terça-feira, 18 de dezembro de 2012

JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA NA FASE DO PRECATÓRIO OU DA REQUISIÇÃO DE PEQUENO VALOR. STF E STJ.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.
 
A celeuma sobre se incide ou não juros de mora e correção monetária na fase do Precatório ou da Requisição de Pequeno Valor vem sendo espancada pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça.
Na decisão que segue, procura-se demonstrar qual o atual entendimento reinante nessas Cortes Judiciais.
Boa leitura.


 

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2ª VARA

 

Processo nº 0006443-10.2006.4.05.8300

Classe:    206 EXECUÇÃO DE SENTENÇA CONTRA FAZENDA PÚBLICA 

AUTOR: K. DE A, L.

RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

C O N C L U S Ã O

 

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

 

Recife, 14/09/2012

 

 

Encarregado(a) do Setor

 

D E C I S Ã O

 

1 - Breve relatório

 

Expedido precatório em favor do Exequente e do seu advogado (fl. 105).

Juntado acompanhamento processual do Precatório nº 77855-PE, informando o respectivo depósito(fl. 113)

O Exequente peticionou solicitando a atualização dos cálculos a partir de 20/08/2009 até a data da inscrição do Precatório, do valora apresentado pela Contadoria, fl. 112.

Determinada a remessa dos autos à Contadoria para apurar eventual crédito remanescente, fl. 114, a Contadoria apresentou a conta de fl. 115.

Instado a se manifestar sobre referida petição, o Executado(INSS)sustentou que, havendo precatório sido pago dentro do prazo constitucional, haveria a impossibilidade de expedição complementar. Afirmou a incidência indevida de juros de mora após os cálculos de liquidação já se encontraria pacificado no E. STJ e no C. STF, conforme precedentes que transcreveu; que, no caso concreto, a Contadoria teria aplicado juros de mora no período de agosto de 2009 a abril de 2011, no percentual de 0,5%, quando tal não seria possível, porque o precatório teria sido pago no prazo legal; que, portanto, não existiria saldo remanescente no presente caso (fls. 119/123). E impugnou a Conta de fl. 115, requerendo a extinção da execução. Juntou Parecer Técnico, fl. 124.

Certificado o decurso do prazo sem que a parte autora houvesse se pronunciado sobre os cálculos da Contadoria(ato ordinatório de fl. 116), pelo que foi novamente intimada para tal fim, tendo se manifestado às fls. 131/132, rebatendo os argumentos do INSS, manifestados na petição de fls. 119/123.

 

2 - Fundamentação

 

Incide, ou não, juros de mora e correção monetária no período que vai da data da elaboração da conta de apuração do crédito até a data do efetivo pagamento?

Eis o entendimento do C.Supremo Tribunal Federal e do E. Superior Tribunal de Justiça.    

 

2.2. Quanto aos Juros de Mora

 

À luz do comando insculpido no art. 100 e respectivos parágrafos da Constituição da República, o pagamento dos débitos fazendários decorrentes de sentença transitada em julgado obedece à sistemática própria, fazendo-se exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios, ressalvados os créditos de natureza alimentar e as obrigações definidas em lei como de pequeno valor, em relação aos quais a Constituição estabeleceu regramento específico.

Conforme disposto no § 5º do mencionado dispositivo constitucional, os precatórios apresentados até 1º de julho deverão ser pagos até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente.

Conclui-se, portanto, que, durante o período previsto no §5º do art. 100 da Constituição da República, não incidem juros de mora sobre os precatórios.

Tal entendimento findou por ser cristalizado na Súmula Vinculante nº 17 do E. STF[1], que, neste particular, como não poderia deixar de ser, findou por ser seguido pelo E. Superior Tribunal de Justiça, o qual ratificou o seu entendimento no sentido de que não incide juros de mora entre a data da elaboração da conta de apuração e a data do efetivo pagamento, desde que satisfeito o débito da Fazenda Pública no respectivo prazo constitucional.

O mesmo entendimento há de ser adotado na Requisição de Pequeno Valor-RPV.

É que há de se considerar o lapso temporal entre a elaboração dos cálculos definitivos até a apresentação do precatório ou da RPV à respectiva entidade de direito público devedora como integrante do iter constitucional necessário à realização do efetivo pagamento

Destarte, não havendo atraso no adimplemento do quantum debeatur, descabida a incidência de juros de mora.

