quinta-feira, 7 de junho de 2012

LENTIDÃO DO JUDICIÁRIO ITALIANO E DA CORTE EUROPEIA DE DIREITOS HUMANOS

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Veja interessante notícia, extraída do CONJUR, sobre a lentidão da Justiça Italiana e também da Corte Europeia de Direitos Humanos, que levou cinco anos para dizer que o Poder Judiciário da Itália, por força de Lei desse País, teria que ter julgado uma ação de indenização no prazo máximo de dois anos e meio. 

 Boa Leitura sobre esse tema de direito comparado.




Lentidão judicial

Corte europeia demora cinco anos para condenar Itália

Mais uma vez, a lentidão da Justiça vai pesar no bolso dos contribuintes italianos. O país foi condenado a indenizar um inspetor de Polícia que teve que esperar 10 anos para a conclusão do processo criminal contra ele. O motivo da condenação, no entanto, não foram os 10 anos, mas sim a espera de cinco anos no processo que ele moveu contra o Estado justamente pela demora judicial.
A Corte Europeia de Direitos Humanos, que analisou a reclamação do inspetor, julgou que a demora de 10 anos acabou beneficiando o acusado. Por conta dela, crimes prescreveram e a pena imposta foi reduzida. Já a espera de quase cinco anos no pedido de indenização foi considerada inaceitável pelos juízes europeus. Eles decidiram que, via de regra, pedido de reparação pela demora judicial deve ser concluído em dois anos e meio, no máximo. Importante dizer que os juízes europeus também demoraram os mesmos cinco anos para dar o seu veredicto, que ainda não é definitivo.
Na Itália, o que garante reparação aos prejudicados pela morosidade da Justiça é a Lei 89, de março de 2001, apelidada de Lei Pinto, em referência ao redator da norma. A lei foi aprovada em resposta à exigência do Conselho da Europa, de que a demora injustificada de processos judiciais prejudica os cidadãos e estes têm direito de receber indenização do Estado.
Em dezembro de 2010, a Itália foi repreendida pela Corte Europeia de Direitos Humanos por causa da pouca efetividade da lei. Os juízes consideraram que a Justiça italiana estava demorando demais para julgar os pedidos de indenização das vítimas da lentidão judicial. Na ocasião, a corte mandou o país rever a sua lei e criar um fundo para garantir indenização aos prejudicados.
Idas e vindas
A trajetória judicial do inspetor Mario Gagliano Giorgi começou em 1988, quando ele foi acusado de exigir suborno para garantir a permissão necessária para imigrantes morarem na Itália. Ele também foi acusado de alterar registro de declarações de um imigrante que relatou a conduta ilícita do inspetor. De 1988 a 1999, o processo criminal contra Giorgi ficou pulando de uma instância para outra.
Ele foi condenado em primeira instância, teve a pena reduzia pela Corte de Apelo e a decisão anulada pela Corte de Cassação, que determinou que o processo fosse de novo julgado pela Corte de Apelo. Esse percurso foi percorrido duas vezes. Na terceira, a Corte de Cassação não anulou a decisão da Corte de Apelo e, em 1999, Giorgi foi definitivamente condenado a um ano de prisão por falsificação de documento. O crime de suborno já estava prescrito.
Em 2001, o inspetor resolveu começar uma batalha na Justiça contra o Estado italiano. Ele pedia indenização pela demora excessiva do processo criminal. Giorgi queria receber quase 31 mil euros (cerca de R$ 70 mil) pelos danos sofridos. Dessa vez, o percurso foi mais curto: ele perdeu na primeira e na segunda instâncias, a decisão foi anulada pela Corte de Cassação, o processo voltou para a segunda instância, que negou mais uma vez o pedido e não foram mais aceitos recursos. Foram cinco anos até a conclusão.
Em 2007, ele resolveu que ia pedir indenização à Corte Europeia de Direitos Humanos. Cinco anos depois, a corte julgou o caso de Giorgi. Considerou que os mesmos cinco anos de demora na Justiça italiana não eram razoáveis e, por isso, o inspetor deve receber 500 euros de compensação (cerca de R$ 1 mil). Já a demora de 10 anos para o processo criminal foi amenizada porque, no final, beneficiou o acusado com a prescrição do crime, disse a corte. Vale dizer que o caso ainda não está encerrado. A Itália ainda pode recorrer para a câmara principal de julgamentos da corte europeia.

BENEFÍCIO SOCIAL. MÃE SOLTEIRA E CARENTE. PEQUENO VALOR. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR DA UNIÃO NO PEDIDO DE RESTITUIÇÃO



PODER JUDICIÁRIO FEDERAL

SEÇÃO JUDICIÁRIA DE PERNAMBUCO

2ª VARA



Juiz: Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 0005845-80.2011.4.05.8300 - Classe: 29 – Ação Ordinária

Autor: UNIÃO FEDERAL

Adv.: A. A. L.(AGU/PRU,5ªR)

Ré: S. B. DE S.

Adv.:  R. A. de F. – OAB/PE





Registro nº ...........................................

Certifico que eu, ..................,  registrei esta Sentença às fls..........

Recife, ...../...../2012.



