terça-feira, 6 de dezembro de 2011

UM CASO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DA ANATEL.

          Por Francisco Alves dos Santos Júnior

          A Decisão infra, minutada por minha Assessora Luciana Simões, trata de um problema de competência judicial para o julgamento do seguinte caso: um Particular contra uma Empresa de Telefonia e contra a ANATEL. Esta foi colocada no pólo passivo, apenas porque o Autor requereu que a Juíza do Estado de Pernambuco dela solicitasse informações sobre telefonemas que dera para a Empresa de Telefonia, fazendo reclamações, pleito esse que foi deferido liminarmente. A ANATEL interpôs agravo de instrumento e o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco anulou a r. decisão da mencionada Magistrada, porque reconheceu a sua incompetênica para a causa, uma vez que a ANATEL é uma Autarquia Federal, e determinou a remessa dos autos para a Justiça Federal, para que esta, por força da Súmula 150 do STJ, decidisse se a ANATEL deveria um não ficar no pólo passivo. A 2ª Vara da Justiça Federal reconheceu que a ANATEL era parte ilegítima para a causa e declinou a competência para o Juízo estadual de oriem.

Boa Leitura!


 
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª REGIÃO
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
2ª VARA

Processo nº 0011628-53.2011.4.05.8300
Classe: 29 AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO)
AUTOR: M E B DA S
RÉU: AGENCIA NACIONAL DE TELECOMUNICACOES - ANATEL E OUTRO

C O N C L U S Ã O

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

Recife, 23/08/2011

Encarregado(a) do Setor

D E C I S Ã O


Breve Relatório

Trata-se de ação ordinária de indenização por danos morais e materiais de obrigação de fazer, cumulada com pedido de antecipação de tutela. Aduz a parte Autora, em síntese, que: teria recebido uma oferta de prêmio caso firmasse um contrato com a referida operadora; o suposto prêmio nunca teria sido entregue; que a EMPRESA Y estaria cobrando as contas de acordo com o Plano ofertado e exigindo uma multa de R$750,00 para cancelar a avença. Pugnou, ao final, pela exibição, pela EMPRESA Y, das conversas gravadas entre as partes, bem como a condenação da operadora no pagamento de danos morais no valor de R$ 100.000,00 e danos materiais no valor de R$102,31, além de um FIAT DUBLÓ ZERO KM e um aparelho celular Black Berry 8100, ou o equivalente. Requereu, ainda, a citação da ANATEL para que, em juízo, exibisse as gravações e protocolos realizados entre a EMPRESA Y e a Autora. Inicial instruída com procuração e documentos (fls. 14-44).

A EMPRESA Y apresentou Contestação às fls. 49-60. Aduziu, em apertada síntese, que a empresa ora demandada jamais teria realizado promoções do tipo mencionado na Inicial, bem como nunca contemplou a Autora na promoção vinculada à premiação de automóveis; a empresa demandada jamais entrou em contato com a Autora a fim de imputar propaganda enganosa; se houve realmente o contato com a Autora, passando as informações inverídicas, não poderia a empresa demandada ser responsabilizada, pois, com toda certeza, essas ligações não teriam partido da equipe interna da demandada; a ré não poderia ser responsabilizada por atitudes de terceiros; houve a solicitação de compra e habilitação das referidas linhas, bem como houve utilização dos serviços. Teceu outros comentários acerca da desnecessidade do dever de indenizar. Pugnou, ao final pela improcedência dos pedidos. Juntou documentos às fls. 62-83.

A Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) apresentou Contestação às fls. 84-86. Suscitou, preliminarmente, ilegitimidade passiva da ANATEL, bem como incompetência absoluta da Justiça Estadual, caso não fosse excluída da Demanda. No mérito, pugnou pela improcedência dos pedidos.

Réplica às fls. 90-93.

Termo de Audiência às fls. 105-106, em que a MM. Juíza de Direito, Dra. Carla de Vasconcellos Rodrigues, determinou que as Demandadas exibissem as degravações das conversas relacionadas nos protocolos ali discriminados.

Às fls. 109-111, a EMPRESA Y acostou petição alegando a impossibilidade em cumprir a decisão proferida. Juntou documentos às fls. 112-116.

À fl. 124, a ANATEL noticiou a interposição de Agravo de Instrumento, bem como alegou inexequibilidade da decisão proferida por aquele Juízo. Juntou cópia do referido recurso às fls. 125-130.

Às fls. 134-135, r. decisão dando provimento ao Agravo de Instrumento interposto pela ANATEL, declarando a nulidade da decisão recorrida, bem como determinando a remessa dos autos à Justiça Federal.

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

Preliminarmente, há de se salientar que incumbe a este Juízo Federal deliberar acerca do interesse da ANATEL em figurar na presente lide, a luz do que preceitua a Súmula nº 150 do STJ.

Pois bem.

Oportunamente salientou a ANATEL, quando da sua Contestação de fls. 84-86, que o único pedido contra ela formulado se referiria à apresentação das conversas ocorridas entre a demandante e a EMPRESA Y e que a relação de direito material objeto da presente ação diria respeito, tão somente, à Autora e à EMPRESA Y, não havendo qualquer razão para que aquela Autarquia figurasse como parte no processo.
De fato, da leitura da descrição dos fatos na petição inicial, resta evidente que o conflito de interesses ali esboçado reside no campo eminentemente privado, no qual a eventual presença da agência reguladora não se traduzirá como o cerne da questão de mérito posta a desate.

Outrossim, como bem sublinhou a Anatel na minuta do noticiado agravo de instrumento, que a própria parte Autora, quando da Réplica (vide fl. 91), asseverou que a presença da ANATEL nesta demanda se mostraria desnecessária, transcrevendo, naquele momento, precedente jurisprudencial proveniente do E. Superior Tribunal de Justiça conclusivo quanto à incompetência da Justiça Federal para o processamento da demanda, tese esta à qual me filio e passo a transcrever:

"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ASSINATURA BÁSICA RESIDENCIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO PROPOSTA EXCLUSIVAMENTE CONTRA CONCESSIONÁRIA DE TELEFONIA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. INEXISTÊNCIA. PRESENÇA DA ANATEL NA LIDE. DESNECESSIDADE. 1. Versam os autos sobre ação declaratória c/c repetição de indébito ajuizada por consumidor contra a Brasil Telecom S/A objetivando o reconhecimento da ilegalidade da cobrança de "assinatura mensal básica". 2. Em que pese a demanda ter sido proposta exclusivamente por consumidor contra a concessionária de telefonia, a Justiça Estadual declinou da competência para que a Justiça Federal decidisse sobre a existência de interesse jurídico da Anatel - necessidade de inclusão no pólo passivo. O Juiz Federal, por seu turno, afastou o interesse da autarquia federal, com respaldo no enunciado n. 150 da Súmula do STJ, in verbis: "Compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas". 3. Esta Corte já se manifestou sobre o tema em inúmeras oportunidades, concluindo pela competência da Justiça Estadual, por não haver necessidade da presença da Anatel em qualquer pólo de demanda que tem como partes, de um lado, consumidor, e de outro, concessionária de serviço público de telefonia: "3. Tratando-se de relação jurídica instaurada entre empresa concessionária de serviço público federal e usuário, não há interesse na lide do poder concedente, no caso, a União, falecendo, a fortiori, competência à Justiça Federal. Precedentes: REsp n. 947.191/PB, Rel. Min. Denise Arruda, DJ de 21.08.2007; REsp n. 900.478/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 16.02.2007; REsp n. 904530/RS, Rel. Min. Humberto Martins, DJ de 16.02.2007" (REsp 973.183/RS, sob minha relatoria, DJ de 24.09.2007). 4. Recurso especial provido.
(RESP 200701016530, JOSÉ DELGADO, STJ - PRIMEIRA TURMA, 21/05/2008)"

No decorrer da tramitação desta ação, se o juízo competente entender pertinente, poderá solicitar que a ANATEL apresente a degravação noticiada na petição inicial e, caso fique comprovado que ela poderia apresentar e, no entanto, venha a negar-se, poderá, ela e/ou seu Dirigente, sofrer as consequências previstas no Parágrafo Único do art. 14 do Código de Processo Civil. Tratar-se-ia apenas de uma prova que poderia estar em seu poder. No entanto, essa situação, não a elege como Parte de demanda privada entre um Assinante e a EMPRESA Y.

