IBAMA reiterando o pedido de guarda do papagaio, bem como declarando que a Autora se comprometia a seguir todas as imposições da Autarquia quanto aos cuidados que deveriam ser prestados ao animal e a Ré teria respondido ao supramencionado ofício no dia 25 de julho de 2013, ou seja, quinze dias após o falecimento do animal, informando apenas que a adoção não seria concedida pela Autarquia, uma vez que a tramitação do procedimento administrativo já estaria concluída; em momento algum o IBAMA teria mencionado a morte do papagaio, que ocorrera há mais de um mês, ferindo o dever de moralidade e publicidade, norteadores da administração pública, nos termos do art. 37 da CR; dessa forma, a Autora, ainda desconhecendo o falecimento do seu animal de estimação, "Meu Lourinho", sua companhia durante oito anos, teria ajuizado  a demanda pleiteando a devolução dele; em virtude da liminar concedida em favor da autora no processo em epígrafe, a Sra. Gedália teria  se dirigido ao IBAMA, no dia 15 de agosto de 2013, em companhia de uma Defensora Pública da União, para receber o seu animal de volta, conforme houvera sido decidido por esse MM Juízo; o momento que deveria ser de extrema alegria para a Autora, que há meses ansiava pelo reencontro com o seu papagaio, teria se transformado num momento de extrema dor, decepção e revolta, eis que, ao chegar à sede regional da Autarquia, a Sra. Gedália fora informada pela Veterinária do IBAMA que o seu animal de estimação (o seu "lourinho") havia falecido há mais de um mês sem que qualquer comunicação lhe fosse prestada; depois de oito anos vivendo em sua companhia, o animal teria morrido em menos de quatro meses após ser apreendido pelos Agentes da  Autarquia, ora Requerida; a Sra Gedália, diante de tamanho abalo psicológico, teria passado mal, chorado compulsivamente diante da perda do seu companheiro de tantos anos, em especial diante das infundadas insinuações de que ela seria de alguma forma culpada por tal fato; dessa forma, a Autora teria passado por um profundo constrangimento, conforme atestado pelas reportagens divulgadas em sites e televisão, matérias estas que demonstrariam  o desespero e a dor que acometeram a Sra. Gedália após a notícia;  a pretensão buscada pela Autora por meio da presente demanda, qual seja, a de obter de volta a guarda de sua ave, acabou não ocorrendo devido ao falecimento do animal na sede do IBAMA; o perecimento do objeto do processo tornaria impossível a concessão da tutela específica, consistente na concessão da guarda definitiva do animal; considerado o profundo vínculo afetivo, também se apresentaria impossível a obtenção de algum resultado prático equivalente; dessa forma, seria manifesto o cabimento da conversão da obrigação em perdas e danos, nos termos do que dispõe o §1º do art. 461 do Código de Processo Civil; como seria cediço, para a caracterização da obrigação de indenizar seria exigível a presença do o fato lesivo; da causalidade material entre o eventus damnie;  o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público (nexo de causalidade) e o dano; o fato lesivo estaria comprovado pelo laudo de necropsia em anexo, que comprovaria o óbito do animal; o nexo de causalidade estaria comprovado, uma vez que a parte Requerida estava com o animal sob sua guarda e responsabilidade há quatro meses, de modo que eventual contração ou agravamento de infecção teria se dado  notoriamente na sede da Autarquia e não durante os oito anos em que o animal permaneceu com a Autora; o dano seria comprovado pelo grave abalo psicológico sofrido pela Autora, conforme amplamente noticiado pela imprensa, além do atestado médico já acostado que certificaria seu quadro depressivo após a data de apreensão do papagaio; teria havido  culpa in vigilando por parte do IBAMA. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, fosse aplicado o art. 461, §1º, CPC, de forma que a obrigação de fazer pretendida fosse convertida em perdas e danos, em importe a ser arbitrado por V. Exa. que refletisse a conduta omissiva da Ré causadora de profundo abalo psíquico à Autora, bem como seu caráter pedagógico e punitivo. Requereu, ainda, fosse expedido ofício ao Ministério Público Federal, a fim de que este, caso entendesse cabível, instaurasse procedimento para averiguar as condições de guarda dos animais no IBAMA. Juntou documentos.

Laudo de necropsia juntado em 16/08/13.

O IBAMA, em 30/08/13, apresentou Contestação, na qual aduziu, prefacialmente, que  a morte do animal teria se dado em razão de baixa imunidade decorrente de seu estado de saúde fragilizado. Suscitou, preliminarmente, a perda do objeto, eis que morto o animal, seria absolutamente impossível o acolhimento do pedido ou o cumprimento da obrigação de fazer, caso a ação viesse a ser julgada procedente. Ao final, impugnou a alteração do pedido autoral, formulado, segundo alegou, após a citação. Em homenagem ao princípio da causalidade, aduziu, em apertada síntese, que ao contrário do que teria sustentado a Autora, não seria lícito nem possível permitir que particulares mantivessem animais silvestres em cativeiro doméstico, cabendo ao Judiciário, coibir tal prática. Protestou, ainda, pela produção de prova pericial.