Sentença tipo C





EMENTA:- ADMINISTRATIVO. BOLSA FAMÍLIA. ALEGADO PAGAMENTO  IRREGULAR. INTERESSE DE AGIR. INEXISTÊNCIA

O Advogado Geral da União baixou Portaria orientando pela não cobrança de créditos da União de valor de até R$ 10.000,00.
Benefício social pago em pequenos valores, por longo período, e cuja soma desses pequenos valores não totaliza nem dois mil e quinhentos reais, mesmo que pago indevidamente, não deve ser cobrado, quer pelo binômio custo-benefício, quer pelo fato de que há dúvida se a Ré o recebeu de má-fé e, incontroversamente, sobrevive com imensas dificuldades financeiras.
Extinção, sem resolução do mérito
VISTOS, ETC.
A UNIÃO propôs, em 27.04.2011, esta “Ação Ordinária de Ressarcimento” contra S. B. DE S., aduzindo, em síntese, que, em decorrência de denúncia dirigida ao Ministério Público Federal, teria sido instaurado o procedimento nº 1.26.002.000054/2009-30, noticiando irregularidades na concessão e percepção de benefícios assistenciais de programas sociais do Governo Federal; que a Ré, apesar de nunca haver se enquadrado nos requisitos legais, teria ingressado no Programa Bolsa Família em 05/2006, percebendo todos os benefícios até 10/2008; que referido programa seria dirigido às famílias em situação de pobreza ou extrema pobreza; que, na forma da Lei nº 10.836/2004 e do Decreto nº 5.209/2004, as famílias extremamente pobres seriam aquelas com renda per capita de até R$ 70,00 por mês e as pobres seriam aquelas com renda per capita entre R$ 70,01 a R$ 140,00 por mês, tendo em sua composição gestantes, nutrizes, crianças ou adolescentes entre 0 e 17 anos; que a Ré seria servidora efetiva do Município de Sanharó (PE), recendo remuneração além dos limites fixados pela Lei nº 10.836/2004 e pelo Decreto nº 5209/2004; que a Ré estaria obrigada a ressarcir os cofres públicos das quantias percebidas indevidamente; que, ao se apoderar de recursos destinados a programa social, a Ré teria praticado a conduta prevista no § 1º do art. 14 da lei de criação do Bolsa Família; que a Ré deveria ser responsabilizada civilmente, nos termos do art. 186 do Código Civil; que o ato ilícito praticado pela Ré teria ocasionado danos materiais à União; que a incidência de juros e correção monetária deveria ser iniciada desde o momento da ocorrência do fato danoso (percepção dos benefícios do Programa Bolsa Família); que as normas de regência do Bolsa Família seriam claras quanto à metodologia de cálculo do ressarcimento de benefícios percebidos indevidamente, nos termos dispostos no art. 14 da lei do Bolsa Família. Teceu outros comentários. Requereu: a citação de SIMONE BEZERRA DE SOUZA; a procedência do pedido para condenar a Ré ao pagamento da indenização referente ao ressarcimento dos valores indevidamente pagos pelo Erário, no valor de R$ 2.196,45 (dois mil, cento e noventa e seis reais e quarenta e cinco centavos), atualizados até a data do efetivo pagamento e acrescidos de juros de mora; a condenação da Ré ao pagamento de custas e honorários advocatícios. Fez protestos de estilo. Deu valor à causa. Pediu deferimento.  Instruiu a Inicial com cópia de documentos (fls. 16/137).
Citada, S. B. DE S. apresentou Contestação, às fls. 141/143, sustentando que, na época dos fatos narrados na Inicial, moraria com sua genitora, um filho e um irmão menores, numa casa alugada; que, em 02.05.2006, sua genitora falecera, passando a assumir a responsabilidade pela manutenção e subsistência da família; que, ao comparecer para proceder à baixa no Bolsa família, teria sido orientada pelos funcionários do CRAS local a ficar cadastrada no mencionado programa; que  faria o curso técnico de enfermagem, na cidade de Pesqueira, bancando os custos de passagens e demais despesas concernentes ao curso; que, em março de 2007, tomara posse como funcionária do Município de Sanharó (PE), mediante concurso público para o cargo de agente administrativo, percebendo a remuneração inicial de um salário mínimo então vigente; que, sendo mãe solteira, não contaria com a colaboração do pai de seu filho nas despesas da criança; que a renda per capita de sua família estaria na média prevista pelo Bolsa Família; que, após o nascimento de outra filha, continuaria na margem per capita; que teria sido cadastrada no mencionado programa pela equipe responsável; que não teria cometido qualquer ato ilícito, eis que preenchera os requisitos legais. Requereu a improcedência dos pedidos formulados na Inicial. Protestou o de costume. Pediu deferimento. Juntou instrumento de procuração e cópia de documentos (fls. 144/151).
A União apresentou Réplica, rebatendo os argumentos da Defesa e reiterando os termos da Inicial (fl. 155).
Designada audiência para instrução e debates (fl. 170).
A parte ré não compareceu à audiência, havendo sido encerrada a instrução processual, conforme respectivo termo de fl. 181.
A Secretaria deste Juízo certificou que não houve manifestação das partes sobre o determinado na audiência (fl. 222-vº).
Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o Relatório. Passo a decidir.
Fundamentação
Resta incontroverso que a Autora não preenchia os requisitos legais para receber as parcelas relativas ao benefício denominado bolsa família.
Mas, há dúvidas se a Ré agiu de má-fé, pois relata que tentara cancelar o recebimento do benefício e fora aconselhada por Servidor da própria ora Autora a continuar cadastrada, em face da precária situação financeira em que vivia.
Além do mais, trata-se de mulher esforçada, pois, mesmo vivendo de forma muito modesta(ganha apenas um salário mínimo e tem dois filhos), conseguiu estudar no CEFET e formar-se como auxiliar de enfermagem.
Ainda resta incontroverso que a pequena quantia mensal que a Ré recebeu, por um longo período, a título de bolsa família, corresponde ao irrisório total de R$ 2.196,45, enquadrando-se, pois, na Portaria nº 377, de 2011, do Advogado Geral da União, na qual há orientação para que as Procuradorias da União não cobrem quantias de até R$ 10.000,00, em virtude do binômio custo-benefício, ou seja, seria mais custoso para União cobrar do que renunciar a esse tipo de crédito.
Mencionado valor não paga sequer a capa, o papel e a tinta que já foram gastos com esses autos, sem contar com os gastos com a remuneração da mão de obra dos valorosos Procuradores da União e de seus servidores, bem como a remuneração deste magistrado e dos servidores deste Juízo.
Continuar com este processo, serviria apenas para aumentar ainda mais os dispêndios da  UNIÃO com a inutilidade que é este processo, até mesmo porque, com 100% de certeza, a ora Ré não terá condições de restituir mencionada quantia, pois tem dois filhas, é mãe solteira(sem esposo) e ganha apenas um salário mínimo ao mês. 
Há processos mais importantes a ser tocados por mencionados d. Procuradores e pelo Judiciário, como, por exemplo, aqueles que envolvem os milhões de reais desviados por Servidores de altos cargos, não concursados, nomeados pela Presidente e por seus Ministros de Estado.  
Portanto, é de se ter por não presente a condição interesse processual de agir da Autora.
Todavia, diante do quadro supra, embora o feito seja inviável, não seria justo condenar a UNIÃO em verba de sucumbência.  
Conclusão
Posto isso, não identifico o interesse processual de agir da UNIÃO, dou este processo por extinto, sem resolução do mérito, e, diante da situação acima descrita, deixo de condenar a UNIÃO em verbas de sucumbência. 
Não submeto esta sentença ao duplo grau de jurisdição, porque o valor em questão está muito distante dos sessenta salários mínimos exigidos na Lei para tanto.
P.R.I.
Recife, 06 de junho de 2012.
           Francisco Alves dos Santos Júnior
               Juiz Federal, 2ª Vara-PE




segunda-feira, 4 de junho de 2012

EMBARGOS À EXECUÇÃO. EFEITOS. EXECUÇÃO DE JULGADO. LITISPENDÊNCIA. PARCIAIS VERBAS INCONTROVERSAS.


