quarta-feira, 21 de novembro de 2012

CASOU ENGANADO, NÃO ERA O PAI DA CRIANÇA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.

Marido que descobriu não ser o pai biológico do filho será indenizado


     O Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu indenização a um homem após ele constatar que não era o pai biológico do filho. A decisão da 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que a conduta desonrosa da ex-mulher ocasionou ao autor sofrimento e humilhação, com repercussão na esfera moral.

     O autor sustentou que se casou com a requerida, com quem namorava, somente porque ela ficou grávida. Tempos depois, após ter se submetido a exame de DNA, ficou constatado que não era o pai biológico do filho dela e pediu 50 salários mínimos pelos danos morais sofridos.

     A decisão de 1ª instância condenou a requerida a indenizar o companheiro em 15 salários mínimos por danos morais. De acordo com o texto da sentença, é cabível a indenização por dano moral, com a finalidade tanto de punir a ré por ter mantido o autor em engano por muito tempo, quanto de compensar o autor pela humilhação sofrida.

     Ela recorreu da decisão, sustentando que tal situação não seria passível de ensejar qualquer ofensa à honra do autor. Alternativamente, pediu a redução do valor fixado.

     O relator do processo, desembargador Luiz Antonio de Godoy, entendeu que a sentença combatida trouxe adequada solução à questão, merecendo ser integralmente confirmada. Os desembargadores Rui Cascaldi e Paulo Eduardo Razuk também participaram do julgamento e acompanharam o voto do relator.

     Apelação nº 0002188-78.2007.8.26.0629. Comunicação Social TJSP AG (texto) / Internet (foto ilustrativa) / DS (arte)
imprensatj@tjsp.jus.br  
Extraído de: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo  - 19 de Novembro de 2012



domingo, 4 de novembro de 2012

ENSINO SUPERIOR. A IMUNIDADE DO INCISO IV DO ART. 206 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O inciso IV do art. 206 da Constituição da República Federativa do Brasil assegura  “gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais”.

Não obstante a clareza desse texto constitucional, as Universidades Públicas Federais e Estaduais passaram a cobrar “taxa” de matrícula dos alunos, os quais insurgiram-se e o caso chegou ao Supremo Tribunal Federal-STF que findou por sumular sua jurisprudência nos seguintes termos:

“Súmula Vinculante nº 12 – A cobrança de taxa de matrícula nas Universidades Públicas viola o disposto no art. 206, IV, da Constituição Federal”.
 
Na verdade, como lembrou a Ministra Carmem Lúcia do Supremo Tribunal Federal-STF, no voto que lançou no julgamento de um dos recursos extraordinários que deram origem à mencionada Súmula(Recurso Extraordinário nº 500.171-7/GO), não se trata de taxa, mas sim de preço público e como tal fora instituído na Universidade de Minas Gerais, no ano de 1992, pelo então Reitor Mendes Pimentel, com a finalidade de utilizar os respectivos recursos no financiamento de bolsas de estudos para os estudantes carentes.
             
        E realmente trata-se de preço público, porque o ensino superior não é uma atividade exclusiva do Estado e quando isso acontece o valor cobrado por Ente Público não tem a roupagem de taxa.

Mas, mesmo sendo preço público, o Supremo Tribunal Federal-STF findou por consagrar o entendimento segundo o qual referida regra constitucional fixa uma imunidade de cunho objetivo, no campo do direito constitucional-financeiro, assegurando a totalidade da gratuidade do ensino oficial superior. 

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

A PERÍCIA MÉDICO-JUDICIAL DEBATIDA NA ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE MEDICINA-APM


Encontro Científico na Associação Paulista de Medicina-AMP a Respeito da Perícia Médica Civil e Previdenciária em Pessoas Pobres na Justiça Federal do Brasil,  o Baixo Valor dos Honorários dos Médicos Fixados pelo Conselho da Justiça Federal – CJF, Decorrente do Arrocho Orçamentário Imposto pelo Poder Executivo Federal, e a Possível Criação de um Departamento Federal de Perícias[1]
Por Francisco Alves dos Santos Júnior, Juiz Federal, titular da 2ª Vara-PE,  Professor Universitário, autor de livros e de artigos publicados em jornais e revistas especializadas.

        Introdução
       A minha participação no importante Encontro Científico, realizado na Associação Paulista de Medicina – AMP, em conjunto com a Associação Paulista de Medicina do Trabalho – APMT, Sociedade Brasileira de Perícias Médicas – SBPM, Associação Nacional de Médicos Peritos – ANMP, Sindicato dos Médicos de São Paulo – SMSP e Institutos de Advogados Previdenciários de São Paulo – IAPSP, realizado no dia 24.09.2012, onde defendi as ideias abaixo alinhavadas e ligeiramente modificadas daquelas que lá desenvolvi, decorreu, certamente, de decisão que proferi nos autos de uma ação indenizatória, na qual fiz uma espécie de desabafo, em virtude das inúmeras negativas de médicos particulares da cidade do Recife de realizem perícia em um Autor pobre, em gozo do benefício da denominada “Justiça Gratuita”, hemofílico e aidético, que pleiteia indenização por danos materiais e morais contra a União, HEMOPE(Ente do Estado de Pernambuco que colhe e fornece sangue para transfusão) e  a Empresa que importou hemoderivados de sangue na época da alegada contaminação.
  