Em petição datada de 18/09/13, a Autora, assisitida pela DPU, reiterou o pedido anteriormente requerido, pugnando-se pela aplicação do art. 461, § 1º, do Código de Processo Civil, para que a obrigação de fazer inicialmente pleiteada fosse convertida em obrigação de indenizar a autora por perdas e danos.

Em 01/10/13, foi prolatada decisão deferindo o pedido de conversão em perdas e danos, bem como foi determinada a intimação das partes para dizer que provas pretenderiam produzir.

A parte autora, em petição datada de 18/11/2013, mencionou não ter mais provas a produzir.

O IBAMA ofertou Agravo Retido, insurgindo-se contra a decisão que converteu a demanda em perdas e danos.

Contrarrazões ao Agravo Retido em 02/12/13.

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Do Agravo Retido - Juízo de Retratação

O IBAMA, em 02/12/13, por intermédio de Agravo Retido, insurgiu-se contra a decisão, calcada no caput do art. 461 do CPC, pela qual se converteu em ação de perdas e danos, com pedido de indenização por danos morais, o pedido inicial da Autora, consubstanciado em pleito, contra essa Autarquia, de determinação de obrigação de fazer, consistente em restituir o papagaio à Autora, uma vez que este, com a morte do papagaio, tornou-se impossível.

Tenho que a decisão agravada merece ser mantida, pelos seus próprios e jurídicos fundamentos, acrescentando-se que ela se encontra em consonância com os princípios de economia processual, celeridade e eficácia processuais.

2. 2.Do julgamento antecipado da lide.

No curso do processo, o IBAMA, suscitando questões ambientais mais amplas, pugnou pela produção de prova pericial, a ser feita não por médico veterinário, mas sim por profissional com formação superior em Biologia e com especialização ou área de atuação em Etologia (comportamento animal), de forma a se apurar a perfeita capacidade de readaptação de papagaios domésticos à vida selvagem.

Entretanto, como bem asseverado pela Defensoria Pública da União, em petição datada de 18/11/2013, o próprio IBAMA teria reconhecido não existir possibilidade de readaptação, ao concluir que o animal deveria ser posto para adoção, como se vê da conclusão da Analista Ambiental daquele órgão. E isso consta de documento do IBAMA nos autos  e de reportagem feita pela TV Justiça, que pode ser vista no link http://www.youtube.com/watch?v=k-fJ98P_gNg.

Ademais, não precisa ser Biológo, nem especialista em aves, para ter conhecimento de que, quando um papagaio é criado em uma casa de família, por longos 8(oito)anos, caso dos autos, não terá a menor condição de adaptar-se a viver na floresta, uma vez que não desenvolveu as habilidades silvestres necessárias para esse fim e iria se transformar em presa fácil dos seus predadores naturais.

Aliás, consta dos autos que o próprio IBAMA informou que negara a guarda do animal à Autora(não justificou o motivo), mas que iria doá-lo para um Criador, amador ou comercial.

Tenho, pois, ser desnecessária qualquer dilação probatória, especialmente a prova pericial complementar indicada pelo IBAMA, cabendo o julgamento do feito de acordo com o atual estado do processo(artigo 330, inciso I, do CPC).

2.3. Do mérito propriamente dito.

2.3.1. Da Ocorrência do Dano e do Dever de Indenizar  

   2.3.1.a) Resta incontroverso que a Autora passou a criar o papagaio quando o encontrou no quintal da sua casa, com defeito em uma das patas. E o criou por longos 8(oito)anos, até que um dia recebeu visita de Agentes do IBAMA que, sem qualquer ordem judicial, o apreenderam e o levaram para o viveiro do IBAMA, em Recife-PE, onde o pássaro morreu 4(quatro)meses depois da apreensão.

     Resta também incontroverso que, depois de ser agredida verbalmente por Servidor do IBAMA do Recife-PE(na reportagem televisa acima mencionada, consta que o Servidor da Autarquia, que a maltratou, pediu desculpas(v. link acima indicado)a Autora, de tanto insistir, conseguiu autorização para visitar o pássaro, no viveiro do IBAMA do Recife-PE e o fez por alguns dias, mas, sem qualquer explicação, a partir de determinado dia,  proibiram as visitas, pelo que a Autora foi à Defensoria Pública da União-DPU, que propôs ação nesta Justiça Federal, onde obteve medida liminar para devolução do pássaro, devendo a Autora ficar com sua guarda até ulterior decisão judicial.