Como não se configura nenhum interesse envolvendo a ANATEL, Entidade Autárquica Federal, e, com sua exclusão, como não figurará em qualquer dos pólos da ação nenhuma outra das Pessoas arroladas no inciso I do art. 109 da Constituição Federal, tampouco qualquer situação das arroladas nos demais incisos desse dispositivo constitucional, vejo-me obrigado a reconhecer a falta de competência da Justiça Federal para processar e julgar esta demanda.

Diante de todo o exposto:

a) Acolho a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam suscitada pela ANATEL;

b) Reconheço a incompetência absoluta deste Juízo Federal para processar e julgar este feito;

c) No momento oportuno, dê-se baixa na distribuição desta Justiça Federal e remetam-se os autos ao Juízo de Origem, qual seja, 5ª Vara Cível da Comarca de Jaboatão dos Guararapes.

Com urgência.

P. I.

Recife, 06 de dezembro de 2011.

Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

INTERESSANTES QUESTÕES DE DIREITO MATERIAL E PROCESSUAL, NA FASE EXECUTIVA.

           Segue uma interessante decisão judicial, na qual são discutidas interessantes questões de direito material e processual, que surgem na fase executiva e que não foram previstas na fase de conhecimento.

           Referida decisão foi minutada pelas Assessoras Élbia Spenser e Luciana Simões.

           Boa leitura.



PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2a. VARA FEDERAL



Processo nº 0010983-28.2011.4.05.8300

Classe:    73 EMBARGOS À EXECUÇÃO





C O N C L U S Ã O



Nesta data, faço conclusos os presentes

autos  a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL

Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR



Recife, 11/10/2011


                                    Encarregado(a) do Setor



D E C I S Ã O  



Relatório

A União opôs os presentes Embargos à Execução, contra INAILZA BESSONI CABRAL e OUTROS, alegando que a parte embargada teria apresentado cálculos que ultrapassariam a correta execução do julgado. Requereu a procedência dos Embargos, para que fosse reconhecido o excesso de execução; o acolhimento dos cálculos elaborados pelo Núcleo Executivo de Cálculos e Perícias – NECAP; a condenação das Embargadas ao pagamento de honorários advocatícios, custas processuais e demais cominações legais. Juntou documentos (fls. 19/78).

Os Embargos foram recebidos (fl. 80).

A parte embargada apresentou sua impugnação (fls. 81/101).

Compulsando os autos principais, verifico que a parte Exequente propôs ação objetivando a contagem do tempo de serviço de seus representados, anterior à Lei nº 8.112/90, para fins de percepção da gratificação por tempo de serviço (anuênio), na forma do art. 67 da referida Lei, com efeito retroativo a 1º de janeiro de 1991, além das parcelas vencidas e vincendas.

O Sindicato Autor promoveu a Reclamação Trabalhista nº 1266/91, perante a 7ª Junta de Conciliação e Julgamento do Recife, sendo declinada a competência para a Justiça Federal, por acórdão do TRT-RO-2290/92, de 19/01/1193.

Distribuído o feito como ação ordinária nº 93.002677-1, proposta contra o INAMPS, perante a 2ª Vara Federal, o pedido foi julgado improcedente, pelo que o Sindicato/Exequente ingressou com Recurso de Apelação AC-105.691-PE (96.05.82580-3), para o Egrégio Tribunal Regional da 5ª Região, onde foi proferida a seguinte decisão:

EMENTA: ADMINISTRATIVO. REGIME JURÍDICO ÚNICO, EX-CELESTISTAS, TEMPO DE SERVIÇO. ANUÊNIO. DIREITO A DQUIRIDO.

- O tempo de serviço público federal prestado por ex-celetistas é computado para todos os efeitos, nos termos do art. 100 da Lei nº 8.112/90;

- A Lei nº 8.162/91 não poderia ferir direito adquirido, já incorporado ao patrimônio do servidor.  

- Apelo provido.

A Executada/ UNIÃO FEDERAL, inconformada com a decisão de segundo grau que lhe foi desfavorável, interpôs, simultaneamente, RECURSO ESPECIAL e EXTRAORDINÁRIO, respectivamente para o STJ e STF, tendo o RESP tombado sob o nº 158796-PE, na qual foi proferida a seguinte decisão:

EMENTA. ADMINISTRATIVO. FUNCIONÁRIO PÚBLICO. LEIS 8.112/90 E 8.162/90. TEMPO DE SERVIÇO CELETISTA. ANUÊNIO.

1.        Nas contagens de tempo de serviço regido pela CLT, são excluídas as vantagens relativas ao anuênio e à licença-prêmio por assiduidade (art. 7º da Lei nº 8.162/91);

2.       Precedente da Turma (Resp. 77.188-DF, 90.222/CE E ererSO Nº 86.985/SP)

3.       Recurso Especial conhecido.

O sindicato exequente rescindiu o acórdão acima citado, tendo garantido o direito pleiteado à percepção do anuênio, em razão da passagem daquele regime para o estatutário, de que trata a Lei nº 8.112/90, através da Ação Rescisória nº 1091/93, na qual foi proferido a seguinte decisão:

Ante o exposto, julgo procedente o pedido para rescindir o acórdão proferido nos autos do RESP 158.796/PE e manter o acórdão recorrido, proferido pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que reconheceu aos substituídos do autor o Direito à contagem de tempo celetista para fins de anuênios.

Condeno a Ré ao pagamento das custas judiciais antecipadas e de honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, §4º, do CPC.”

Diante deste panorama processual, o Sindicato-Autor deu início à execução do julgado e a parte Ré foi citada, nos termos do art. 730 do CPC, o que ensejou o ajuizamento dos presentes Embargos à Execução, sobre o quais passo a deliberar nos seguintes termos:


Fundamentação

1.DA HOMOLOGAÇÃO DOS VALORES INCONTROVERSOS

A UNIÃO FEDERAL, ora Embargante, reputa devido o montante de R$ 112.892,75 (cento e doze e mil, oitocentos e noventa e dois reais e setenta e cinco centavos), cabendo às  Exequentes, ora Embargadas, o valor ali especificado, e impugna a diferença entre o referido valor e os pretendidos R$ 352.441,17 (trezentos e cinquenta e dois mil, quatrocentos e quarenta e um reais e dezessete centavos) indicados na memória de cálculos dos autos principais.

Não há, pois, nenhuma razão para não prosseguir a execução nos autos principais, relativamente aos R$ 112.892,75 (cento e doze e mil, oitocentos e noventa e dois reais e setenta e cinco centavos) incontroversos.

Sendo assim, esses valores incontroversos merecem ser homologados, retomando-se, nos autos principais, a execução apenas com relação a tais valores.

2. QUESTÕES INCIDENTES

Relativamente aos valores controversos, impõe-se a remessa dos autos à Contadoria, de modo a se aferir o quantum efetivamente devido aos Exequentes.

Pois bem.

A controvérsia dos presentes embargos cinge-se, basicamente, em quatro principais pontos de divergência entre a União, ora Embargante e a parte embargada: I) o termo final das diferenças; II) o início da contagem dos juros moratórios; III) a incidência ou não de juros de mora nas parcelas pagas administrativamente e IV) a base de cálculo dos honorários advocatícios.

2.1.TERMO FINAL DAS DIFERENÇAS

Sustenta a União que, em observância ao contido no art. 9º, da Medida Provisória nº 1.909-15/1999, o termo final das diferenças pleiteadas seria março/1999, e não agosto/99, como pretendido pela parte embargada.

Assim dispunha o art. 67, da Lei nº 8.112/90, anteriormente à revogação conferida pela Medida Provisória nº 2.225-45, verbis:

Art. 67. O adicional por tempo de seviço é devido à razão de 1% (um por cento) por ano de serviço público efetivo, incidente sobre o vencimento de que trata o art. 40.

Parágrafo único. O servidor fará jus ao adicional a partir do mês em que completar o anuênio.

Com efeito, assiste razão à União, ora Embargante, ao lembrar que com a edição da Medida Provisória nº 1.909/99, a qual, após várias reedições, foi consolidada na Medida Provisória nº 2.225-45, restou revogado o instituto do anuênio.