Nesse sentido, observe-se o aresto abaixo:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PRECATÓRIO COMPLEMENTAR. JUROS DE MORA CONCERNENTE AO PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE A ELABORAÇÃO DOS CÁLCULOS E A DATA DA EXPEDIÇÃO DO OFÍCIO REQUISITÓRIO. NÃO INCIDÊNCIA. PRECEDENTES DA CORTE ESPECIAL E DA PRIMEIRA SEÇÃO. SÚMULA VINCULANTE 17/STF. 1. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, analisando a aplicação da Súmula Vinculante 17 do Supremo Tribunal Federal, firmou orientação no sentido de que não incidem juros de mora no período compreendido entre a conta de atualização e o efetivo pagamento do precatório. 2. Tal entendimento ficou assentado, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.143.677/RS, da Relatoria do Ministro Luiz Fux, no qual se ratificou o posicionamento já consolidado neste Tribunal de que não incide juros de mora no período compreendido entre a data da elaboração dos cálculos e o efetivo pagamento do Precatório/Requisição de Pequeno Valor (RPV), ressalvada a observância dos critérios de atualização porventura fixados na sentença exequenda, em respeito ao princípio da vedação de ofensa a coisa julgada. 3. Agravo Regimental não provido.
(AGRESP 201001519355, BENEDITO GONÇALVES, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:17/12/2010.)[2]

 

2.2. Quanto à Correção Monetária

 

No que diz respeito à correção monetária, o C. Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento que será sempre devida, e assim tem que ser, porque, sendo mera atualização do poder aquisitivo da moeda, caso não incidisse, o pagamento nunca seria integral.

Eis um dos julgados do C. Supremo Tribunal Federal, tratando do assunto, e no qual ficou assentado que caberia a correção monetária:

 

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONVERTIDOS EM AGRAVO REGIMENTAL. CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. PRECATÓRIOS. INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS (ART. 100, § 1º, CF). SÚMULA VINCULANTE N. 17. OFENSA À COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. 1. Os embargos de declaração opostos objetivando reforma da decisão do relator, com caráter infringente, devem ser convertidos em agravo regimental, que é o recurso cabível, por força do princípio da fungibilidade. Precedentes: Pet 4.837-ED, rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, DJ 14.3.2011; Rcl 11.022-ED, rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, DJ 7.4.2011; AI 547.827-ED, rel. Min. DIAS TOFFOLI, 1ª Turma, DJ 9.3.2011; RE 546.525-ED, rel. Min. ELLEN GRACIE, 2ª Turma, DJ 5.4.2011) 2. Os juros moratórios não são devidos dentro do prazo estabelecido no art. 100, § 1º, da CF.[3] Precedente do Plenário quando do julgamento do RE nº 591.085-QO, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 20/02/09, e posterior edição da Súmula Vinculante nº 17, in verbis: “Durante o período previsto no parágrafo 1º do artigo 100 da Constituição, não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos”. 3. In casu, não há que se aduzir à violação à coisa julgada, porquanto há incidência de juros moratórios sempre que houver demora injustificada para quitação do montante devido. A demora no pagamento do precatório decorre da própria Constituição, que determina a inclusão de previsão orçamentária para quitação do débito até o final do exercício financeiro posterior, incidindo apenas a atualização monetária, em regra. Precedentes: RE 597.833-AgR, primeira turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, Dje de 10/06/09, RE 544.070, Rel. Min. Dias Toffoli, Dje de 28/10/10; AI 665.701, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe de 08/08/10; AI 816.099, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Dje de 15/10/10; RE 602.444-AgR, primeira turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, Dje de 11/12/09. 4. Embargos de declaração convertidos em agravo regimental a que se nega provimento.
(AI-ED 764975, LUIZ FUX, STF)[4]

Então, a correção monetária incide no período compreendido entre o mês seguinte ao da elaboração dos cálculos e o mês do efetivo pagamento do requisitório(precatório ou requisição de pequeno valor).

 

Conclusão

 

À vista das razões acima aduzidas,  determino o retorno dos autos à Contadoria Judicial para que refaça sua conta apresentada à fl. 115, de acordo com os parâmetros estabelecidos na fundamentação supra, excluindo os juros de mora e mantendo apenas a correção monetária.