     Então, a Autora foi com a Defensora Pública ao IBAMA do Recife-PE para receber o animal, quando recebeu a notícia de que ela falecera há mais de um mês.

    Diante do escândalo e da ampla repercussão na imprensa falada, escrita e televisa, afinal o papagaio ficou 8(oito)anos com a ora Autora, saudável e falante, e 4(quatro)meses depois de apreendido, faleceu no viveiro da referida Autarquia, uma Especialista dessa Autarquia(o IBAMA)veio a público e deu entrevista a um programa da TV Justiça(v. íntegra na reportagem acima referida, em http://www.youtube.com/watch?v=k-fJ98P_gNg), na qual tentou impingir à Autora a culpa pela morte do pássaro, todavia, fica claro, na referida reportagem(e na documentação constate dos autos), que o laudo cadavérico do pássaro só feito por mencionada Especialista do IBAMA dias depois do seu falecimento e sem qualquer participação de outro Especialista, indicado pela Autora e/ou por qualquer Entidade de Defesa dos animais. 

       Também fica claro, na mencionada reportagem, que o IBAMA do Recife-PE não tem a menor estrutura para guarda de animais apreendidos, sendo enjaulados em gaiolas minúsculas, num ambiente insalubre e com ares de total abandono, tendo um Dirigente da referida Autarquia, na mencionada reportagem, confessado essa falta de estrutura e de verbas para aquisção de área própria para tal fim.

      2.3.1.b) O fato  de a ora Autor ter em sua posse o papagaio de forma irregular, não poderia ser, por si só, motivo para a noticiada apreensão.

     Extrai-se da legislação que trata do assunto, referida no preâmbulo de Instrução Normativa do próprio IBAMA, indicada no final deste tópico, que só cabe a apreensão no caso em que animais silvestres estejam sendo objeto de tráfico e também no caso de que esse tipo de animal esteja sendo maltratado por algum particular que esteja a criá-lo.

      O bom senso, a razoabilidade, que faz parte do princípio da proporcionalidade, hoje incorporado pelo art. 2º da Lei nº 9.784, de 29.01.1999, ao direito administrativo do Brasil, leva ao seguro entendimento de que, quando os Agentes Fiscais do IBAMA encontrarem na residência de alguém algum pássaro silvestre, devem, primeiro, verificar se esse pássaro está sendo maltratado e, se não estiver, devem também verificar se o seu proprietário está devidamente registrado no IBAMA como Criador Amador ou como Criador Comercial. Se não estiver, e caso o proprietário do pássaro esteja a criá-lo porque gosta de animais, deve orientá-lo a providenciar o seu registro e do pássaro perante o IBAMA local, que passará, por técnicos próprios, a orientar o proprietário quanto ao manejo do animnal, bem como a cobrar-lhe a taxa anual devida.

      E esse entendimento extrai-se das Leis e Resolução  CONAMA regulamentadas pela Instrução Normativa nº 10, de 20.09.2011 do próprio IBAMA. 

     Além da acima demonstrada falta de urbanidade do Servidor do IBAMA do Recife-PE,(e aqui esse Servidor contrariou o inciso XI do art. 116 da Lei nº 8.112, de 11.12.1990, segundo o qual é dever de qualquer Servidor "XI - tratar com urbanidade as pessoas -), que tratou a Autora com desdém(certamente por ser pobre e com pouco estudo), quando das suas primeiras tentativas de visita ao pássaro, os demais Servidore da mesma Autarquia também feriram o princípio da moralidade(art. 37 da atual Constituição da República e art. 2º da referida Lei 9.784, de 1999), quando passaram a proibir as visitas, em face da morte do pássaro, sem avisar à Autora quanto ao real motivo, vindo a Autora a tomar conhecimento dessa morte apenas quando foi buscar o animal, quase dois meses depois do seu falecimento, quando estava concretizando o direito de guarda que lhe foi concedido em medida cautelar judicial dada por este Órgão Judiciário. 

     E por que feriram o princípio constitucional da moralidade?

     Porque, escondendo da Autora esse lamentável fato, feriram o dever legal de lealdade(inciso I do art. 116 da Lei nº 8.112, de 1990), o direito à comunicação da Autora(que faz parte do princípio da transparência), previsto no inciso X do art. 2º da acima invocada Lei nº 9.784, de 1999, e não atuaram  segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé, como exigido no inciso IV desse art. 2º desta Lei, no que também feriram o dever legal imposto no inciso II do mencionado art.116 da Lei nº 8.112, de 1990, instituidora do Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais. 

    Além do que foram impiedosamente desumanos. 