Aliás, não é outro o entendimento pretoriano esposado, conforme se verifica abaixo:

 TRABALHISTA. REMESSA OFICIAL. ANUÊNIO DO ART. 67 DA LEI 8112/90. SERVIDOR DO REGIME CELETISTA CONVERTIDO AO ESTATUTÁRIO. TEMPO COMPLETO ANTES DE MARÇO DE 1999. DIREITO ADQUIRIDO. RECURSO IMPROVIDO. 1. O adicional por tempo de serviço - anuênio - previsto no art. 67, da Lei nº 8.112/1990, que conferia aos servidores estatutários um acréscimo de 1% por ano de serviço público efetivo, incidente sobre o vencimento, ficou garantido somente aos servidores estatutários com situações definidas até 05 de julho de 1996 e não foi reconhecido aos servidores que, por força da Lei federal nº8.112/91, passaram do regime celetista para o estatutário. 2. O Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento, decidindo serem inconstitucionais os incisos I e III, do art. 7º, da Lei nº8.162/1991, por violação do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF), ensejando a edição da Medida Provisória nº 1.909-15, que revogou o anuênio, com ressalva às situações de direito adquirido anteriores a 08 de março de 1999. 3. Os Tribunais Regionais Federais adotaram o entendimento de que o servidor público, em regime celetista que foi convertido para o regime estatutário, tem a contagem do tempo de serviço, para fins de percebimento do anuênio, a partir do contrato celetista, e o mesmo é devido aos servidores que tiveram um ano completo de regime estatutário antes de março de 1999. 4. No caso dos autos, todos os autores atingiram tempo de serviço para a percepção do anuênio antes de março de 1999. 5. Remessa oficial improvida.
(REO 200903990258696, JUIZ MARCO AURELIO CASTRIANNI, TRF3 - JUDICIÁRIO EM DIA - TURMA E, DJF3 CJ1 DATA:05/04/2011 PÁGINA: 869.)(G.N.)

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A Lei 9.527/97, de 11.12.1997, alterou a redação do art. 67 da Lei 8.112/90, modificando o tempo necessário para a aquisição do direito ao Adicional por Tempo de Serviço. 2. Aos 24.09.1999, a Medida Provisória 1.909-16 extinguiu o direito ao Adicional por Tempo de Serviço, respeitadas as situações constituídas até 8 de março de 1999. 3. As provas dos autos revelam que a agravante, em 1997, contava com 18 anos de serviço (1979 a 1997) fazendo jus, portanto, a 18 anuênios. Os dois anos seguintes, trabalhados pela agravante, não poderão ser contados para efeitos de anuênios, tendo em vista que, a partir de 1997, o adicional passou a ser devido a cada cinco anos de serviço público efetivo. 4. Agravo a que se nega provimento.
(AG 200201000270222, JUIZ FEDERAL MANOEL JOSÉ FERREIRA NUNES (CONV.), TRF1 - PRIMEIRA TURMA, DJ DATA:20/11/2006 PAGINA:14.)(G.N.)

Destarte, as diferenças devidas às ora Embargadas devem ser apuradas até 08/03/1999, data da edição da mencionada Medida Provisória, ressalvando-se as situações de direito adquirido anteriores ao mencionado marco temporal.


2.2. INÍCIO DA CONTAGEM DOS JUROS MORATÓRIOS

A União entende que os juros moratórios deveriam incidir a partir da citação relativamente à ação rescisória, enquanto as ora Embargadas argumentam que tais juros seriam cabíveis desde a citação havida na ação ordinária nº 93.2677-1.

A esse respeito, observem-se os arestos abaixo colacionados:

AÇÃO RESCISORIA. VENCIMENTOS DE FUNCIONARIO PUBLICO. CORREÇÃO MONETARIA. JUROS MORATORIOS. CAUSA DE ALÇADA. AUSENCIA DE CERTIDÃO DO TRANSITO EM JULGADO. 1. EM CAUSA DE ALÇADA, TEM-SE POR TRANSITADA EM JULGADO A SENTENÇA, DESDE QUE EXCEDIDOS OS PRAZOS DE INTERPOSIÇÃO DOS EMBARGOS INFRINGENTES DO JULGADO (LEI N. 6825/80, ART. 4), E INEXISTENTES EMBARGOS DE DECLARAÇÃO QUE OS SUSPENDAM, (CPC ART. 538), PORQUANTO E, NO CASO, DISPENSADA A REMESSA OFICIAL (LEI N. 6825/80, ART. 1). 2. CUIDANDO-SE DE PARCELAS DE REMUNERAÇÃO ANTERIORES A VIGENCIA DA LEI N. 6899/81, A RESPECTIVA ATUALIZAÇÃO E DEFERIDA EM CONSIDERAÇÃO A NATUREZA ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES, CONSOANTE JURISPRUDENCIA CONSOLIDADA NOS TRIBUNAIS SUPERIORES. 3. A MORA DO DEVEDOR CARACTERIZA-SE A PARTIR DE SEU CHAMAMENTO A JUIZO E OS EFEITOS DELA RESULTANTES CONTAM-SE A PARTIR DE ENTÃO (CPC ART. 219, CODIGO CIVIL ART. 1536, PARAGRAFO 2, SUMULA STF/163). 4. AÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.
(AR 8904168872, ELLEN GRACIE NORTHFLEET, TRF4 - TURMAS REUNIDAS, DJ 24/08/1994 PÁGINA: 45716.)(G.N.)


DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO CELETISTA PARA PERCEPÇÃO DE ANUÊNIOS. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO AO ART. 485, V, DO CPC. SÚMULA 343/STF. INAPLICABILIDADE. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. PRESCRIÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. O óbice da Súmula 343/STF, segundo a qual é incabível ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei quando fundada a decisão rescindenda em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais, é afastado quando a matéria é de índole constitucional. 2. "São inconstitucionais os incisos I e III do art. 7º da Lei n. 8.162/1991, que afastam, para efeito de anuênio e de licença-prêmio, a contagem do tempo de serviço regido pela CLT dos servidores que passaram a submeter-se ao Regime Jurídico Único" (Súmula 678/STF). 3. Havendo desconstituição do acórdão e novo julgamento da causa, favorável ao autor, tem-se que a repercussão financeira da condenação incide com base na data de ajuizamento da demanda primitiva, e não da ação rescisória. Isso porque, reconhecendo o Tribunal de origem que o julgado rescindendo contém um dos vícios elencados no art. 485 do CPC, esse julgado é eliminado do mundo jurídico. 4. Recurso especial conhecido e improvido.
(RESP 200700771959, ARNALDO ESTEVES LIMA, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:02/02/2009.)(G.N.)

Sendo assim, tendo em conta o fato de que a parte autora, ora embargada, sagrou-se vencedora na tese inicialmente defendida na Reclamação Trabalhista, há de ser considerado legítimo o seu pleito relativo à inclusão de juros de mora desde a citação na referida ação originária, uma vez que a parte Ré, desde aquele momento, cientificou-se da pretensão contra ela vindicada.

O entendimento ora adotado possui respaldo jurisprudencial, aplicável mutatis mutandis ao caso em análise, cuja ementa transcrevo a seguir:

AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RECONHECIMENTO DE TEMPO RURAL E ESPECIAL. LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DOS FATOS. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES AGRESSIVAS DA ATIVIDADE. LOCAL DE TRABALHO QUE EXPÕE A RISCO A SAÚDE DO TRABALHADOR. RUÍDO. POEIRA SÍLICA. CONVERSÃO. POSSIBILIDADE. EMENDA 20/98. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. VERBA HONORÁRIA. CUSTAS PROCESSUAIS. I - A ação rescisória objetiva desconstituir a decisão de mérito que determinou a implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, tendo em vista a não implementação do tempo necessário para a aposentação, haja vista a ausência de pedido na exordial quanto ao reconhecimento dos períodos exercidos em atividade especial. II – (...)