Por Francisco Alves dos Santos Jr.

      Segue decisão na qual se debate quanto aos efeitos que se deve dar nos Embargos à Execução de julgado, quando a própria Parte Embargante confessa uma parte da dívida, relativamente a alguns Embargados, e levanta preliminar de litispendência, com relação à integralidade da dívida de outros Embargados, que estão na mesma execução dos autos principais.

Boa leitura.



PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2ª VARA



Processo nº 0008474-90.2012.4.05.8300

Classe:    73 EMBARGOS À EXECUÇÃO

EMBARGANTE: DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS - DNOCS

EMBARGADO: M. C. H. DE V.



C O N C L U S Ã O



Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

              Recife, 31/05/2012

Encarregado(a) do Setor

D E C I S Ã O

  
                    Relatório

O DNOCS(AGU/PRF), ora Embargante, levanta preliminar de litispendência, relativamente aos Embargados que indica na sua petição inicial e, com relação aos demais Embargados, no quadro que acostou à petição inicial e que se encontra à fl. 07 destes autos, apresenta demonstrativo, indicando que seria devedor apenas da quantia total de de R$ 641.949,35, e não a quantia de R$ 664.186,41, requerida e indicada na memória de cálculos dos autos principais.

Fundamentação

1. Relativamente aos Embargados indicados na preliminar de litispendência, esta ação de embargos à execução do julgado há de ser recebia no efeito suspensivo, até que se decida quanto a essa matéria preliminar.

2. Relativamente aos demais Embargados, não há nenhuma razão para não prosseguir a execução nos autos principais, relativamente aos R$ 641.949,35, que considero incontroversos, porque confessados pelo próprio(a) Executado(a), ora Embargante.

No entanto, ainda com relação a estes Embargados, deve-se dar a esta ação efeito suspensivo referentemente às parcelas controversas, porque não há como executar estas antes da respectiva definição, não sendo de se exigir do(a)Embargante garantias, por se tratar de Ente que faz parte do rol do que se denomina Fazenda Pública, cujos bens são impenhoráveis e a execução faz-se por requisição, na forma preconizada no art. 100 da Constituição da República.

Conclusão

Portanto: a) com relação aos Embargados arrolados na noticiada  preliminar de litispendência, recebo esta ação de embargos no efeito suspensivo; b) com relação aos demais Embargados e relativamente à acima mencionada quantia incontroversa, recebo esta ação de embargos apenas no efeito devolutivo, homologo mencionada quantia(R$ 641.949,35) e os valores individuais que lhe totalizam, conforme demonstrativo de fl. 07, autorizando, desde já,  sua execução nos autos principais, com a expedição dos respectivos requisitórios(§ 3º do art. 739-A do Código de Processo Civil); d) ainda com referência aos Embargados que não estão arrolados na preliminar de litispendência, relativamente às verbas controversas, recebo estes embargos no efeito suspensivo

À parte embargada para, querendo, apresentar impugnação, no prazo de lei.

Traslade-se cópia desta Decisão para o feito principal, bem como dos cálculos de fls. 07, onde deve ser executada.

         P. I., na íntegra

      Recife,  04 de junho de 2012.

     Francisco Alves dos Santos Júnior
                   Juiz Federal, 2ª Vara-PE, Brasil

quinta-feira, 31 de maio de 2012

A ACUPUNTURA, OS BIOMÉDICOS E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


   Na sentença que segue, é discutido o problema da falta de Lei, no Brasil, regulamentando o exercício da atividade de acupuntura.
   Boa leitura.
   

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA



Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 0005996-12.2012.4.05.8300 - Classe: 126 - Mandado de Segurança

Impetrante: CONSELHO REGIONAL DE BIOMEDICINA – 2ª REGIÃO

Adv.: George Luiz Vidal Wanderley – OAB/PE 21.071

Impetrado: SECRETARIO DE ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO DE PESSOAS DO MUNICÍPIO DO RECIFE
Litisconsorte Passivo Necessário: Município do Recife.


Registro nº ...........................................

Certifico que eu, ..................,  registrei esta Sentença às fls..........

Recife, ...../...../2012.



Sentença tipo A



EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. EXERCÍCIO PROFISSIONAL. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

- Resolução do Conselho Federal de Biomedicina não é instrumento normativo apto ao reconhecimento da acupuntura como atividade a ser exercida pelos biomédicos, à míngua de previsão legal.

- Negação da segurança.



Vistos etc.

O CONSELHO REGIONAL DE BIOMEDICINA – 2ª REGIÃO – CRBM2, impetrou, em 06/03/2012, o presente “Mandado de Segurança com Pedido Liminar”, contra ato do SR. SECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO DE PESSOAS DO MUNICÍPIO DE RECIFE, aduzindo, em síntese, que a Autoridade Impetrada estaria promovendo concurso público para provimento de vários cargos da Rede Municipal de Saúde do Recife, cujas inscrições seriam encerradas em 12.03.2012; que, consoante disposto no respectivo edital, os biomédicos teriam sido indevidamente excluídos para concorrer à vaga de acupunturista, ofertada apenas aos profissionais com registro em Medicina, Psicologia e Fisioterapia, nos termos do anexo I do aludido edital; que a acupuntura não seria curso de graduação, mas uma habilitação realizada por meio de pós-graduação e factível a vários profissionais da área de saúde, incluindo o biomédico, conforme previsto nos artigos 1º e 8º da Resolução do Conselho federal de Biomedicina nº 78, de 29.04.2002. Teceu outros comentários. Transcreveu algumas decisões judiciais. Requereu a concessão de medida liminar inaudita altera parte para determinar a imediata retificação do edital do concurso público promovido pela Autoridade Impetrada, de modo a também ofertar aos biomédicos, isonomicamente, a possibilidade de concorrência ao cargo de acupunturista, ou, alternativamente, a suspensão do mencionado concurso público para o referido cargo. Requereu ainda: a notificação do Impetrado e da pessoa jurídica que integra; a ciência ao órgão de representação judicial da pessoa jurídica interessada; a ouvida do Ministério Público Federal; a procedência dos pedidos, concedendo a segurança definitiva para determinar a participação dos biomédicos devidamente habilitados no certame ao cargo nº 01, denominado “acupunturista”, do edital do concurso público promovido pelo Impetrado. Ao final, requereu que, na hipótese de algum biomédico se inscrever e participar do aludido certame, no prazo previsto de inscrição, e, uma vez aprovado, fosse reconhecido seu direito à vaga ofertada para o cargo em questão. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com instrumento de procuração e cópia de documentos (fls. 22/162).

