segunda-feira, 26 de setembro de 2011

MUNICÍPIO. SUSPENSÃO DE INSCRIÇÃO NO SIAFI/CAUC. ATO ILÍCITO DE EX-PREFEITO. OBRIGATORIEDADE DA PROPOSITURA DE TOMADA DE CONTAS ESPECIAL.


           O que deve fazer o Prefeito quando assume a administração de uma Prefeitura e detecta atos irregulares do Prefeito que o antecedeu, sobretudo quando essas irregularidades envolvem recursos federais, decorrentes de convênios que foram firmados com a União? 
         Segue decisão tratando deste importante assunto, que é de grande interesse público, bem como de advogados que trabalhaam na assessoria jurídica de Prefeitos e/ou nas procuradorias municiapis. 

            Obs.: A decisão foi minutada pela Assessora do Gabinete do Juiz da 2ª Vara Federal de Pernambuco, Srta. Sheila Alves de Almeida.

  

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2ª VARA



Processo nº 0011090-72.2011.4.05.8300

Classe:    29 AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO)

AUTOR: PREFEITURA MUNICIPAL DE ESCADA

RÉU: UNIAO FEDERAL



C O N C L U S Ã O



Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) Francisco Alves dos Santos Júnior


Recife, 09/09/2011

Encarregado(a) do Setor


D E C I S Ã O


1-   Relatório

Trata-se de ação ordinária proposta pelo Município de Escada/PE em face da União (AGU-PRU), com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, em que se requer a suspensão das restrições junto ao SIAFI/CAUC decorrentes da inadimplência do Município em razão da não prestação de contas de convênio firmado entre as partes relativo aos anos de 1993/1996, que teve como objeto a alimentação escolar.

O Município autor alega que o referido convênio foi formalizado e teve sua total execução na época em que era gestor da edilidade o ex-prefeito J. A. da S. e que pelo fato deste não ter apresentado a prestação de contas regularmente, não poderia haver prejuízos à municipalidade, já que esta, por se encontrar inadimplente perante o SIAFI/CAUC, estava impedida de receber investimentos/transferências de recursos federais e participar de outros convênios.

Argumenta que a responsabilidade pela ausência de prestação de contas deve ficar restrita à esfera do ex-gestor e não alcançar o Município. Outrossim, afirma que o atual gestor tomou as providências necessárias para perseguir o ressarcimento ao erário, de modo que  procedeu com representação perante o Ministério Público Federal (MPF) e também ajuizou ação própria para recomposição do patrimônio público. Trouxe à baila entendimentos jurisprudenciais para reforço de sua tese.

É o relatório, no essencial.

Decido.

2. Fundamentação

Atualmente, muitas ações vem se repetindo com o mesmo objeto da presente lide, qual seja, impedir que o fato de não haver prestação de contas de convênios pactuados por ex-gestores municipais, redunde em manutenção dos municípios faltantes nos cadastros restritivos federais, a exemplo do SIAFI/CAUC, de forma a obstar as edilidades de auferir recursos federais ou travar novos convênios.

O cerne da presente demanda consiste em estabelecer se os registros de irregularidades do Município Autor junto ao CAUC/SIAFI merecem ser suspensos ou não, de modo a possibilitar o repasse de recursos federais, bem como a contratação de novos convênios.

         A Instrução Normativa STN nº 01/1997 traz, em seu art. 5º[1], inc. I, vedação expressa quanto à celebração de convênios, efetivação de transferências ou concessão de benefícios de qualquer modalidade para entidades que estejam em mora, inadimplentes em relação a outros convênios ou não estejam em situação de regularidade com a União ou com a Administração Pública Federal Indireta.

Tal restrição, no entanto, é excetuada nas hipóteses de falta de apresentação ou de não aprovação de contas referentes aos recursos recebidos pela entidade, desde que o atual administrador não seja o faltoso e desde que sejam adotadas as seguintes medidas: a) instauração de tomada de contas especial, com imediata inscrição, pela unidade de contabilidade analítica, do potencial responsável em conta de ativo 'Diversos Responsáveis'; b) comprovação semestral de que as ações adotadas continuam prosseguindo regularmente.

Nesta senda, na impossibilidade de o novo Prefeito Municipal proceder à apresentação das contas faltosas, deverá ele adotar as medidas legais necessárias ao resguardo do patrimônio público, nos termos da Súmula 230[2] do Tribunal de Contas da União (TCU), promovendo a instauração de Tomada de Contas Especial, mediante requerimento ao órgão competente para tanto, qual seja, o TCU.

No caso dos autos, muito embora o Município Autor tenha demonstrado que procedeu com representação junto ao Ministério Público Federal contra o ex-gestor da edilidade, bem como ajuizou ação própria visando ao ressarcimento do erário público (Processo nº 0011089-87.2011.4.05.8300, em tramitação na 5ª Vara Federal desta Seção Judiciária), o atual gestor não provou ter requerido ao Tribunal de Contas da União a tomada de contas especial, tal como orienta a súmula deste órgão de fiscalização financeira e exige a supracitada instrução normativa aplicável à espécie.

É, aliás, nesse mesmo sentido que vem se fixando a jurisprudência nacional, como se segue:

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELA ALÍNEA "C" DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA. IRREGULARIDADES NA PRESTAÇÃO DE CONTAS DE GESTÃO ANTERIOR. BLOQUEIO DE TRANSFERÊNCIAS VOLUNTÁRIAS AO MUNICÍPIO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1-2. (omissis) 3. Para que a entidade municipal, dirigida por outro administrador que não o faltoso, possa ser liberada para receber novas transferências é indispensável que: a) seja "comprovada a instauração da devida tomada de contas especial, com imediata inscrição, pela unidade de contabilidade analítica, do potencial responsável em conta de ativo 'Diversos Responsáveis'" (art. 5º, § 2º, IN 01/97) e b) o novo dirigente comprove, "semestralmente ao concedente, o prosseguimento das ações adotadas, sob pena de retorno à situação de inadimplência" (art. 5º, § 3º, IN 01/97). 4. Hipótese na qual o Tribunal de origem concluiu, com base na prova dos autos: a) o Município comprovou que adotou as providências cabíveis para responsabilizar o ex-prefeito pelos atos que ocasionaram a inadimplência e b) a suspensão da inscrição no SIAFI permanecerá enquanto continuarem sendo adotadas as providências cabíveis pela atual administração. A revisão desse entendimento implica reexame de fatos e provas, obstado pelo teor da Súmula 7/STJ. 5. Agravo Regimental não provido.” (AGA 200702209220, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, 20/04/2009). GRIFEI.
        

Desta feita, entendo escassa de verossimilhança as alegações do município postulante.