XVI - Tendo o acórdão rescindendo concedido a aposentadoria integral por tempo de serviço, violou literal disposição do artigo 53, da Lei nº 8.213/91. XVII - O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação na demanda primitiva, em 10/02/1999, momento em que o INSS tomou conhecimento da pretensão do autor. XVIII - A correção monetária das prestações em atraso será efetuada de acordo com o Provimento nº 64, de 28 de abril de 2005, da E. Corregedoria Geral da Justiça Federal da 3ª Região, incluindo-se os índices expurgados pacificados no STJ, sendo indevida a incidência da taxa Selic. XIX - Os juros moratórios serão devidos no percentual de 0,5% ao mês, a contar da citação, até a entrada em vigor do novo Código Civil, nos termos do art. 406, que conjugado com o artigo 161, § 1º, do CTN, passou para 1% ao mês. XX - Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre as parcelas vencidas entre a citação da ação original até a prolação do decisum neste feito (Súmula nº 111, do STJ), atualizadas monetariamente (Provimento "COGE" 64/05). XXI - A Autarquia Federal é isenta de custas, cabendo apenas as em reembolso, eis que concedida a gratuidade da justiça, não há despesas para o réu. XXII - Ação rescisória procedente. Ação originária parcialmente procedente.
(AR 200303000287919, JUIZA MARIANINA GALANTE, TRF3 - TERCEIRA SEÇÃO, DJF3 DATA:04/06/2008.) (original sem grifos).

Ante tal situação, é de se considerar como termo inicial para a incidência dos juros moratórios a data da citação da ação ordinária nº 93.2677-1.


2.3. INCIDÊNCIA OU NÃO DE JUROS MORATÓRIOS SOBRE AS PARCELAS PAGAS ADMINISTRATIVAMENTE

As Exequentes, ora Embargadas, detêm título executivo judicial transitado em julgado, que lhes concede o direito à contagem de tempo de serviço prestado sob o regime da CLT para fins de anuênio.

Entendem que não devem incidir juros moratórios nas parcelas pagas administrativamente, com o que não concorda a União, ora Embargante.

Não há dúvidas de que deve ser efetivada a
compensação dos valores já pagos administrativamente às Exeqüentes,
como forma de se evitar o enriquecimento ilícito.

Contudo, a divergência travada nos autos refere-se à incidência de juros sobre tais valores, antes de se efetivar a compensação.

Por óbvio, o que deve ser abatido do valor em execução é o montante referente aos anuênios que o ente público já tenha pago administrativamente.

Outrossim, para que haja uma lógica no valor total encontrado e o valor a ser compensado, é necessária a aplicação dos juros também sobre as parcelas já pagas, de forma a compensar a incidência dos juros sobre o excedente nos
cálculos iniciais.

Com efeito, necessária a aplicação de juros sobre as parcelas pagas administrativamente, antes de subtraí-las do principal, sobre o qual está sendo aplicados juros de mora, como forma de se compensar os juros no encontro de contas.

Para ilustrar o entendimento ora adotado, transcrevo o seguinte precedente jurisprudencial:

PROCESSUAL CIVIL EMBARGOS À EXECUÇÃO
REAJUSTE DE 28,86% MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1704/98 TRANSAÇÃO REALIZAÇÃO POSTERIOR À DATA DETERMINADA NO DECRETO Nº 2693/98 IMPLEMENTAÇÃO NÃO COMPROVADA JUROS DE MORA SOBRE AS PARCELAS PAGAS ADMINISTRATIVAMENTE CABIMENTO 1 No caso dos
autos, a transação administrativa para o recebimento do percentual de 28,86% teria ocorrido em dezembro de 2003, posteriormente à data prevista no art 9º do Decreto nº 2693/98 2 Ainda que o documento
extraído do SIAPE goze de presunção de veracidade, não se presta a comprovar o adimplemento da obrigação, pois não demonstra a efetiva incorporação aos vencimentos dos servidores públicos civis 3 Os valores pagos administrativamente devem ser abatidos do total devido,
devendo ser calculados juros sobre as parcelas pagas administrativamente apenas para efeito de compensação com os juros que incidiram sobre aquelas parcelas e que, indevidamente, foram computadas no cálculo do valor total devido 4 Agravo Retido desprovido Apelação parcialmente provida
(AC 200651010211913, Desembargador Federal MARCELO PEREIRA/no afast Relator, TRF2 - OITAVA TURMA
ESPECIALIZADA, 10/09/2009)

2.4. BASE DE CÁLCULO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

A União, ora Embargante, defende que os honorários advocatícios, no percentual de 10% (dez por cento) devem ser calculados sobre o valor da causa atualizado.

De outro turno, as Embargantes argumentam que tal percentual, a título de honorários, deveria incidir sobre o valor da condenação.

No que tange a este ponto, penso serem descabidas maiores digressões, eis que a decisão proferida nos autos da ação rescisória nº 1091/PE, fixou os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, §4º, do CPC, (vide cópia da decisão às fls. 111/114 da ação principal), sendo este, pois, o critério a der adotado pela Contadoria quando da elaboração dos cálculos.

Conclusão:

          Posto isso:

a) Homologo os valores incontroversos, no montante de R$ 112.892,75 (cento e doze e mil, oitocentos e noventa e dois reais e setenta e cinco centavos)e determino a expedição, nos autos principais, de RPV/Precatórios, com as cautelas de praxe, nos termos consignados no item 1 da fundamentação supra;

b) determino sejam os autos remetidos à Contadoria Judicial, para que essa apure, à luz do julgado e do acima consignado, qual memória de cálculo está correta, se a da parte Embargada ou se a da União, ora Embargante e, se nenhuma das duas estiver correta, que elabore e apresente sua conta, de acordo com as determinações aqui expendidas.

 P. I.

          Recife, 05 de dezembro de 2011


       Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara-PE

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

O CONVÊNIO ICMS E O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

          Por Francisco Alves dos Santos Júnior




Introdução

O Convênio ICMS, previsto inicialmente na Emenda Constitucional nº 18, de 1965, à Constituição de 1946, então vigente, passou a ter sua aprovação regulamentada pela Lei Complementar nº 24, de 1975, ainda hoje em vigor.

A sua finalidade inicial foi tratar de incentivos na área do então ICM.

Na Constituição da República de 1988, embora essa finalidade originária tenha sido mantida(alínea g do inciso XII do § 2º do art. 155), ele pôde ser utilizado como Lei Complementar Transitória(§ 8º do art. 34 do ADCT da referida Constituição)e de fato o foi pelo Convênio ICMS 66, de 1988, e pode ser utilizado como instrumento para fixação de alíquotas do ICMS(inciso IV do § 4º do art. 155 da mesma Carta).

Neste trabalho, trataremos apenas do Convênio ICMS relativo a incentivo na área desse imposto, como consta do nosso livro “Direito Tributário do Brasil, Aspectos Estruturais do Sistema”(2ª Edição, Olinda: Livro Rápido, 2011, p. 109 e segs), onde sempre sustentamos que suas regras só podem ser introduzidas no ordenamento jurídico de cada Unidade da Federal, por Lei. 

O Convênio ICMS de Incentivo Fiscal e o Princípio da Legalidade

Aprovado, na forma das regras da Lei Complementar nº 24, de 1975, o Convênio ICMS tem natureza meramente autorizativa, pois só poderá ser efetivamente aplicado pela Unidade da Federação depois que a respectiva Assembléia Legislativa, após apresentação do pertinente projeto, transformar as regras do Convênio em Lei própria. Ou seja, não pode a Unidade da Federação aplicar diretamente o Convênio, principalmente depois da Emenda Constitucional nº 3, de 1993, que introduziu o § 6º no art. 150 da Constituição da República, exigindo Lei específica para qualquer tipo de renúncia fiscal. O art. 4º da Lei Complementar nº 24, de 1975, que autorizava a introdução das regras do Convênio ICMS, nos Estados e Distrito Federal, por mero Decreto[1], não foi recepcionado pela Constituição da República em vigor, principalmente depois da mencionada Emenda Constitucional nº 3, de 1993. Mencionada prática apenas concretizava o autoritarismo institucional então reinante, quando estávamos sob o período mais ditatorial do regime militar, sob a presidência de Garrastazu Médice.

             E, naquela época,  o Supremo Tribunal Federal-STF sacramentou esse autoritarismo no seguintes julgados: RE 99.648,  RTJ 105/1307; RE 109.965, DJ de 29.11.85; RE 106.456,  DJ de 28.11.86.     

           No entanto, felizmente, depois da Constituição da República de 1988, essa Suprema Corte decidiu que havia necessidade de Lei:

“ICMS E REPULSA CONSTITUCIONAL À GUERRA TRIBUTÁRIA ENTRE OS ESTADOS-MEMBROS: O legislador constituinte republicano, com o propósito de impedir a ‘guerra tributária’ entre os Estados-membros, enunciou postulados e prescreve diretrizes gerais de caráter subordinante destinados a compor o estatuto constitucional do ICMS. Os princípios fundamentais consagrados pela Constituição da República, em tema de ICMS, (a) realçam o perfil nacional de que se reveste esse tributo, b) legitimam a instituição, pelo poder central, de regramento normativo unitário destinado a disciplinar, de modo uniforme, essa espécie tributária, notadamente em face de seu caráter não-cumulativo, (c) justificam a edição de lei complementar nacional vocacionada a regular o modo e a forma como os Estados-membros e o Distrito Federal, sempre após deliberação conjunta, poderão, por ato próprio, conceder e/ou revogar isenções, incentivos e benefícios fiscais.
CONVÊNIOS E CONCESSÃO DE ISENÇÃO, INCENTIVO E BENEFÍCIO FISCAL EM TEMA DE ICMS: A celebração dos convênios interestaduais constitui pressuposto essencial à validade das isenções, incentivos ou benefícios fiscais em tema de ICMS.
Esses convênios - enquanto instrumentos de exteriorização formal do prévio consenso institucional entre as unidades federadas investidas de competência tributária em matéria de ICMS - destinam-se a compor os conflitos de interesses que necessariamente resultariam, uma vez ausente essa deliberação intergovernamental, da concessão, pelos Estados-membros ou Distrito Federal, de isenções, incentivos e benefícios fiscais pertinentes ao imposto em questão.
O pacto federativo, sustentando-se na harmonia que deve presidir as relações institucionais entre as comunidades políticas que compõem o Estado Federal, legitima as restrições de ordem constitucional que afetam o exercício, pelos Estados-membros e Distrito Federal, de sua competência normativa em tema de exoneração tributária pertinente ao ICMS.
MATÉRIA TRIBUTÁRIA E DELEGAÇÃO LEGISLATIVA: A outorga de qualquer subsídio, isenção ou crédito presumido, a redução da base de cálculo e a concessão de anistia ou remissão em matéria tributária só podem ser deferidas mediante lei específica, sendo vedado ao Poder Legislativo conferir ao Chefe do Executivo a prerrogativa extraordinária de dispor, normativamente, sobre tais categorias temáticas, sob pena de ofensa ao postulado nuclear da separação de poderes e de transgressão ao princípio da reserva constitucional de competência legislativa. Precedente. ADIn 1.296-PE, Rel. Min. CELSO MELLO.”(Grifei).[2]
Mas, para nossa decepção, esse saudável e científico entendimento do Plenário do Supremo Tribunal Federal-STF não foi observado por esse mesmo Plenário dessa mesma Suprema Corte no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI nº 3.410/MG, proposta pelo Governador do Estado do Paraná contra o Governador do Estado de Minas Gerais que, por Decreto, incorporara à legislação de Minas Gerais as regras do Convênio ICMS nº 128, de 1994, e o fez por unanimidade, no que ignorou por completo os dois julgados acima referidos e, data máxima vênia, feriu de morte o § 6º do art. 150 da Constituição da República e permitiu que a Assembléia Legislativa desse rico Estado do Sudeste do Brasil fosse substituída por seu Secretário da Fazenda, que participou da reunião que aprovou o referido Convênio, e por seu Governador, que editou e publicou a regra concedendo benefícios fiscais para operações com farinha de trigo via simples Decreto.[3] 

Todavia, na última decisão a respeito desse assunto, o Plenário dessa Suprema Corte voltou a aplicar o bom direito. Eis sua ementa:

“Ementa: TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE COMUNICAÇÃO E DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL E INTERESTADUAL. ISENÇÃO CONCEDIDA A TÍTULO DE AUXÍLIO-TRANSPORTE AOS INTEGRANTES DA POLÍCIA CIVIL E MILITAR EM ATIVIDADE OU INATIVIDADE. AUSÊNCIA DE PRÉVIO CONVÊNIO INTERESTADUAL. PERMISSÃO GENÉRICA AO EXECUTIVO. INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 13.561/2002 DO ESTADO DO PARANÁ. 1. A concessão de benefício ou de incentivo fiscal relativo ao ICMS sem prévio convênio interestadual que os autorize viola o art. 155, § 2º, XII, g da Constituição. 2. Todos os critérios essenciais para a identificação dos elementos que deverão ser retirados do campo de incidência do tributo (regra-matriz) devem estar previstos em lei, nos termos do art. 150, § 6º da Constituição. A permissão para que tais elementos fossem livremente definidos em decreto do Poder Executivo viola a separação de funções estatais prevista na Constituição. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente.”[4]

         Conclusão

         Então, podemos dizer que na atualidade o Plenário do C. Supremo Tribunal Federal entende que o Convênio ICMS só poderá ser introduzi no ordenamento jurídico interno de cada Unidade da Federação por meio de Lei, tendo em vista a regra do § 6º do art. 150 da Constituição da República.  

         Enfim, prevaleceu o bom direito.

         Aleluia!



[1]      Eis a redação desse artigo 4º da Lei Complementar nº 24, de 1975:  “Art. 4º - Dentro do prazo de 15 (quinze) dias contados da publicação dos convênios no Diário Oficial da União, e independentemente de qualquer outra comunicação, o Poder Executivo de cada Unidade da Federação publicará decreto ratificando ou não os convênios celebrados, considerando-se ratificação tácita dos convênios a falta de manifestação no prazo assinalado neste artigo.”.
    E por que não foi recepcionado? Porque, como já dito no texto acima, depois da Emenda Constitucional nº 3, de 1993, acresceu-se o § 6º ao artigo 150 da Constituição da República, exigindo Lei Específica para a concessão de qualquer tipo de renúncia fiscal(isenção, redução de base de cálculo, redução de alíquota, etc.).
    Então, na atualidade, os Estados e o Distrito Federal firmam o Convênio ICMS, mas este só poderá ser aplicado em cada Estado se as respectivas Assembléias Legislativas o transformarem em Lei Específica.   
[2] BRASIL. Supremo Tribunal Federal-STF. Ação Direta de Inconstitucionalidade com Pedido de Medida Cautelar – ADIMC nº 1.247/PA. Partes[n/c]. Julgamento em 17.08.1995. Relator Ministro Celso de Mello. Diário da Justiça da União-DJU de 08.09.195, p. 28.354. Ementário Vol. 01799-01, p. 20.
Note-se que na Ementa invocou-se a ADI nº 1.296-PE, no mesmo sentido.
[3] BRASIL. Supremo Tribunal Federal-STF. ADI 3.410/MG. Governador do Paraná x Governador de Minas Gerais. Julgado em 21.11.2006. Relator Ministro Joaquim Barbosa. Diário da Justiça Eletrônico-DJe nº 32, divulgado em 06.06.2007 e publicado em 08.06.2007, p. 28, Ementário Vol. 2279-01, p. 141. Plenário do Supremo Tribunal Federal-STF[unânime].
[4] ADI 2688, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 01/06/2011, DJe-164 DIVULG 25-08-2011 PUBLIC 26-08-2011 EMENT VOL-02574-01 PP-00015.

domingo, 30 de outubro de 2011

A RESPEITO DAS ALTERAÇÕES DAS ALÍQUOTAS DO IPI, UM TRIBUTO EXTRAFISCAL



            Por Francisco Alves dos Santos Júnior.
 
1.                   O  imposto sobre produtos industrializados-IPI, embora não se submeta ao princípio da anterioridade do exercício, porque arrolado na primeira parte do novo § 1º do art. 150, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 2003,  submete-se à anterioridade nonagesimal da alínea “c” do inciso III desse artigo 150, pois não foi  excepcionado na segunda parte desse § 1º.
As suas alíquotas encontram-se, atualmente, fixadas em Tabela aprovada pelo Decreto nº 6.006, de 2006, já com diversas alterações.

2.                  O Poder Executivo Federal pode,  segundo regra do § 1º do art. 153 da Constituição da República, alterar as alíquotas desse imposto: para menos, ou seja, para até zero por cento, ou para mais, ou seja, em até tantas unidades percentuais, na forma prevista em Lei,  e com a devida motivação(justificativa, explicando porque está reduzindo ou porque está aumentando a alíquota).
O ato pelo qual o Poder Executivo pode fazer essa variação de alíquotas pode ser Decreto ou Portaria Ministerial, conforme se encontre previsto em Lei.
O assunto encontra-se regido no art. 4º do Decreto-lei nº 1.199, de 1971, da seguinte forma:   
Art 4º O Poder Executivo, em relação ao Impôsto sôbre Produtos Industrializados, quando se torne necessário atingir os objetivos da política econômica governamental, mantida a seletividade em função da essencialidade do produto, ou, ainda, para corrigir distorções, fica autorizado:
I - a reduzir alíquotas até 0 (zero);
II - a majorar alíquotas, acrescentando até 30 (trinta) unidades ao percentual de incidência fixado na lei;
III - a alterar a base de cálculo em relação a determinados produtos, podendo, para êsse fim, fixar-lhes valor tributável mínimo.

Pois bem, valendo-se dessas regras constitucionais e legais, o Poder Executivo Federal, pelo Decreto nº 7.567, de 2011, reduziu as alíquotas do IPI de determinados produtos da área de transporte e majorou outras alíquotas desse mesmo imposto, com relação à importação de produtos da mesma área. 
              Embora não necessitasse, o Poder Executivo baixou, antes desse Decreto, duas Medidas Provisórias, as de nºs 540, de 2011 e 545, de 2011, traçando regras quanto à redução desse imposto, mas silenciando quanto à majoração das alíquotas.
Tem-se, pois, quanto a essa majoração, que o referido Decreto teria que observar as regras do referido § 1º do art. 153 da Constituição, e do acima transcrito art. 4º do Decreto-lei nº 1.199, de 1971.
Todavia, extrai-se do art. 10 desse Decreto que o Poder Executivo não apresentou a respectiva motivação, como exigida em tais regras desses Diplomas do nosso direito positivo.
Realmente, eis o texto do art. 10 desse Decreto:
CAPÍTULO V
Das Alíquotas da TIPI 
Art. 10.  Ficam alteradas para os percentuais indicados no Anexo V, até 31 de dezembro de 2012, as alíquotas do IPI, conforme a TIPI. 
Parágrafo único. O disposto no caput não alcança os destaques “Ex” existentes nos códigos relacionados no Anexo V.
Não consta desse dispositivo o motivo pelo qual as alíquotas do IPI foram majoradas, no anexo V desse Decreto, em torno de 30%(trinta)por cento, relativamente à importação de alguns veículos e produtos industrializados da área de transporte.
Então, neste particular, referido Decreto quer me parecer totalmente inconstitucional. 
3.                  Teria esse Decreto, se não fosse inconstitucional, que observar o prazo de 90(noventa)dias, fixado na alínea “c” do inciso III do art. 150 da Constituição, nela introduzida pela Emenda Constitucional nº 42, de 2003?
O Plenário do Supremo Tribunal Federal – STF, em decisão liminar, nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.661, de 2011, proposta pelo Partido Democratas-DEM, concedeu Medida Cautelar, entendendo que sim, e por isso suspendeu sua aplicação por mencionado prazo.
O Supremo Tribunal Federal – STF não examinou, em tal r. decisão,  a constitucionalidade do referido Decreto pela vertente abordada no item “2” supra, porque certamente não houve, em tal sentido, nenhuma argumentação na petição inicial da referida Ação Direta de Inconstitucionalidade.
Data maxima venia, se referido Decreto não se encontrasse contaminado pela inconstitucionalidade apontada no item “2” deste trabalho, não necessitaria submeter-se à mencionada anterioridade de 90(noventa)dias,  pois não estaríamos diante de um aumento de alíquotas do IPI, mas de mera variação dessas alíquotas, autorizada pela invocada regra do § 1º do art. 153 da Constituição da República e do art. 4º do Decreto-lei nº 1.199, de 1971.
Só haveria necessidade de submissão a anterioridade de 90(noventa)dias eventual Medida Provisória ou Lei que aumentasse as alíquotas do IPI para patamar superior às trinta unidades percentuais já autorizadas pelo referido Decreto-lei.
E é isso, data maxima venia,  que se extrai, claramente, da alínea “c” do inciso III do art. 153 da Constituição, que faz referência à Lei e não a ato do Poder Executivo que apenas exerça o seu poder-dever de fazer a variação de alíquotas desse impostos para percentuais inferiores ao que se encontram na TIPI(atualmente, aprovada pelo Decreto nº 6.006, de 2006) ou para percentuais superiores em até trinta unidades percentuais, com finalidades regulatórias, extrafiscais, como autorizado pelo invocados § 1º do art. 153 da Constituição e art. 4º do Decreto-lei nº 1.199, de 1971.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. MÃE HIPOSSUFICIENTE E DEFICIENTE.


       A partir da Lei nº 8.742, de 1993, as pessoas que sejam deficientes físicas ou mentais, não tenham renda e cuja família tenha renda inferior a um quarto(1/4)do salário mínimo,  têm direito de receber da Previdênica Social Pública o denominado Benefício Assistencial, correspondente a um salário mínimo.
     Também têm direito a esse Benefício pessoas idosas.
     Na sentença que segue, é analisada a situação de uma mãe, deficiente física e portadora do mal de Hansen e cuja única renda é a quantia de R$ 90,00 mensais do Bolsa Família.
     Será que ela faz jus ao Benéfício Assistencial?
    Boa leitura.


    OBS.: Sentença minutada pela Assessora do Gabinete do Juiz, Rossana Marques.





PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA



Juiz Federal : FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR

Proc. nº 2008.83.00.015969-3   Classe 29  AÇÃO ORDINÁRIA

AUTORA: R C DE M
Adv.: M E de A M A L  OAB/PE nº ... 

RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
Adv.: Procuradora Federal



Registro nº ...........................................

          Certifico que registrei esta Sentença às fls..........

Recife, ...../...../2011


 
Sentença tipo A


 
EMENTA - PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, INCISO V DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA/88 E LEI Nº 8.742/93, ART. 20. REQUISITOS.

Comprovada a incapacidade e a hipossuficiência da parte autora, é devido o benefício assistencial, desde a data em que diagnosticada a incapacidade pelo Perito Oficial do Juízo.

Procedência parcial.


Vistos etc.
  
          RISONEIDE CORREIA DE MELO, qualificada na Petição Inicial, propôs, em 24/09/2008, esta ação, rito ordinário, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL. Requereu os benefícios da Justiça Gratuita e alegou, em síntese, que teria requerido o Amparo Assistencial ao Deficiente (LOAS) ao INSS, em 04/03/2002, e que o benefício lhe teria sido negado porque a Perícia Médica teria concluído pela inexistência da  incapacidade para a vida independente e para o trabalho; que, todavia, o INSS teria deixado de observar que a autora seria portadora de doença de seqüela de poliomielite; que, além disso, o seu estado de saúde teria sido alterado após o INSS ter negado a LOAS. Teceu algumas considerações acerca da doença Poliomielite e aduziu que, na qualidade de portadora de tal doença necessitaria de medicação e alimentos que não seriam encontrados em Postos de Saúde e não seriam doados facilmente; que seu sustento adviria de terceiros; que sua incapacidade, atualmente, seria irreversível. Requereu, ao final:  a citação do INSS; a intimação do INSS para que apresente o processo administrativo da Autora; a concessão do benefício da amparo assistencial, desde 04/03/2002, com o pagamento das parcelas vencidas desde então, no montante de R$ 32.785,00, e as parcelas vincendas; condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios no percentual de 20% do valor da condenação; a concessão à Autora dos benefícios da assistência judiciária gratuita. Protestou o de estilo. Deu valor à causa e juntou procuração e documentos, fls. 11/18.
À fl. 19, deferido o benefício da gratuidade da justiça.
Às fls. 22/30, o INSS apresentou Contestação. Arguiu prejudicial de prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao qüinqüênio que precedeu o ajuizamento da ação. No mérito, alegou, em síntese, que não seria possível a concessão do benefício porque a Autora não teria preenchido os requisitos legais necessários para tanto; que a Autora não teria demonstrado ser inapta para a vida independente e para o trabalho; que a Autora não teria comprovado que percebe renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo; que, no caso de concessão do benefício, não poderia ser concedido a partir de 04/03/2002; que o requisito da incapacidade só estaria atendido se o perito judicial concluir pela incapacidade definitiva da demandante, e somente a partir de então é que haverá que se falar no pagamento de atrasados pelo INSS, consoante ementa de v. Acórdão que transcreveu; que, na hipótese de o INSS restar sucumbente, os honorários advocatícios deveriam ser fixados nos moldes do art. 20, §4º do CPC, ou então, sucessivamente, na hipótese de condenação em honorários ser feito sobre o valor apurado na liquidação, que seja determinada a observância ao disposto na Súmula nº 111 do E. STJ. Teceu outros comentários e requereu: a improcedência dos pedidos, com a conseqüente condenação da Autora nas verbas de sucumbência. Sucessivamente, no caso procedência do pedido, que o deferimento do beneficio seja fixado na data em que o laudo médico atestar a incapacidade da Autora para os atos da vida comum e para o trabalho; que os juros de mora sejam fixados em 0,5% ao mês,  e os honorários advocatícios na forma retro delineada. Protestou o de estilo e juntou documento, fl. 12.
Certificado o decurso do prazo sem que a parte autora houvesse apresentado Réplica à Contestação, fl. 34.
À fl. 35, decisão interlocutória determinando que a parte autora comprovasse que atende ao requisito previsto no §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93, isto é, que está inserida em família cuja renda mensal per capita  seja inferior a ¼ do salário mínimo.
À fl. 73, proferido despacho constatando, à luz das declarações prestadas pela Autora às fls. 57/58 e documento acostado à fl. 61, que o grupo familiar da Autora aufere renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo, e designando Perícia médica.
À fl.  75, o INSS ingressou com petição apresentando quesitos (fl. 76) e indicando  assistente técnico.
À fl. 86, o Perito do Juízo peticionou requerendo o arbitramento de seus honorários periciais.
Às fls. 88/91, apresentado o Laudo médico pericial.
À fl. 95, a Autora manifestou-se sobre o Laudo médico, ressaltando que o Laudo teria concluído pela incapacidade laboral da Autora e para os atos da vida diária, pelo que pugnou pela procedência do pedido.
Às fls. 97/100, o INSS alegou que o seu assistente técnico não teria sido intimado acerca do início da perícia e requereu que fosse suprida a apontada nulidade por meio da realização de novo exame a ser feito com a intimação prévia do assistente técnico do Réu. Destacou, outrossim, que o Perito Judicial teria afirmado a aptidão da Autora para o trabalho.
À fl. 101, certidão cartorária atestando que o INSS não foi intimado acerca da data, local e hora para o início da perícia.
À fl. 102/102-vº, decisão interlocutória determinando a intimação do Sr. Perito para designar dia, hora e local para atender novamente a Autora; determinando a intimação do  INSS a respeito do início dos trabalhos periciais; concedendo ao Sr. Perito Judicial o prazo de 20 (vinte) dias para a apresentação do Laudo Pericial, ou, se for o caso, complementar o anterior.
À fl. 114, o INSS deu ciência da data da realização da nova perícia, ratificou os quesitos formulados às fls. 75/76, e indicou como assistente técnico qualquer um dos médicos peritos do INSS.
Às fls. 119/123, apresentado Laudo Pericial.
À fl. 126, certificado o decurso do prazo sem que a autora houvesse se manifestado acerca do Laudo Pericial.
À fl. 127, o INSS manifestou-se sobre o Laudo Pericial afirmando que as conclusões do laudo seriam no sentido da incapacidade parcial da Autora, razão pela qual não estaria enquadrada no art. 20 da Lei nº 8.742/93. Apresentou Laudo Médico-Pericial do Assistente Técnico do INSS, fls. 128/131.
É o relatório.
Passo a decidir.


Fundamentação 
Mérito
1. A Autora pretende obter o benefício de natureza assistencial no valor de um salário mínimo, porque, segundo afirma, encontra-se incapacitada para o exercício de atividade laboral, e sua renda familiar per capita é inferior a ¼ do salário mínimo.
2. A Constituição da República/88, no inciso V do art. 203, assegura o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A Lei nº 8.742/93 (art. 20[1]), ao regulamentar o dispositivo constitucional, definiu como portador de deficiência, para fins da concessão do benefício, a pessoa incapaz para a vida independente e para o trabalho e com família de renda per capita inferior a um quarto(1/4) do salário mínimo, ou seja, sem possibilidade financeira de manter o Deficiente.
Cumpre averiguar, portanto, se a parte autora preenche os requisitos legais para a obtenção do benefício assistencial: deficiência incapacitante para a vida independente e situação de miserabilidade econômica.
2.1- Hipossuficiência econômica.
A hipossuficiência econômica restou suficientemente demonstrada nos autos, pois a Autora comprovou, com o documento juntado à fl. 61, que a única renda de sua família provém do benefício assistencial do Governo Federal intitulado “Bolsa Família”, no valor de R$ 90,00 (noventa reais), e é com este dinheiro que a Autora se sustenta e ao seu filho, menor impúbere (v. certidão de nascimento à fl. 16).
A Autora, segundo declarado às fls. 57/58, não recebe pensão do Pai do seu filho e conta apenas com a solidariedade de sua irmã que a ajuda com alimentos, a qual não vive no mesmo teto da Autora.
2.2- Incapacidade para a vida independente e para o trabalho.
Preambularmente, esclareço que será considerado o Laudo Pericial apresentado às fls. 119/123, porque a primeira Perícia Médica realizada pelo Perito do Juízo não contou com a participação do médico assistente do INSS, e, por esse motivo, precisou ser refeita.
Ao proceder ao exame físico na Autora, o Sr. Perito Judicial constatou:
Mão direita não realiza movimentos de apreensão e com limitação da extensão.
Limitação da abdução da mão direita.
Atrofia muscular do membro superior direito em relação ao esquerdo.
Discreta atrofia muscular do membro inferior direito, principalmente na panturrilha.
Manchas hipercrônicas em todo o corpo.
Falta de sensibilidade nos membros inferior e superior direito. (fl. 20)
Ao responder aos quesitos das partes, o Perito do Juízo afirmou que a Autora está incapacitada para o trabalho e não está incapacitada para as atividades da vida independente (quesito 5, fl. 121); que a pericianda possui incapacidade parcial devido a sequela de poliomielite que atingiu o seu membro superior direito e inferior do mesmo lado, adquirida na primeira infância (quesito 6, fl. 121); que a incapacidade é de caráter definitivo (quesito 8, fl. 122).
 Ao apresentar suas conclusões, o Sr. Perito Judicial afirmou que no exame físico da Autora foi encontrado um déficit motor leve, com atrofia muscular nos membros superior e inferior direito, com limitação funcional dos mesmos; que a Autora está em tratamento para o Mal de Hansen com lesões na pele por todo o corpo; que o interrogatório da pericianda foi prejudicado devido ao seu nível intelectual e mental, pois demonstrou possuir alguma deficiência psicomental.
O Sr. Perito finalizou o Laudo afirmando que há uma limitação parcial devido às alterações mostradas no exame físico e intelectual.
Da análise do Laudo Pericial, tem-se que, relativamente ao requisito incapacidade da Autora para a vida independente e para o trabalho, este requisito foi devidamente comprovado, sobretudo quando sopesadas as condições pessoais da Autora: é semi-analfabeta, nunca trabalhou, tem 41 anos de idade. Tais condições analisadas conjuntamente deixam patente a impossibilidade de inserção da Autora no mercado de trabalho, não tendo a Autora, portanto, condições de prover a própria subsistência através do trabalho.
Em casos extraordinários, as circunstâncias pessoais da parte autora podem autorizar a concessão do benefício, a despeito da incapacidade laborativa parcial apurada no Laudo Pericial, e essa excepcionalidade restou comprovada nos autos, tendo em vista a idade e o grau de instrução da Autora que a impossibilitam de exercer atividades compatíveis com a limitação física apresentada. Além disso, a Autora é portadora do Mal de Hanseníase e possui deficiência psicomental.
As decisões que seguem, em hipóteses nas quais os Requerentes estavam em situação físico-mental bem melhor que a ora Autora, os Tribunais decidiram pela concessão do benefício, verbis:
(...) 6. Laudo médico pericial (fls. 51/52) concluiu que, apesar da seqüela de meningite bacteriana, com perda de audição bilateral, visão sub-normal e distúrbio da fala, há incapacidade para o trabalho é moderada. 7. Sendo a incapacidade laborativa parcial, porém permanente, somadas as condições pessoais do autor para o exercício de qualquer profissão, acrescentando-se o meio social em que vive e o nível econômico, enquanto não houver reabilitação, subsiste direito ao benefício por incapacidade. (AC 200601990097840, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, TRF1 - SEGUNDA TURMA, 02/04/2009)

(...) II - No caso em apreço, ainda que se considere que a incapacidade decorrente da amputação de parte de três dedos não configure invalidez total, conforme afirma o agravante, considerando-se o contexto social do agravado, evidencia-se a impossibilidade do mesmo exercer as atividades que lhe garantiam a subsistência, tendo em vista que se trata de pessoa semianalfabeta, que obtinha a subsistência por meio de trabalhos braçais no campo. (AG 200902010171800, Desembargador Federal MESSOD AZULAY NETO, TRF2 - SEGUNDA TURMA ESPECIALIZADA, 08/06/2010)

(...) II - Laudo pericial concluiu que o autor, atualmente com 54 (cinqüenta e quatro) anos de idade, apresenta epilepsia, hipertireoidismo e hipertensão arterial e está incapacitada parcial e definitivamente para o trabalho. III - A incapacidade total e permanente resulta da conjugação entre a doença que acomete o trabalhador e suas condições pessoais, de forma que, se essa associação indicar que ele não possa mais exercer a função habitual, porque a enfermidade impossibilita o seu restabelecimento, e nem receber treinamento para readaptação profissional, em função de sua idade e baixa instrução, não há como deixar de se reconhecer a invalidez. IV - Há no conjunto probatório, elementos que possam induzir à convicção de que o(a) autor(a) está entre o rol dos beneficiários descritos na legislação, à luz da decisão do E - STF (ADI 1232/DF), em conjunto com os demais dispositivos da CF/88, fazendo jus à concessão do benefício assistencial.  (AC 199961130033932, JUIZA MARIANINA GALANTE, TRF3 - OITAVA TURMA, 02/05/2007)
(...) Se a parte autora comprovar a sua deficiência, bem como a sua condição de miserabilidade, faz jus à concessão do benefício assistencial, nos termos previstos nos art. 20 da Lei nº 8.742/93. 2. Caso em que embora o laudo pericial conclua pela incapacidade parcial e permanente, considerando-se a patologia apresentada pela parte autora, além das condições pessoais desfavoráveis, notadamente a pouca escolaridade e sua idade, afigura-se correta ao presente caso a concessão do amparo assistencial. (AC 200871080029295, FERNANDO QUADROS DA SILVA, TRF4 - QUINTA TURMA, 15/03/2010)
E, ainda, no mesmo sentido, transcrevo, na íntegra, ementa de recente v. Acórdão proferido pelo Pleno do E. TRF-5ª Região:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO CÍVEL. AMPARO SOCIAL. ART. 203, V da CF/88 E LEI Nº 8.742/93. IMPLEMENTO DOS REQUISITOS PARA CONCESSÃO. BENEFÍCIO DEVIDO. 1- A circunstância de o laudo pericial haver concluído pela incapacidade permanente porém parcial da autora para o trabalho não obstaculiza a concessão do amparo social quando existirem nos autos elementos que autorizem a conclusão de que a enfermidade mental, associada às precárias condições de instrução, cultura e formação profissional da autora, impossibilita a obtenção de recursos para sua subsistência, consistindo, na prática, em causa invalidante para o trabalho. Precedentes deste Tribunal. 2- Manutenção do acórdão turmário que, diante do implemento dos requisitos do art. 20 da Lei nº 8.742/93 (LOAS), reconheceu o direito ao benefício assistencial. 3- Embargos infringentes aos quais se nega provimento. (EIAC 20070599000037801, Desembargador Federal Marcelo Navarro, TRF5 - Pleno, 13/06/2011)
 2.2.1- Embora o Laudo Pericial tenha atestado a capacidade da autora para as atividades da vida independente, porque pode “vestir-se, alimentar-se, caminhar” (fl. 121), o E. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que a incapacidade exigida pela Lei nº 8.742/93 é aquela que mantém a pessoa incapacitada para o trabalho de forma que não possa manter o seu próprio sustento, sendo dispensável que esta incapacidade atinja as atividades elementares de sua vida pessoal, verbis:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA.ART. 20, § 2º DA LEI 8.742/93. PORTADOR DO VÍRUS HIV. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA PROVER O PRÓPRIO SUSTENTO OU DE TÊ-LO PROVIDO PELA FAMÍLIA. LAUDO PERICIAL QUE ATESTA A CAPACIDADE PARA A VIDA INDEPENDENTE BASEADO APENAS NAS ATIVIDADES ROTINEIRAS DO SER HUMANO. IMPROPRIEDADE DO ÓBICE À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO. I - A pessoa portadora do vírus HIV, que necessita de cuidados freqüentes de médico e psicólogo e que se encontra incapacitada, tanto para o trabalho, quanto de prover o seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família - tem direito à percepção do benefício de prestação continuada previsto no art. 20 da Lei 8.742/93, ainda que haja laudo médico-pericial atestando a capacidade para a vida independente. II - O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador. III - Recurso desprovido. (RESP 200101200886, GILSON DIPP, STJ - QUINTA TURMA, 01/07/2002) 
 No mesmo sentido, a Turma Nacional de Uniformização sumulou a matéria, verbis:
TNU, Súmula nº 29: Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento.

 Portanto, preenchidos os requisitos legais para a sua obtenção, a Autora faz jus ao benefício assistencial.  

3 - Termo inicial do benefício
 O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data do laudo médico-pericial, acima referido, qual seja, 08.06.2011(fl. 123), data essa na qual restou atestada, em caráter definitivo, a incapacidade laboral da Autora.
 4. Exceção de Prescrição
 O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS exceção de prescrição, das parcelas do qüinqüênio anterior à propositura desta ação.
Como se sabe, a prescrição, quando se trata benefício previdenciário de prestação continuada, não atinge o fundo de direito, mas somente os créditos relativos às parcelas vencidas há mais de 05 (cinco) anos(Súmula nº 85 do  E. Superior Tribunal de Justiça).
A exceção do INSS, pela qual se pugna pelo reconhecimento da prescrição das verbas anteriores a setembro de 2003, até mereceria ser acolhida, caso não se tivesse estabelecido como marco inicial do direito ao benefício o dia 08.06.2011, data do laudo pericial do Sr. Perito Judicial, acostado às fls. 88-91.
Nessa situação, tenho por prejudicada referida exceção, porque não há prescrição a ser acolhida.

Conclusão
 POSTO ISSO:
a) tenho por prejudicada a exceção de prescrição da defesa do INSS;
b)julgo parcialmente procedente o pedido e condeno o INSS a conceder à Autora o benefício assistencial previsto na Lei nº 8.742/93, no valor de um salário mínimo, a partir de 08.06.2011, data do Laudo Médico-Pericial,  bem como a pagar à Autora as parcelas vencidas e vincendas, com correção monetária e juros de mora na forma preconizada na Lei nº 11.960, de 2009.
Sem ressarcimento de custas porque a Autora é beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita.
Condeno o INSS ao pagamento de verba honorária que arbitro em 10%(dez por cento)do valor das verbas vencidas(Súmula 111 do E. Superior Tribunal de Justiça), consideradas como tais aquelas devidas até a data da efetiva implementação do benefício.
Deixo de submeter esta sentença ao duplo grau de jurisdição, porque a condenação não excede a 60 (sessenta) salários mínimos (CPC, art. 475, §2º).
P.R. I.
Recife, 28 de setembro de 2011.
Francisco Alves dos Santos Júnior
                  Juiz Federal, 2ª Vara-PE                


[1] Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
 § 1o  Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica.
§ 5º A situação de internado não prejudica o direito do idoso ou do portador de deficiência ao benefício.
§ 6o  A concessão do benefício ficará sujeita a exame médico pericial e laudo realizados pelos serviços de perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.
§ 7o  Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura.
§ 8o  A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.