Outrossim, considerando que o Autor já atingiu a maioridade, deixo de determinar a remessa dos autos ao MPF.

 

P. I.

Recife, 18.12.2012

 

Francisco Alves dos Santos Júnior

  Juiz Federal, 2ª Vara-PE



[1] Súmula Vinculante 17. Durante o período previsto no parágrafo 1º do artigo 100 da Constituição, não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos.
[2] Negritei.
[3] Negritei.
[4] Negritei.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

DIREITO TRIBUTÁRIO: DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. SENTENÇA RELATIVA A UM CASO CONCRETO.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

 
Decadência e prescrição no direito tributário brasileiro são fenômenos que têm gerado muitas discussões na doutrina e uma intensa e extensa jurisprudência. Na sentença que segue, esses fenômenos são debatidos num caso concreto. Boa leitura.

PODER JUDICIÁRIO

                                                                     JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA


                Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA

 

Juiz Federal: FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR

Processo nº 0007752-56.2012.4.05.8300  – Classe 029 – AÇÃO ORDINÁRIA


AUTOR: A. LTDA.

Adv.:  R. de M. P.C., OAB/PE ...

RÉU: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)

Adv.: Procurador da Fazenda Nacional

 

Registro nº ...........................................

Certifico que eu, .................., registrei esta Sentença às fls..........

Recife, ...../...../2012

 

 

Sentença tipo A

                                          EMENTA: - DIREITO TRIBUTÁRIO. CRÉDITO TRIBUTÁRIO. LANÇAMENTO.  DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO.

 

A declaração apresentada pelo Contribuinte corresponde a lançamento definitivo.

Após o lançamento, inicia-se a fluência do prazo de prescrição, que pode sofrer interrupções.

Pedido de parcelamento, com confissão da totalidade da dívida, relativo a crédito tributário ainda não prescrito, implica em interrupção da fluência do prazo de prescrição(inciso IV do Parágrafo Único do art. 174 do Código Tributário Nacional).

Créditos tributários em questão não foram objeto do noticiado pedido de parcelamento, nem foram dolosamente omitidos pela Autora.

Ação de Execução Fiscal, relativa aos créditos tributários em questão, que não foram objeto do parcelamento, foi proposta quando referidos créditos já tinham sido fulminados pela prescrição.

Procedência.
                                                                                             
 

Vistos etc.

ARCODUTO LTDA., qualificada na Petição Inicial, ajuizou, em 02/04/2012, a presente “Ação Ordinária com pedido de tutela antecipada” em face da UNIÃO. Alegou, em síntese, que, ao tentar obter certidão negativa de débitos previdenciários, junto à Receita Federal do Brasil, teria sido informada da impossibilidade, em razão da existência do débito indicado no processo nº 393116964 de LDCG/DCG, no valor de R$ 412.010,49 (quatrocentos e doze mil, dez reais e quarenta e nove centavos); que, todavia, referido débito estaria extinto em virtude do advento da prescrição; que o aludido processo seria referente a lançamento de débitos declarados em GFIP, relativamente ao período de 01/2003 a 06/2004; que as GFIP’s teriam sido informadas tempestivamente no referido período e, posteriormente, reenviadas em 24.08.2008; que só teria sido cientificada da LDCG/DCG em 25.11.2010; que o crédito tributário cobrado através da LDCG/DCG 393116964 teria sido devidamente constituído em definitivo através das GFIP’s retificadoras, as quais teriam sido enviadas em 24.08.2006; que não teria havido qualquer movimento da Receita Federal no sentido de promover a cobrança dos referidos valores; que, nos casos de pagamento em valor menor que o devido, o prazo prescricional começaria a correr da data do pagamento, à luz do comando insculpido no art. 174 do CTN; que, todavia, na hipótese de omissão total de pagamento, o prazo prescricional teria seu termo inicial apenas no primeiro dia do exercício subsequente, pela aplicação conjunta dos artigos 174 e 150, § 4º, ambos do CTN; que, quando da apresentação das GFIP’s originais, teria sido realizado o recolhimento do tributo; que não teria havido nenhuma das hipótese de suspensão e interrupção da exigibilidade do crédito tributário; que seriam distintos os institutos do LDC e do LDCG/DCG; que o LDCG não seria documento apto a constituir o crédito tributário em favor da União, eis que serviria apenas como mecanismo de cobrança administrativa de crédito previamente constituído; que, no LDCG/DCG, somente estariam listados os débitos já informados pelo contribuinte; que a data da informação da GFIP deveria servir como data da constituição do crédito tributário, de modo a servir de início da fluência do prazo prescricional. Teceu outros comentários. Transcreveu algumas decisões judiciais. Requereu a antecipação dos efeitos da tutela para que fosse determinada a suspensão da exigibilidade do crédito tributário constituído através do LDCG/DCG 393116964, extinto em razão do advento da prescrição. Ao final, requereu: a citação da União; a intimação do Ministério Público; a procedência dos pedidos, para decretar a extinção do crédito tributário constituído no processo LDCG/DCG 393116964; a condenação da Ré ao pagamento de honorários advocatícios. Fez protestos de estilo. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com instrumento de procuração e cópia de documentos (fls. 13/112).