Oportuno destacar que a parte autora apenas deduziu o pedido inicial em face da União (AGU-PRU). Acontece que, como se extrai dos documentos acostados aos autos (fl. 15), é o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação a entidade com a qual o município realizou o convênio ora em discussão nestes autos, relativo ao Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE, tanto é assim que na anotação constante no CAUC (fl.20) a referida autarquia aparece como “concedente”. 

Desse modo, o FNDE, autarquia vinculada ao Ministério da Educação, deve integrar o polo passivo da presente lide, na qualidade de litisconsorte passivo necessário (art. 47, parág. único, do CPC), de forma que deve o Município demandante promover sua citação para os fins legais pertinentes.

3. Dispositivo


Posto isso, indefiro o pedido pela antecipação dos efeitos da tutela requestada.

Cite-se a União (AGU-PRU) na forma legal.

Quanto ao FNDE, promova o Município autor a devida citação, no prazo de 10 (dez) dias, conforme acima restou assentado, sob pena de extinção do feito sem resolução do mérito (art. 47, parág. único, do CPC), por falta de pressuposto válido para o regular desenvolvimento do processo.

Intimações necessárias.


Recife, 20 de setembro de 2011.


Francisco Alves dos Santos Júnior

   Juiz Federal, 2ª Vara-PE













[1] “Art. 5º É vedado:
I - celebrar convênio, efetuar transferência, ou conceder benefícios sob qualquer modalidade, destinado a órgão ou entidade da Administração Pública Federal, estadual, municipal, do Distrito Federal, ou para qualquer órgão ou entidade, de direito público ou privado, que esteja em mora, inadimplente com outros convênios ou não esteja em situação de regularidade para com a União ou com entidade da Administração Pública Federal Indireta;
(...)
§ 1º Para os efeitos do item I, deste artigo, considera-se em situação de inadimplência, devendo o órgão concedente proceder à inscrição no cadastro de inadimplentes do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal - SIAFI e no Cadastro Informativo - CADIN, o convenente que:
I - não apresentar a prestação de contas, final ou parcial, dos recursos recebidos, nos prazos estipulados por essa Instrução Normativa;
II - não tiver a sua prestação de contas aprovada pelo concedente por qualquer fato que resulte em prejuízo ao erário.
III - estiver em débito junto a órgão ou entidade, da Administração Pública, pertinente a obrigações fiscais ou a contribuições legais.
§ 2º Nas hipóteses dos incisos I e II do parágrafo anterior, a entidade, se tiver outro administrador que não o faltoso, e uma vez comprovada a instauração da devida tomada de contas especial, com imediata inscrição, pela unidade de contabilidade analítica, do potencial responsável em conta de ativo "Diversos Responsáveis", poderá ser liberada para receber novas transferências, mediante suspensão da inadimplência por ato expresso do ordenador de despesas do órgão concedente. (Redação alterada p/ IN 5/2001)
§ 3º O novo dirigente comprovará, semestralmente ao concedente o prosseguimento das ações adotadas, sob pena de retorno à situação de inadimplência.” (grifei)

[2] Súmula 230 do TCU: “Compete ao prefeito sucessor apresentar as contas referentes aos recursos federais recebidos por seu antecessor, quando este não o tiver feito ou, na impossibilidade de fazê-lo, adotar as medidas legais visando ao resguardo do patrimônio público com a instauração da competente Tomada de Contas Especial, sob pena de co-responsabilidade.”

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

DESVINCULAÇÃO DE RECEITA DA UNIÃO-DRU: NATUREZA NÃO TRIBUTÁRIA. NÃO INTEGRAÇÃO NO FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS-FPM

Segue uma sentença, já um tanto antiga, pois do ano de 2007. Mas o tema nela tratado continua atual, pois a validade da DRU encontra-se estendida para este ano de 2011, pela Emenda Constitucional nº 56, de 20.12.2002, e certamente, no final deste ano, será prorrogado por mais alguns anos.
O Partido dos Trabalhadores, quando era oposição, fez de tudo para acabar com essa figura constitucional, mas, chegando ao poder, mudou de idéia e vem fazendo como os demais, aprovando sua prorrogação.
Com base nele, o(a) Presidente da República tem, à disposição, 20% do total das receitas dos impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, para gastar como lhe aprouver.
Na sentença que segue, há um debate sobre sua integração ou não no valor que serve de base para cálculo do Fundo de Participação dos Municípios-FPM.
Boa leitura.


PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA


Juiz Federal : Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2006.83.00.009343-0 - Classe 29 – Ação Ordinária
Autor: MUNICÍPIO DE JOAQUIM NABUCO – PE
Adv.: B R P M, OAB/PE ...
Réu: UNIÃO FEDERAL (Fazenda Nacional)

Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2007.


Sentença tipo A



Ementa: - DIREITO CONSTITUCIONAL. DESVINCULAÇÃO DE RECEITA DA UNIÃO-DRU. NATUREZA JURÍDICA.

A verba decorrente da Desvinculação de Receita da União-DRU, prevista no art. 76 do ADCT da Constituição da República, não tem natureza tributária, não corresponde a adicional de imposto de renda, e não se integra na base de cálculo das verbas que compõem o Fundo de Participação dos Municípios-FPM.

Improcedência

Vistos etc.