A liminar pleiteada restou indeferida na decisão de fls. 164/165-vº.

Notificada, a Autoridade Impetrada apresentou informações, às fls. 176/182, suscitando preliminarmente a inadequação da via mandamental. No mérito, argumentou que as alegações do Impetrante seriam improcedentes; que não haveria qualquer ilegalidade na restrição imposta pelo edital do concurso em questão, relativamente à inscrição de profissionais biomédicos para o cargo de acupunturista; que o Impetrante não teria competência para legislar sobre a profissão, mas apenas fiscalizar as atividades de seus inscritos; que a acupuntura estaria inserida no conceito de ato médico; que apenas uma lei poderia retirar a acupuntura do âmbito de abrangência exclusiva da atuação dos médicos. Fez outros comentários. Ao final, pugnou pela denegação da segurança pleiteada. Ao final, requereu que o MUNICÍPIO DO RECIFE fosse incluído no polo passivo da lide. Pediu deferimento.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofertou Parecer, às fls. 184/184-vº, opinando pela extinção do processo sem resolução do mérito, em razão de alegada perda superveniente do objeto.

Vieram os autos conclusos para sentença.

 É o relatório. Passo a decidir.

 Fundamentação

 Matérias Preliminares.

 Integração do Município do Recife no Polo Passivo

Este Município, às fls. 181-182 dos autos, pede sua integração no polo passivo, por ser visível o seu interesse na demanda.

Esse pleito merece acolhida, não só por esse visível interesse, mas também porque há regra nesse sentido no arts. 6º e 7º-II, todos da nova Lei do Mandado de Segurança, Lei nº 12.016, de 2009.  

Inadequação da Via Mandamental

A Autoridade Impetrada levantou tal preliminar, sob a alegação de que o Impetrante não teria provado o seu direito líquido e certo. Ocorre, porém, que, saber se o direito é líquido e certo, consubstancia-se no mérito deste tipo de ação. Vale dizer, não pode ser apreciado como matéria preliminar. Logo, esta preliminar não merece ser acolhida.

Extinção do Processo, sem Resolução do Mérito, por Perda Superveniente do Objeto

O Ministério Público Federal sustenta, no seu r. parecer de fl. 184, que o feito deveria ser extinto, sem resolução do mérito, porque houve a negativa da medida liminar e o concurso em questão foi realizado, de forma que não poderia mais ser apreciado o alegado direito líquido e certo dos Biomédicos, porque, mesmo que acolhida a pretensão, não poderiam mais participar do referido concurso. 

Tenho que esta preliminar não merece ser acolhida, porque, não obstante a realização do concurso, o mérito da causa tem que ser apreciado e decidido, uma vez que os Biomédicos tiveram direitos atingidos pela decisão que negou a liminar e, caso haja mudança de posicionamento deste magistrado, mencionados direitos poderão ser reavivados e gerar, até mesmo, indenização perante a pessoa jurídica à qual se encontra vinculada a Autoridade apontada como coatora, pessoa jurídica essa que se integrou no pólo passivo, a seu próprio pedido, conforme se vê às fls. 181-182 destes autos.  

Mérito

1. O Impetrante se insurge contra ato do Sr. SECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO DE PESSOAS DO MUNICÍPIO DE RECIFE, relativamente ao edital do concurso público promovido por esse município, com vistas ao provimento de vagas, para cargos efetivos da Rede Municipal de Saúde do Recife, especificamente para o cargo de “acupunturista”, sustentando que, de maneira ilegal e arbitrária, referido edital teria excluído a participação dos biomédicos para concorrer à vaga ofertada para tal cargo.

2. A questão posta em análise cinge-se em saber se a prática de acupuntura, ramo da Medicina Tradicional Chinesa, pode ser exercida, no Brasil, pelos Biomédicos.

3. No Brasil, não existe legislação federal que proíba a prática da acupuntura por quem não seja médico, tampouco existe Lei que estabeleça ser privativa de médico o exercício dessa atividade.

Encontro no site http://acupuntura.pro.br/legislacao/quem-pode-praticar/#comentar um interessante artigo, indicado como escrito por Nöthlicv, donde colho o seguinte trecho: “A Organização Mundial de Saúde publicou em 2001 um amplo levantamento sobre a situação das medicinas alternativas no mundo, e verificou que somente em dois países a acupuntura é restrita a médicos: Arábia Saudita e Áustria. Tal constatação se contrapõe frontalmente aos radicais que tentam creditar esta técnica milenar como um ato exclusivamente médico. Em mais de 50 países, porém, todo indivíduo com a devida formação em acupuntura pode praticá-la. Assim, não apenas os médicos, mas também, os enfermeiros, os psicólogos, os quiropráticos, os terapeutas e outros profissionais, aplicam esta técnica, além, evidentemente, dos Acupunturistas graduados em uma faculdade própria de acupuntura.”. Mas o articulista lembra que, no Brasil, há necessidade de Lei para regulamentar a matéria, e por isso o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ), apresentara “um Projeto de Lei que visa regulamentar o exercício profissional desta atividade, seguindo as orientações da OMS. Pelo projeto, todos poderão exercer esta prática dentro da sua respectiva área. Deste modo, o médico aplicará a acupuntura na sua especialidade (clínica médica, cardiologia, ginecologia, geriatria, etc); o fisioterapeuta aplicará na fisioterapia; o enfermeiro, na enfermagem; o psicólogo, na psicologia; o dentista, na odontologia, o veterinário, no trato de animais; e assim por diante.”.


