quinta-feira, 25 de julho de 2013

BACHAREL EM EDUCAÇÃO FÍSICA. INSCRIÇÃO NO CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA. ATUAÇÃO PLENA. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE X RESOLUÇÕES.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior
 
 
   Segue decisão na qual se discute o problema da forma pela qual se deve fazer alterações na grade curricular e da estrutura dos Cursos Superiores de Educação Física. 
    Boa leitura.   
 
 
 
PROCESSO Nº: 0802232-48.2013.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTORA: J F C
ADVOGADA: F D R C
RÉU: CONSELHO REGIONAL DE EDUCACAO FISICA DA 12 REGIAO PERNAMBUCO/ALAGOAS - CREF12/PE-AL (e outro)
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL



DECISÃO




J. F. C, qualificada na petição inicial, propôs a presente ação ordinária com pedido de tutela antecipada em face do CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA (CONFEF) e do CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA - 12ª REGIÃO (CREF/PE-AL), para ter autorizado o livre exercício de sua profissão de educadora física tanto em escolas (Educação Básica), quanto em academias, clubes, condomínios, ou qualquer outro ambiente não escolar. Alegou, em síntese, que: a) colou grau em 19.08.2010, no curso de licenciatura em Educação Física, na FASNE - Faculdade Salesiana; b) participou de inúmeros eventos de aperfeiçoamento na modalidade esportiva de natação, tanto na condição de congressista, quanto na condição de palestrante e também organizadora; c) estagiou no período de janeiro/2009 a maio/2010 na clínica especializada em Fisioterapia e Hidroterapia (FISIOCLÍNICA CASAFORTE); d) logo após sua formatura, graças a sua dedicação, foi contratada pela clínica para o exercício da função de professora de Natação Infantil; e) atualmente, desempenha a função de Educadora Física no Clube de Natação Via Água, com turmas de Natação Infantil, de segunda à sexta-feira; f) no último dia 15.07.2013, após o encerramento de sua última aula, foi surpreendida com a fiscalização do CREF/PE-AL, ocasião em que os representantes do Conselho Regional informaram que somente profissionais formados no curso de Bacharelado em Educação Física poderiam lecionar no referido Clube de Natação; g) o CREF/PE-AL procedeu com a notificação de todas as colegas de trabalho que ainda estavam ministrando aula na piscina e deixou claro que as demais trabalhadoras ali presentes somente não sofreram a notificação porque não foram "pegas em flagrante", mas que estavam também impedidas de laborar, pois são LICENCIADAS e não BACHARÉIS em Educação Física; h) segundo a agente de fiscalização do CREF/PE-AL, a Sra. Rebekka Kretzschamr (CREF 3456-G/PE), de acordo com a Resolução no 182/2009 do CONFEF a sua formação em LICENCIATURA NO CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA permite apenas que ela atue em "educação básica"; i) para o CREF/PE-AL, a atuação em outros ramos da Educação Física como academias de ginástica, clubes, bem como de desenvolver trabalhos de personal trainner seria tipificada como exercício ilegal da profissão; j) desde sua formatura, vem desempenhando regularmente a função de educadora física em diversos clubes de natação, o que possibilitou, inclusive, o custeio de sua Pós-Graduação[1] na Escola Superior de Educação Física - ESEF, concluído em abril/2012. Teceu outros comentários, transcreveu precedentes e requereu a concessão da antecipação dos efeitos da tutela para que lhe seja garantida a atuação plena em todos os ramos da educação física, por considerar que as exigências impostas pelo CONFEF e pelo CREF/PE-AL, por meio de resolução administrativas, extrapolam suas funções de órgão fiscalizatório uma vez que medidas que restringem o exercício da profissão apenas poderiam ser impostas por Lei, e não por resoluções administrativas.
É o relatório.
Decido.
Da Justiça Gratuita e Tramitação Prioritária
Merece ser concedido à Autora o benefício da justiça gratuita, porque presentes os requisitos legais, mas com as ressalvas da legislação criminal pertinente, no sentido de que se, mais tarde, ficar comprovado que declarou falsamente ser pobre, ficará obrigada ao pagamento das custas e responderá criminalmente (art. 5º, LXXXIV da Constituição da República e Lei nº 1.060, de 1950).
Outrossim, o benefício ora concedido não abrange as prerrogativas previstas no §5º, art. 5º da Lei nº 1.060/50, pois estas são exclusivas de defensor público ou de quem ocupe cargo equivalente.
Da antecipação da tutela requerida.
A característica fundamental do provimento satisfativo consiste na entrega antecipada dos efeitos da sentença de procedência a um dos integrantes da relação jurídica processual. O art. 273 do Código de Processo Civil, com a redação trazida pela Lei no 8.952/94, retrata o modelo básico de tutela jurisdicional antecipatória.
À luz do dispositivo legal em comento, in verbis:
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
[...]
§ 2º Não se concederá a antecipação da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.
O adiantamento promovido pela medida emergencial repousa, assim, sobre eficácias inerentes ao pedido articulado na petição inicial, ou melhor, imanentes à sentença que provavelmente o julgará procedente, no todo ou em parte.
No caso dos autos, pelo menos nesta análise perfunctória, vislumbro os requisitos autorizadores da concessão da medida pleiteada.
Requer a Autora, graduada no curso de Licenciatura em Educação Física[2] em 19.08.2010, que a anotação "ATUAÇÃO EM EDUCAÇÃO BÁSICA", que consta em sua carteira profissional, seja substituída pela inscrição "ATUAÇÃO PLENA", a fim de que lhe seja garantido o livre exercício de sua profissão, sem as restrições impostas pelas resoluções do CONFEF e CREF, no tocante a área de atuação dos educadores físicos, egressos dos cursos de Licenciatura em Educação Física.
A profissão Educação Física foi regulamentada pela Lei nº 9.696/98. De acordo com o art. 1º, deste diploma legal, as atividades atinentes a esta profissão devem ser exercidas, exclusivamente, por profissionais registrados nos Conselhos Regionais de Educação Física. O art. 2º, por sua vez, enumera os profissionais que estão aptos a efetuar inscrição do CREF, dispondo, in verbis:
Art. 2º. Apenas serão inscritos nos quadros dos Conselhos Regionais de Educação Física, os seguintes profissionais:
a) Os possuidores de diploma obtidos em curso de Educação Física, oficialmente autorizado ou reconhecido.
b) Os possuidores de diploma em Educação Física expedido por instituição de ensino superior estrangeira, revalidado na forma da legislação em vigor.