  Assim, como consequência desses lamentáveis e ilícitos atos dos Servidores do IBAMA-PE, exsurge visível o dano moral causado à Autora, gerando, por força do § 6º("§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".)do art. 37 da vigente Constituição da República,  a responsabilidade civil objetiva dessa Autarquia, para indenizar a Autora, como reparação desse dano(v. regra idêntica no art. 43 do vigente Código Civil brasileiro).

   Como se sabe, a indenização por danos morais está expressamente prevista no artigo 5º da Carta de 1988, entre os direitos e garantias individuais, nos termos do que dispõem os incisos V e X, in verbis:

"Art. 5.º (...).

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; (...)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (...)".

      O vigente Código Civil brasileiro tratou do assunto no seu art.186, verbis:

"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."..

   O fato de o dano moral não atingir um bem jurídico avaliável economicamente não impossibilita a fixação de indenização para minimizar os dissabores causados, razão por que tal possibilidade, como acima mencionado, foi recepcionada pela Carta Magna.

   A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça está consolidada no sentido de que, para se configure a ocorrência dos danos morais e, conseqüentemente, seja fixada uma indenização apta a atenuar seus efeitos, não é necessária a efetiva comprovação do prejuízo sofrido pela vítima, bastando que o fato caracterizado como danoso acarrete ao ser humano, como um todo, um sentimento de dor, humilhação, desonra ou constrangimento. Deve, outrossim, a referida indenização ser fixada com bom senso e razoabilidade, levando-se em conta, dentre outros fatores, a complexidade do dano sofrido pela vítima[1]. 

   2.3.2. Do quantum indenizatório

   Estabelecido o dever de indenizar, cumpre, então, fixar o montante devido à Autora.

   Como se sabe, para a fixação do dano moral, deve-se ter em conta as peculiaridades do caso, a condição econômico-financeiraa do ofensor e do Lesado.

   Diante da frágil situação econômico-financeira da Autora e da sua delicadíssima situação emocional, abalada pelo acima demonstrado dano moral, e frente à falta de urbanidade e de cunho orientador dos Servidores do IBAMA, bem como do ferimento, por partes destes, do princípio da moralidade e de outras regras legais de obrigações comportamentais, todas acima minudentemente declinadas, para que essa Autarquia, num viés pedagógico, tome providências para que lamentáveis fatos como os acima debatidos não voltem a ocorrer, tenho por razoável estabelecer indenização no valor de R$ 5.000,00(cinco mil reais), para amenizar o constrangimento e dores morais e emocionais sofridos pela Autora.

  Não há que se falar em verba honorária, porque a Autora se encontra assistida pela Defensoria Pública da União.

   3. Conclusão

   Diante de todo o exposto:

   a) ratifico a decisão exarada em 01/10/2013, que converteu o pedido de busca e apreensão em perdas e danos;

   b) julgo procedente o pedido, reconheço que o IBAMA, por intermédio dos seus Servidores, causou danos morais à Autora e, por isso, o condeno a pagar a esta indenização, amenizadora desses danos, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), valor este que deverá ser atualizado, a partir do mês seguinte ao da publicação desta sentença, pelos índices de correção monetária do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, acrescidos de juros de mora, à razão de 0,5%(meio por cento), incidentes a partir da mesma data, sobre o valor já monetariamente corrigido.

   c) Sem custas e sem verba honorária, ex lege. 

   Registre-se. Publique-se. Intimem-se. 

   Recife, 02 de julho de 2014 

   Francisco Alves dos Santos Júnior 

       Juiz Federal, 2ª Vara/PE.

[1]  Vide STJ, RESP 602401/RS, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, 4.ª Turma, DJU 28.6.2004, e STJ, RESP 567158/SP, Rel. Min. Castro Filho, 3.ª Turma, DJU, 8.3.2004.



CONTINUAÇÃO DO CASO.  

As duas Partes Recorreram para o Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no qual o feito foi distribuído para a 2ª Turma e esta deu provimento ao recurso do IBAMA e negou provimento ao recurso da Autora. 
Ou seja
A sentença  da 2a Vara Federal de Pernambuco, acima transcrita, foi reformada por mencionada Turma do referido  Tribunal. 
Segue a íntegra do acórdão acima referido:




Tribunal Regional Federal da 5ª Região


Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho






PJe-AC 0802510-49.2013.4.05.8300



                              RELATÓRIO



O Des. Federal FREDERICO WILDSON DA SILVA DANTAS (convocado):



Trata-se de apelações interpostas, a primeira por Gedalia Valentim Ferreira, assistida pela Defensoria Pública da União e, a segunda, pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, a desafiar sentença do Juízo Federal da 2ª Vara, sediado em Recife, que, em ação ordinária, julgou procedente o pedido, reconhecendo que o IBAMA, por intermédio dos seus agentes, causou danos morais à parte autora, condenando-o ao pagamento de cinco mil reais, corrigidos a partir do mês seguinte ao da publicação da sentença, pelos índices de correção monetária do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, com juros de mora, à razão de meio por cento, incidentes a partir da mesma data, sobre o valor já monetariamente corrigido.