MUNICÍPIO DE JOAQUIM NABUCO, qualificado na Inicial, ajuizou, em 06.07.2006, a presente “AÇÃO ORDINÁRIA DECLARATÓRIA COM PEDIDO URGENTE DE TUTELA ANTECIPADA”(sic) em face da UNIÃO (FAZENDA NACIONAL). Alegou, em síntese, que sua principal fonte de receita adviria do Fundo de Participação dos Municípios – FPM, composto por 22,5% do valor arrecadado a título de IR e IPI; que o IR possuiria como um dos fatos geradores o lucro das pessoas jurídicas, que também seria fato gerador da CSLL; que a destinação dada às contribuições sociais é que lhes conferiria o caráter de contribuição social; que as Emendas Constitucionais nºs 27/00 e 42/03 teriam alterado a destinação de 20% dos recursos das contribuições sociais entre 2000 e 2007; que, portanto, se a CSLL teve parte de seus recursos constitucionais desvinculados de órgão, fundo ou despesa, teria adquirido a feição de imposto na parcela que foi desvinculada, e, desse modo, as mencionadas emendas constitucionais teriam criado um adicional do IR transfigurado em CSLL; que o respeito ao FPM seria vital à manutenção da forma federativa de Estado, pois o FPM seria responsável pela receita mais pujante dos municípios, sobretudo os mais pobres; que, com base no disposto na alínea b do inciso I do art. 159 da Constituição/88, o Município-Autor teria direito de perceber sua parcela de FPM, adicionando em seu cálculo os 20% arrecadados a título de CSLL destinados à Conta única do Tesouro Nacional tal qual o IR; que teria direito de perceber sua parcela de FPM, adicionando em seu cálculo os 20% arrecadados a título de CSLL, destinado à Conta Única do Tesouro Nacional tal qual o IR. Teceu outros comentários e requereu: a concessão da tutela antecipada declarando o suposto direito do Município Autor de receber o valor devido pelo repasse do FPM mensal adicionando em sua base de cálculo o valor recolhido a título de CSLL decorrentes da desvinculação de 20% dos recursos arrecadados destinado à Conta Única do Tesouro Nacional; a citação da União; a intimação da União para dar cumprimento à decisão. No mérito, a confirmação do pedido liminar, obrigando a União a repassar os valores a título de CSLL, decorrentes da desvinculação de 20% dos recursos arrecadados desde o início da vigência da EC 27/2000, destinados à Conta Única do Tesouro Nacional, devidamente atualizado pela SELIC; a condenação da parte demandada ao pagamento das custas e honorários advocatícios. Protestou o de estilo. Deu valor à causa e instruiu a Inicial com instrumento de procuração e documentos, fls. 21/30.
O pedido de antecipação da tutela jurisdicional ficou para ser apreciado após a manifestação da União, no prazo de 72 (setenta e duas) horas, fls. 31.
Devidamente intimada, a União manifestou-se às fls. 37/41, pugnando pelo indeferimento do pedido de antecipação da tutela jurisdicional.
Citada, a União apresentou Contestação (fls. 43/47), argüindo prejudicial de prescrição qüinqüenal dos supostos créditos da parte autora, nos moldes do art. 1º do Decreto nº 20.910/32, e requereu a extinção do processo com resolução do mérito. No mérito, alegou, em suma, que, diferentemente do que teria sido alegado na Inicial, as EC nºs 27/00 e 42/03 não teriam criado um adicional de Imposto de Renda; que o art. 76 do ADCT/88 teria criado a denominada Desvinculação das Receitas da União (DRU), que significaria que a própria Constituição prescreveria a possibilidade dos valores arrecadados por meio de tributos fossem aplicados da forma desejada pela União, e, portanto, não teria havido a criação de qualquer adicional de IR; que, para ser criado um adicional de IR seria necessária a promulgação de uma lei e, acaso acatada a tese do Autor, estar-se-ia criando tributo por meio de analogia, o que seria vedado pelo Código Tributário Nacional. Teceu outros comentários e requereu: o acolhimento da prejudicial de prescrição; a improcedência dos pedidos; e a condenação do Autor nas verbas de sucumbência.
O Autor apresentou Réplica, fls. 49/63.
O Autor ingressou com petição juntando cópia de decisão judicial, fls. 65 e 66/81, respectivamente.
Decisão interlocutória pronunciando a prescrição das verbas anteriores a 06.07.2001 e indeferindo o pedido de antecipação da tutela jurisdicional, fls. 82/83.
Cópia da decisão proferida nos autos do IVC nº 2006.83.00.0108615, julgando procedente o pedido, majorando o valor da causa e constatando a desnecessidade de complementação das custas por se tratar de Ente isento, fls. 86.
Instado a dizer se pretendia fazer prova pericial, o Autor ingressou com a petição de fls. 88 pugnando pelo julgamento antecipado da lide.
Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

Fundamentação

A Desvinculação de Receita da União-DRU(que foi antecedida pelo Fundo Social de Emergência e pelo Fundo de Estabilização Fiscal) consiste em permitir que a UNIÃO utilize 20% de determinadas receitas tributárias, já deduzidas as parcelas das transferências constitucionais obrigatórias dos Estados e dos Municípios, em finalidades sociais, educacionais e de saúde pública, pelo período de 2003 a 2007.

O assunto encontra-se atualmente regido no art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias-ADCT da atual Constituição da República, com redação dada pela Emenda Constitucional nº. 42, de 19.12.2003.

Eis a íntegra do mencionado dispositivo constitucional:

“Art. 76. É desvinculado de órgão, fundo ou despesa, no período de 2003 a 2007, vinte por cento da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou que vierem a ser criados no referido período, seus adicionais e respectivos acréscimos legais. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
§ 1º O disposto no caput deste artigo não reduzirá a base de cálculo das transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios na forma dos arts. 153, § 5º; 157, I; 158, I e II; e 159, I, a e b; e II, da Constituição, bem como a base de cálculo das destinações a que se refere o art. 159, I, c, da Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
§ 2o Excetua-se da desvinculação de que trata o caput deste artigo a arrecadação da contribuição social do salário-educação a que se refere o art. 212, § 5o, da Constituição.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 27, de 2000)”.

Trata-se, como dito na decisão de fls. 82-83, de mero arranjo administrativo-orçamentário de emergência, transitório, autorizado pelo Legislador Constituinte Derivado, não tendo o resultado dessa operação natureza tributária, porque não se trata de mais um tributo a ser exigido dos Contribuintes.

Com a instituição da Desvinculação de Receita da União-DRU, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não sofreram qualquer prejuízo, porque o § 1º do art. 76 do ADCT, acima transcrito, estabeleceu que, antes de se fazer o cálculo dos 20% dessa desvinculação de receita, fossem deduzidas as parcelas das transferências constitucionais obrigatórias devidas a essas Unidades da Federação, por força dos artigos 157-159 da Constituição da República.

A tese da petição inicial, segundo a qual a parcela da Desvinculação de Receita da União-DRU incidente sobre o total das receitas da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, seria um “adicional de imposto de renda”, data venia do I. Subscritor da referida peça, não encontra nenhum sustentáculo no nosso direito constitucional-tributário, que exige expressa autorização no texto da Constituição da República para a instituição de qualquer tributo, especificamente adicional de imposto de renda e, se houvesse essa competência constitucional, esse adicional, como bem lembrado na defesa da UNIÃO, para ser exigido, teria que ser instituído por Lei de sua competência, pois não se pode exigir tributo sem observância do princípio da legalidade(art. 150, I, da Constituição da República).

E se fosse possível caracterizar referida parcela como adicional de imposto de renda, ainda assim não se poderia obrigar a UNIÃO a integrar o respectivo montante na base de cálculo das verbas que compõem o Fundo de Participação dos Municípios-FPM, porque para tanto teria que haver regra expressa na Constituição da República e não se vê esse “adicional” no rol dos artigos 158 e 159 dessa Carta, quanto trata das transferências constitucionais obrigatórias para os Municípios.

Portanto, não pode prosperar o pedido da petição inicial, no sentido de fazer mencionada integração.

Conclusão

Posto isso, julgo improcedentes os pedidos desta ação e condeno o Município-Autor em verba honorária, que arbitro em 10%(dez por cento) do valor da causa, fixado em R$ 479.065,00 na decisão lançada nos autos da impugnação ao valor da causa, processo nº. 2006.83.00.01086515, cuja cópia se encontra às fls. 86, atualizado a partir do mês seguinte ao em que referida decisão foi lançada, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, mais juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados, todavia, da data da citação da execução desta sentença(art. 219 c/c art. 730 do Código de Processo Civil), mas sobre o valor já monetariamente corrigido.