c) Os que, até a data do início da vigência desta Lei, tenham comprovadamente exercido atividades próprias dos profissionais de Educação Física, nos termos a serem estabelecidos pelo Conselho Federal de Educação Física.
As atividades privativas do profissional de Educação Física, consoante o art. 3º, da mencionada lei, consistem em "coordenar, planejar, programar, supervisionar, dinamizar, dirigir, organizar, avaliar e executar trabalhos, programas, plano, projetos, bem como prestar serviços de auditoria, consultoria, assessoria, realizar treinamentos especializados, participar de equipes multidisciplinares e interdisciplinares e elaborar informes técnicos, científicos e pedagógicos, todos nas áreas de atividades físicas e do desporto."
Para o exercício das atividades referidas acima, a Lei nº 9.696/98 não fez qualquer distinção entre o Educador Físico proveniente do curso de bacharelado ou licenciatura, exigindo tão somente a posse de diploma obtido em curso de Educação Física, autorizado e reconhecido, e a inscrição nos Conselhos Regionais de Educação Física.
No entanto, as Resoluções nº 01/2002 e 07/2004, emitidas pelo Conselho Nacional de Educação, ao instituírem diretrizes curriculares para a formação de professores da Educação Física básica, bem como para os cursos de graduação em Educação Física, estabeleceram a cisão do curso em licenciatura e bacharelado, diferenciados em relação aos currículos e às cargas horárias.
 E, para complicar mais ainda a situação, vem o Conselho Federal de Educação Física - CFEF baixando Resoluções, como a de nº 182/2009, fazendo exigências documentais, que findam por limitar direitos das pessoas que frequentaram Estabelecimento de Ensino Superior e Educação Física, sem base em Lei, criando  atritos judiciais como o que se faz presente neste feito. Com efeito, nessa Resolução,  que trata dos documentos necessários à inscrição no Conselho Regional de Educação Física-CREF, exige-se que o diploma emitido pelas instituições de ensino superior indique a base legal do referido curso, a fim de emitir a carteira profissional, diferenciando a área de atuação, conforme se trate de profissional oriundo do curso de bacharelado ou licenciatura.
Ocorre que os atos administrativos, como é o caso das Resoluções acima mencionadas, por serem inferiores à lei, jamais podem contrariá-la.
Assim, considerando que a Lei nº 9.696/98 é a única que regulamenta a profissão do educador físico e nessa Lei não se estabeleceu qualquer restrição ao profissional licenciado, não há como diminuir seu campo de atuação.
As resoluções emitidas pelo MEC, CONFEF ou CREF podem regulamentar a profissão, dentro dos limites que lei estabelecer, mas não podem extrapolar esses limites, criando direitos e obrigações que interfiram na atividade profissional.
Nesse sentido, registro o seguinte precedente:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONSELHO PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA. INSCRIÇÃO NOS QUADROS DO ÓRGÃO FISCALIZADOR. EXIGÊNCIA NÃO PREVISTA EM LEI. DESOBEDIÊNCIA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. I. Hipótese em que se interpõe agravo de instrumento contra decisão que concedeu a medida de antecipação dos efeitos da tutela, determinando ao CREF/1-PB/RN - Conselho Regional de Educação Física emitisse a carteira profissional da autora/agravada, com a anotação de ATUAÇÃO PLENA, garantindo-lhe o livre exercício das atividades relativas ao curso de Educação Física, em qualquer dos ramos, a despeito de haver concluído o curso de licenciatura em Educação Física. II. "A orientação jurisprudencial do colendo Superior Tribunal de Justiça, tem se firmado no sentido de que, sem previsão expressa em lei, é ilegal limitação imposta ao exercício da profissão por meio de resolução dos órgãos fiscalizadores, visto que não pode a Resolução inovar, extrapolando os limites da lei." ( REO - Remessa Ex Offício - 491918. Desembargador Federal Manuel Maia. Segunda Turma. DJE. 25/03/2010. p. 269). III. A Lei nº 9.696/98 é a única que regulamenta a profissão de educador físico, e como esta não estabeleceu qualquer restrição ao profissional licenciado, não há como diminuir seu campo de atuação. Assim, as resoluções emitidas pelo MEC, CONFEF ou CREF não podem exceder esses limites. IV. Agravo de instrumento improvido. (AG 00151359020114050000, Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, TRF5 - Quarta Turma, DJE - Data::01/12/2011 - Página::781.) (G.N.)
ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA. CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA - LICENCIATURA DE GRADUAÇÃO PLENA. REGISTRO PROFISSIONAL. RESTRIÇÕES. IMPOSSIBILIDADE. CÉDULA DE IDENTIDADE PROFISSIONAL COM A RUBRICA "ATUAÇÃO PLENA". LEIS NS. 9.394/96 E 9.696/98. RESOLUÇÕES CNE NS. 01/02, 02/02, 07/04. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ARTS. 5º, XIII E 22, XXIV. PARECER MEC N. 400/2005. INVERSÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. I - Nos termos do art. 5º, inciso XIII, da Constituição Federal, somente lei em sentido formal pode estabelecer os critérios que habilitam uma pessoa ao desempenho da atividade escolhida, objetivando, com essas limitações do direito individual, a proteção da sociedade, garantindo formas para se aferir a capacitação profissional. II - A Lei n. 9.696/98, norma que dispõe sobre a Profissão de Educação Física, não traz qualquer distinção acerca da existência de diferentes cursos de Educação Física no País que possibilitem ao Conselho Regional de Educação Física a expedição das cédulas de identidade profissional com restrições em relação à área de atuação. III - A Lei n. 9.394/96 e as Resoluções CNE ns. 01/02, 02/02 e 07/04 não se prestam a impor limitações ao exercício profissional, mas apenas estabelecem as diretrizes curriculares dos cursos de graduação, carga horária e o tempo de duração dos mesmos. IV - Parecer MEC/CNE n. 400/2005 que firma o entendimento de que não tem sustentação legal a discriminação do registro profissional, e, portanto, a aplicação de restrições distintas ao exercício profissional de graduados em diferentes cursos de graduação de Licenciatura ou de Bacharelado em Educação Física, por meio de decisões de Conselhos Regionais ou do Conselho Federal de Educação Física. V - Cursos de Licenciatura de Graduação Plena concluídos em 3 (três) anos e com carga horária superior a 2.880 (duas mil e oitocentas e oitenta) horas, nos termos da legislação vigente à época da conclusão do curso (2007). VI - Decaindo o Réu integralmente do pedido, devem ser invertidos os ônus de sucumbência. VII - Apelação provida (AC nº 1418814, TRF 3, relatora Juíza Regina Costa, DJ 13/04/2011) (G.N.)
 