Aquela decisão teve ampla repercussão na imprensa, inclusive no blog do jornalista FredericoVasconcelos, na folha on line de 04.05.2012, que tratou do assunto com o título de “Médicos negam-se a fazer perícias em pobres”, onde gerou a participação de mais de oitenta leitores, uns criticando azedamente a decisão judicial e outros a elogiando, numa demonstração clara que o assunto é polêmico e representa um dos grandes problemas sociais que temos no Brasil.
Em tal decisão foi proposta a criação de um Departamento Federal de Perícias Médicas, para que o Judiciário Federal não fique dependendo de médicos particulares, pagos pela própria Justiça Federal, que, para tanto, nunca tem dotação orçamentária suficiente, pelo que se vê obrigada a estabelecer honorários em valores baixos, com relação aos valores de  mercado(examinaremos, abaixo, os valores atualmente em vigor).
E o Judiciário Federal brasileiro não pode fixar valores maiores em face do seu crônico problema orçamentário, uma vez que o projeto de lei do  orçamento anual é da exclusiva competência do Chefe do Poder Executivo Federal(art. 165 da Constituição), que nunca acolhe as propostas do Chefe do Poder Judiciário Federal(art. 99 da Constituição), de forma que a independência político-administrativa deste finda por se encontrar ameaçada, porque em um regime capitalista, sem dinheiro, nada se faz e não se exerce nenhum poder(no final do tópico "A Importância da Perícia Médica no Campo Civil e Previdenciário" volto a esse assunto).
 
O Tema do Encontro do Título
No mencionado Encontro Científico, coube-me discutir o assunto no campo civil-previdenciário e processual civil, área em que atuo na Justiça Federal.
A Importância da Perícia Médica no Campo Civil e Previdenciário
1.                    As regras do chamado direito material(direito civil e direito previdenciário)exigem a realização de prova médico-pericial quando a resolução de alguma questão judicial envolve problema de saúde, por exemplo, para gozo de alguma indenização decorrente de danos estéticos, gozo de aposentadoria por invalidez, etc.
E quando algo assim acontece e a pretensão é dirigida contra a União, Empresas Públicas Federais, Autarquias Federais e Fundações Públicas Federais, a ação é proposta na Justiça federal, que,  por força do art. 109, inciso I, da Constituição da República em vigor, tem competência exclusiva para apreciar e julgar processos envolvendo essas pessoas jurídicas estatais.
E nesses casos o Autor da ação, regra geral, é pessoa pobre, em gozo do benefício assistencial judicial, popularmente conhecido como “benefício da justiça gratuita”, até hoje regido pela Lei nº 1.060, de 1950, com algumas alterações.
2.                    O atual Código Civil do Brasil, Lei nº 10.406, de 10.01.2002,  nos seus artigos 231 e 232, veicula regras que geram presunção iuris tantum contra aquele que se nega a ser submetido à exame médico, não poucas vezes necessários à concretização da perícia médica, verbis:
“Art. 231. Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário não poderá aproveitar-se de sua recusa.
Art. 232. A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame.”
Então, nessa situação surge uma presunção iuris tantum contra aquele que se nega a ser submetido à perícia médica e, por lógica jurídica, a favor daquele que a perícia médica poderia provar determinado fato ou determinada situação. Se João propõe uma ação contra o INSS, pedindo aposentadoria por invalidez, alegando determinado problema de saúde, e nega-se a ser submetido a exame médico-pericial, tem-se que não fez a prova e o seu pedido é julgado improcedente, isto é, o INSS sai-se vencedor. Outro exemplo, muito comum, se Pedro, acusado por Maria de ser pai do filho desta, nega-se a fazer o exame pericial de DNA, presume-se que realmente seja o Pai da criança e, caso não haja nos autos alguma outra prova que afaste totalmente essa possibilidade(por exemplo, os resultados do exame de sangue dos três, feito anteriormente, demonstrando que o garoto não pode ser filho de Pedro, à vista do fator RH dos três; ou então exame médico provando que o Pedro é estéril), então Pedro será considerado Pai do filho de Maria. E nesse sentido posicionou-se a maioria dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária de 10.11.1994, no julgamento do habeas corpus n° 71.373-4/RS(relator originário ministro Francisco Rezek(vencido), relator para o acórdão ministro Marco Aurélio, julgado em 10.11.1994, por maioria, DJU de 22.11.1996, p. 45.686). A 2ª turma desse mesmo Tribunal, por unanimidade, no julgamento do recurso extraordinário nº 110.315/SP, em 06.11.1987, tendo por relator ministro Aldir Passarinho, publicado no Diário da Justiça da União-DJU de 05.02.1988, p. 1388. E foi esse o entendimento abraçado pelo Superior Tribunal de Justiça, na sua Súmula 301, que tem o seguinte texto: “Em ação investigatória de paternidade, a recusa do suposto Pai a submeter-se ao exame do DNA induz presunção iuris tantum de paternidade”. 
Mas, no caso do exame do DNA, quando esse Pai concorda, a Lei nº 10.317, de 06.12.2011, acrescentou regra à Lei n° 1.060, de 1950, que trata da Assistência Judiciária, estabelecendo que, caso a Autora esteja em gozo do benefício da Justiça Gratuita, as despesas desse exame serão custeadas pelo Poder Público.
3.                    Já no campo da Previdência Social,  no qual os benefícios são pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, a matéria é regida, atualmente, pela Lei nº 8.213, de 1991.
Extrai-se do inciso II do art. 26 dessa Lei que os Segurados do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, com ou sem carência, podem ter o direito de receber auxílio-doença ou aposentar-se por invalidez, nos casos de acidentes de qualquer natureza ou quando acometidos de doenças que os impeçam de trabalhar.
O Supremo Tribunal Federal submeteu à repercussão geral  recurso extraordinário no qual se discute a seguinte questão: pode o  Segurado do INSS pleitear um desses benefícios diretamente na Justiça Federal, ou seja, antes de fazer o pedido na via administrativa e ter esse pedido negado nessa via?
Mas se o pedido for negado ao Segurado na via administrativa, não há dúvida que ele poderá renová-lo na via judicial e nesse tipo de ação judicial, quando a pretensão do Segurado-Autor for contestada pelo INSS, pode surgir a necessidade da realização de perícia médica, para provar se o Segurado-Autor realmente encontra-se acometido de alguma doença que o impeça de continuar trabalhando.
Como o juiz não pode nomear médico-perito do próprio INSS, réu na ação, para realizar a perícia e a Justiça Federal não tem um corpo de médicos-peritos e não há um Departamento Federal de Perícias, o juiz vê-se obrigado a nomear um médico particular, cujo nome está em uma relação de médicos na secretaria do juízo, fornecida pelo Sindicato dos Médicos ou por outras Entidades Médicas, públicas e/ou particulares, médico esse que o juiz não conhece e não tem a menor ideia de quem seja.
Quando o Segurado-Autor não está em gozo da assistência judiciária, vale dizer, não está em gozo da denominada justiça gratuita, o juiz arbitra os honorários, observando o preço de mercado,  esse Autor deposita e a perícia é realizada com certa celeridade.
O problema surge quando o Segurado-Autor é pobre, e isso corresponde a quase 100%(cem por cento)dos casos, situação em que o juiz é obrigado, quanto aos honorários do Perito, a seguir regras e tabela de Resolução do Conselho da Justiça Federal-CJF.     
A Resolução que está em vigor atualmente é a de nº 558, de 22.05.2007 desse Conselho, publicada no DOU de 29.05.2007, da qual vamos destacar alguns tópicos.
Eis a sua ementa:
“Dispõe sobre o pagamento de honorários de advogados dativos, curadores, peritos, tradutores e intérpretes, em casos de assistência judiciária gratuita, e disciplina os procedimentos relativos ao cadastramento de advogados voluntários e dativos no âmbito da Justiça Federal de primeiro e segundo graus e dos Juizados Especiais Federais.”.
Nessa Resolução há uma preocupação importante: o problema orçamentário:
“Art.1º (...). § 1º(...). § 2º (...).
§ 3º Os recursos vinculados ao custeio da assistência judiciária aos necessitados destinam-se ao pagamento de honorários dos advogados dativos, curadores, peritos, tradutores e intérpretes.”.
E, quanto a esse assunto, para os Juizados Especiais Federais há outra regra específica, mas bem semelhante, e que se encontra no § 2º do art. 3º da Resolução, com a seguinte redação:
“§ 2º Nos Juizados Especiais Federais, os honorários de perito serão pagos à conta de verba orçamentária da respectiva Seção Judiciária e, quando vencida na causa a entidade pública, seu valor será incluído na ordem de pagamento a ser feita em favor da Seção Judiciária.”.