Sem custas, porque o Município-autor goza de isenção legal.

P. R. I.

Recife, 07 de dezembro de 2007


FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
Juiz Federal, 2ª Vara-PE

terça-feira, 30 de agosto de 2011

HOMOAFETIVIDADE E O DIREITO PREVIDENCIÁRIO

   No início de agosto, você encontra neste blog sentença deste Magistrado, reconhecendo o direito de uma mulher receber pensão previdencária em decorrência do falecimento de sua companheira, com a qual vivia em união estável. 

   O assunto, envolvendo outro processo,  chegou ao Supremo Tribunal Federal e sua segunda turma decidiu pela primeira vez a matéria, adotando o mesmo entendimento acolhido naquela nossa sentença.

   Segue a notícia sobre a decisão da Suprema Corte.  

 "Supremo mantém direito a benefício previdenciário decorrente de união estável homoafetiva

 A Segunda Turma do STF negou, por unanimidade, recurso de agravo regimental interposto pela filha de uma das partes em união homoafetiva contra a concessão de benefício previdenciário de seu falecido pai ao companheiro dele. O agravo foi interposto nos autos do RE 477554, com fundamento no art. 226, § 3º, da CF, segundo o qual, “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar”.

 Ao negar provimento ao agravo regimental e confirmar sua decisão em favor do companheiro homoafetivo, o ministro Celso de Mello reportou-se à decisão do Plenário do Supremo no julgamento da ADPF 132 e da ADI 4277, quando a Corte estendeu o conceito de família também aos casais do mesmo sexo que vivem em união estável. 

O RE foi interposto na Suprema Corte contra decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que não reconheceu o direito do companheiro de falecido ao recebimento de benefício previdenciário. O TJMG alegou inexistência de lei prevendo esse direito. Entretanto, apoiado em entendimento firmado pelo STF, o ministro Celso de Mello cassou a decisão da corte mineira e concedeu ao companheiro do falecido o direito ao recebimento de benefício previdenciário.

 Notícia na íntegra: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=186690&caixaBusca=N

 Inteiro teor: http://www.cjf.jus.br/caju/inf%20caju%2035.1.pdf

Artigo conexo: http://www.cjf.jus.br/caju/inf%20caju%2035.2.pdf

Legislação  pertinente: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm"

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

PREVIDENCIÁRIO. RATEIO DE PENSÃO. VERBAS PASSADAS.

D. Maria estava recebendo pensão vitalícia, como dependente do seu falecido companheiro e, de repente, o valor dessa pensão passou a ser dividido com a ex-esposa do mencionado de cujus. E, como se não bastasse, o INSS passou a descontar do que lhe restou os valores que, segundo essa Autarquia, D. Maria teria recebido indevidamente. Será que ela precisa restituir aquelas parcelas, ou não?
Na decisão abaixo, isso se encontra resolvido.
Boa Leitura.


Obs.: Decisão minutada pela Assessora Rossana Marques.



PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
2ª VARA

Processo nº 0011652-81.2011.4.05.8300
Classe:    29 AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO)
AUTORA: MARIA S. S.
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS


                                                                                            C O N C L U S Ã O

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR
         Recife, 23/08/2011
Encarregado(a) do Setor


                                                                  D E C I S Ã O

1-                      Relatório

       M  S S, qualificada na Petição Inicial, representada pela Defensoria Pública da União, ajuizou a presente ação, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS. Requereu, inicialmente, os benefícios da Justiça Gratuita e alegou, em suma, que seria beneficiária do benefício previdenciário de pensão por morte – NB 113.730.403-8, desde 14/09/1999; que, em 23/10/2007, teria sido surpreendida com o rateio da pensão com outra dependente do falecido, no caso, sua esposa, de quem o ex-segurado seria separada de fato há mais de 20 anos; que, em decorrência disso, o INSS teria inscrito débito em seu nome no valor de R$ 93.511,28, a título de pagamento dos atrasados da outra beneficiária e passado a realizar um desconto mensal no seu benefício no valor de R$ 336,04, visando saldar referido débito; que seria ilegal o débito que lhe teria sido atribuído pelo INSS, porque a Autora teria recebido integralmente o valor da pensão por morte porque seria, à época, a única beneficiária; que, além disso, seria flagrante a natureza alimentar do benefício, assim como a boa-fé da Autora ao recebê-lo, o que tornaria irrepetível o seu valor; que, além disso, a Autora faria jus aos danos morais e materiais que teria sofrido. Teceu outros comentários, e requereu a antecipação dos efeitos da tutela para que seja determinada a imediata suspensão dos descontos mensais realizados no benefício da Autora até o curso final do processo. Juntou Declaração de hipossuficiência financeira (fl. 10) e documentos, fls. 11/32.

2-                      Fundamentação

         2.1- Benefício da Justiça Gratuita
Merece ser concedido à Autora o benefício da justiça gratuita, porque presentes os requisitos legais, mas com as ressalvas da legislação criminal pertinente, no sentido de que se, mais tarde, ficar comprovado que declarou falsamente ser pobre, ficará obrigada ao pagamento das custas e responderá criminalmente(art. 5º, LXXXIV da Constituição da República e Lei nº 1.060, de 1950).
Outrossim, o benefício ora concedido abrange as prerrogativas previstas no § 5º, art. 5º da Lei nº 1.060/50, exclusivas de defensor público ou de quem ocupe cargo equivalente.
2.2-  Os documentos carreados aos autos comprovam que:
     1-O benefício de pensão por morte foi concedido à Autora em 01/09/1999 (fl. 13); 
2-Em razão da concessão de uma outra pensão, o valor do benefício foi alterado, conforme aviso de desdobramento enviado pelo INSS à Autora (fl. 14);
3-Em outubro de 2007, a pensão por morte foi efetivamente desdobrada (fl. 20);
4-O nome da Autora está inscrito em débito para com o INSS, no valor de R$ 93.511,28, relativo ao recebimento integral da pensão, no período compreendido entre 03/01/2000 e 31/10/2010 (fl. 20);e
5-O INSS vem promovendo descontos nos proventos de pensão da Autora no valor de R$336,38 (fl. 32). 
Dos referidos documentos, conclui-se que, em outubro de 2007, em face da habilitação da esposa do ex-segurado, ora falecido, aconteceu o desdobramento da pensão até então apenas percebida pela Autora. Portanto, até outubro de 2007, a Autora recebeu 100% (cem por cento) da pensão instituída por Carlos José de Lima, porque era a única habilitada ao seu recebimento perante a Previdência Social.
O pagamento integral da pensão à Autora, até a superveniente habilitação de eventuais beneficiários, está previsto na Lei nº 8.213/91, verbis:
Art. 76. A concessão da pensão por morte não será protelada pela falta de habilitação de outro possível dependente, e qualquer inscrição ou habilitação posterior que importe em exclusão ou inclusão de dependente só produzirá efeito a contar da data da inscrição ou habilitação.
       Portanto, a teor do caput do art. 76, a posterior habilitação da esposa do de cujus não pode prejudicar a dependente que se habilitou anteriormente, porque, conforme previsto pela Lei de Benefícios da Previdência Social (art. 76), a nova habilitação só produz efeitos financeiros a contar da data da sua efetivação, ocorrida, in casu, em outubro de 2007, razão pela qual se mostra indevido o desconto promovido pelo INSS nos proventos de pensão percebidos pela Autora, a tal título. E o INSS não necessita pagar, para a nova habilitada, as diferenças do passado.
Sendo assim, numa análise perfunctória, convenço-me da verossimilhança da alegação e da presença da prova inequívoca, e tenho que são ilegítimos os descontos efetivados pelo INSS, a título de devolução da metade da pensão percebida pela Autora, devendo, portanto, ser suspenso o desconto até ulterior determinação deste Juízo. 
Ademais, mesmo que não houvesse a acima invocada regra legal, ainda assim não poderia haver desconto, porque a ora Autora recebeu de boa-fé e nesse sentido é o entendimento pacífico do E. Superior Tribunal de Justiça e do C.Supremo Tribunal Federal. 
Quanto ao periculum in mora, também se acha presente, diante do caráter nitidamente alimentar de que se reveste o benefício previdenciário de pensão por morte.
3-                      Conclusão