Câmara dos Deputados:Regulamentação da Acupuntura

O projeto de Aline Corrêa foi nesta quarta-feira, 12 de maio, aprovado na Comissão de Seguridade Social e de Família da Câmara dos Deputados o relatório da deputada Aline Corrêa (PP-SP) que regulamenta o exercício profissional da Acupuntura. A comissão é constituída por muitos deputados médicos era um obstáculo para regulamentação da Acupuntura de forma multiprofissinal O relatório de Aline Corrêa, apresentado como substitutivo ao projeto de Lei 1.549/2003, é considerado histórico por regulamentar a Acupuntura como atividade multiprofissional, assim a acupuntura não será mais uma
atividade exclusiva e ou privativa de médicos. Os demais profissionais de saúde com a aprovação, do parecer, por unanimidade, o substitutivo da Deputada Aline Corrêa, garante o exercícico nos seguintes termos:
I –profissionais de saúde de nível superior, portadores de certificados de conclusão de curso de especialização em acupuntura ou em acupuntura, reconhecidos pelos respectivos Conselhos Federais;
II –portadores de certificado de conclusão de curso técnico em acupuntura, expedido por instituições de ensino oficialmente reconhecidas, que exerçam a atividade até a data de publicação desta Lei;
III –profissionais que, venham exercendo a acupuntura por um período mínimo de cinco anos, até a data de publicação da nova legislação.”

Há outros inúmeros projetos de Lei em tramitação no Congresso Nacional a respeito deste assunto, dentre os quais fiz referência, na decisão inicial, ao Projeto de Lei nº 2.626/2003, que dispõe sobre a regulamentação e fiscalização do exercício profissional da Acupuntura.

E isso demonstra que o assunto é de grande interesse de várias profissões da área de saúde e confere acerto à decisão inicial deste juízo, na qual se negou medida liminar, por faltar Lei que autorize o Biomédico a exercer a atividade de acupunturista.

 4. A profissão de Biomédico é regulamentada pela Lei nº 6.684, de 03.09.1979, a qual elenca as atividades passíveis de ser exercidas por tal profissional:

Art. 4º Ao Biomédico compete atuar em equipes de saúde, a nível tecnológico, nas atividades complementares de diagnósticos.

Art. 5º Sem prejuízo do exercício das mesmas atividades por outros profissionais igualmente habilitados na forma da legislação específica, o Biomédico poderá: I - realizar análises físico-químicas e microbiológicas de interesse para o saneamento do meio ambiente; II - realizar serviços de radiografia, excluída a interpretação;

III - atuar, sob supervisão médica, em serviços de hemoterapia, de radiodiagnóstico e de outros para os quais esteja legalmente habilitado; IV - planejar e executar pesquisas científicas em instituições públicas e privadas, na área de sua especialidade profissional. Parágrafo único. O exercício das atividades referidas nos incisos I a IV deste artigo fica condicionado ao currículo efetivamente realizado que definirá a especialidade profissional.

O Impetrante fundamenta sua pretensão nos artigos 1º e 8º da Resolução do CFBM nº 78, de 29.04.2002, onde foi reconhecida a acupuntura como atividade cujo exercício é permitido ao biomédico.

Ocorre que o Conselho Federal de Biomedicina, assim como todo e qualquer conselho profissional, não tem poder de legislar sobre profissões, mas apenas o de fiscalizar as atividades profissionais daqueles pertinentes à circunscrição de suas respectivas esferas específicas de atribuição. Logo, mencionados dispositivos, nesse particular, são inconstitucionais, pois ferem o princípio da legalidade(inciso II do art. 5º da Constituição da República) e, por isso, desprovidos de qualquer valor.

Destarte, não cabe aos conselhos profissionais extrapolar o âmbito de suas atribuições, sob pena de invadir matéria reservada à lei.

            Tenho que a Autoridade apontada como coatora errou ao especificar, como aptos ao concurso para a função ou cargo de acunpunturista, apenas pessoas formadas em Fisioterapia ou Psicologia ou Medicina e/ou pessoa com certificado ou declaração de conclusão de especialização na área de acupuntura, emitido por instituição reconhecida pelo Ministério da Educação e Cultura-MEC, porque:  a) as Leis que regulamentam as três profissões citadas não lhes asseguram a privacidade do exercício dessa atividade; b) não há Lei regulamentando esses cursos de especialização de acupuntura,ainda que autorizados pelo MEC.    

Mas, por outro lado, não pode o Judiciário obrigar referida Autoridade a praticar outra ilegalidade: que Biomédicos possam fazer o concurso para a função ou cargo de acunpunturista, apenas com base em uma Resolução do respectivo Conselho Federal.

            Ora, a Lei que regulamenta a atividade de Biomédico não autoriza esse profissional a realizar a atividade de acupuntura.

            Dessa forma, os arts. 1º, item 22, e 8º e respectivo inciso I, todos da Resolução CFBM nº 78, de 29.04.2002, são inconstitucionais, porque ferem o inciso II do art. 5º da Constituição da República, uma vez que tratam de assunto que só poderia ser tratado por Lei.  

            Nessa situação, não há que se falar em ilegalidade, tampouco abuso de poder por parte da Autoridade Impetrada, por não ter admitido a inscrição de biomédico para concorrer ao cargo para exercer a atividade de acupuntura no mencionado edital.  

 Conclusão

 POSTO ISSO, preliminarmente, determino que a Secretaria, antes da publicação desta sentença, remeta os autos à Distribuição para que esta autue o Município do Recife no polo passivo como litisconsorte necessário, rejeito as matérias preliminares levantadas pela Autoridade Impetrada e pelo Ministério Público Federal,  incidenter tantum,  declaro a inconstitucionalidade do item 22 do art. 1º e o art. 8º e respectivo inciso I, todos da Resolução CFBM nº 78, de 29.04.2002, e, no mérito, julgo improcedentes os pedidos desta ação mandamental e NEGO a segurança pleiteada.

Custas, ex lege.

Sem honorários, ex vi art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009[1].

P.R.I.

 Recife, 31 de maio de 2012.