Comprovante de recolhimento de custas (fl. 113).

Determinada a retificação do termo de autuação do feito (fl. 115), o que foi cumprido, conforme Termo de Retificação juntado à fl. 117.

Proferida decisão interlocutória indeferindo o pedido de antecipação dos efeitos da tutela e determinando a citação da União, fl. 119/119-vº.

A UNIÃO apresentou Contestação às fls. 121/128, afirmando, inicialmente, que não teria ocorrido a prescrição sustentada na Petição Inicial e aduzindo que o termo inicial da contagem do prazo prescricional seria a constituição definitiva do crédito tributário, o qual só se consideraria constituído com o lançamento; que, em regra, a entrega da declaração do contribuinte ao órgão fazendário elidiria a necessidade de constituição formal do débito pelo Fisco, e passaria a fluir, desde o momento da citada declaração, o prazo prescricional do art. 174 do CTN, para a propositura da execução fiscal; que não se discutiria que tais informações foram enviadas pela Autora, já que estariam sendo discutidos débitos declarados em GFIP relativamente ao período de 01/2003 a 06/2004, cujas declarações teriam sido informadas tempestivamente no referido período e, posteriormente, reenviadas no segundo semestre de 2006; que a União, em princípio, não estaria pretendendo discutir o fato de que a declaração dessa natureza, prevista em lei, consiste em modo de constituição do crédito tributário, dispensada, para esse efeito, qualquer outra providência por parte do Fisco; que, no entanto, a parte autora teria omitido o fato de que teria promovido a interrupção do lapso prescricional em 22/06/2010, quando teria indicado a totalidade dos débitos para o parcelamento da Lei nº 11.941/2009; que a adesão a parcelamento equivaleria a confissão de dívida e atrairia a incidência do art. 174-IV do CTN, causa interruptiva da prescrição que apagaria todo o lapso temporal já decorrido, e se trataria de reconhecimento do débito pelo sujeito passivo. Transcreveu ementas de decisões judiciais e aduziu que as leis autorizativas do parcelamento de débitos fiscais, de regra, consignariam que a opção pelo benefício importaria confissão irrevogável e irretratável da dívida, conforme se verificaria do art. 5º da Lei nº 11.941/2009, que contemplaria a opção pelo parcelamento como confissão irrevogável e irretratável dos débitos indicados pelo sujeito passivo para integrar o programa de regularização fiscal; que, portanto, o crédito tributário em discussão nos autos estaria incólume, e seria plenamente exigível. Argumentou, outrossim, que, caso não acolhidas as razões supra consignadas, que o termo inicial da contagem do prazo prescricional seria a constituição definitiva do crédito tributário, portanto, considerando que no caso teria havido um lançamento de ofício na LDCG/DCG nº 393116964 no valor de R$412.010,49, sua emissão deflagaria a interrupção do lapso prescricional em curso. Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos e juntou documentos, fls. 127/149.