Posto ISSO: a) concedo à Autora os benefícios da justiça gratuita, sob as condições estabelecidas na fundamentação supra; b)defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela e determino que o Instituto Nacional do Seguro Social suspenda, incontinenti, o noticiado desconto, sob o título de ressarcimento ao erário, no valor mensal de R$ 336,04, do total da sua pensão mensal,  sob as penas da Lei.
Cite-se, na forma e para os fins legai, e o intime da decisão supra, para o seu efetivo e imediato cumprimento, sob pena de pagamento de multa, a favor da Autora, correspondente a R$ 500,00(quinhentos reais)por mês, sem prejuízo da responsabilização funcional e criminal do Servidor ou Dirigente que der azo ao seu pagamento.


P. I.

             Recife, 24.08.2011

            Francisco Alves dos Santos Júnior
               Juiz Federal, 2ª Vara-PE

sábado, 20 de agosto de 2011

A INCONSTITUCIONALIDADE DA IRRETROATIVIDADE DO ART. 3º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 118, DE 2005, E OS SEUS EFEITOS.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior




   Firmou-se, no Superior Tribunal de Justiça-STJ, o entendimento segundo o qual a prescrição de crédito na repetição de indébito, relativo a tributo submetido a lançamento por homologação, por força da interpretação sistemática do inciso I do art. 168 e do inciso VII do art. 156, todos do Código Tributário Nacional – CTN, só se iniciaria após a extinção do crédito tributário, que, como se sabe, pelo dispositivo legal por último referido(o inciso VII do art. 156 do Código Tributário Nacional – CTN), relativamente a tributos que se submetem a esse tipo de lançamento, só ocorre com a concretização da homologação desse lançamento, seja expressa ou tácita e não apenas pelo pagamento que, nessa hipótese, segundo o § 4º do art. 150 do referido Código, é resolúvel.

   E a Fazenda Pública, conforme o dispositivo legal por último mencionado, tem o prazo decadencial de cinco anos para essa homologação, contado da data do fato gerador.

   Como, regra geral, a Fazenda Pública silencia, ou seja, não faz a homologação expressa, concretiza-se a homologação tácita, no final desse prazo de cinco anos.

   Daí, então, segundo a jurisprudência desse E. Tribunal, o prazo prescricional para o Contribuinte requerer a restituição de tributo, indevidamente pago, só começaria a fluir a partir desse momento.

   E por isso se diz que, segundo o Superior Tribunal de Justiça-STJ, o contribuinte tem 5(cinco)anos + 5(cinco)anos para repetir, entendimento esse que se popularizou como “teoria dos cinco + cinco’.(1).

Nota 1 - BRASIL. Superior Tribunal de Justiça-STJ. 1ª Seção. Embargos em Recurso Especial –ERESP nº 435.835/SC. Relator, para o acórdão, Ministro José Augusto Delgado. Julgamento em 24.03.2004.[maioria]. Apud Superior Tribunal de Justiça-STJ, 1ª Turma, Recurso Especial nº 714397, 2005/0005493-3, Relator Ministro Teori Zavascki, julgamento em 12.04.2005, Diário da Justiça de 02.05.2005, p. 236.
   Então, veio à luz a Lei Complementar nº 118, de 09.02.2005, publicada no Diário Oficial da União de 09.02.2055, tendo entrado em vigor 120 dias após sua publicação, cujo art. 4º estabeleceu que o seu art. 3º teria efeito retroativo.

   A razio iuris desse art. 4º estaria no fato de que mencionado art. 3º teria caráter interpretativo e por isso, ante a regra do inciso I do art. 106 do Código Tributário Nacional – CTN, o seu efeito seria retroativo à data da entrada em vigor desse Código.

   Para melhor clareza, eis a redação desses dispositivos da Lei Complementar nº 118, de 2005:

“Art. 3o Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1o do art. 150 da referida Lei.

Art. 4o Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3o, o disposto no art. 106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional.”.
   A Lei Complementar nº 118, de 2005, estabeleceu, no acima transcrito art. 3º, que esse prazo seria de 5(cinco)anos, contados, não da extinção do crédito tributário(que, como vimos acima, só ocorre com a homologação do ‘lançamento’(2)), mas sim do pagamento indevido.

Nota 2 - Na verdade, não é do lançamento, mas sim dos procedimentos adotados pelo Contribuinte na apuração e pagamento do tributo, pois o Contribuinte não realiza lançamento, porque, segundo o art. 142 do Código Tributário Nacional-CTN, esse é um ato privativo da Fazenda Pública. Logo, a Fazenda Pública não homologa o lançamento, mas sim realiza o lançamento com a homologação dos procedimentos até então realizados pelo Contribuinte.


   Logo, eliminou a possibilidade de contar-se cinco anos(para homologar) + cinco anos(para requerer a restituição), ficando apenas este último prazo, contado do pagamento.

   Ou seja, o prazo para repetição de indébito passou a ser de apenas cinco anos, contado do dia seguinte ao do pagamento indevido.

   Seria mencionado art. 3º da Lei Complementar nº 118, de 2005, uma nova regra, frente à regra do inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional-CTN, ou seria uma regra que apenas interpreta esta, como determinado no referido art. 4º dessa mesma Lei Complementar?