Ana Lúcia Padrão dos Santos, Mestre em Educação Física, Universidade de São Paulo (USP); Professora Adjunta da Escola de Educação Física e Esportes, USP; e Antonio Carlos Simões, Doutor em Ciências da Comunicação, Universidade de São Paulo (USP); Professor Titular da Escola de Educação Física e Esporte, USP. no excelente Ensaio denominado "Desafios do ensino superior em educação física: considerações sobre a política de avaliação de cursos"(disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-40362008000200006&script=sci_arttext, acesso em 25.07.2013), a respeito do assunto ora debatido registram:  
Até 2004, os cursos de Educação Física tinham como referência a Resolução CFE nº. 3, de 16 de junho de 1987 (CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, 1987), para estruturação de cursos superiores na área, porém em virtude destas significativas transformações, a Comissão da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação aprovou o Parecer CNE/CES nº. 58, de 18 de fevereiro de 2004 (CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 2004), que culminou com a instituição das diretrizes curriculares nacionais para os cursos de graduação em Educação Física, por meio de aprovação da Resolução CNE/CES nº. 7, de 31 de março de 2004 (CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 2004). Nesta Resolução há a distinção entre o curso de formação de professores da educação básica, licenciatura plena em Educação Física e o curso de graduação em Educação Física, o qual hoje é conhecido geralmente por bacharelado em Educação Física.
E nesse mesmo trabalho propõem:
Seria de grande valia uma definição legal sobre as diretrizes curriculares, especialmente no que diz respeito à carga horária mínima e ao tempo de duração de cada habilitação. 
Como vimos acima, esses Especialistas têm razão, o assunto é sério demais para ficar sob o critério de órgãos do Poder Executivo que baixam Resoluções sem base em Lei, e às vezes desencontradas, criando direitos e deveres, no que ferem o princípio constitucional da legalidade(inciso II do art. 5º da Constituição)e geram insegurança jurídica.
    O fumus boni iuris encontra-se delineado no acima consigando e o periculum in mora no risco iminente de prejuízos jurídico-financeiros que podem ser imputados à ora Autora, no sentido de que ficará impedida de realizar as atividades do curso de edução física superior no qual se formou. 
 
Conclusão
Posto isso:
a) defiro os benefícios da justiça gratuita, nos termos da fundamentação supra;
b) defiro o pedido de antecipação da tutela, tal qual requerida na petição inicial, para determinar que seja expedida nova carteira profissional para a autora com a anotação "ATUAÇÃO PLENA", sendo-lhe garantida o livre exercício das atividades relativas ao curso de Educação Física, em qualquer dos ramos, até o julgamento definitivo da presente ação.
Citem-se. Intime-se.
 
Recife, 25 de julho de 2013.

Francisco Alves dos Santos Jr
  Juiz Federal, 2ª Vara-PE

 

[1] Vide Declaração de Conclusão do Curso de Especialização em Educação Física Escolar e Histórico Escolar, expedidos pela Escola Superior de Educação Física da Universidade de Pernambuco. Documentos de comprovação NUM: 163186 e 163187.

[2] Vide Certificado de Conclusão de Curso e Colação de Grau, expedido pela Faculdade Salesiana. Documento de Comprovação NUM: 163164.



 

terça-feira, 18 de junho de 2013

PRESCRIÇÃO CIVIL. CRÉDITO BANCÁRIO ROTATIVO. HIPÓTESE DE APLICAÇÃO DO NOVO CÓDIGO CIVIL DO BRAISL.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.

Na sentença que segue, enfrenta-se questão de direito intertemporal relativa à aplicação de prazo prescricional do novo Código Civil brasileiro, do ano de 2002, à dívida vencida antes do seu advento.
 
A pesquisa jurisprudencial foi efetuada pela Assessora Luciana Simões C. Albuquerque.
 
Boa leitura.  
 

 

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA

 

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 0013153-36.2012.4.05.8300  Classe: 28 - AÇÃO MONITÓRIA

AUTORA: C E F

Advogado: R P B de A

RÉU: M N S

Advogado: M N

 

Registro nº ...........................................

Certifico que eu, ..................,  registrei esta Sentença às fls..........

Recife, ...../...../2013

 

Sentença tipo A

 

Ementa: - DIREITO COMERCIAL, CIVIL E BANCÁRIO. CONTRATO DE CRÉDITO ROTATIVO. PRESCRIÇÃO.

 

-É líquida, sem o atributo da executividade, a dívida decorrente de contrato bancário de crédito rotativo.

 

-A fluência do prazo de prescrição de crédito da Entidade Bancária, decorrente de dívida de contrato de crédito rotativo, inicia-se no dia seguinte à existência de débito que deixou de ser pago.

 

-Acolhimento da exceção de prescrição

 

Vistos etc.

 

1.      Breve Relatório

 

Trata-se de Ação Monitória ajuizada pela C E F, em face de M N S, qualificado na Inicial.  Aduziu, em síntese, que: o Requerente, através de sua agência, teria celebrado com o Requerido um contrato de Abertura de Conta e de Produtos e Serviços, onde estaria previsto um contrato de crédito rotativo de nº 15.0045.195.003188258-5, sendo disponibilizado na mesma data, na conta-corrente do Requerido, um limite de crédito de R$10.000,00, estando em situação de inadimplência desde 04/09/2006, de acordo com o demonstrativo em anexo; o Requerido teria utilizado efetivamente os créditos dos financiamentos concedidos, deixando, contudo, de efetuar os pagamentos das parcelas mensais, em montante idôneo ao valor utilizado e dos respectivos encargos, ensejando os vencimentos antecipados, conforme expresso nas cláusulas pactuadas nos aludidos contratos; os extratos analíticos acostados representariam e espelhariam toda a movimentação financeira, oriunda dos tipos de operações contratadas, ocorridas na conta do Requerido, onde constariam, inclusive, os excessos no limite praticados, bem como as devoluções de cheques havidas por insuficiência de saldo credor em conta corrente; conforme demonstrativos de débitos acostados, a soma dos débitos inadimplidos pelo Requerido, até 26/06/2012, totalizaria R$22.580,57; a Requerente teria desenvolvido, sem sucesso, todos os esforços necessários à recuperação do seu crédito pelas vias administrativas, não restando outra alternativa senão, com base nos documentos que instruem essa peça, buscar a tutela do Judiciário.  Teceu outros comentários.  Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos (fls. 60-20).

Custas recolhidas às fls. 21.

Determinada a citação (fl. 23), o Réu ofertou Embargos Monitórios(fl.28), suscitando, prejudicialmente, prescrição quinquenal, eis que a inadimplência datara de 04.06.2006. No mérito, mencionou que: não conseguira saldar os débitos em face de dificuldades financeiras; para quitar a dívida, estaria oferecendo como pagamento do veículo, descrito na petição e ainda os valores investidos na C VIDA E PREVIDÊNCIA. Teceu outros comentários. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos (fl.29).

A C E F apresentou Impugnação aos Embargos Monitórios.  Alegou, em sede de prejudicial, inocorrência da prescrição, eis que o contrato que não constitui uma obrigação líquida, e, por essa razão, não seja título executivo, estaria sujeito ao prazo prescricional de 10 (dez) anos, previsto no art. 205, caput do Código Civil brasileiro; o vencimento antecipado da dívida não poderia lastrear o termo inicial da prescrição. Teceu comentários sobre a atividade bancária e do equilíbrio econômico-financeiro das atividades; os contratos teriam força obrigacional; o Embargante deveria ser intimado a comparecer a uma agência onde fora pactuado o contrato, visando obter, pessoalmente, condições atuais de pagamento/parcelamento do débito exequendo e da desnecessidade de perícia contábil.

Embargos recebidos e determinada a intimação da parte ré acerca da Impugnação (fl. 37).

Certidão de decurso de prazo sem manifestação da parte Embargada (fl. 38-vº).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

 

2.      Fundamentação


Examinemos, em primeiro lugar, a exceção de prescrição, levantada pelo Devedor nos embargos monitórios de fl. 28.

Nessa peça de defesa, o Devedor levantou exceção de prescrição quinquenal,  prevista no inciso I do § 5º do art. 206 do atual Código Civil, eis que, entre a sua inadimplência, datada de 04.09.2006, e a o ajuizamento da presente Ação Monitória, teria transcorrido prazo superior a 5 (cinco) anos.

 

A C E F alega que ao caso não se aplica o prazo do mencionado dispositivo do novo Código Civil brasileiro, mas sim o prazo do art. 205 do desse Código, porque a dívida do Devedor, ora Réu-Embargante,  não seria líquida, mas sim ilíquida.

 

Data venia, tenho que a C E F não está com a razão, porque a dívida em questão é líquida e certa, como líquido e certo é o crédito dela decorrente, crédito esse que apenas não goza do atributo de executividade, e é por isso que está sendo cobrada via ação monitória.

 

Aliás, conforme se extrai do art. 1.102-A do código de processo civil,  utiliza-se desse tipo de ação todo Credor que pretende receber o pagamento de soma em dinheiro, sem força executiva, mas em valor líquido, pois se não fosse líquido teria que se utilizar de ação de conhecimento.

Resta, examinar, se o crédito em questão estava realmente prescrito, quando da propositura desta ação.

 
Trata-se de contrato bancário de crédito rotativo que, segundo o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça, não goza do atributo de executividade(Súmulas 233 e 247 desse E. Tribunal), embora gere dívida líquida e certa.

 

É tanto que a C E F, conforme consta da sua petição inicial,  está a cobrar do ora Réu o valor de R$ 22.508,57, em decorrência de não pagamento desde 04.09.2006, tendo inclusive instruído mencionada peça com demonstrativo de crédito, acostado à fl. 12 dos autos, onde realmente consta que a inadimplência deu-se a partir da referida data.

 

Logo, o prazo prescricional de cinco anos passou a fluir a partir de 05.09.2006, tendo se completado em 05.09.2011, de forma que quando a C E F propôs esta ação monitória, em 23.07.2012(v. fl. 02), a sua pretensão de exigir[1] o seu crédito já se encontrava fulminada pela prescrição quinquenal, prevista no invocado inciso I do § 1º do art. 206 do vigente Código Civil.

 

         E realmente aplica-se, neste caso, o prazo desse dispositivo do novo Código Civil, porque, levando-se em consideração as regras de direito intertemporal do seu art. 2.028(“Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor[2], já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada”), verifica-se que, quando esta ação foi proposta, em 23.07.2012(v. fl. 02), a partir do dia seguinte ao vencimento da dívida, qual seja, a partir de 05.09.2006 até 23.07.2012 ainda não havia transcorrido “mais da metade do tempo estabelecido” na Lei revogada que, para o caso concreto, era o art. 177 do revogado Código Civil de 1916[3], o qual fixava o prazo de 20(vinte)anos para ações pessoais. Realmente, note-se que entre 05.09.2006 e 23.07.2012 ainda não havia transcorrido o período de 10(dez)anos e 1(um)dia, que seria “mais da metade do tempo estabelecido”  da Lei revogada.  

 

         E também não é possível aplicar o prazo de 10(dez)anos do art. 205 do novo Código Civil, como pretendido pela Caixa Econômica Federal-CEF na sua impugnação aos embargos monitórios,  porque esse prazo só se aplica para casos em que não haja, nesse novo Código, nem em Lei extravagante, um prazo específico.

 

            Ora, como demonstrado, para o caso concreto há regra legal específica, o acima invocado inciso I do § 1º do art. 206 do novo Código Civil, que fixa prazo específico de 5(cinco)anos.

 

Então, como já dito acima, quando a C E F propôs esta ação, em 23.07.2012, sua pretensão de exigir o crédito em questão já tinha sido fulminada pela prescrição quinquenal, porque já transcorridos cinco anos entre o início da fluência do prazo prescricional(05.09.2006)e a referida data(23.07.2012).

 

           Nesse sentido vem se firmando a jurisprudência do E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, conforme r. julgados que seguem:

 

CIVIL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO MONITÓRIA. PRESCRIÇÃO. CRÉDITO LÍQUIDO. INSTRUMENTO PARTICULAR. ARTS. 206, PARÁGRAFO 5º, INCISO I E 2.028 DO CÓDIGO CIVIL. ACOLHIMENTO DA PREJUDICIAL DE MÉRITO.

1. Cinge-se a controvérsia recursal à insurgência da Caixa Econômica Federal em face de sentença judicial singular que nos autos de ação monitória, extinguiu o processo com julgamento do mérito, acolhendo a prejudicial de prescrição, a teor do art. 209, inciso IV do CPC.

2. O prazo prescricional quando se pretende a cobrança de débito referente à inadimplência de contrato de crédito rotativo, tratando-se, pois, de cobrança de dívida líquida constante no instrumento contratual firmado entre as partes, deve ser quinquenal, nos termos do art. 206, parágrafo 5º, I, do Código Civil.

3. O art. 2.028 do Código Civil é expresso ao invocar a possibilidade de aplicação do prazo anterior, reduzido pelo novo, quando apenas tiver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada, quando seria aplicável à hipótese fática o art. 177 que previa um prazo de 20 (vinte) anos.

4. Entretanto, considerando que na hipótese fática apresentada a inadimplência se efetivou em 07.12.2002, no dia de entrada em vigor do Novo Código Civil, 11 de janeiro de 2003, que reduziu o prazo de prescrição para cobrança de crédito líquido contratual para 5 anos, não havia sequer transcorrido do prazo anterior, em face do que a inovação legislativa deve ser aplicada.

5. Considerando que o termo inicial da inadimplência se efetivou em 07.12.2002 e tendo a ação monitória sido proposta em 18.12.2007, há de se verificar o transcurso de mais de cinco anos, tendo prescrevido a pretensão de cobrança.

6. Apelação da Caixa Econômica Federal conhecida, mas não provida.

(PROCESSO: 200780000081760, AC493502/AL, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, JULGAMENTO: 15/06/2010, PUBLICAÇÃO: DJE 22/06/2010 - Página 227)

 

ROTATIVO. INEXISTÊNCIA DE CITAÇÃO VÁLIDA. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.

1.  A CEF ajuizou ação monitória objetivando a cobrança de dívida no valor de R$23.385,06, resultante de Contrato de Crédito Rotativo Cheque Azul firmado com os promovidos.

2. Inexistência de citação válida, eis que os réus não foram encontrados nos endereços indicados e a CEF não requereu a citação por edital, razão pela qual continuou a fluir o prazo prescricional, nos termos do art. 219, parágrafo 4º, do CPC.

3. No tocante à prescrição, o art. 177 do Código Civil de 1916 previa o prazo prescricional de 20 anos para as ações pessoais. Ocorre que esse prazo foi reduzido pelo novo Código Civil, restando ressalvados os casos em que já houvesse transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada quando da entrada em vigor do novo diploma legal, conforme estabelecido no art. 2.028, do Código Civil de 2002.

4.  In casu, na data da entrada em vigor do Código Civil de 2002 (11/01/2003) ainda não havia transcorrido mais da metade do prazo prescricional, devendo ser observadas, por conseguinte, as disposições constantes desse diploma normativo.

5. Consoante art. 206, parágrafo 5º, I, do Código Civil, é de 5 (cinco) anos o prazo para cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular.

6. Considerando que transcorreram mais de cinco anos da data da vigência do Código Civil de 2002 (11/01/2003) sem que houvesse sido efetivada a citação interruptiva do prazo prescricional, impõe-se reconhecer a prescrição da pretensão autoral.

7. Apelação improvida.(PROCESSO: 200481000209704, AC489733/CE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 03/05/2012, PUBLICAÇÃO: DJE 11/05/2012 - Página 157) (original sem grifos).

 

3.      Conclusão

 

POSTO ISSO:

a)                       acolho a exceção de prescrição da pretensão da C E F de exigir o crédito em debate, exceção essa levantada pelo Embargante nos embargos monitórios,  e dou este processo por extinto, com resolução do mérito(art. 269-IV do Código de Processo Civil);

b)                      condeno a C E F nas custas processuais e em verba honorária que arbitro em 10%(dez por cento)sobre o valor da causa, valor esse que será atualizado, a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, pelos índices de correção monetária do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal, e acrescido de juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento)ao mês, contados todavia apenas da intimação da execução desta sentença, na forma preconizada no art. 475-J do Código de Processo Civil, mas incidentes sobre o valor já monetariamente atualizado.

P.R.I.

 

Recife,  18 de junho de 2013.

 

 

Francisco Alves dos Santos Júnior

  Juiz Federal, 2ª Vara-PE



[1] O que prescreve é a pretensão de exigir, conforme art. 189 do novo Código Civil do Brasil, o qual, neste particular, seguiu o Código Civil alemão. O crédito persiste, é tanto que, caso o Devedor, por mera liberalidade, queira pagá-lo, nada o impede de fazê-lo. Todavia, o Credor não pode exigir, porque o crédito persiste sem o atributo da exigibilidade. Mesmo antes do atual Código Civil, que é de 2002, sustentamos esse ponto de vista em nossa dissertação de mestrado na Faculdade de Direito do Recife da Universidade Federal de Pernambuco(FDRUFPE), que foi publicada em livro, sob o título de Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil: análise das principais teorias existentes e proposta para alteração da respectiva legislação. Rio de Janeiro, Renovar, 2001, encontrando-se o assunto na sua p. 48.
 
[2] O novo Código Civil do Brasil, que é de 2002, por força do seu art. 2044, entrou em vigor em 12.01.2003, qual seja, um ano depois da sua publicação, que se deu em 11.01.2013.
 
[3] Código Civil de 1916:
  “Art. 177. As ações pessoais prescrevem, ordinàriamente, em vinte anos, as reais em dez, entre presentes e entre ausentes, em quinze, contados da data em que poderiam ter sido propostas.”.
 
 

segunda-feira, 17 de junho de 2013

ENSINO SUPERIOR PRIVADO. TAXAS QUE NÃO PODEM SER COBRADAS DOS ALUNOS.


 
Por Francisco Alves dos Santos Jr

   Segue decisão, lançada nos autos de uma ação civil pública, proposta pelo Ministério Público Federal de Pernambuco contra a determinada Entidade privada de Ensino Superior, buscando proibir esta de cobrar dos seus alunos determinadas taxas não previstas em Lei e cujos respectivos serviços já têm seus custos cobertos pelas mensalidades ou semestralidades pagas pelos alunos.
   Na decisão, indica-se também o que pode ser cobrado à parte, além das mensalidades ou semestralidades.
    Boa leitura!



PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2ª VARA

 

Processo nº 0005792-31.2013.4.05.8300

Classe:    1 AÇÃO CIVIL PÚBLICA

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RÉU: A V I DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA

 

C O N C L U S Ã O

 

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

 

Recife, 13/06/2013

 

Encarregado(a) do Setor

 

 

D E C I S Ã O

 

1-                   Relatório

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ingressou com esta “AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR” em face da A V DO IDE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE J L F DE CIÊNCIAS APLICADAS). Alegou, em síntese, que em 13.03.2013, teria sido instaurado na Procuradoria da República em Pernambuco o Procedimento Administrativo nº 1.26.000.000766/2013-55, com a finalidade de apurar possíveis irregularidades cometidas pela Instituição de Ensino Superior Faculdade J L F de Ciências Aplicadas, no que diz respeito à cobrança de taxas para expedição de documentos escolares, assim como para a realização de outras medidas inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada; que a Faculdade José Lacerda Filho de Ciências Aplicadas teria confirmado que, de fato, cobraria as taxas internas de seus alunos, contudo, teria ressaltado que a cobrança estaria prevista no Contrato de Prestação de Serviços Educacionais. Sustentou a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público Federal e o cabimento da presente ação civil pública, assim como a competência da Justiça Federal para apreciar e julgar o presente feito, e aduziu que a natureza de ente privado, por si só, não seria hábil para excluir a demandada da incidência das normas constitucionais e legais, tampouco o fundamento de que a livre iniciativa lhe permitiria escapar dos regramentos impostos pelas normas legais da educação nacional, cujo cumprimento seria condição para que o serviço educacional fosse prestado no âmbito da iniciativa privada; que a cobrança de taxas para a emissão de documentos acadêmicos, assim como para a realização de outros serviços também inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada, é pratica que não se coadunaria com a legislação vigente; que os serviços prestados por uma Instituição de Ensino Superior – IES, via de regra, seriam remunerados pelas anuidades, semestralidades ou mensalidades, e deveriam estar obrigatoriamente inclusos na referida contraprestação todos os serviços inerentes ao objetivo da prestação escolar; que a Lei nº 9.870/99 teria revogado a Lei nº 8.170/91, que preveria a existência e o modo de fixação dos encargos educacionais nos estabelecimentos particulares de ensino de nível pré-escolar, fundamental, médio e superior, e estipulava a forma de reajuste, e autorizava a intervenção da Delegacia Regional do MEC; que, se a nova lei revogou a anterior e passou a prever, como forma de remuneração das IESs apenas as anuidades e a semestralidades, seria evidente o propósito do legislador de extinguir os encargos educacionais antes existentes; que, no mesmo sentido estariam inclinadas as Resoluções nºs 01/83 e 03/89, editadas pelo extinto Conselho Federal de Educação, que, ao tratar dos encargos pagos aos alunos às IESs, preconizariam que a anuidade/mensalidade escolar constituiria a contraprestação pecuniária correspondente à educação ministrada e à prestação de serviço a ela diretamente vinculados, enquanto a taxa escolar remuneraria, a preço de custo, apenas os serviços extraordinários efetivamente prestados pelo corpo discente; que apesar de tais resoluções terem sido revogadas pelo Conselho Nacional de Educação, permaneceriam íntegros os balizamentos postos à disciplina das taxas cobradas pelas IESs; que seria inconstitucional a cobrança de taxa para emissão de certidões que visam esclarecer situações de interesse pessoal; que também seria inadequada a cobrança de taxa para prestação de outros serviços inerentes à prestação educacional, como a realização de segunda chamada, quando motivada pro fatores excepcionais (saúde, por exemplo), que impediram o aluno de se submeter ao exame regular; que o mesmo raciocínio seria aplicável à revisão de prova, que constituiria um direito do aluno e seria inerente à prestação do serviço de ensino; que a cobrança de taxa pela transferência do aluno da IES seria expressamente vedada pela Portaria nº 230/2007 do MEC; que os preços cobrados seriam desproporcionais ao serviço prestado. Invocou o Código de Defesa do Consumidor e acrescentou que a previsão contratual de cobrança das taxas referidas seria nula de pleno direito. Transcreveu ementas de decisões judiciais. Teceu outros comentários, e requereu a concessão da medida liminar para que seja determinado à Ré que: suspenda imediatamente a cobrança de qualquer tipo de prestação pecuniária, como condição para emissão de documentos escolares, como ementa de disciplina, declaração de vínculo, histórico escolar, certidão de notas, declaração de conclusão de curso, declaração de regime de aprovação, declaração de frequência, declaração de aprovação no vestibular, declaração de horário de prova, declaração de quitação de mensalidades, dentre outros documentos que constituem decorrência lógica da prestação educacional, assim como para a realização de outros serviços também inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada, tais como realização de segunda chamada, revisão de prova, dentre outros. A petição inicial veio acompanhada de duas pastas: uma pasta da cor amarela contendo o Inquérito Civil nº 018/2011 (Peças de Informação) e a outra pasta da cor branca contendo o IC nº 018/2011.

 

2-                   Fundamentação

 

2.1) O Ministério Público Federal pretende compelir a A V I DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE J L F DE CIÊNCIAS APLICADAS), a cumprir obrigação de não fazer, consistente na abstenção de cobrança de taxas de seus discentes, a exemplo dos valores exigidos para a expedição de declaração de conclusão de curso, histórico escolar, revisão de prova, e outros que constituam decorrência lógica da prestação educacional.

 

2.2) A Resolução nº 01/83 e também a Resolução nº 03/89, ambas do ora extinto Conselho Federal de Educação (atual Conselho Nacional de Educação), evocadas na Petição Inicial desta ACP, definem os encargos educacionais do corpo discente das Instituições de Ensino Superior, nos seguintes termos:

 

Resolução nº 01, de 1983:

 

Art. 2º. Constituem encargos educacionais de responsabilidade do corpo discente:

I – a anuidade;

(...) § 1º. A anuidade escolar, desdobrada em 2 (duas) semestralidades, constitui a contraprestação pecuniária correspondente à educação ministrada e à prestação de serviços a ela diretamente vinculados, como a matrícula, estágios obrigatórios, utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino e uso coletivo, material destinado a provas e exames, 1ª via de documentos para fins de transferência, certificados ou diplomas (modelo oficial) de conclusão de curso, de identidade estudantil, de boletins de notas, de cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas.

 

     Resolução nº 03, de 1989:

 

Art. 4º. Constituem encargos educacionais de responsabilidade do corpo discente:

I – a mensalidade

II- a taxa

III- a contribuição.

 

 (...) § 1º. A mensalidade escolar constitui a contraprestação pecuniária, correspondente à educação ministrada e à prestação de serviços a ela diretamente vinculados como matrícula, estágios obrigatórios, utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino de uso coletivo, material destinado a provas e exames, de certificados de conclusão de cursos, de identidade estudantil, de boletins de notas, cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas.

 

Tratou também do assunto, mais recentemente, a Portaria Normativa nº 40[1], de 12 de dezembro de 2007, expedida pelo Ministro de Estado da Educação, no §4º do seu art. 32, proíbe que as IES exijam pagamento pela expedição e registro de diplomas e de certificados de conclusão de cursos, por considerar tais serviços incluídos nos serviços educacionais prestados pelas Instituições de Ensino, verbis:

 

§ 4º A expedição do diploma e histórico escolar final considera-se incluída nos serviços educacionais prestados pela  instituição, não ensejando a cobrança de qualquer valor, ressalvada a hipótese de apresentação decorativa, com a utilização de papel ou tratamento gráfico especiais, por opção do aluno.

 

Também recentemente, a Portaria nº 230[2], de 9 de março de 2007, expedida pelo  Ministro de Estado da Educação, no seu art. 2º, veda a cobrança de taxa de matrícula como condição para apreciação e pedidos de emissão de documentos de transferência para outras instituições.

 

Portanto, à luz das Resoluções nºs 01/83 e 03/89, ambas do ora extinto Conselho Federal de Educação, e, ainda, da Portaria Normativa nº 40 e da Portaria nº 230, estas duas últimas do Ministro de Estado da Educação, não podem ser cobrados do corpo discente da ASSOCIAÇÃO VALE IPOJUCA DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (Faculdade José Lacerda Filho de Ciências Aplicadas): o pagamento pela expedição de diploma, expedição de histórico escolar, utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino de uso coletivo, material destinado a provas e exames, 1ª via de documentos para fins de transferência de certificados ou diplomas (modelo oficial) de conclusão de curso, de identidade estudantil, de boletins de notas, de cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas, bem como a taxa de matrícula como condição para apreciação e pedidos de emissão de documentos de transferência para outras instituições.

 

Também não pode ser cobrada dos alunos taxa para realização de exames finais, porque esses exames fazem parte da regular atividade de qualquer estabelecimento de ensino, sendo, por isso, coberto pela mensalidade ou anuidade paga pelo Aluno.

    

2.3.)  As taxas e encargos que podem ser cobrados à margem da mensalidade ou anuidade encontram-se arrolados no § 2º do art. 4º da Resolução nº 03, de 1989, verbis:

 

§2º A taxa escolar remunera, a preços de custos, os serviços extraordinários efetivamente prestados ao corpo discente como a segunda chamada de provas e exames, declarações, e de outros documentos não incluídos no §1º deste artigo, atividades extracurriculares optativas, bem como os estudos de recuperação, adaptação e dependência prestados em horários especiais com remuneração específica para os professores. (G.N.)

     

Acresce o rol desse dispositivo também: os diplomas ou certificados expedidos em modelos não oficiais, decorrentes de escolha do aluno(tais como, em papeis decorativos, em coro de carneiro etc.) e as segundas vias dos documentos relacionados nos dispositivos transcritos no item 2.2 supra. 

        

2.4) Como visto, a mensalidade ou anuidade remunera os chamados serviços ordinários, mencionados no subitem 2.2 supra e a taxa escolar, os serviços extraordinários,  referidos no subitem 2.3 supra.

 

2.5) O E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região e, mais recentemente, o E. Tribunal Regional Federal da 1ª Região, ao apreciar pleitos semelhantes ao veiculado na Petição Inicial, com esteio nas Resoluções acima transcritas, reconheceram a ilegitimidade da cobrança da taxa de emissão de histórico escolar e do certificado de conclusão de curso pelas IES, sob o argumento principal de que tais documentos constituem serviços ordinários e vinculados à atividade educativa, já remunerados pelas mensalidades pagas pelos discentes, verbis: 

 

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DE TAXA PARA EMISSÃO DE HISTÓRICO ESCOLAR E ATESTADO DE CONCLUSÃO DE CURSO. ILEGITIMIDADE. 1. Revela-se ilegítima a cobrança por universidade de taxa para a expedição de histórico escolar e atestado de conclusão de curso. Inteligência das Resoluções 01/83 e 03/89, ambas do Conselho Federal de Educação. Precedentes desta Corte. 2. Remessa oficial desprovida. (REOMS 200738110048768, DESEMBARGADOR FEDERAL FAGUNDES DE DEUS, TRF1 - QUINTA TURMA, 09/07/2010)

 

ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. UNIVERSIDADE PRIVADA. HISTÓRICO ESCOLAR. TAXA. ISENÇÃO. PROCEDÊNCIA.- A despesa realizada pelo aluno com o histórico escolar está definida no parágrafo 1º do art. 4º da Resolução nº 3, de 3.10.1989 do Conselho Federal de Educação, como despesa ordinária, e como tal, incluída já no valor das mensalidades escolares cobradas pela Universidade.- Remessa oficial improvida. (REO 200283000105384, Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante, TRF5 - Primeira Turma, 15/10/2004)

 

Conclusão

 

Posto isso:

 

a) defiro, parcialmente, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, e determino que a ASSOCIAÇÃO VALE DO IPOJUCA DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE JOSÉ LACERDA FILHO DE CIÊNCIAS APLICADAS), ora Ré,  cobre dos seus Alunos apenas a anuidade ou as semestralidades, e que suspenda a cobrança de qualquer outro valor ou encargo, tais como valor para expedição de diploma no impresso e no modelo oficial, certidões em geral, inclusive a de conclusão de curso, revisão de prova ou exame, grade curricular, isenção de disciplina, conteúdo programático, guia de transferência, segunda chamada, provas finais e de quaisquer outros documentos ou serviços próprios de Estabelecimentos de Ensino Superior,  podendo ser cobrado, todavia, à parte, encargo ou valor, correspondente ao custo(entendendo-se como tal o total dos gastos que a Entidade de Ensino teve para adquiri-lo e para fornecê-lo), de diploma em impresso e/ou em modelo diverso do oficial(como em pele de carneiro, cartolina dourada,  etc.), a repetição de quaisquer documentos(segunda via) ou serviços, tanto dos  dados como exemplo ou a duplicidade de outros documentos ou serviços que não tenham sido arrolados entre os exemplos indicados e que sejam próprios dos fornecidos ou prestados por esse tipo de Estabelecimento de ensino, sob pena de exigência de multa, no valor correspondente a 100%(cem por cento)do valor indevidamente cobrado, que será majorada em 10%(dez por cento) sempre que houver reincidência, conforme preconizado no ar. 57 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, aprovado pela Lei nº 8.078, de 11.09.1990, multa essa que será destinada ao Fundo Federal, previsto no art. 13 da Lei nº 7.347, de 1985, sem prejuízo da responsabilização criminal dos Dirigentes da Associação ora Ré e de esta poder vir a sofrer as sanções administrativas do art. 56 daquele Código e também sem prejuízo do direito de o aluno ou pessoa por ele responsável, que tenha pago o valor indevido, reclamar e receber a restituição em dobro desse valor, na forma preconizada no Parágrafo Único do art. 42 do referido Código.

 

b) Cite-se e Intimem-se, na forma e para os fins legais.

 

P.I.

 

Recife, 17 de junho de 2013

 

 

Francisco Alves dos Santos Júnior

     Juiz Federal, 2ª Vara/PE