A Autora apresentou Réplica às fls. 155/156, sustentando, em síntese, que, de acordo com a Contestação apresentada pela União, observar-se-ia o reconhecimento do fato descrito na Petição Inicial, no sentido de que o prazo prescricional teria iniciado em 24/08/2006 e que não teria havido o ajuizamento da execução antes do advento do quinquênio legal para operar-se a prescrição; que, conforme se depreenderia dos documentos que estaria anexando aos autos, o débito em questão não teria sido consolidado no parcelamento especial pela Receita Federal, e estaria com sua exigibilidade ativa diante do ajuizamento da Execução Fiscal em curso na 30ª Vara Federal de Pernambuco; que, em face do ajuizamento da aludida Execução Fiscal, seria de se concluir que o débito não teria sido incluído no parcelamento, conforme, inclusive, demonstraria o extrato de débito acostado com a Petição Inicial, que não indicaria qualquer parcelamento efetuado anteriormente, e a Procuradoria da Fazenda Nacional teria ajuizado a Execução Fiscal após o advento da prescrição. Teceu outros comentários e pugnou pela procedência do pedido formulado na Petição Inicial. Juntou documentos, fls. 157/166.

Intimada para se manifestar sobre os documentos acostados pela Autora às fls. 157/166, a União manifestou-se às fls. 166/171, afirmando que teria enviado Memorando à Delegacia da Receita Federal do Brasil em Recife, para o fim de perquirir a causa que motivou a não inclusão de débito da Autora na consolidação final da modalidade parcelamento “L 11941 – RFB – PREV – ART. 1”, o qual se encontraria ativo no âmbito da RFB, embora tivesse sido objeto de confissão irretratável e irrevogável pela Contribuinte-Autora. Ao final, requereu: a desconsideração dos argumentos lançados pela Autora às fls. 155/164, e reiterando o pleito de improcedência do pedido; que seja concedido à Fazenda Nacional o prazo de 15 dias para acostar aos autos resposta ao Memorando por ela encaminhado à DRF/Recife para melhor esclarecimento dos fatos ora discutidos. Juntou documentos, fls. 172/179.

Deferido o pedido formulado pela União à fl. 171, a União ingressou com a petição de fl. 182, requerendo a juntada do Memorando nº 290/2012-SECAT/DRF/REC/PE, no qual estariam ratificadas as informações anteriormente prestadas no sentido de que a Autora teria promovido a interrupção do prazo prescricional ao optar por parcelar a totalidade dos débitos junto à Fazenda Nacional; que, portanto, não haveria como concordar com a tese desenvolvida na Petição Inicial. Reiterou o teor do disposto na petição de fls. 166/171, aliado ao fato de que a suposta intenção da parte autora de não promover o devido parcelamento da totalidade dos seus débitos deveria ter sido objeto de comunicação à RFB, a fim de que a mesma prosseguisse na exigibilidade do seu crédito; que, pensar de outro modo, seria garantir ao contribuinte o poder de se beneficiar do fato de induzir a Fazenda Nacional a erro. Reiterou o pedido de improcedência do feito e requereu a  juntada de documentos, fls. 183/192.

 A parte autora manifestou-se às fls. 195/197 sobre a petição juntada pela União à fl. 182 e documentos a ela acostados às fls. 183/192, alegando, em síntese, que os argumentos e documentos juntados pela União não afastariam o direito da Autora, ao contrário, confirmariam o seu direito; que a Autora teria pretendido incluir todos os seus débitos no parcelamento especial, formulando adesão ainda no ano de 2010, todavia, a União não teria feito a inclusão do aludido débito quando da consolidação, de forma que o mencionado valor não teria sido incluído no parcelamento, e permaneceria exigível até o momento, sendo, atualmente, objeto de execução fiscal, processo nº 0000331-79.2012.4.05.8311 na 30ª Vara Federal desta Seção Judiciária. Teceu outros comentários e pugnou pela procedência do pedido.

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o Relatório. Passo a decidir.


Fundamentação


1. Diante da r. decisão do d. Magistrado Federal da 30ª Vara Federal desta Seção Judiciária, cuja cópia se encontra à fl. 161 destes autos, e considerando que as regras administrativas que instituíram referida Vara não permitem que julgue ação pelo rito ordinário, vou julgar esta ação ignorando por completo a existência da noticiada ação de execução fiscal, bem como o fato de que a ora Autora não interpôs, perante aquele juízo, a respectiva ação de embargos à mencionada execução fiscal.

2. A decadência e a prescrição tributárias envolvem normas de ordem pública e é por isso que ambas têm o mesmo efeito quanto ao crédito tributário, qual seja, quando qualquer delas se concretiza extingue esse crédito, conforme regra expressa do inciso V do art. 156 do Código Tributário Nacional.