Note-se que as duas dotações orçamentárias fazem parte do total da verba orçamentária do Poder Judiciário Federal, verba essa que, como vimos na primeira parte deste trabalho, depende de projeto do(a) Chefe(a) do Poder Executivo Federal, o(a) qual vem ignorando, olimpicamente, ano a ano, a proposta que o Chefe do Poder Judiciário Federal, elaborada em conjunto com o Conselho da Justiça Federal e com os Presidentes do Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais, apresenta todos os anos, proposta essa que referido(a) Chefe(a) do Poder Executivo Federal deveria incorporar no total do seu projeto de Lei, a ser encaminhado ao Poder Legislativo Federal e, não só a  ignora, como a substitui por outra, de sua própria iniciativa, ferindo, assim, de morte a autonomia político-administrativa e orçamentária do Poder Judiciário, fixada no art. 99 da Constituição da República, e o faz com valores desatualizados, às vezes até menores que o do orçamento do ano anterior.
Neste ano de 2012, o problema chegou a tal ponto que forçou  o Chefe do Ministério Público Federal(que também goza de autonomia administrativa e financeira, §§ 2º e 3º do art. 127 da Constituição da República, mas que vem sofrendo da mesma violência sofrida pelo Poder Judiciário Federal)a impetrar um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal contra o ato da Presidente da República e da sua Ministra do Planejamento, que simplesmente ignoraram a proposta orçamentária que enviou para o exercício financeiro de 2013.
O arbitramento do valor dos honorários do perito judicial cabe ao Juiz da causa, mas, conforme consta do § 4º do artigo 1º da mencionada Resolução,  o juiz é obrigado a obedecer a tabela de honorários e aos critérios nela fixados.