A sentença recorrida reconheceu a responsabilidade civil objetiva da União, art. 37, § 6º, da Constituição, na irrazoabilidade da apreensão do papagaio que vivia há oito anos com uma senhora idosa, à míngua de qualquer demonstração de maltrato com o animal, sendo que os agentes da autarquia deveriam orientá-la a regularizar a guarda do pássaro, tendo-lhe dispensado tratamento grosseiro à autora na sede do referido instituto em Pernambuco, malferindo a urbanidade que obriga a todo servidor público e, também, a moralidade, ao esconder dela, a morte do papagaio, ocorrida nos viveiros da repartição (confessadamente inapropriados como relatado pelo dirigente da autarquia em reportagem da TV Justiça), id. 4088300.488823.



A parte autora apela, inconformada com o valor fixado a título de indenização por dano moral, cinco mil reais, alegando: 1) alto grau de reprovabilidade do instituto réu, que violou frontalmente os princípios constitucionais da publicidade e moralidade; 2) ao ocultar a morte do animal, o IBAMA continuou a causar sofrimento à autora; 3) ao tentar, por diversas vezes, transferir à autora a culpa pelo óbito do "Meu Lourinho"; 4) não ter o IBAMA do Recife a menor estrutura para guarda de animais apreendidos, sendo enjaulados em gaiolas minúsculas, num ambiente insalubre e com ares de total abandono; 5) que o sofrimento causado à autora foi de grande monta, sendo que, desde a apreensão do animal, tem recebido acompanhamento psicológico, com depressão, que só se agravou após ser informada do óbito do pássaro, id. 541550.



Por seu turno, o IBAMA alega em seu apelo: preliminarmente, o conhecimento do agravo retido, id. 265323, a desafiar a decisão que converteu a demanda em perdas e danos, alegando a impossibilidade de alteração do pedido, após a citação, diante da perda de objeto da demanda, em razão da falta de interesse processual superveniente, nos termos dos arts. 264 e 267, inc. VI, ambos, do Código de Processo Civil (1973) então vigente.



No mérito, alega: 1) a ausência de demonstração de ato ilícito praticado pelo IBAMA a ensejar pagamento de dano moral à demandante, a teor dos arts. 186 e 927, ambos do Código Civil, art. 333, inc. I e 334, incs. III e IV, todos do Código de Processo Civil (1973); 2) não ter logrado a autora infirmar a presunção de legitimidade e veracidade dos atos administrativos, que quando da apreensão da ave agiu em consonância com a legislação vigente; 3) o ato de apreensão submeteu-se a regular procedimento fiscalizatório conforme o art. 25, caput, e § 1, art. 72, inc. IV, da Lei 9.605/98, art. 3º, inc. IV, do DL 6.514/08, não havendo o que falar em ato ilícito praticado pelo instituto réu; 4) do apurado nos exames e perícias realizadas, constatou-se que a ave já apresentava um quadro de saúde debilitado quando adentrou no viveiro do IBAMA, id. 543210.



Foram apresentadas contrarrazões pela parte autora, id. 638101.



O procurador regional da república que neste órgão fracionário oficia ofertou parecer pelo provimento da apelação da parte autora e pelo improvimento do recurso da parte ré, id. 1664764.



É o relatório. 