Então, quando um Juiz recebe em mãos uma ação de execução fiscal, antes de deferir a citação, com todas as suas consequências, tem a obrigação de primeiro examinar, de ofício, se algum desses dois fenômenos aconteceu e, caso constate a ocorrência de algum deles, é obrigado a dar a obrigação tributária por extinta, bem como o respectivo crédito tributário(§ 1º do art. 113 c/c o inciso V do art. 156, ambos do Código Tributário Nacional).

Aliás, quanto à prescrição, esse procedimento do magistrado também passou a ser obrigatório no campo do direito privado, depois da inclusão do § 5º do art. 219 do Código de Processo Civil, pela Lei nº 11.280, de 16.02.2006, dispositivo esse que findou por revogar o art. 194 do Código Civil de 2002.

A apreciação desses fenômenos, no campo tributário, nunca dependeu, pois, data maxima venia, da oposição de embargos à execução fiscal. 

Aliás, atualmente, na área federal, até mesmo a Autoridade Administrativa tem poderes para reconhecer a prescrição tributária de ofício, conforme regras consignadas no art. 53 e respectivo Parágrafo Único da Lei nº 11.941, de 2009. 

3. Examinemos, pois, se os créditos tributários em questão encontram-se ou não fulminados pela decadência ou pela prescrição.

 3.1 - Como se sabe, em direito tributário a decadência incide sobre o direito de a Fazenda Pública(na verdade, um poder-dever)lançar, ato esse que torna o crédito tributário líquido e certo, mas exigível apenas depois do término do prazo legal(na área federal esse prazo é de 30-trinta dias)para o Contribuinte impugnar. Caso não haja a impugnação nesse prazo legal, tem-se que o crédito tributário passou a ser líquido, certo e exigível. Se houver a impugnação, o atributo exigibilidade só se iniciará depois de findo o respectivo processo administrativo(e nesse sentido há julgado do plenário do C. Supremo Tribunal Federal desde o ano de 1982, Recurso Extraordinário nº 94.462/SP, União x Fibratam S/A, Rel. Min. Moreira Alves, acórdão de 06.10.1982, Revista Trimestral de Jurisprudência-RTJ, v. 106, nº 1, p. 263-270, out, 1993, Pleno do C.Supremo Tribunal Federal). A partir de então, inicia-se o prazo de prescrição.

 3.2 - O prazo de decadência é de cinco anos, com início a depender do tipo de lançamento a que se submete o tributo. Se o tributo for submetido a lançamento por homologação, o prazo de cinco anos para a Fazenda Pública lançar(na verdade, homologar os procedimentos feitos até então pelo Contribuinte)inicia-se a partir do dia seguinte à data do fato gerador(§ 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional). Se o tributo for submetido às demais modalidades de lançamento(de ofício ou direto, misto ou por declaração), o prazo de cinco anos inicia-se a partir do dia primeiro do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado(inciso I do art. 173 do Código Tributário Nacional), ou da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício de forma, o lançamento anteriormente efetuado(inciso II do art. 173 do Código Tributário Nacional). 

 No caso de tributo submetido a lançamento por homologação, se houver total omissão do Contribuinte, quanto aos procedimentos que lhe caberiam, resta pacificado na doutrina e em boa parte da jurisprudência que o prazo de decadência, para lançar, passa a ser contado como se lançamento de ofício fosse, ou seja, passa a se aplicar a regra do inciso I do art. 173 do Código Tributário Nacional.

 Tenho entendido que, nessa situação, caso fique comprovada má-fé do Contribuinte, e, portanto, dolo, o prazo de cinco anos para a Fazenda Pública lançar só se iniciará a partir do momento em que ela descobrir a fraude do Contribuinte e notificá-lo do início do procedimento tendente à realização do lançamento(final do § 4º do art. 150 c/c Parágrafo Único do art. 173, todos do Código Tributário Nacional). Esse entendimento, que sustentei em tese de mestrado, no ano de 1999, na Faculdade de Direito do Recife da Universidade Federal de Pernambuco, aprovada e publicada em livro[1], mutatis mutandis, vem sendo adotado em julgados recentes do E. Superior Tribunal de Justiça, inclusive da sua 3ª Seção, verbis:

“5. O prazo decadencial de 5(cinco)anos do direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários não corre quando comprovada má-fé.”. [2]

I-O prazo decadencial para a Administração anular atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos administrados decai em cinco anos, contados de 1º/2/1999, data da entrada em vigor da Lei nº 9.784/99. Contudo, o decurso do tempo não é o único elemento a ser analisado para verificação da decadência administrativa. Embora esta se imponha como óbice à autotutela tanto nos autos nulos quando nos anuláveis, a má-fé do beneficiário afasta sua incidência.”.[3]

 O C. Supremo Tribunal Federal[4] e o E. Superior Tribunal de Justiça têm firme jurisprudência no sentido de que é constitucional a legislação que permite à Fazenda Pública considerar como lançamento definitivo declaração feita pelo próprio Contribuinte, situação essa que implica cessação da fluência do prazo de decadência e imediato início da fluência do prazo de prescrição do tributo.

 A respeito desse assunto, o E. Superior Tribunal de Justiça até já sumulou sua jurisprudência: “Súmula 436 – A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensando qualquer outra providência por parte do fisco”

 3.3 – Já a prescrição tributária, cujo prazo é também de cinco anos,  submete-se às regras do art. 174 e respectivo Parágrafo Único do Código Tributário Nacional que, como vimos, só passam a incidir a partir do dia seguinte à data em que o crédito tributário passa a ser exigível, não podendo fluir prazo de prescrição enquanto a Fazenda Pública não puder cobrar esse crédito.

 3.4 – No presente caso, a Empresa Autora alega que houve prescrição do crédito tributário lançado no processo LDCG/DCG 393116964, pugnando pelo reconhecimento dessa prescrição e extinção do processo, com resolução do mérito.

 Tem-se, então, que a Autora não discorda da forma pela qual o crédito tributário em questão foi lançado, ou seja, que referido crédito teve lançamento concretizado com base em declaração por ela mesma efetuada e foi realizado dentro do prazo legal de cinco anos.

 A UNIÃO(Fazenda Nacional)alega, na contestação(fls. 121-126), que o lançamento dos tributos em questão foi feito com base em declaração apresentada pela própria ora Autora e que essa declaração, relativa aos créditos das competências de 01/2003 a 06/2004, fora feita tempestivamente e ratificada, posteriormente, no segundo semestre de 2006.

 E, como já dito, disso a ora Autora não discorda, pois não discute se, quando apresentou referida declaração, o crédito tributário já fora ou não fulminado pela decadência, uma vez que levanta apenas a exceção de prescrição.

 Qual foi a data em que a ora Autora apresentou a declaração pela primeira vez?

 É importante chegar a essa data, pois a partir do dia seguinte a essa data, começou a fluir prazo de prescrição, que pode ter sido interrompido com a entrega de outra declaração, que, segundo a contestação, teria ocorrido no segundo semestre de 2006 e nova interrupção em 22.06.2010 quando, segundo a contestação, a ora Autora teria confessado a dívida e requerido o respectivo parcelamento pelas regras da Lei nº 11.941, de 2009.

 Extrai-se do documento da Receita Federal, acostado às fls. 129-130, que a ora Autora entregou as declarações dos créditos tributários de 01/2003 a 06/2004 nas seguintes datas:

 Créditos tributários                       Data de Entrega da Declaração

 

                01/2003                                                13.09.2006

                02/2003                                                13.09.2006

                03/2003                                                13.09.2006

                04/2003                                                12.02.2008

                05/2003                                                17.08.2006

                06/2003                                                sem informação

                07/2003                                                 sem informação

                08/2003                                                  07.09.2006

                09/2003                                                  15.09.2006

                10/2003                                                  18.08.2006

                11/2003                                                  21.08.2006

                12/2003                                                  21.08.2006

                13/2003                                                  15.09.2006

                 Obs.: esta informação está incorreta, pois não existe o 13º mês.

                01/2004                                                   23.08.2006

                02/2004                                                   23.08.2006

                03/2004                                                    23.08.2006

                 04/2004                                                   24.08.2006

                 05/2004                                                   24.08.2006

                 06/2004                                                   24.08.2006.               

 
Note-se que nesse documento, originário da Receita Federal do Brasil, não se encontram todos os meses dentro do período em debate, que seria de 01/2003 a 06/2004, além da apontada falha, na qual se indicou o mês 13º, inexistente.