É verdade que o § 1° do art. 3º dessa Resolução admite que o juiz, “atendendo ao grau de especialização do perito, à complexidade do exame e ao local de sua realização”, poderá fixar os honorários do Perito no triplo do valor máximo da tabela, comunicando sua decisão ao Corregedor ao qual se encontra submetido. Obviamente, diante desse quadro, o Juiz só poderá dar andamento ao processo depois que receber uma resposta desse Corregedor.
É também verdade que, se o Perito comprovar que necessita  de valores para a satisfação antecipada de despesas nos trabalhos iniciais da perícia, o Juiz pode antecipar 30%(trinta por cento)dos honorários fixados(§ 3º do art. 3º da Resolução). 
 Ainda é verdade que o Perito, para receber o valor dos seus honorários, não precisa esperar que haja o trânsito em julgado da sentença do Juiz ou do acórdão do Tribunal, pois o pagamento será feito após o término do prazo para que as Partes do processo se manifestem sobre o laudo ou, havendo solicitação de esclarecimentos das Partes ou de alguma delas, depois que o Perito prestar esses esclarecimentos(art 3º, caput, dessa Resolução).
O problema é que a tabela da Resolução acima indicada do Conselho da Justiça Federal não vem sendo reajustada desde o ano de 2007, por falta de dotação orçamentária, dotação essa que, como vimos acima, fica nas mãos do(a) Chefe do Poder Executivo Federal, quando da elaboração da Lei do Orçamento Anual.  
Eis a tabela dos honorários periciais em vigor, fixada na referida Resolução:
TABELA II
HONORÁRIOS PERICIAIS
PERÍCIAS
VALOR MÍNIMO (R$)
VALOR MAXIMO (R$)
Área de Engenharia
140,88
352,20
Outras áreas
58,70
234,80
Note-se que os honorários dos Médicos-Peritos ficam arrolados entre “Outras Áreas” e entre os menores valores, situação essa que não pode perdurar, por se tratar de profissionais de grande respeitabilidade no seio social e cuja formatura exige muitos anos de estudos e investimentos financeiros de grande monta das respectivas famílias. 
Quando se trata de uma perícia médica simples, que não exija muito da capacidade e do tempo do médico e ele resida em região mais pobre do País,  o triplo do valor máximo acima indicado corresponde a R$ 704,04(setecentos e quatro reais e quatro centavos), então, pelo menos em Recife-PE, onde atuo, os médicos não têm se negado a realizar a perícia.
No entanto, quando se trata de uma perícia médica mais complexa, o Médico nomeado, aleatoriamente, pelo juiz  simplesmente nega-se a realizar a perícia. 
Às vezes, o Médico nomeado diz claramente que os honorários pagos pela Justiça são muito baixos. Outras vezes alega falta de tempo ou desconhecimento técnico da matéria.
Então o Juiz nomeia outro Médico-Perito e, com relação àquele, comunica o fato ao Conselho Regional de Medicina para examinar sua conduta e, se for o caso, aplicar-lhe a pena prevista no respectivo Código de Ética.
 Não poucas vezes, o Juiz chega a nomear de cinco a seis Médicos, até encontrar um, aquele que certamente tem algum envolvimento social com sua profissão ou tem uma veia mais humanitária, que finda por fazer a perícia.
No caso que provocou a decisão, indicada na “Introdução” deste trabalho, o último médico nomeado alegou que não poderia realizar a perícia, porque não tinha conhecimento técnico suficiente para realizá-la, embora fosse um infectologista e a perícia seria apenas para saber se era possível esclarecer, pela documentação médica acostada nos autos, se o Autor fora infectado pelo vírus da AIDS quando recebera, anos atrás, transfusão de sangue no HEMOPE(Entidade Estatal do Estado de Pernambuco), mediante aplicação de hemoderivados importados por uma Empresa Privada e vendidos ao Serviço Único de Saúde da União, que, por sua vez, os repassara para o referido HEMOPE.
Poderia o Juiz, nesse caso, aplicar a multa ao Médico, como estabelecido no Parágrafo Único do art. 424 do Código de Processo Civil?
Tenho entendido que não.
Nem mesmo quando o Médico nega-se a fazer a Perícia, alegando ser baixo o valor dos honorários médicos, quer me parecer que o Juiz possa aplicar referida multa, porque reza o Parágrafo Único do art. 98 do Código de Étíca Médica(Resolução n° 1931, de 2009) que “o médico tem direito a justa remuneração pela realização do exame médico pericial”e o Juiz não tem como argumentar que o valor dos honorários da tabela do Conselho da Justiça Federal-CNJ seja corresponde a uma “justa remuneração”, para casos de perícias médicas mais complexas, que exijam maiores estudos e maiores conhecimentos médico-científicos.    
O Juiz só pode aplicar ao Perito, seja médico ou não, a multa do referido Parágrafo Único do art. 424 do Código de Processo Civil quando ocorrer a hipótese do inciso II desse seu artigo, que tem a seguinte redação: “II – sem motivo legítimo, deixar de cumprir o encargo no prazo que lhe foi assinado”,  hipótese em que o Juiz poderá substituí-lo por outro Perito e ainda aplicar-lhe multa, “fixada tendo em vista o valor da causa e o possível prejuízo decorrente do atraso no processo”, conforme reza o mencionado Parágrafo Único.  E nesse caso, também cabe comunicação ao respectivo Conselho Regional de Medicina, para que este aplique a penalidade ética pertinente.
E como poderíamos resolver esse crítico problema nacional?

Na decisão referida na “introdução” deste trabalho, propus a possível criação de um Departamento Federal de Perícias Médicas - DFPM.
Hoje, admito que a ideia deve ser ampliada, porque os problemas periciais, envolvendo pessoas pobres, ocorrem em todas as áreas do conhecimento, então, ao invés de apenas um Departamento Federal de Perícias Médicas – DFPM, poderíamos pensar em um Departamento Federal de Perícias, com cargos para peritos das principais atividades profissionais do Brasil, tais como médicos(de todas as especialidades), contadores, engenheiros civis, engenheiros de pesca e ambientais e biólogos(estes três últimos muito exigidos atualmente em perícias envolvendo problemas ambientais), bioquímicos e farmacêuticos.
Como o Judiciário já tem inúmeros problemas administrativos, creio que esse Departamento não deve ficar sob sua órbita, mas sim vinculado ao Ministério da Justiça do Poder Executivo, pois incorporaria também os Peritos da Polícia Federal.
No entanto, imagino esse Departamento com o máximo de autonomia administrativa e com completa autonomia orçamentária, com competência para realizar perícias para fins administrativos e judiciais, com Profissionais de  carreira, concursados, devendo ter um Diretor Presidente escolhido entre esses Profissionais, em lista tríplice decorrente de votação interna de todos que fazem parte do seu quadro e que sejam concursados. Os Profissionais-Peritos, acima indicados, devem ter carga horária diária de 6(seis)horas, podendo exercer outro cargo da mesma profissão, no setor público ou privado, desde que sem coincidência de horário, devendo a indicação do Profissional para perícia ser feita por distribuição informatizada, organizada nesse Departamento, para que um mesmo Profissional não fique sobrecarregado e evite-se apadrinhamentos internos, sendo que o Juiz, para os casos judiciais, o nomeará para o feito depois de comunicado dessa distribuição interna computadorizada. A remuneração desse profissional deve seguir o sistema de subsídio mensal, proporcional aos subsídios dos membros da Advocacia Geral da União-AGU. Logo, não haverá honorários por cada perícia, pois o profissional será um servidor público federal de carreira.
A criação desse Departamento passa, obrigatoriamente, pelo Chefe do Poder Executivo Federal, porque, como haverá a criação de cargos e de despesas, o respectivo projeto de lei será da sua exclusiva competência(alínea ”a”, “c” e “e” do § 1º do art. 61, c/c art. 84-XXII e art. 165, todos da Constituição da República), de forma que qualquer Entidade ou Parlamentar que quiser enviar proposta para tal finalidade deve, antes, procurar apoio em um largo leque de grupos e Entidades envolvidas com a questão, sob pena de correr o risco de um grande fracasso, sobretudo na atualidade em que, surpreendentemente, o governo do Partido dos Trabalhadores só pensa em privatizar.
  São essas as nossas ideias para colaborar na solução desse grave problema nacional.