Tribunal Regional Federal da 5ª Região

Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho

PJe-AC 0802510-49.2013.4.05.8300



                                         VOTO



O Des. Federal FREDERICO WILDSON DA SILVA DANTAS (convocado):
Para o aperfeiçoamento da pretensão de condenação em danos morais, reclama-se a demonstração do concurso das três condições imprescindíveis para a caracterização da responsabilidade civil do Estado, quais sejam: dano, ação administrativa e nexo de causalidade.
Mesmos considerando que o ato administrativo impugnado, apreensão do animal silvestre, tenha causado dano, resultando em grande sofrimento infligido à autora, a desencadear trauma psíquico, que exigiu acompanhamento psicológico, em razão dos sintomas de depressão, recrudescida com o óbito do papagaio "Meu Lourinho", id. 541550, restando demonstrado o nexo causal, não se pode imputar qualquer ilicitude à conduta do instituto réu, tendo em vista que agiu estritamente no cumprimento da lei.
Com efeito, não ocorreu conduta ilícita indenizável por parte da Administração Pública, no fato da apreensão do animal, eis que o instituto apenas exerceu suas atribuições constitucionais e legais.
Assim o art. 225, § 1º, incs. I e VII, da Constituição:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
(...)
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
Dando efetividade a esses princípios positivados na Carta Magna, a ação do IBAM foi levada a efeito, revelando-se indeclinável na proteção da fauna e da flora, por força das leis ambientais, a exemplo da Lei 9.605/98 e da regulamentação do Decreto 6.514/08, a determinar a apreensão dos espécimes, ilegalmente mantidos em cativeiro, quando constatada a infração, e a posterior soltura em habitat natural.
Tal é verificado na previsão do arts. 72, inc. IV, da Lei 9.605, e 2º, combinado com o 3º, inc. IV, do Decreto 6.514/08, a prescrever a apreensão do animal silvestre aprisionado em cativeiro, diante da constatação de infração administrativa e crime ambiental.
Lei 9.605:
Art. 72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções, observado o disposto no art. 6º:
(...)
IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração;
Decreto 6.514:
Art. 2º Considera-se infração administrativa ambiental, toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente, conforme o disposto na Seção III deste Capítulo.
(...)
Art. 3º As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções:
(...)
IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora e demais produtos e subprodutos objeto da infração, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração; (Redação dada pelo Decreto nº 6.686, de 2008);
A autora detinha o animal ilegalmente, sendo assente que os animais silvestres nativos são propriedade do Estado, com já previsto há muito tempo na norma hospedada no art. 1º da Lei 5.197/67, em harmonia com a norma do art. 1.228, do Código Civil, ressaltando que o proprietário tem o direito de reaver o animal de quem injustamente o detenha, não se impondo à Administração qualquer obrigação de comunicar a parte autora o falecimento da ave, não havendo, outrossim, qualquer mácula de ilegalidade no ato administrativo impugnado.
Nestes termos os referido art. 1.228, do referido diploma:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
Por outro lado, elementos os autos, em especial quanto ao tratamento dispensado ao papagaio, não foram devidamente observados no édito recorrido.
Ainda que certamente, sem intenção de ter causar maus tratos ao papagaio, relatórios de avaliação das condições de saúde da ave, atestam a condição precária de subnutrição, motivo determinante de indeferimento pelo instituto demandado, do pedido de guarda formulado pela parte autora.
A fiscalização observou o manejo inapropriado e as condições precárias em que foi encontrada a ave, no momento da apreensão.
Neste sentido, o relatório do IBAMA, cujas conclusões não foram elididas pela parte autora, que repousa no id. 170060:
Exame Físico: o animal apresenta desenvolvimento inadequado das penas devido à deficiência nutricional no cativeiro, além do corte das rêmiges primárias de ambas as assas de forma a impedir o voo do animal e a ausência das rêmiges secundárias. O animal apresenta, no membro pélvico direito, um desvio de eixo ósseo na mediação da tíbia, tarso e metatarsos, comprometendo a locomoção. No cetas o animal adaptou-se bem à dieta oferecida.
Exame radiológico: foi realizado procedimento radiológico no dia 21/03/2013 em clínica particular, onde foi descrita presença de fratura antiga em região distal de tíbia esquerda e fratura antiga em osso metatársicos de membro esquerdo, com perda de radiodensidade óssea.
Conclusão: devido às sequelas descritas acima o animal é enquadrado como mutilado e poderá se disponibilizado à adoção por pessoa que ofereça condições adequadas para a espécie, considerando inclusive o fator nutricional, o que não foi atendido por parte da interessada neste processo.
Portanto, além da demonstração de qualquer ato ilícito perpetrado pela Administração, existe a comprovação, a toda evidência, de culpa da parte autora diante do estado periclitante em que foi encontrada a ave no momento da apreensão pelos agentes do IBAMA.
Por este entender, dou provimento à apelação do ente público e nego provimento à apelação do particular.
É como voto.



Tribunal Regional Federal da 5ª Região

Gabinete do Desembargador Federal Vladimir Souza Carvalho

PJe-AC 0802510-49.2013.4.05.8300

APTE                         : GEDALIA VALENTIM FERREIRA

REPTE                      : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

APTE                         : IBAMA

APELADO                 : OS MESMOS

ORIGEM                   : 2ª VARA FEDERAL - PE

RELATOR                 : DES. FEDERAL VLADIMIR SOUZA CARVALHO - 2ª TURMA

CONVOCADO          : DES. FEDERAL FREDERICO WILDSON DA SILVA DANTAS



                                         EMENTA


Administrativo e Processual Civil. Apelações a desafiar sentença que, em ação ordinária, julgou procedente o pedido, reconhecendo que o IBAMA, por intermédio dos seus agentes, causou danos morais à parte autora, condenando-o ao pagamento de cinco mil reais, corrigidos a partir do mês seguinte ao da publicação da sentença, pelos índices de correção monetária do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, com juros de mora, à razão de meio por cento, incidentes a partir da mesma data, sobre o valor já monetariamente corrigido.