 Francisco Alves dos Santos Júnior
                Juiz Federal, 2ª Vara-PE



[1] Art. 25. Não cabe, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. (G.N.)
  No mesmo sentido, a Súmula 512 do Supremo Tribunal Federal.

terça-feira, 29 de maio de 2012

PARÁGRAFO 11 DO ART. 74 DA LEI Nº 9.430, DE 1996: SUA NATUREZA

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Qual a natureza da regra do § 11 do art. 74 da Lei nº 9.430,de 1996, nesta introduzido pela Medida Provisória nº 135, de 2003? Que efeitos gerou nos processos administrativos em andamento?
Na sentença que segue, tudo isso é discutido de forma detalhada.
Boa leitura.


PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA


Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 0002644-46.2012.4.05.8300 - Classe: 126  – Mandado de Segurança


Impetrante: U. T. S/A

Adv.: Dr. T J M C F - OAB/PE nº 

Impetrado: PROCURADOR REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL EM PERNAMBUCO

Parte Interessada: UNIÃO

Adv.: Procurador da Fazenda Nacional



Registro nº ...........................................

Certifico que registrei esta Sentença  às fls..........

Recife, ...../...../2012.



Sentença tipo A



Ementa: - PROCESSUAL ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO ADMINISTRATIVO. EFEITO SUSPENSIVO.

- A interposição de reclamação ou recurso administrativo suspende, automaticamente, a exigibilidade tributária(art. 151-III do Código Tributário Nacional), sendo, pois, um direito do Contribuinte.

-O Parágrafo 11 do art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, nela introduzida pela Medida Provisória nº 135, de 2003, tem natureza interpretativa, com efeito ex tunc, relativamente à norma interpretada, e, caracterizando-se como norma procedimental-processual, é de aplicação imediata.

- Enquanto tramita o processo administrativo tributário, em face da suspensão da exigibilidade do crédito tributário, o Contribuinte, ainda que devedor, faz jus à certidão positiva, com efeito de negativa(art. 206 do Código Tributário Nacional).

- Concessão da segurança.

  

Vistos etc.

 U. T. S/A impetrou o presente “Mandado de Segurança com Pedido de Liminar”, em 09/01/2012, contra atos praticados pelo ILMO SR. PROCURADOR REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL EM PERNAMBUCO, autoridade vinculada à UNIÃO FEDERAL, aduzindo, em síntese, que, em 15/06/1999, teria protocolizado pedido de ressarcimento junto à Receita Federal do Brasil, tombado sob o nº 10480.021078/99-15, buscando o reconhecimento de créditos de IPI em seu favor; que, posteriormente, a Impetrante teria utilizado parte do referido crédito apurado e pleiteado no mencionado processo para compensar os débitos de IPI e de PIS sob sua responsabilidade, referentes às CDA’s nº 40.3.04.000082-66 e 40.7.06.000570-22; que, como as compensações teriam sido realizadas sob condição resolutória, por força do art. 74, § 2º, da Lei nº 9.430/96, a extinção do crédito tributário somente ocorreria com a homologação da compensação; que o crédito apurado e pleiteado no processo nº 10480.021078/99-15 encontrar-se-ia ainda sob discussão administrativa no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda (CARF), havendo sido indeferido originalmente pela Receita Federal, em 11/10/2001, em face do qual a Impetrante apresentara manifestação de inconformidade, nos termos da Instrução Normativa SRF nº 210/02; que, não acolhida a manifestação de inconformidade, teria interposto, em 07/12/2004, recurso voluntário, com fulcro no art. 74, § 10, da citada Lei nº 9.430/96; que, em 21/07/2009, teria sido intimada do acórdão que negara provimento a seu recurso voluntário, havendo mais uma vez utilizado do recurso especial, cabível conforme previsto no art. 32, § 2º, do Decreto nº 70.235/72 cumulado com o art. 62 da Portaria MF nº 256/2009; que, embora ainda estivesse pendente a discussão administrativa sobre o crédito, a Autoridade Coatora estaria sustentando que não poderia suspender a exigibilidade dos débitos compensados com o referido crédito, pois a manifestação de inconformidade teria sido apresentada em momento no qual ainda não possuiria efeito suspensivo; que, ainda que se admitisse que a manifestação de inconformidade somente teria passado a possuir efeito suspensivo a partir da edição da Medida Provisória nº 135, de 30/10/2003, convertida na Lei nº 10.833/03, a ato coator seria incorreto e violador do art. 151, III, do CTN e da Lei nº 9.430/96, uma vez que, após a apresentação da referida manifestação de inconformidade, a Impetrante teria interposto recursos com efeito suspensivo. Alegou que a manifestação de inconformidade e os recursos voluntário e especial estariam previstos nas leis reguladoras do processo tributário administrativo; que a suspensão da exigibilidade decorreria do disposto no art. 151, III, do CTN, independentemente da existência de outra norma infralegal; que a Instrução Normativa nº 210/2003 seria ilegal e inconstitucional, por ofensa ao princípio da igualdade, insculpido no art. 5º da Constituição da República, eis que os contribuintes que teriam apresentado manifestação de inconformidade antes do advento da Medida provisória nº 135/2003 estariam sendo tratados de maneira desigual; que, mesmo que à época não houvesse regulamentação que determinasse a suspensão da exigibilidade do crédito para as reclamações e recursos administrativos, o CTN já disciplinara a matéria, determinando a suspensão (art. 151, inciso III). Teceu outros comentários. Invocou entendimentos doutrinários. Transcreveu decisões judiciais. Requereu a concessão de medida liminar, para determinar a suspensão da exigibilidade dos débitos inscritos nas CDA’s nº 40.3.04.000082-66 (processo administrativo nº 13401.5000395/2004-15) e nº 40.7.06.000570-22 (processo administrativo nº 13401.500092/2006-56), enquanto o processo nº 10480.021078/99-15 estiver pendente de julgamento administrativo definitivo, bem como a expedição da Certidão Positiva de Débitos em Efeito de Negativa em favor da Impetrante.  Ao final, requereu: a notificação da Autoridade Impetrada; a intimação do Ministério Público; a procedência do pedido, para, concedendo a segurança definitiva, confirmar o provimento liminar concedido e determinara a suspensão da exigibilidade dos débitos inscritos nas CDA’s nº 40.3.04.000082-66 (processo administrativo nº 13401.500395/2004-15) e nº 40.7.06.000570-22 (processo administrativo nº 13401.500092/2006-56), enquanto pendente de julgamento definitivo o processo nº 10480.021078/99-15. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com cópia de instrumento de procuração e de documentos (fls. 23/155).