Então, o prazo de prescrição de cada crédito tributário das competências supra-relacionadas iniciou-se no dia seguinte às datas da entrega da declaração, igualmente constantes da relação supra.

Quanto à alegada interrupção da prescrição,  em 22.06.2010, quando a ora Autora teria confessado o total da dívida e requerido parcelamento, pelas regras da Lei nº 11.941, de 2009, alega a Autora, na sua réplica de fls. 155-156, que mencionados créditos tributários não teriam sido objeto do noticiado parcelamento, é tanto que estariam sendo objeto de execução fiscal, nos autos do processo acima referido, em tramitação na mencionada 30ª vara federal desta seção judiciária.

E prova a Autora, com o documento de fl. 159, que foram objeto de parcelamento apenas os créditos tributários das competências de 01.01.2006 a 01.11.2006.

A UNIÃO, intimada para falar desse documento, manifestou-se às fls. 166-171, não  impugnou referido documento e não provou que os créditos tributários das competências de 01/2003 a 06/2004 tenham efetivamente sido objeto do noticiado pedido de parcelamento, de forma que a fluência do respectivo prazo de prescrição não sofreu a alegada, pela União, interrupção. Ou seja, tais créditos não foram objeto do noticiado pedido de parcelamento.

Constato que a ação de execução fiscal foi distribuída em 28.03.2012, quando, considerando as datas em que a ora Autora entregou as respectivas declarações(v. relação acima), há muito tinha ocorrido a prescrição dos mencionados créditos tributários.

Logo, prospera o pleito da Autora.

3.5 – Diante do quadro supra, e agora restando claro que a Autora não agiu dolosamente, é tanto que declarou os ora questionados créditos tributários, tenho que se perfez a verossimilhança exigida pelo art. 273 do Código de Processo Civil, situação essa que implica revogação da decisão de fls. 119-119vº, e concessão da antecipação da tutela, para suspender a exigibilidade dos créditos tributários em questão, até o reexame desta sentença pelas Cortes superiores.

Conclusão

POSTO ISSO: a) preliminarmente, revogo a decisão de fls. 119-119vº e defiro o pedido de antecipação da tutela, suspendendo em caráter definitivo a exigibilidade dos créditos tributários em questão; b) julgo procedentes os pedidos desta ação, pronuncio a prescrição dos créditos tributários em questão e, à luz do inciso V do art. 156 do Código Tributário Nacional,   dou-lhes por extinto, para todos os fins de direito, bem como por extinto este processo, com resolução do mérito, e condeno a  UNIÃO a ressarcir as custas processuais despendidas pela Autora, bem como a pagar-lhe verba honorária, pelo percentual mínimo legal, qual seja, 10%(dez por cento)do valor dos créditos tributários em questão(R$ 412.010,49), base de cálculo essa que, para apuração do valor final dessa verba honorária, será monetariamente corrigida a partir do mês seguinte ao da data da distribuição desta ação, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal-CJF.     

De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição, afastando o efeito suspensivo quanto a acima consignada suspensão da exigibilidade dos créditos tributários em questão.

Com urgência, remeta-se cópia desta sentença para os autos da noticiada ação de execução fiscal, aos cuidados do d. magistrado da 30ª Vara Federal desta seção judiciária, que preside referido feito, para os fins legais pertinentes.
                                                                                                                                                                                 

P.R.I.


Recife, 11 de dezembro de 2012.


Francisco Alves dos Santos Júnior
  Juiz Federal, 2ª Vara-PE

 






[1] Sustentei essa tese no meu livro Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil: Análise das Principais Teorias Existentes e Proposta para Alteração da Respectiva Legislação, Rio de Janeiro, Renovar, 2001,  p. 283-284.


[2] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. ROMS 200701724600. Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima. DJe de 16.02.2009[5ª Turma]. 

 


[3] _______________MS 2000800558673. Relator Ministro Félix Fischer. DJe de 02.02.2009.[3ª Seção].

 


[4] BRASIL. C. Supremo Tribunal Federal. AR/AI nº 144.609-9, 2ª Turma. e em Despacho, no AI nº 217.280-5. Apud MAIA, Mary Elber Gomes Queiroz. Do Lançamento Tributário – Execução e Controle. Dialética, 1999, p. 19-20.