Muito obrigado.


NOTA: os honorários de advogados e peritos na Justiça Estadual, relativamente a processos de pessoas pobres, que gozam da denominada Justiça Gratuita,  também sofrem de sérios problemas.
No final do seu mandato na presidência do Supremo Tribunal Federal e, consequentemente, também na presidência do Conselho Nacional da Justiça – CNJ, o ministro César Peluzo, em decorrência desta última presidência, baixou a Portaria CNJ nº 127, de 15.03.2011, tratando do assunto e nela estabeleceu que o valor máximo dos honorários será de R$ 1.000,00(hum mil reais), que, no entanto, poderá quintuplicar esse valor.
Cabe lembrar, todavia, que cada Tribunal de Justiça Estadual só poderá aplicar essa Portaria do CNJ se tiver dotação orçamentária, e esta depende da boa vontade dos Chefes do Poder Executivo Estadual,  que, quase sempre, como na área federal, tratam os seus Juízes a pão e água.
Deixo de tecer maiores comentários a respeito desse assunto, porque foge um pouco do nosso tema, que diz respeito a honorários pericias nas ações civis, envolvendo pessoas pobres, na Justiça Federal, mas chamo atenção para o valor, que é bem superior ao estabelecido pelo Conselho da Justiça Federal – CJF, na Resolução n° 558, de 2007, do Conselho da Justiça Federal.


[1] Trabalho apresentado em Encontro Científico na Associação Paulista de Medicina – AMP, em 24.09.2012, na cidade de São Paulo, para discutir o problema da perícia médica, dos honorários periciais e a possível criação de um Departamento Federal de Perícias Médicas – DFPM.

PREVIDENCIÁRIO. INSS. CONVERSÃO DE TEMPO DE ATIVIDADE SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS EM TEMPO DE ATIVIDADE COMUM

Por Francisco Alves dos Santos Júnior
 
   Segue interessante sentença, na qual se discute matéria relativa à conversão de tempo especial em tempo comum para fins de gozo do benefício de aposentadoria, com detalhado estudo da legislação vigente e menção a importante precedente do Superior Tribunal de Justiça-STJ sobre debatida modificação dessa legislação.
 
   Sentença minutada pela Assessora Élbia Lídice Spenser.
 
   Boa leitura! 

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA

 

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior


Processo nº 0003015-10.2012.4.05.8300 - Classe 29 - Ação Ordinária

Autor: G J B P

Adv.: R G F - OAB-PE 

Réu: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL

Procurador Federal

 
Registro nº ...........................................

Certifico que registrei esta Sentença às fls..........

Recife, ...../...../2012.


Sentença tipo A

 

EMENTA:- PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. TEMPO DE SERVIÇO INSALUBRE. CONVERSÃO. POSSIBILIDADE.

- Reconhecimento da coisa julgada, relativamente ao período de 05/03/79 a 31/12/2004.

- Continuidade da prestação laboral, em condições não especiais.

- Conversão do tempo especial em comum(precedente do Superior Tribunal de Justiça).

- Aposentadoria integral concedida.

- Procedência.

 

Vistos etc.

 

GENILDO JOSÉ BRAGA PEREIRA, qualificado na Inicial, propôs, em 18/01/2012, a presente “Ação Especial Previdenciária para Concessão de Aposentadoria Especial”, contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, requerendo preliminarmente os benefícios da gratuidade da justiça. Aduziu, em síntese, que seria filiado à Previdência Social desde 05/03/1979; que teria exercido atividades insalubres, sendo, portanto, detentor do direito à aposentadoria especial; que teria requerido administrativamente sua aposentadoria junto ao órgão previdenciário; que mencionado pedido teria sido indeferido; que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 e seu regulamento estabeleceriam critérios para conversão do tempo de trabalho exercido sob condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado; que seriam aplicáveis ao caso em tela o Decreto nº 53.831/64, o Decreto nº 83.080/79 e o Decreto nº 2.172/97. Discorreu sobre a legislação que reputou aplicável ao caso. Teceu outros comentários. Requereu: a citação do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL; a procedência dos pedidos para condenar a parte ré a implantar a aposentadoria especial à razão de 100% do salário benefício; o pagamento das parcelas vencidas e vincendas, a contar do requerimento administrativo; a condenação do INSS ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios. Fez protestos de estilo. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com instrumento de procuração e cópia de documentos (fls. 09/36).
Concedido ao Autor o benefício da justiça gratuita (fl. 37).
Citado, o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL apresentou Contestação, às fls. 38/46, suscitando a preliminar de coisa julgada. Arguiu, com prejudicial ao exame de mérito, a prescrição quinquenal. No mérito, argumentou que não haveria nenhum documento contemporâneo alusivo aos contratos de trabalho referidos na Inicial; que o uso de EPI eficaz neutralizaria as condições nocivas ao trabalhador, não havendo razão para se reconhecer o enquadramento da atividade como especial; que não teria restado comprovada a existência dos agentes agressores. Sustentou que, em razão da coisa julgada, o Autor deveria ser condenado ao pagamento das penas de litigância de má-fé. Fez outros comentários. Ao final, requereu o acolhimento da preliminar levantada, ou, em caso contrário, a improcedência dos pedidos formulados na Inicial, condenado o Autor ao pagamento das custas processuais, honorários advocatícios e pena por litigância de má-fé. Pugnou, ainda, que, na hipótese de condenação, fosse reconhecida a prescrição quinquenal e fossem os juros de mora e correção monetária fixados de acordo com a Lei nº 9.494/97. Protestou o de costume. Pediu deferimento. Juntou cópia de documentos (fls. 47/68).
O Autor apresentou Réplica, às fls. 72/85, rebatendo os argumentos da Defesa e reiterando os termos da Inicial. Juntou cópia de documentos (fls. 86/89).
Vieram os autos conclusos para sentença.
 