Comprovante de recolhimento de custas (fl. 157).

Determinado que a Impetrante regularizasse sua representação processual em decisão de fls. 160/160-vº, o que foi cumprido às fls. 162/169.

A União manifestou-se, às fls. 171/176, sustentando que teria interesse no feito; que a Impetrante teria indicado erroneamente a Autoridade Impetrada; que a pretensão da Impetrante estaria pautada em interpretação jurídica equivocada; que a posterior interposição de recursos administrativos contra decisões que teriam mantido a não homologação da compensação formalizada não teria o condão de suspender a exigibilidade dos créditos fiscais em discussão, uma vez que a disciplina jurídica a que se submetera a Impetrante teria sido a da IN SRF 210/2002, segundo a qual a manifestação de inconformidade não estaria sujeita a efeito suspensivo, e, consequentemente, os recursos a ela posteriores; que o encaminhamento dos citados créditos fiscais para inscrição em DAU teria sido feito com espeque no art. 22, parágrafo único, da IN SRF 210/2002, inexistindo qualquer ilegalidade no referido procedimento. Fez outros comentários. Ao final, requereu o indeferimento do pedido liminar, denegando-se a segurança pleiteada. Pediu deferimento.

Rejeitada a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, levantada na defesa da União, em decisão de fls. 177/178, na qual restou concedida a medida liminar.

A União opôs Embargos de Declaração, às fls. 184/186, argumentando que teria havido erro material na decisão de fls. 177/178.

A Autoridade Impetrada apresentou suas Informações, às fls. 190/199, suscitando sua ilegitimidade passiva e arguindo a decadência do direito à impetração. Argumentou que a pretensão da Impetrante seria improcedente, uma vez que a manifestação de inconformidade por ela apresentada não seria capaz de gerar o efeito suspensivo colimado, em respeito ao princípio tempus regit actum; que a manifestação de inconformidade manejada pela Impetrante teria sido lastreada no permissivo constante do art. 35 da IN SRF 210/2002; que o efeito suspensivo mencionado pela Impetrante teria surgido com o advento da Medida Provisória nº 135, de 30/10/2003, posteriormente convertida na Lei nº 10.833/03, a qual introduzira os §§ 9º e 11, do art. 74, da Lei nº 9.430/96; que apenas a lei strictu sensu seria capaz de normatizar a atribuição de efeitos suspensivo a determinado ato afeto ao crédito tributário; que, salvo disposição legal em contrário, o recurso não teria efeito suspensivo; que o advento ulterior da lei, regulando a existência de efeito suspensivo em razão da apresentação de manifestação de inconformidade pelo contribuinte não produziria nenhum reflexo no presente caso; que, diante da impossibilidade de se conferir efeito suspensivo à manifestação de inconformidade e aos recursos interpostos pela Impetrante nos autos do processo administrativo nº 10480.021078/99-15, não haveria causa suspensiva da exigibilidade dos débitos inscritos nas CDA’s nº 40.3.04.000082-66 e 40.7.06.000570-22, as quais deveriam permanecer ativos e em cobrança, impedindo, por conseguinte, a emissão da certidão de regularidade fiscal. Fez outros comentários. Ao final, requereu fosse revogada a liminar concedida e denegada a segurança. Pediu deferimento.

Acolhidos os Embargos de Declaração de fls. 184/186, na decisão de fl. 201.

A União noticiou a interposição de Agravo de Instrumento (fl. 211), juntando cópia do referido recurso (fls. 212/226).

Mantida a decisão agravada (fl. 227).

O Ministério Público Federal ofertou r. Parecer, afirmando que não se pronunciaria sobre a matéria sub judice, eis que não haveria interesse público a justificar o pronunciamento do órgão ministerial, o que poderia ser revisto em face de fato superveniente (fls. 230/230-vº).

 É o relatório. Passo a decidir.

 Fundamentação

1. Preliminarmente, a Secretaria deve providenciar a autuação da UNIÃO, no pólo passivo, como Parte Interessada, em face da sua integração na demanda, pela manifestação de fls.   171-176 e Embargos de Declaração de fls. 184-186.

 2.   A União sustenta que teria decaído o direito de ser impetrado o presente mandamus, uma vez que o ato efetivamente combatido na impetração seria o juízo de admissibilidade da manifestação de inconformidade apresentada nos autos do processo administrativo nº 10480.021078/99-15, ocorrido há vários anos.

Não assiste razão à União, pois, ao contrário do que alega, a ora Impetrante se insurge contra os despachos exarados nos autos dos processos administrativos nº 13401.500395/2004-15 (fls. 25/32) e nº 13401.500092/2006-56 (fls. 34/40), nos quais foi indeferido o pedido de suspensão da exigibilidade dos créditos cobrados, em face da interposição do noticiado recurso administrativo.

Assim, a arguição de decadência, levantada pela  UNIÃO, não merece acolhida .

3. O que pretende a ora Impetrante é que se dê efeito suspensivo a recurso que interpôs nos processos administrativos e, enquanto não houver um julgamento final nesses feitos administrativos, que lhe seja fornecida certidão positiva de débito, com efeito de negativa, para que possa continuar exercendo suas atividades.

Cabe lembrar que as reclamações e os recursos administrativos tributários têm efeito suspensivo (art. 151-III do Código Tributário Nacional).

Outrossim, o assunto em pauta não pode ser tratado por mero  ato administrativo.

É que os atos normativo secundários, a exemplo das instruções normativas expedidas pelo Poder Executivo e por seus Órgãos, devem subordinar-se às leis.

Portanto, ilegal a parte do parágrafo único do art. 22 da Instrução Normativa SRF nº 210, de 2002, segundo a qual a reclamação administrativa do contribuinte, na hipótese nela prevista, seria destituída de efeito suspensivo.

Afinal, sobrepõe-se no nosso ordenamento jurídico, como verdadeiro dogma, o princípio da legalidade, segundo o qual ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de Lei(art. 5º-II da Constituição da República).