1. A sentença recorrida reconheceu a responsabilidade civil objetiva da União, art. 37, § 6º, da Constituição, na irrazoabilidade da apreensão do papagaio que vivia há oito anos com uma senhora idosa, à míngua de qualquer demonstração de maltrato com o animal, sendo que os agentes da autarquia deveriam orientá-la a regularizar a guarda do pássaro, tendo-lhe dispensado tratamento grosseiro à autora na sede do referido instituto em Pernambuco, malferindo a urbanidade que obriga a todo servidor público e, também, a moralidade, ao esconder dela, a morte do papagaio, ocorrida nos viveiros da repartição (confessadamente inapropriados como relatado pelo dirigente da autarquia em reportagem da TV Justiça), id. 4088300.488823.

2. A parte autora apela, inconformada com o valor fixado a título de indenização por dano moral, cinco mil reais, alegando: 1) alto grau de reprovabilidade do instituto réu, que violou frontalmente os princípios constitucionais da publicidade e moralidade; 2) ao ocultar a morte do animal, o IBAMA continuou a causar sofrimento à autora; 3) ao tentar, por diversas vezes, transferir à autora a culpa pelo óbito do "Meu Lourinho"; 4) não ter o IBAMA do Recife a menor estrutura para guarda de animais apreendidos, sendo enjaulados em gaiolas minúsculas, num ambiente insalubre e com ares de total abandono; 5) que o sofrimento causado à autora foi de grande monta, sendo que, desde a apreensão do animal, tem recebido acompanhamento psicológico, com depressão, que só se agravou após ser informada do óbito do pássaro, id. 541550.

3. O ente público alega: 1) a ausência de demonstração de ato ilícito praticado pelo IBAMA a ensejar pagamento de dano moral à demandante, a teor dos arts. 186 e 927, ambos do Código Civil, art. 333, inc. I e 334, incs. III e IV, todos do Código de Processo Civil (1973); 2) não ter logrado a autora infirmar a presunção de legitimidade e veracidade dos atos administrativos, que quando da apreensão da ave agiu em consonância com a legislação vigente; 3) o ato de apreensão submeteu-se a regular procedimento fiscalizatório conforme o art. 25, caput, e § 1, art. 72, inc. IV, da Lei 9.605/98, art. 3º, inc. IV, do DL 6.514/08, não havendo o que falar em ato ilícito praticado pelo instituto réu; 4) do apurado nos exames e perícias realizadas, constatou-se que a ave já apresentava um quadro de saúde debilitado quando adentrou no viveiro do IBAMA, id. 543210.

4. Para o aperfeiçoamento da pretensão de condenação em danos morais, reclama-se a demonstração do concurso das três condições imprescindíveis para a caracterização da responsabilidade civil do Estado, quais sejam: dano, ação administrativa e nexo de causalidade.

5. Mesmo considerando que o ato administrativo impugnado, apreensão do animal silvestre, tenha causado dano, resultando em grande sofrimento infligido à autora, a desencadear trauma psíquico, que exigiu acompanhamento psicológico, em razão dos sintomas de depressão, recrudescida com o óbito do papagaio "Meu Lourinho", id. 541550, restando demonstrado o nexo causal, não se pode imputar qualquer ilicitude à conduta do instituto réu, tendo em vista que agiu estritamente no cumprimento da lei.

6. Com efeito, não ocorreu conduta ilícita indenizável por parte da Administração Pública, no fato da apreensão do animal, eis que o instituto apenas exerceu suas atribuições constitucionais e legais. Assim o art. 225, § 1º, incs. I e VII, da Constituição

7. Dando efetividade a esses princípios positivados na Carta Magna, a ação do IBAMA foi levada a efeito, revelando-se indeclinável na proteção da fauna e da flora, por força das leis ambientais, a exemplo da Lei 9.605/98 e da regulamentação do Decreto 6.514/08, a determinar a apreensão dos espécimes, ilegalmente mantidos em cativeiro, quando constatada a infração, e a posterior soltura em habitat natural.

8. Tal é verificado na previsão do arts. 72, inc. IV, da Lei 9.605, e 2º, combinado com o 3º, inc. IV, do Decreto 6.514/08, a prescrever a apreensão do animal silvestre aprisionado em cativeiro, diante da constatação de infração administrativa e crime ambiental.

9. A autora detinha o animal ilegalmente, sendo assente que os animais silvestres nativos são propriedade do Estado, como já previsto há muito tempo na norma hospedada no art. 1º da Lei 5.197/67, em harmonia com a norma do art. 1.228, do Código Civil, ressaltando que o proprietário tem o direito de reaver o animal de quem injustamente o detenha, não se impondo à Administração qualquer obrigação de comunicar a parte autora o falecimento da ave, não havendo, outrossim, qualquer mácula de ilegalidade no ato administrativo impugnado.