É o Relatório
Passo a decidir.
 
Preliminar
 
Coisa julgada
 
O INSS levantou a preliminar de coisa julgada, sustentando que o Autor já teria ingressado com idêntica ação, a qual tramitara na 21ª Vara Federal-PE (nº 2008.83.00.17359-8), já havendo transitado em julgado a decisão ali prolatada; que os períodos que o Autor buscaria reconhecer como especiais já teriam sido objeto do pedido da primeira ação.
A esse respeito, o Autor esclareceu que, na ação anterior teria comprovado o período de 24 anos e 26 dias como de atividade penosa; que continuaria trabalhando na mesma empresa, exercendo atividade em condições danosa à saúde.
À luz da documentação acostada aos autos, verifico que o E. TRF/5ª Região deu provimento à apelação interposta pelo Autor (v. acórdão de fls. 67/68).
O INSS opôs embargos de declaração em face do v. acórdão, havendo o E. TRF/5ª Região dado provimento aos referidos embargos, considerando como especiais as atividades desenvolvidas pelo Autor, nos interregnos de 05/03/79 a 02/10/1982, 03/07/84 a 30/04/85 e de 01/05/1985 a 31/12/2004, num total de 24 anos e 26 dias, mas reconhecendo como tempo insuficiente para a concessão do beneficio de aposentadoria pleiteada, nos termos do v. acórdão de fl. 61.
Outrossim, o E. TRF/5ª Região também decidiu no sentido de não reconhecer a especialidade das atividades exercidas pelo Autor no período de 01/01/2005 a 25/03/2008.
Ante tal situação, há de se acolher em parte a preliminar de coisa julgada, relativamente ao período de prestação de serviço do Autor analisado pelo E. TRF/5ª Região, qual seja, de 05/03/79 a 25/03/2008.
Todavia, como o Autor permaneceu laborando, não merece ser acolhida tal preliminar quanto ao período posterior a 25/03/2008.
 
Exceção de prescrição quinquenal

Pleiteia o Autor obter a condenação do INSS à concessão de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento do tempo de serviço laborado em condições especiais.
Como se sabe, o direito a determinado benefício previdenciário é imprescritível, prescrevendo apenas o direito à percepção de parcelas do quinquênio legal anterior ao pedido administrativo,
Caso a decisão administrativa tenha sido dada há mais de cinco anos, a prescrição atingirá apenas as parcelas posteriores a esses cinco anos e desde que de período quinquenal anterior à data da propositura desta ação judicial, tudo no termos da Súmula 85 do E. Superior Tribunal de Justiça.
Ora, tratando-se de ação proposta objetivando a concessão de benefício previdenciário, incide a prescrição quinquenal prevista na Súmula 85/STJ:
"Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do quinquênio anterior à propositura da ação.".
     Assim, quanto à prescrição quinquenal suscitada pelo INSS, assiste parcial razão à Autarquia Previdenciária, porque há regra legal expressa regulamentando a matéria (art. 103 da Lei nº 8.213/91), de forma que se encontram prescritas todas as verbas do quinquênio anterior à propositura desta ação, ou seja, anteriores a 18/01/2007, uma vez que esta ação foi apresentada na Distribuição em 18/01/2012.

Mérito

O Autor pretende obter aposentadoria, mediante o reconhecimento e conversão de período especial, pois, segundo alega, ao longo da execução de seus sucessivos contratos de trabalho esteve sujeito a atividades insalubres.
O INSS afirma que o Autor não comprovou que todo seu período laboral foi exercido sob condições especiais para fins previdenciários.
A Aposentadoria Especial desde sua instituição pela Lei nº 3.807/60[1] é devida ao segurado que se encontrar exposto, no seu ambiente de trabalho, durante 15, 20 ou 25 anos, pelo menos, a agentes considerados perigosos, insalubres ou penosos, pela legislação pertinente.
Atualmente, a aposentadoria especial é regrada pela Lei nº 8.213/91, em seus artigos 57 e 58, verbis:
 

Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95)

§ 1º e §2º - omissis

§ 3º A concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social–INSS, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95)

§ 4º O segurado deverá comprovar, além do tempo de trabalho, exposição aos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, pelo período equivalente ao exigido para a concessão do benefício. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 28.4.95)

§ 5º O tempo de trabalho exercido sob condições especiais que sejam ou venham a ser consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física será somado, após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, segundo critérios estabelecidos pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, para efeito de concessão de qualquer benefício. (Parágrafo acrescentado pela Lei nº 9.032, de 28.4.95).