Desse modo, a Administração Pública não pode limitar direitos sem base legal.

A respeito desse assunto disserta CARVALHO FILHO, José dos Santos:


“Poder regulamentar, portanto, é a prerrogativa conferida à Administração Pública de editar atos gerais para complementar as leis e permitir a sua efetiva aplicação. A prerrogativa, registre-se, é apenas para complementar a lei; não pode, pois, a Administração alterá-la a pretexto de estar regulamentando. Se o fizer, cometerá abuso de poder regulamentar, invadindo a competência do Legislativo.[1]

 E nenhuma limitação de direito, tampouco alteração do núcleo obrigacional pode ser veiculada em atos normativos secundários, porque, no Brasil, desde nossa primeira Constituição, aquela de 1824, outorgada na época do Império,  Art. 179 - (...). Nenhum cidadão pode ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude da Lei”(mantida a redação originária, no  português da época)[2], regra principiológica essa hoje agasalhado no inciso II do art. 5º e, para o campo tributário, no inciso I do art. 150, todos da vigente Constituição da República Federativa do Brasil, sendo que no primeiro plano como garantia e direito individual constitucional.

Ora, as normas gerais do processo administrativo, relativas a tributos administrados pela Receita Federal do Brasil, estão contidas no Decreto nº 70.235, de 06/03/1972, o qual, em razão das normas institucionais da época de sua edição, tem força de lei.

E, segundo mencionado Decreto, a recurso administrativo será dado efeito suspensivo.[3]

Realmente, qualquer decisão administrativa só poderá ser executada quando considerada definitiva, ou seja, quando não mais pendente nenhum tipo de recurso.

Outrossim, a regra prevista no referido Decreto findou por ser incorporada à Lei nº 9.430/1996, nos termos do art. 74, § 11, verbis:

§ 11. A manifestação de inconformidade e o recurso de que tratam os §§ 9º e 10 obedecerão ao rito processual do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, e enquadram-se no disposto no inciso III do art. 151 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, relativamente ao débito objeto da compensação. (incluído pela Lei nº 10.833, de 2003).

 Note-se que esse Parágrafo 11 tem uma forte conotação interpretativa. Realmente, nele não se instituiu o efeito suspensivo para o recurso em questão, mas apenas se reconheceu que a ele se aplicava efeito suspensivo legal já existente, fato esse que põe por terra os argumentos da  UNIÃO, desenvolvidos no agravo de instrumento, que foi transformado em agravo retido(v. fls. 230-231vº), no sentido de que, quando do acréscimo desse dispositivo ao art. 74 da Lei nº 9.430, de 1996, já teriam decorridos vários anos. É que, como se sabe, as regras interpretativas retroagem à data da norma interpretada, no caso, o noticiado inciso III do art. 151 do Código Tributário Nacional, que é de 1966.

Por outro lado, por ser regra procedimental-processual, o comando nele insculpido tem efeito imediato, passando a ser aplicável a todos os processos administrativos em andamento. E, no caso em questão, embora o processo administrativo nº 10480.021078/99-15 tenha se iniciado em 1999, a impugnação administrativa e o recurso especial foram interpostos pela ora Impetrante quando já vigente o dispositivo legal ora sob  exame.

Então, se ainda não findo o noticiado processo administrativo, porque submetido a recurso administrativo da Impetrante, o qual teria que ser recebido no efeito suspensivo, há de ser mantida a suspensão da exigibilidade do crédito tributário em questão.

 4. As custas judiciais têm natureza tributária, modalidade taxa, conclusão essa à qual chegou o C. Supremo Tribunal Federal há muito tempo.  Então, sendo, no caso,  um tributo federal, o valor da sua restituição goza da atualização do § 39 da Lei nº 9.250, de 1995, qual seja, índice de variação da tabela SELIC, pois, caso a Impetrante tivesse que recolher o respectivo valor com atraso, seria obrigada a fazê-lo com a atualização desse índice.

 5. Não cabe verba honorária sucumbencial em mandado de segurança(Súmula  512 do E. Superior Tribunal de Justiça, ratificada pelo art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009). 

 Conclusão

POSTO ISSO:

a) determino que a Secretaria, antes da publicação desta sentença, remeta os autos à Distribuição para autuação da  UNIÃO, no pólo passivo, como Parte Interessada;

b)  rejeito a prejudicial de decadência;

c) julgo procedentes os pedidos da petição inicial, ratificando a decisão de fl. 177-178, com as modificações da decisão de fl. 201, concedendo a segurança definitiva, e determinando  que a Autoridade apontada como coatora, caso seja solicitada pela Impetrante na via administrativa, que providencie-lhe o fornecimento de certidão positiva com efeito de negativa, caso outras dívidas não existam à margem das regras do art. 206 do Código Tributário Nacional, tudo sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009.

Outrossim, condeno a União a ressarcir a Impetrante das custas judiciais que despendeu, devidamente atualizada, pela tabela SELIC(§ 4º do art. 39 da Lei nº 9.430, de 1995) desde a data do desembolso.    

Sem honorários, Súmula 512 do C.Supremo Tribunal Federal e art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009[4].

Deixo de mandar remeter cópia desta sentença para os autos do noticiado agravo de instrumento, porque ele foi transformado em agravo retido, conforme notícia de fl. 231vº.

De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição.

P.R.I.

Recife,  29 de maio de 2012.

Francisco Alves dos Santos Júnior


   Juiz Federal da 2ª Vara-PE




[1] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris. 10ª ed. 2003, p. 38.
[2] Apud SANTOS JÚNIOR, Francisco Alves dos. Direito Tributário do Brasil: Aspectos Estruturais do Sistema Tributário Brasileiro. Volume I. Edição 2ª, revisada e aumentada, Olinda: Livro Rápido, 2010, p. 69.
[3] Art. 33. Da decisão caberá recurso voluntário, total ou parcial, com efeito suspensivo, dentro dos trinta dias seguintes à ciência da decisão.”.
(...)
Art. 42. São definitivas as decisões:
I – (...).
II - de segunda instância de que não caiba recurso ou, se cabível, quando decorrido o prazo sem sua interposição;

[4] Art. 25. Não cabem, no processo de mandado de segurança, a interposição de embargos infringentes e a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, sem prejuízo da aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé. (G.N.)