10. Por outro lado, elementos os autos, em especial quanto ao tratamento dispensado ao papagaio, não foram devidamente observados no édito recorrido.

11. Ainda que certamente, sem intenção de causar maus tratos ao papagaio, relatórios de avaliação das condições de saúde da ave, atestam a condição precária de subnutrição, motivo determinante de indeferimento pelo instituto demandado, do pedido de guarda formulado pela parte autora.

12. A fiscalização observou o manejo inapropriado e as condições precárias em que foi encontrada a ave, no momento da apreensão.

13. Neste sentido, o relatório do IBAMA, cujas conclusões não foram elididas pela parte autora, que repousa no id. 170060:

Exame Físico: o animal apresenta desenvolvimento inadequado das penas devido à deficiência nutricional no cativeiro, além do corte das rêmiges primárias de ambas as assas de forma a impedir o voo do animal e a ausência das rêmiges secundárias. O animal apresenta, no membro pélvico direito, um desvio de eixo ósseo na mediação da tíbia, tarso e metatarsos, comprometendo a locomoção. No cetas o animal adaptou-se bem à dieta oferecida.

Exame radiológico: foi realizado procedimento radiológico no dia 21/03/2013 em clínica particular, onde foi descrita presença de fratura antiga em região distal de tíbia esquerda e fratura antiga em osso metatársicos de membro esquerdo, com perda de radiodensidade óssea.

Conclusão: devido às sequelas descritas acima o animal é enquadrado como mutilado e poderá se disponibilizado à adoção por pessoa que ofereça condições adequadas para a espécie, considerando inclusive o fator nutricional, o que não foi atendido por parte da interessada neste processo.

14. Portanto, além da demonstração de qualquer ato ilícito perpetrado pela Administração, existe a comprovação, a toda evidência, de culpa da parte autora diante do estado periclitante em que foi encontrada a ave no momento da apreensão pelos agentes do IBAMA.

15. Apelação do ente público provida, apelação do particular improvida.



ACÓRDÃO



Vistos, etc.



Decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do ente público e negar provimento à apelação do particular, nos termos do voto do relator.



Recife (PE), 04 de dezembro de 2018.

      (Data do julgamento)





Desembargador Federal FREDERICO WILDSON DA SILVA DANTAS

                  Relator (convocado) - Ato 213/2018-TRF5

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Processo: 0802510-49.2013.4.05.8300
Assinado eletronicamente por:
FREDERICO WILDSON DA SILVA DANTAS - Magistrado
Data e hora da assinatura: 09/12/2018 10:06:56
Identificador: 4050000.13300608

Para conferência da autenticidade do documento:
https://pje.jfpe.jus.br/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam


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EPÍLOGO

E ASSIM TERMINOU A TRISTE HISTÓRIA DE  UM LINDO PAPAGAIO  E DA SUA DESDITOSA AMIGA E AVÓ.

NUNCA MAIS O SEU VOO RASANTE, O SEU GRITO ESTRINDENTE A DESPERTÁ-LA:  "ACORDA VOVÓ", "ACORDA VOV´", ...

AGORA APENAS O TRAUMA DA PERDA REPENTINA E VIOLENTA DO SEU PAPAGAIO E AS DOENÇAS PSICOLÓGICAS DAÍ DECORRENTES, SEM QUALQUER  INDENIZAÇÃO.


TEME-SE QUE BELO PAPAGAIO TENHA MORRIDO DE TRISTEZA DA SOLIDÃO DO "CÁRCERE" E DE SAUDADE DA SUA QUERIDA "VOVÓ".

OXALÁ, OS  SENHORES FISCAIS DO IBAMA, DEPOIS DESTE TRISTE CASO, TENHAM  PASSADO A RECEBER TREINAMENTO PARA QUE TRATEM OS CIDADÃOS E AS CIDADÃS DO PAÍS DE FORMA MAIS HUMANA. DEVEM,  PRIMEIRO EXAMINAR SE O  ANIMAL  ESTÁ  SENDO MALTRADO. E SÓ NESSA HIPÓTESE É QUE DEVEM FAZER A APREENSÃO.

CASO CONTRÁRIO, DEVEM APENAS ORIENTAR O RESPECTIVO DETENTOR A REGULARIZAR A SITUAÇÃO PERANTE O IBAMA, OCASIÃO EM QUE ESTE TAMBÉM DEVERÁ RECEBER INSTRUÇÕES DE MANEJO DO ANIMAL.

AFINAL, HÁ  NORMAS ADMINISTRATIVAS, DO PRÓPRIO IBAMA, NESSE SENTIDO, INDICADAS NA SENTENÇA DO JUIZ  DE PRIMEIRO GRAU E, INFELIZMENTE, IGNORADAS NO MENCIONADO ACÓRDÃO DA 2ª TURMA  DO TRF5R.