§ 6º ao § 8º - omissis

Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 10.12.97)

§ 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista. (Redação dada pela Lei nº 9.732, de 11.12.98)

§ 2º ao § 4º - omissis.”

 

O regramento insculpido na redação original da Lei nº 8.213/91, nesse particular, sofreu alterações ao longo do tempo.

A partir da Lei nº 9.032, de 29.04.95, não foi mais possível o reconhecimento do tempo de serviço especial, com base na categoria profissional do trabalhador, impondo-se então a efetiva exposição do segurado a agentes nocivos à saúde, cuja comprovação deveria ser feita por meio dos formulários SB-40, DISES BE 5235, DSS-8030 e DIRBEN 8030 (estes formulários foram substituídos pelo PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário). Não se exigia que tais formulários fossem preenchidos com base em laudo técnico, exceto quando se tratava de trabalhador exposto a ruído ou a calor. Ademais, tal exposição passou a ter que se dar de forma permanente, não podendo ser ocasional nem intermitente.

Em outras palavras, considerando a regra da irretroatividade, até 28.04.95, a simples exposição ao agente agressivo configurava a especialidade do trabalho. Após essa data, passou a ser exigido que a exposição se desse dentro da mesma jornada diária sem interrupção ou alternância com atividade comum.

A Medida Provisória nº 1.523, de 11.10.96, convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97, ao dar nova redação ao art. 58[2] da Lei nº 8.213/91, determinou que os formulários fossem preenchidos com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.

Após o advento da Lei nº 9.528/97, passou-se a exigir a apresentação de formulários próprios, conforme regulamentação do INSS, e de laudo técnico de médico ou de engenheiro do trabalho, vez que, anteriormente, só se exigia laudo para caracterizar a exposição a ruído acima do limite permitido.

Assim, até 11.10.1996, prescindia-se de laudo técnico para a comprovação da atividade especial. Após o advento da referida medida provisória, o laudo passou a ser indispensável.

Outrossim, a partir da edição da Medida provisória nº 1.663-10/98, revogando o § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, o INSS entende não mais ser possível a conversão de tempo especial em comum. Contudo, com a conversão dessa Medida Provisória na Lei nº 9.711/98, não foi repetido o dispositivo que determinava tal revogação, razão pela qual se passou a discutir sobre a continuidade ou não da vigência da regra permissiva da conversão.

Embora o entendimento esposado pela Autarquia previdenciária tenha prevalecido inicialmente, inclusive com a edição da Súmula nº 16 da TNU, o entendimento contrário terminou por se consolidar, inicialmente no seio do E. STJ (RESP 977125/PB e RESP 956110/SP) e, posteriormente, na própria Turma Nacional, que cancelou a referida súmula.

Nos termos da Súmula nº 12[3] do Superior Tribunal do Trabalho e 225[4] do Supremo Tribunal Federal, as anotações constantes da CTPS/Carteira Profissional gozam de presunção legal relativa de veracidade.

Portanto, considerando que as anotações da CTPS do Autor não foram infirmadas pelo INSS, tenho por verdadeiros os contratos de trabalho ali anotados.

No que se refere à  conversão de tempo de serviço trabalhado sob condições especiais em comum, para aqueles segurados que não lograram trabalhar o período integral para concessão de aposentadoria especial, adota-se, para o caso, o entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.010.028/RN, no sentido de que a Medida Provisória nº 1.663-10, de 28/05/98, ao ser convertida na Lei nº 9.711, de 20/11/98, não manteve a revogação do §5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, acrescentado pela Lei nº 9.032/95, subsistindo a possibilidade de conversão.

De ver-se que a Emenda Constitucional nº 20/98 manteve a aposentadoria especial submetida às regras dos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 até que a Lei Complementar, a que se refere o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, venha à luz.

Ademais, tal possibilidade é expressamente permitida pela nova redação do art. 70 do Decreto nº. 3.048/1999, dada pelo Decreto nº. 4.827, de 3.9.2003:

 


Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:

 

 TEMPO A
CONVERTER
MULTIPLICADORES
MULHER
(PARA 30)
HOMEM
(PARA 35)
DE 15 ANOS
2,00
2,33
DE 20 ANOS
1,50
1,75
DE 25 ANOS
1,20
1,40

 

§ 1o A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.

§ 2o As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. (G.N.)


Embora os fatores acima transcritos não tenham se mantido uniformes no correr dos anos, o § 2º, do art. 70 do Decreto nº 3.048/99 determina a aplicação da tabela acima transcrita para todo e qualquer período que for convertido[5].

A jurisprudência pátria é firme no sentido de que os requisitos para a aposentadoria devem ser aferidos à luz da legislação contemporânea aos requisitos exigidos por lei (Súmula 359 do STF[6]).

No caso em tela, conforme adrede esclarecido, o E. TRF/5ª Região já reconheceu a especialidade das atividades desenvolvidas pelo Autor, no período de 05/03/1979 a 31/12/2004, totalizando 24 (vinte e quatro) anos e 26 (vinte e seis) dias.

Assim, considerando que referida decisão já transitou em julgado, bem como que o Autor continuou a laborar, cabe apenas, nestes autos, verificar se o mesmo atingiu o tempo mínimo para a concessão da aposentadoria pleiteada, conforme as anotações constantes em sua CTPS.

Pois bem.

Convertendo-se o tempo especial, já reconhecido pelo E. TRF/5ª Região, em comum, com a aplicação do percentual de 40%(quarenta por cento)[7], obtém-se o total de 33 (trinta e três) anos, 8 (oito) meses e 02 (dois) dias.