   No ano de 1977, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal-STF decidiu que o prazo do inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional-CTN iniciar-se-ia do pagamento indevido(3) e nesse sentido sempre se posicionou o jurista Luciano Amaro, no seu conhecido livro Direito Tributário Brasileiro, registrando ser inadequado o texto do inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional-CTN, o qual, ao invés de se referir a pagamento, refere-se à extinção do crédito tributário(4).

Nota 3 – BRASIL. Supremo Tribunal Federal-STF, Segunda Turma. Relator Ministro Cordeiro Guerra. Julgado em 19.04.1977. Revista Trimestral de Jurisprudência-RTJ nº 81/428-431. Fiz referência a esse julgado no livro de minha autoria, denominado Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil – Análise das Principais Teorias Existentes e Proposta para Alteração da Respectiva Legislação, Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 261-262.
Nota 4 - Direito Tributário Brasileiro. 14ª Edição, revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 427.
   E parece-me que só poderia ser do pagamento, porque o Direito Tributário não pode modificar os institutos de direito privado(art.110 do Código Tributário Nacional-CTN)e, em direito privado, o prazo prescricional para repetição indébito sempre se iniciou depois da ocorrência do pagamento indevido.

   No entanto, como vimos acima, o Superior Tribunal de Justiça-STJ não adotou esse entendimento e firmou sua jurisprudência no sentido de que o prazo total chegaria a dez anos(os cinco anos decadenciais para a Fazenda Pública homologar e os cinco anos prescricionais para o Contribuinte requerer a restituição do indevidamente pago, contado do fim do prazo para a Fazenda Pública homologar).

   Com o advento da Lei Complementar 118, de 2005, que adotou mencionado entendimento da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal-STF, os Contribuintes foram ao Judiciário, sustentando a tese de que não se trataria de regra legal interpretativa, mas sim de uma nova regra, pelo que só poderia alcançar fatos(pagamentos indevidos)ocorridos depois da sua vigência, em face do princípio da irretroatividade das leis, agora expresso na alínea “a” do inciso III do art. 150 da Constituição da República.

   O assunto chegou ao Superior Tribunal de Justiça-STJ e este, em um primeiro momento, concluiu que a nova Lei só seria aplicável a processos que se iniciaram após sua entrada em vigor(5) e, posteriormente, assentou o entendimento de que ela só seria aplicável a fatos(pagamentos indevidos)efetuados após a sua vigência.

Nota 5 – Entendimento esse que só seria justificável se tais regras fossem de direito processual, porque estas se aplicam imediatamente, inclusive aos processos em andamento. Mas, como  as regras referentes a decadência/prescrição são de direito material, tal entendimento não vingou e logo, logo o mesmo Superior Tribunal de Justiça-STJ tratou modificá-lo e passou a adotar o entendimento consignado no texto acima.
Nota 6 - Quanto a este último entendimento do Superior Tribunal de Justiça-STJ, há inúmeros julgados, dentre os quais o acima indicado, da sua 1ª Turma, relatado pelo Ministro Teori Zavascki.
   Essa matéria, depois do advento da Lei Complementar nº 118, de 2005, também chegou ao Supremo Tribunal Federal-STF, e o seu Plenário decidiu, em 04.08.2011, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 566.621/RS, interposto pela União em abril de 2007, por maioria, seis votos a quatro:
“Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto da Relatora, negou provimento ao recurso extraordinário, contra os votos dos Senhores Ministros Marco Aurélio, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes. Ausente, licenciado, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Cezar Peluso. Plenário, 04.08.2011.”(7).

 Nota 7 - Brasil. Supremo Tribunal Federal – STF. Recurso Extraordinário nº 566621/RS(Processo físico). Recorrente: União. Recorrido: RCAF. Intdo(A/S): Estado do Rio Grande do Sul. Relatora Ministra Ellen Grace. Por maioria. Plenário. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2565341, acesso em 06.08.2011.
   Portanto, concluiu-se pela inconstitucionalidade da parte do art. 4º da referida Lei Complementar, na qual mandava aplicar ao art. 3º da mesma Lei o inciso I do art. 106 do Código Tributário Nacional-CTN, isto é, estabelecia que tal regra era interpretativa e, por isso, retroagia à data em que o Código Tributário Nacional-CTN entrara em vigor.

   Então, tem-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal-STF, em 04.08.2011, findou por mudar o posicionamento da sua 2ª Turma, adotado no ano de 1977, no AI 69.363(AgRg)SP, acima referido, e passou a admitir que o art. 110 do Código Tributário Nacional-CTN pode ser inobservado, ou seja, que leis do campo tributário podem modificar a definição, o conteúdo e o alcance dos institutos de direito privado.

   Extrai-se dos votos vencedores desse julgado do Supremo Tribunal Federal – STF que o art. 3º da Lei Complementar nº 118, de 2005, só pode ser aplicado com relação a fatos posteriores à entrada em vigor dessa Lei, da mesma forma que vinha entendendo o Superior Tribunal de Justiça – STJ.

   Logo, o prazo prescricional de cinco anos, para o Contribuinte requerer a restituição de tributo, submetido a lançamento por homologação, passou a ser de cinco anos, contado da data do pagamento indevido, na verdade, do dia seguinte à data desse pagamento por força do art. 210 do Código Tributário Nacional – CTN, mas apenas com relação a pagamentos indevidos ocorridos depois que essa Lei Complementar entrou em vigor e, com referência a pagamentos indevidos, efetuados antes disso, continua o prazo de dez anos(cinco anos + cinco anos).

   Num embate mais amplo, Estado x Capital, podemos concluir que a mencionada apertada maioria da composição do Supremo Tribunal Federal – STF de 04.08.2011 deu ganho de causa ao Capital, certamente gerando aumento da despesa pública, transferindo dinheiro público para os cofres dos Empresários. Oxalá, essa montanha de dinheiro seja bem aplicada pelos Empresários, melhorando o desenvolvimento do Brasil!

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

INCADUCIDADE DO DIREITO DE LANÇAR O TRIBUTO. OMISSÃO DOLOSA DO CONTRIBUINTE NO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO.

Segue uma sentença, na qual se discute o tormentoso assunto: decadência no direito tributário do Brasil, em um caso no qual se conclui que não flui o prazo decadencial  para a Fazenda Pública lançar o tributo, quando este se submete ao lançamento por homologação e o Contribuinte não efetua o pagamento, mediante omissão dolosa.

Boa leitura e deixe o seu comentário, a sua opinião.




PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA



Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 0009243-69.2010.4.05.8300 - Classe 29 – Ação Ordinária
Autor: C A A
Adv.: M F G - OAB/PE ...
Ré: COMISSÃO DE VALORES IMOBILIÁRIOS - CVM
Procurador(a) Federal



Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2011

Sentença tipo A


EMENTA : - DIREITO TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. INEXISTÊNCIA.