Ocorre que o Autor também laborou em atividades que não foram consideradas pelo E. TRF/5ª Região como especiais (de 22/04/1983 a 09/01/1984 e de 01/01/2005 a 25/03/2008).

Insta salientar, ainda, que o Autor continuou a laborar no período a partir de 25/03/2008.

Assim, relativamente às atividades exercidas pelo Autor, não consideradas pelo E. TRF/5ª Região como especiais, constata-se o seguinte:

 
VÍNCULO
FATOR
DATA INICIAL
DATA FINAL
TEMPO EM DIAS (COMUM)
TEMPO EM DIAS (CONVERTIDO)
SOUZA LUNA S/A
1,0
22/04/1983
09/01/1984
263
263
SIDERURGICA AÇONORTE S/A(GERDAU AÇOS LONGOS)
1,0
01/01/2005
18/01/2012
2.574
2.574

 
Tempo computado em dias ........................................................................  2.837 dias.

(equivalente a 7(sete) anos, 9(nove) meses e 7(sete) dias)

 
Enfim, considerando o período reconhecido pelo E. TRF/5ª Região como de atividade especial, já convertido em tempo comum, acrescido do período em que o Autor não laborou em atividade especial, constata-se o seguinte:

 
Tempo computado nos períodos de 05/03/1979 a 02/10/1982; 03/07/1984 a 30/04/1985 e 01/05/1985 a 31/12/2004 (atividades especiais) ................................................. 33 (trinta e três) anos, 8 (oito) meses e 02 (dois) dias

 
Tempo computado nos períodos de 22/04/1983 a 09/01/1984 e 01/01/2005 a 18/01/2012  (atividades não especiais)............................................................................... 7(sete) anos, 9(nove) meses e 7(sete) dias

 
Total de tempo em anos, meses e dias: 41 (QUARENTA E UM) ANOS, 05 (CINCO) MESES E 21 (VINTE E UM) DIAS.

 
Verifica-se, portanto, que, após a conversão do(s) citado(s) período(s) em tempo de serviço para fins de obtenção de uma aposentadoria comum, tem-se um total 41 (quarenta e um) anos, 05 (cinco) meses e 21 (vinte e um) dias.

Assim, na data da propositura desta ação, o ora Autor já fazia jus ao benefício pretendido, impondo-se, portanto, a procedência do pedido.

 

Conclusão

 

POSTO ISSO: a) acolho em parte a preliminar de coisa julgada, relativamente ao período de 05/03/79 a 25/03/2008; b) pronuncio a prescrição das verbas do qüinqüênio anterior à data da propositura desta ação, ou seja, das verbas do período anterior a 18/01/2007, e com relação a tais verbas dou este processo por extinto com resolução do mérito (art. 269-IV do CPC); c) julgo procedentes os pedidos desta ação, reconheço como tempo de serviço do Autor o total de 41 (quarenta e um) anos, 05 (cinco) meses e 21 (vinte e um) dias, e condeno o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL a conceder a aposentadoria do Autor, retroativamente à data da propositura desta ação, adequando a renda mensal inicial do benefício ora declarado, com observância das regras legais específicas, bem como a pagar ao Autor as parcelas passadas, não fulminadas pela prescrição, ou seja, retroativas a 18/01/2007, cujo valor será apurado na fase de liquidação-execução desta sentença, a ser perpetrada na forma prevista no art. 475-B c/c art. 730, ambos do Código de Processo Civil, com correção monetária (índices adotados pelo Conselho da Justiça Federal) desde a data dos respectivos vencimentos, acrescidas de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde a data da citação (art. 219 do Código de processo Civil e Súmula nº 204/STJ[8]) incidentes sobre os valores já monetariamente corrigidos, até o advento da Lei nº 11.960, de 2009, a partir da qual a atualização (correção monetária e juros de mora) será feita na forma nela preconizada; c) condeno o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS em verba honorária que fixo em 10%(dez por cento) do valor total das parcelas vencidas.

Sem custas, ex lege.

De ofício, submeto esta sentença ao duplo grau de jurisdição.


P.R. I.


Recife,  01 de outubro de 2012

 
Francisco Alves dos Santos Júnior

       Juiz Federal, 2ª Vara-PE

 

 

 



[1] A aposentadoria especial veio sofrendo várias alterações, e, até a publicação da Lei nº 9.032/95, era possível ao segurado adquirir aposentadoria especial por ser titular de uma atividade considerada perigosa, insalubre ou penosa, mas, daí em diante, a aposentadoria especial passou a ser concedida apenas ao segurado que comprove efetiva exposição ao agente agressivo.
[2]Art. 2º A Lei n" 8.213, de 24 de julho de 1991, passa a vigorar com as seguintes alterações
Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior e será definida pelo Poder Executivo.
§ 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social-INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.’
[3]Súmula nº 12:
CARTEIRA PROFISSIONAL (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
“As anotações apostas pelo empregador na carteira profissional do empregado não geram presunção ‘juris et de jure’, mas apenas ‘juris tantum’". 
[4] Súmula nº 225: “Não é absoluto o valor probatório das anotações da carteira profissional;”
[5] Art. 57. (...)
§ 2º. As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. (Incluído pelo Decreto nº 4.827/2003).
[6] 359 - Ressalvada a revisão prevista em lei, os proventos da inatividade regulam-se pela lei vigente ao tempo em que o militar, ou o servidor civil, reuniu os requisitos necessários, inclusive a apresentação do requerimento, quando a inatividade for voluntária. (D.C.; D. Adm.)
[7] Art.70 do Decreto nº3.048/99
[8] Brasil. Superior Tribunal de Justiça:
“Súmula 204 – Os juros de mora nas ações relativas a benefícios previdenciários incidem a partir da citação válida.”