-Não flui o prazo de decadência do § 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional, quando o Contribuinte não paga o tributo, utilizando-se de prática dolosa.
         -Rejeição da exceção de decadência. Improcedência.



Vistos etc.

C A A, qualificada nos autos, ajuizou, em 06.07.2010, a presente “Ação Anulatória de Lançamento Fiscal com Pedido de Tutela Antecipada para Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário” contra a COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS, aduzindo, em síntese, que teria incorporado a sociedade  C S A; que a Ré teria lavrado contra referida empresa notificação de lançamento nº 173/32, em 06.11.2001, formalizando o processo administrativo nº CVM nº RJ 2002/146, relativamente a crédito tributário decorrente do não recolhimento da Taxa de Fiscalização de Valores Mobiliários dos quatro trimestres do ano de 1991; que teria se insurgido administrativamente contra mencionado lançamento, sem, contudo, haver obtido êxito; que não teria havido lançamento por homologação, eis que a Ré teria procedido de ofício; que, não havendo a Autora efetuado o pagamento da taxa em questão, o prazo decadencial passara a contar do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetivado (01.01.1992), conforme disposto no inciso I, do art. 173 do CTN; que a notificação de lançamento teria sido datada de 06.11.2001, quando já ultrapassado o prazo decadencial para constituição do crédito tributário; que o lançamento questionado deveria ser anulado; que, em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação e inexistindo antecipação de pagamento, não seria possível a soma dos prazos do § 4º, do art. 150 e do inciso I, do art. 173 do CTN; que, remontando o início do prazo decadencial a 01.01.1992, e, havendo sido a Autora notificada do lançamento apenas em 06.11.2001, teria tal prazo sido ultrapassado a partir de 01.01.1997. Teceu outros comentários. Transcreveu algumas decisões judiciais. Invocou entendimentos doutrinários. Requereu a antecipação dos efeitos da tutela, inaudita altera pars, para que fosse ordenada a suspensão da exigibilidade do crédito tributário lançado no processo administrativo CVM nº RJ 2002/146, bem como a abstenção da inscrição do nome da Autora no CADIN; a citação da COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS; a procedência dos pedidos, para anular o lançamento de ofício perpretado pela Ré através do referido processo administrativo; a condenação da Ré ao pagamento de honorários advocatícios e custas. Fez protestos de estilo. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com cópia de documentos e instrumento de procuração (fls. 20/95).

Comprovante de recolhimento de custas (fl. 96).

O pedido de antecipação da tutela foi indeferido em decisão de fls. 100/101.

À fl. 104, a Autora noticiou a interposição de Agravo de Instrumento, juntando cópia do referido recurso (fls. 105/127).

Mantida a decisão agravada (fl. 128).

À fl. 129, ofício encaminhando cópia de decisão proferida nos autos do noticiado Agravo de Instrumento (fls. 130/133).

Citada, a COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS apresentou Contestação, às fls. 138/145, sustentou que a Autora não teria comprovado que a sua omissão, quanto ao recolhimento da Taxa de Fiscalização do Mercado de Títulos e Valores Mobiliários, teria sido apenas culposa; que, configurada a omissão dolosa, a contagem do prazo decadencial se daria nos termos do disposto no final do § 4º, do art. 150 e do parágrafo único, do art. 173 do CTN; que, ainda que se admitisse a tesa da omissão dolosa e, se partisse da premissa de existir omissão culposa, não mereceria prosperar a tesa da Autora; que mencionada taxa seria um tributo sujeito a lançamento por homologação, de modo que o nascimento do crédito tributário coincidiria com o instante de ocorrência do fato gerador; que o lançamento, condição de exigibilidade do referido crédito, poderia ser realizado até o prazo decadencial; que, considerando que o prazo do lançamento por homologação seria de cinco anos, a CVM possuiria mais cinco anos para constituir definitivamente o seu crédito; que o crédito em comento referir-se-ia ao exercício de 1991; que o prazo para constituição do crédito, relativamente ao fato gerador mais remoto, ocorrido em 16.02.1991, teria iniciado em 01.01.1992; que de 01.01.1992 até a data em que o lançamento fora aperfeiçoado não teriam decorrido dez anos; que o lançamento poria termo à decadência, enquanto a prescrição somente se iniciaria com a constituição definitiva do crédito, que se daria após o encerramento do contencioso administrativo; que, realizado o lançamento tributário dentro do prazo legal, a Fazenda teria ainda o prazo de cinco anos, contados da constituição definitiva do crédito, para ajuizar a ação de execução fiscal, ex vi o art. 174 do CTN; que, no presente acaso, também não teria ocorrido a prescrição. Fez outros comentários. Ao final, requereu: a improcedência dos pedidos formulados na Inicial, condenando a Autora nos ônus da sucumbência. Protestou o de costume. Pediu deferimento. Juntou cópia de documentos (fls. 146/224).

A Autora apresentou Réplica, às fls. 231/252, rebatendo os argumentos da Defesa e reiterando os termos da Inicial.

Vieram os autos conclusos para julgamento.


É o Relatório.

Passo a decidir.


Fundamentação.


1. A Autora alega que o direito de a Comissão de Valores Mobiliários-CVM, Autarquia Federal, lançar a taxa de fiscalização em debate teria sido fulminado pela decadência, para cujo exercício o prazo seria de 5(cinc)anos, contados da data do fato gerador. E assim seria, porque o crédito tributário era do quarto trimestre de 1991, de forma que, embora se trate de tributo submetido ao lançamento por homologação, ante a não realização dos procedimentos para o lançamento e a falta de pagamento, o início do prazo de decadência transmudara-se para o primeiro dia do exercício subsquente àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, qual seja, para 01.01.1992, e findado cinco anos depois, em 01.01.1997, tudo conforme inciso I do art. 173 do Código Tributário Nacional e sedimentado entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça e da doutrina.

Realmente, há esse entendimento no E. Superior Tribunal de Justiça e dele transcrevo uma de suas inúmeras r. decisões a respeito desse assunto, verbis:

TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. TRIBUTOS SUJEITOS AO REGIME DO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. Nos tributos sujeitos ao regime do lançamento por homologação, a decadência do direito de constituir o crédito tributário se rege pelo artigo 150, § 4º, do Código Tributário Nacional, isto é, o prazo para esse efeito será de cinco anos a contar da ocorrência do fato gerador; a incidência da regra supõe, evidentemente, hipótese típica de lançamento por homologação, aquela em que ocorre o pagamento antecipado do tributo. Se o pagamento do tributo não for antecipado, já não será o caso de lançamento por homologação, hipótese em que a constituição do crédito tributário deverá observar o disposto no artigo 173, I, do Código Tributário Nacional. Embargos de divergência acolhidos.

(EREsp 101407/SP, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 07/04/2000, DJ 08/05/2000, p. 53)
Esse E. Tribunal também já adotou a tese de cinco anos + cinco anos para que a Fazenda Pública ultimasse o lançamento, tese essa afastada por sua 1ª Seção, no julgamento do ERESP 101407, in DJU de 08.05.2000, conforme tratou de demonstrar a Autora na sua petição inicial.

O acima transcrito entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça pode ser aceito, tranquilamente, nas hipóteses em que o Contribuinte age culposamente.

2. Mas quando ele age ou omite-se dolosamente, não recolhendo nenhuma parcela do tributo, não pode receber o mesmo tratamento, porque há regra expressa no final do § 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional, regra essa que, data maxima vênia, nunca foi abordada pelo mencionado E. tribunal.

Resta claro nessa parte desse dispositivo legal que, se o Contribuinte praticar qualquer ato doloso, ou omitir-se dolosamente, quanto as atividades que deveria realizar, tendentes à concretização do lançamento, que findaria com a homologação da Fazenda Pública, e assim agindo ou omitindo-se não recolhe nenhuma parcela do tributo, não fluirá o prazo decadencial de 5(cinco)anos para que a Fazenda Pública realize a homologação ou, por óbvio, faça o lançamento de ofício(de caráter revisional, quando o Contribuinte, por exemplo, tiver recolhido valor menor que o devido; ou realize o lançamento integral, quando o Contribuinte tiver se omitido totalmente).

Então, nessa situação, quando a Fazenda Pública tomar conhecimento do ato ou da omissão, se qualquer deles for doloso, poderá, quando descobrir o ato ou a omissão dolosos, efetuar o lançamento por notificação de lançamento, por notificação de auto de infração ou por notificação de início de procedimento fiscal, tendente à realização do lançamento. E, se for esta última hipótese(notificação de início de procedimento tendente ao lançamento), o prazo de cinco anos será para que finde o procedimento, ou seja, para que concretize o lançamento(Parágrafo Único do art. 173 do Código Tributário Nacional).

Constata-se, no documento de fl. 76, acostado pela Autora com sua petição inicial, que a Comissão de Valores Mobiliários-CVM optou pela notificação de lançamento, com data de 06.11.2001.

Conforme procurei demonstrar na decisão inicial, que se encontra às fls. 100-101, isso não é nenhuma inovação do Direito Brasileiro, pois encontra igual tratamento no Código Tributário da Alemanha de 1977, ainda em vigor, bem como em Lei da Espanha, que trata do Imposto sobre Transmissões Patrimoniais – ITP.

Extrai-se do referido dispositivo legal do nosso Código Tributário Nacional que cabe apenas examinar se o Contribuinte agiu ou não dolosamente.

O Contribuinte não age dolosamente, nos tributos submetidos a lançamento por homologação, quando comprova que não poderia, em hipótese alguma, recolher o tributo que apurou, por completa impossibilidade econômico-financeira, ou quando comprova sua total ignorância no que diz respeito a essa responsabilidade, a de apurar e recolher o tributo, sob condição resolutória.

Não é o que aconteceu no presente caso, pois a própria ora Autora tratou de demonstrar sua higidez econômico-financeira, e o seu completo conhecimento da legislaão tributária brasileira.

Não pode vingar o seu argumento de que absorvera a Empresa, que seria a Devedora originária(CISA), por incorporação, de forma que não poderia ter agido olosamente.

Ocorre que, ao incorporar a Devedora originária, a ora Autora assumiu a responsabilidade pelas dívidas tributárias desta(art. 132 do Código Tributário Nacional).

E se continuou silente a respeito da referida dívida tributária, agiu dolosamente, a espera da decadência.

Assim, quando a Comissão de Valores Mobiliários-CVM notificou a ora Autora do lançamento, em 06.11.2001, ainda não tinha ocorrido a alegada decadência.

Como a Autora não impugna o mérito da taxa em cobrança, alegando apenas a existência de decadência, a qual, data maxima venia, não ocorreu, tenho que referida exceção merece ser rejeitada, com a conseqüente improcedência do pleito e respectiva resolução do mérito.

3. O entendimento acima constou do anteprojeto do Código Tributário Nacional, feito pelo saudoso RUBENS GOMES DE SOUZA, cujo artigo 213 tinha a seguinte redação:

“Art. 213. A prescrição não começa a correr enquanto a ocorrência do fato gerador do tributo, ou a prática da infração, não cheguem ao conhecimento da autoridade administrativa competente, por qualquer das seguintes razões: I. Dolo, fraude, simulação ou ocultação por parte do contribuinte ou de terceiro em benefício daquele; II. Omissão de cumprimento de obrigação tributária acessória, ainda que sem dolo ou fraude, por parte do contribuinte ou de terceiro em benefício daquele”.[1]
Nota 1 – Apud SANTOS JR, Francisco Alves dos. Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil: análise das principais teorias existentes e proposta para alteração da respectiva legislação. Rio de Janeiro – São Paulo: Renovar, 2001, p. 152.
Obs.: Esse livro foi uma adaptação da Dissertação de Mestrado do Autor, defendida na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, no ano 2000.
Note-se que no anteprojeto falava-se apenas em prescrição, porque o direito positivo brasileiro de então não tinha a figura da decadência, tendo passado a existir expressamente a partir exatamente do Código Tributário Nacional e no Código Civil de 2002, atualmente em vigor.

4. O referido dispositivo legal(o § 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional)e o entendimento supra, data maxima venia, não ferem o princípio da segurança jurídica, que é um dos fundamentos da origem da decadência e da prescrição, pois se trata de um caso excepcional, pelo qual, elastecendo-se a possibilidade de a Fazenda Pública efetuar o ato de lançamento dos seus tributos, busca-se punir o contribuinte que age com dolo.

Haveria ferimento a esse princípio, sim, se acontecesse o contrário, ou seja, se o contribuinte que agisse dolosamente recebesse, como pretende a Autora, o mesmo tratamento tributário dado ao contribuinte que agisse apenas culposamente, no descumprimento das obrigações tributárias.

Se assim fosse, aí sim haveria um incentivo a práticas dolosas, um incentivo à insegurança jurídica, à insegurança na realização das receitas tributárias por parte da Fazenda Pública.

Conclusão

Posto isso, rejeito a exceção de decadência e, com resolução do mérito, julgo improcedentes os pedidos desta ação(art. 269-I do Código de Processo Civil), condenando a ora Autora nas custas processuais e em verba honorária, que arbitro em 10%(dez por cento)do valor total do tributo em debate, atualizado na forma da respectiva legislação tributária, valor esse a ser apurado na forma preconizada no art. 475-B do Código de Processo Civil e executado conforme art. 475-J do mesmo diploma processual.

Com urgência, remeta-se cópia desta sentença para os autos do noticiado agravo de instrumento, aos cuidados do respectivo Relator.

P.R.I.

Recife, 08 de agosto de 2011.

Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE