sexta-feira, 1 de setembro de 2017

REGISTRO DE ARMA DE FOGO. RENOVAÇÃO. MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DISPENSA DE EXAME PSICOLÓGICO.





Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Renovação do registro de arma de fogo, pertencente a Membros do Ministério Público, que estejam na ativa ou aposentados, necessita  da submissão destes a exame psicológicos destes?
A decisão que segue discute esta matéria. 
Boa leitura. 

Obs.: decisão pesquisada e minuta pela Assessora Luciana Simões Correa de Albuquerque.



PROCESSO Nº: 0811335-40.2017.4.05.8300 - PROCEDIMENTO 
COMUM
AUTOR: P F DE A
ADVOGADO: E S R V e outros
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

D E C I S Ã O

Ementa: - O próprio Estatuto do Desarmamento, no caput de seu art. 6º, determina "ser proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria".

  1. Breve Relatório

P F DE A, qualificado na Inicial, ajuizou esta Ação de Procedimento Comum com pedido de tutela de urgência em desfavor da UNIÃO. Aduziu, em síntese, que: contaria atualmente com 76 (setenta e seis) anos e seria Promotor de Justiça do Estado de Pernambuco aposentado; diante do contido no previsto no artigo 42 da Lei Federal nº 8.625/93, deteria o direito ao porte de arma, independentemente de licença ou autorização; a validade do registro da arma de fogo do demandante teria expirado no último dia 08/01/2017, ocasião em que deu início aos procedimentos para renovação do registro de sua arma de fogo; o demandante teria sido surpreendido com a informação de que, sem justificativa legal plausível e por mera interpretação interna do órgão, o Departamento do Polícia Federal estaria exigindo do interessado, para a renovação do registro da arma de fogo dos membros do Ministério Público e da Magistratura (apenas), a realização do exame de aptidão psicológica; o art. 42 da Lei 8.625 de 1993, Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, seria claro ao estabelecer que os membros da instituição, promotores e procuradores, possuem porte de arma válido em todo o território nacional, independentemente de quaisquer atos formais de licença ou autorização; em 2003, fora editada a Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento), impondo os requisitos da capacidade técnica e realização de exame psicológico para portar arma de fogo, mas que tais exigências não se aplicariam aos membros do Ministério Público, que possuiriam uma regulamentação própria; o exercício das funções do Ministério Público seria atividade de risco, sendo essencial à garantia do porte de arma funcional; seria inconstitucional a alteração de lei complementar (Estatuto do MP) por lei ordinária (Estatuto do Desarmamento); o registro seria condição sine qua non para o porte e, se este deve observar as disposições das Leis Orgânicas do Ministério Público, não poderiam ser exigidos requisitos adicionais para o registro. Teceu outros comentários e requereu, liminarmente, que não fosse exigido exame de aptidão psicológica para renovação do registro de suas armas de fogo, com a confirmação na sentença de mérito. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.

Exarada decisão determinando a intimação da parte contrária acerca do pedido antecipatório (Id. 4058300.3702483).

A União (Fazenda Nacional) apresentou Contestação (Id. 4058300.3749086). Defendeu, em apertada síntese, que: a finalidade precípua do Estatuto do Desarmamento, norma específica sobre o tema, teria sido a diminuição de oferta de armas de fogo em circulação no país, trazendo disposições rígidas para a obtenção da autorização estatal para a compra e, mais excepcionalmente ainda para o porte de arma de fogo; em linhas gerais, apenas aos entes que lidariam com a segurança pública, privada ou nacional, a lei original teria reservado a faculdade de possuir e portar arma; após a devida comprovação por parte de seus membros, de possuírem habilidade técnica e psicológica para portá-la (ordinariamente através da aprovação em cursos de formação profissional, como seria o caso dos integrantes dos órgãos policiais, das Forças Armadas e de empresa de segurança privada); especificamente  sobre o registro de arma de fogo, disporia o art. 4º da Lei nº10.826/03 "Art. 3o É obrigatório o registro de arma de fogo no órgão competente. Parágrafo único. As armas de fogo de uso restrito serão registradas no Comando do Exército, na forma do regulamento desta Lei. Art. 4o Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos: I - comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos; (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008) II - apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa; III - comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei.(...) § 8o Estará dispensado das exigências constantes do inciso III do caput deste artigo, na forma do regulamento, o interessado em adquirir arma de fogo de uso permitido que comprove estar autorizado a portar arma com as mesmas características daquela a ser adquirida. (Incluído pela Lei nº 11.706, de 2008); ao se regulamentar o referido dispositivo, teria sido editado o Decreto nº 5.123/04, o qual teria previsto, expressamente, em seu artigo 12:  Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá: (...) VII - comprovar aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestada em laudo conclusivo fornecido por psicólogo do quadro da Polícia Federal ou por esta credenciado; a comprovação para a capacidade técnica e de aptidão psicológica para o registro de arma de fogo possuiria fundamento legal  e específico, pelo que escorreita seria a atuação dos agentes da Polícia Federal quando exige de todos os cidadãos, inclusive membros do Ministério Público;  que a questão sobre uma aparente colisão entre as disposições do Estatuto do Desarmamento e a Lei Orgânica do Ministério Público (art. 42) não seria nova, tendo o Superior Tribunal de Justiça, reiteradamente, validado a postura do Departamento da Polícia Federal ao exigir a comprovação de aptidão técnica e psicológica para membros do Parquet; o Superior Tribunal de Justiça, em anterior julgado, de forma detalhada, teria confirmado a legitimidade e legalidade da exigência dos requisitos para obtenção o registro de armas de fogo por parte de membros do Ministério Público, bem como fez a exata distinção entre o registro de arma e porte de arma (sublimado na petição inicial); a ementa desse paradigmático julgado do STJ, o qual, apesar de se referir à comprovação de capacidade técnica, seria aplicável mutatis mutandis, ao caso dos autos; por mais que se esforce o autor em tentar estender a previsão do art. 42 da Lei Orgânica do Ministério Público (restrita a porte de arma) de sorte a contemplar o registro, não haveria como sustentar o seu raciocínio de "quem pode o mais, pode o menos"; o porte e o registro de arma de fogo seriam categorias distintas, merecendo tratamento distintos, tal como explicitado no julgado do Superior Tribunal de Justiça, transcritos na Contestação,caberia ao legislador, quando da edição da lei nº 8.625/93, dispensar os membros do Ministério Público das exigências referentes ao registro de arma;  se não o fez seria porque teria entendido que tal matéria poderia ser disciplinada em outra norma legal; ao silenciar sobre o registro de arma, o legislador teria colocado os membros do Ministério Público em igualdade com os demais cidadãos em relação à devida observância das exigências do Poder Público; os exames de aptidão psicológica para o registro de armas em nada poderiam interferir em suas prerrogativas funcionais, tampouco atentariam contra suas garantias institucionais;  o exame de capacidade psicológica para o registro de arma de fogo se trataria de um critério objetivo para a aferir se o cidadão (independentemente de sexo, raça, idade, profissão etc.) apresentaria condições de ser possuidor de uma arma de fogo, sem oferecer risco para si mesmo e para a sociedade; a demonstração de capacidade psicológica seria uma exigência objetiva, cuja razão se de ser repousaria na necessidade de garantir segurança à sociedade de que aqueles que vão manusear uma arma estão aptos a tanto; tal exigência seria dotada de razoabilidade e proporcionalidade, por óbvio, em nada viria a macular as prerrogativas dos membros do Parquet; ao contrário disso, a obtenção da aprovação no exame psicológico para o registro de arma conferiria respeitabilidade aos membros do Ministério Público, porquanto restaria demonstrada a questão de que todos seriam iguais perante a Lei (art. 5º, II, da CF/88);  o exame psicotécnico ao qual seriam submetidos, uma única vez, os candidatos ao cargo de promotor de justiça, em nada se assemelharia ao exame de capacidade psicológica previsto no Estatuto do Desarmamento; o art. 60 da Resolução CNJ 75/2009, que tratou dos concursos de ingresso nas carreiras do Ministério Público teria mencionado que, na hipótese de aprovação no psicotécnico, e ainda que eventualmente se atendam aos requisitos estabelecidos no ato normativo de regência da Polícia Federal para o registro e renovação de registro de arma de fogo, a bateria de instrumentos de avaliação psicológica utilizados na aferição das características de personalidade e habilidades específicas para manuseio de arma de fogo deveria ser periodicamente  aplicada para o registro e renovação de registro de arma de fogo, em período não superior a 05 (cinco) anos, conforme disciplina o parágrafo 2º do Artigo 16 do Decreto 5.123/04; até mesmo a questão alusiva à dispensa prevista no art. 4º, § 8º, do Estatuto do Desarmamento, suscitada na inicial, teria sido enfrentada  no Recurso Especial - 1.327,796; sobre o tema em exame, o Supremo Tribunal Federal já teria tido a oportunidade de se pronunciar na Ação Originária nº 1.429/DF2, quando analisou pleito similar formulado por uma associação de magistrados; a Ministra Ellen Gracie teria mencionado a necessidade e justificativa, notadamente quanto à questão da segurança, das condicionantes impostos pela Polícia Federal no que toca ao registro de armas de fogo.  Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes, notadamente os REsp 1.606.433 e 1.327.796, bem como a Ação Originária nº 1.429/DF2. Pugnou, ao final, fosse a ação julgada  totalmente improcedente, pelos fundamentos acima ponderados condenando a parte autora nos ônus sucumbênciais.

A parte autora pugnou pela apreciação do pleito antecipatório e juntou cópia de decisão favorável à sua tese (Id. 4058300.3850483).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.
2. Fundamentação


2.1 - Nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, a concessão da tutela de urgência exige a presença dos elementos: a) que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano; b) ou o risco ao resultado útil do processo.

Trata-se de medida excepcional, utilizada apenas quando houver urgência na obtenção de determinados efeitos que somente seriam alcançados ao final do processo. A excepcionalidade decorre do fato de se tratar de medida concedida antes que se instaure o regular contraditório, de modo que a urgência afirmada permita conceder antecipadamente alguns efeitos fáticos da sentença de procedência, desde que haja meios de prova para, mediante cognição sumária, constatar-se a verossimilhança das alegações, bem como seja possível reverter o provimento antecipado (art. 300, §3º, do CPC).

Além disso, revela-se necessário que a medida seja juridicamente possível.

No caso em análise, o Autor é promotor de justiça aposentado e sustenta a ilegalidade da exigência, por parte da Polícia Federal, de comprovação de capacidade técnica (avaliação psicológica) para a renovação do registro da sua arma de fogo. 

No corpo da petição inicial, justifica o periculum in mora no fato da validade do registro da arma de fogo ter expirado no último dia 08/01/2017, ocasião em que deu início aos procedimentos para renovação do registro de sua arma de fogo, quando, então,  deparara-se com a exigência de comprovação de capacidade técnica (avaliação psicológica), exigência esta que reputou ilegal, pelos motivos expostos no relatório desta decisão.

Pois bem.

Apesar de conhecer os precedentes do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça mencionados no corpo da Contestação, nos quais são feitas distinções entre porte e registro de arma, validando a exigência de capacidade técnica como requisito para o registro da arma, ainda que o interessado tenha porte por força de lei  (prerrogativa funcional), tenho que a matéria comporta solução diversa, pelos motivos a seguir expedidos:

A Constituição Federal determina que os estatutos do Poder Judiciário e do Ministério Público sejam objeto de leis complementares (art. 93, caput; 128, § 5º; 129, § 4º - EC 45/04).


Para o Poder Judiciário, a Lei Complementar nº 35/79, recepcionada pela Carta Política de 1988, cumpre esse papel e estabelece o porte de arma como prerrogativa do magistrado, nos seguintes termos: "Art. 33 - São prerrogativas do magistrado: (...) V - portar arma de defesa pessoal".


Também os membros do Ministério Público detêm o porte de arma funcional como prerrogativa, por força de leis complementar e ordinária.


A Lei Complementar nº 75/93, que é o Estatuto do Ministério Público da União, prevê:


Art. 18. São prerrogativas dos membros do Ministério Público da União: I - institucionais: (...) e) o porte de arma, independentemente de autorização;


E a Lei nº 8.625/93 - Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (LONMP) - contém a seguinte previsão no "CAPÍTULO VI, Das Garantias e Prerrogativas dos Membros do Ministério Público":


Art. 42. Os membros do Ministério Público terão carteira funcional, expedida na forma da Lei Orgânica, valendo em todo o território nacional como cédula de identidade, e porte de arma, independentemente, neste caso, de qualquer ato formal de licença ou autorização.


A mesma Lei 8.625/93 determina:


Art. 80. Aplicam-se aos Ministérios Públicos dos Estados, subsidiariamente, as normas da Lei Orgânica do Ministério Público da União.
Vê-se que os artigos 18 da LC 75/93 e 42 da LONMP conferem aos membros do MP a prerrogativa de portar arma de defesa pessoal, sem prever qualquer requisito para o exercício. Trata-se de um porte de arma especial, que constitui verdadeira prerrogativa funcional e que está imune às restrições regulamentares e legais.
O Estatuto do Desarmamento ((Lei 10.826/2003), por sua vez, estabelece que:


Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm. § 1o A autorização prevista neste artigo poderá ser concedida com eficácia temporária e territorial limitada, nos termos de atos regulamentares, e dependerá de o requerente: I - demonstrar a sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física; II - atender às exigências previstas no art. 4o desta Lei; III - apresentar documentação de propriedade de arma de fogo, bem como o seu devido registro no órgão competente.






O art. 4º deste Estatuto, assim prevê:


Art. 4o Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos: I - comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos; (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008)  II - apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa;  III - comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei.

Não há qualquer previsão legal na legislação específica do Ministério Público que obriga os seus membros a preencherem os requisitos dos art. 4º e 6º da Lei 10.826/2003, supratranscritos.
O próprio Estatuto do Desarmamento, no caput de seu art. 6º, determina "ser proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria".

Com efeito, tem-se que o Estatuto do Desarmamento é lei geral e de hierarquia distinta, não podendo revogar nem restringir a prerrogativa específica atribuída aos promotores, prevalecendo a presunção legal estabelecida pelo estatuto dos membros do MP quanto à higidez do impetrante para portar arma para defesa pessoal, o que aliás é bastante apropriado se considerarmos as responsabilidades e os riscos que o exercício da função impõe.
A renovação do registro da arma, para os membros do Ministério Público e do Poder Judiciário, deve ser entendido apenas como forma de controle administrativo, pelos Órgãos de Segurança, das pessoas que são portadoras de arma de fogo, bem como para o pagamento da respectiva taxa(tributo) para o Ente público custear as despesas com esse controle.






Ademais, embora regularmente instada, a UNIÃO não trouxe para os autos nenhuma notícia de que o Impetrante tenha algum antecedente que manche a sua capacidade de ter registrada, como sua, uma arma de fogo, ou que a impedisse de portá-la para defesa pessoal. 
Por outro lado, sabe-se da incapacidade das Polícias brasileiras, federais e estaduais, de impedir o tráfico de armas, bem como o seu uso por malfeitores, e ainda de dar a devida segurança a todos os cidadãos, situação essa que coloca a vida dos cidadãos de bem em perene situação de risco, e especialmente dos que exercem cargos públicos cujas atividades têm por escopo punir esses malfeitores, de forma que abster os Membros dessas categorias profissional-públicas, que exercem ou exerceram esses cargos, de ter em seu nome registrada arma de fogo, para defesa pessoal, corresponderia a um absurdo contrassenso, principalmente quando, como demonstrado, há Leis específicas que lhes dão o poder-dever-direito de portar esse tipo de arma para defesa pessoal. 
Finalmente, não diviso ferimento ao princípio constitucional da isonomia, como alegado pela UNIÃO na sua contestação, pois essas pessoas que exercem ou exerceram mencionados cargos, não se igualam aos cidadãos de bem comuns,  e é exatamente por isso que recebem tratamento legal diferenciado, sendo sempre bom relembrar que esse princípio constitucional consiste exatamente em permitir que se dê tratamento desigual aos desiguais e igual àqueles que se igualam. 



Nesse sentido, confiram-se os precedentes que se seguem, aplicáveis mutatis mutandis ao presente caso:


EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PORTE DE ARMA DE FOGO. MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ART. 18 DA LEI COMPLEMENTAR 75/93. LEI 10.826/2003 (ESTATUTO DO DESARMAMENTO), ART. 4º-III. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 23/2005-DG/DPF. 1. Os membros do Ministério Público não estão sujeitos à comprovação de capacidade técnica para o manuseio de arma de fogo como requisito para obtenção do respectivo porte, exigência essa prevista genericamente no art 4º-III do Estatuto do Desarmamento. 2. A Lei Complementar 75/93, no art. 18, inciso I, alínea "e" estabelece que é prerrogativa do membro do Ministério Público o porte de arma independentemente de autorização, não podendo a legislação ordinária ou regulamentação administrativa restringir essa prerrogativa ou estabelecer requisitos diferentes daqueles previstos na norma complementar quanto aos magistrados, que são submetidos ao estatuto previsto no artigo 93 da Constituição quanto aos encargos, prerrogativas, direitos e deveres. 3. Ainda que a limitação administrativa imposta aos magistrados pelo Departamento de Polícia Federal por meio da Instrução Normativa nº 23/2005-DG/DPF (prova de capacidade técnica de manuseio da arma) esteja sendo dirigida ao registro periódico da arma e não ao seu porte propriamente dito, o efeito prático é o mesmo, pois não haverá porte regular de arma se não houver seu registro regular. 4. Tendo a LC 75/93 instituído o porte de arma de fogo como prerrogativa específica atribuída aos membros do MP, prevalece a presunção legal por ela estabelecida quanto à higidez do procurador para portar arma para defesa pessoal. 5. Apelação provida para conceder a segurança.   (TRF4, AC 5035735-75.2015.404.7100, QUARTA TURMA, Relator CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 07/12/2015).
 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. MAGISTRATURA. PORTE DE ARMA DE FOGO. LOMAN, ART. 33-V. LEI 10.826/2003 (ESTATUTO DO DESARMAMENTO), ART. 4º-III. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 23/2005-DG/DPF. 1. Os membros da magistratura nacional não estão sujeitos à comprovação de capacidade técnica para o manuseio de arma de fogo como requisito para obtenção do respectivo porte, exigência essa prevista genericamente no art 4º-III do Estatuto do Desarmamento. 2. A Lei Orgânica da Magistratura - LOMAN, que é lei complementar, no art. 33-V estabelece que é prerrogativa do magistrado portar arma de defesa pessoal, não podendo a legislação ordinária ou regulamentação administrativa restringir essa prerrogativa ou estabelecer requisitos diferentes daqueles previstos na norma complementar quanto aos magistrados, que são submetidos ao estatuto previsto no artigo 93 da Constituição quanto aos encargos, prerrogativas, direitos e deveres. 3. Ainda que a limitação administrativa imposta aos magistrados pelo Departamento de Polícia Federal por meio da Instrução Normativa nº 23/2005-DG/DPF (prova de capacidade técnica de manuseio da arma) esteja sendo dirigida ao registro periódico da arma e não ao seu porte propriamente dito, o efeito prático é o mesmo, pois não haverá porte regular de arma se não houver seu registro regular. 4. Tendo a LOMAN instituído o porte de arma de fogo como prerrogativa específica atribuída aos magistrados, prevalece a presunção legal por ela estabelecida quanto à higidez do magistrado para portar arma para defesa pessoal. (TRF4 5008267-93.2016.404.7200, QUARTA TURMA, Relator CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 22/08/2017)






Diante de todo o narrado, tenho por presente a plausibilidade do direito alegado.

O perigo da demora também se evidencia pela ineficácia da medida se deferida apenas ao final, que a validade do registro de propriedade da arma do demandante já venceu, conforme noticiado na inicial.
3. Conclusão 


Diante de tal contexto, defiro a tutela provisória de urgência de antecipação e determino que a UNIÃO, por seu Órgão Departamento de Policia Federal loca, providencie imediatamente a renovação do registro da arma de fogo do Autor, sem dele exigir qualquer exame de aptidão psicológica, ou algo semelhante, sob as penas da Lei. 

Quanto ao mais, intime-se a parte para, querendo,  apresentar réplica.

Após, conclusos.


Recife, 01 de setembro de 2017.

Francisco Alves dos Santos Júnior




Juiz Federal, 2ª Vara/PE

quinta-feira, 31 de agosto de 2017

PRESCRIÇÃO. CONTRATO. INADIMPLÊNCIA. VENCIMENTO ANTECIPADO DAS PRESTAÇÕES FALTANTES. MANUTENÇÃO DO TERMO INICIAL DA FLUÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL: DIA SEGUINTE AO VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA DO CONTRATO ANTES DO VENCIMENTO ANTECIPADO. PRECEDENTES DO STJ.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Segue sentença que trata da prescrição de obrigação contratual civil, à luz de sedimentado entendimento de Turmas do Superior Tribunal de Justiça, posterior ao vigente Código Civil de 2002. 
Boa leitura. 

Obs.: pesquisa feita pelo Assessor Marcos Eduardo França Rocha.



PROCESSO Nº: 0803621-63.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTORA: C M DE A T
ADVOGADO: L A Da S e outro
RÉS: EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)





  Sentença tipo B





EMENTA: CONTRATO. INADIMPLÊNCIA. ANTECIPAÇÃO DAS PRESTAÇÕES VINCENDAS. INÍCIO DA FLUÊNCIA DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO. VERBA HONORÁRIA. CONDIÇÃO SUSPENSIVA.
A antecipação do vencimento das prestações vincendas, em decorrência de inadimplência do Devedor, não modifica o início da fluência do prazo de prescrição da pretensão do Credor, que continua sendo o dia seguinte ao do vencimento da última prestação do contrato, como se a antecipação não tivesse ocorrido.
Verba honorária fixada no mínimo legal, com cobrança submetida à condição suspensiva, em face do gozo da assistência judiciária da Parte Autora, pelo tempo fixado n§ 3º do art. 98 do vigente Código de Processo Civil.
Improcedência.



Vistos, etc.

1. Relatório



C M T DE C P propôs a presente ação declaratória de prescrição da dívida contra a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA e a EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA, requerendo, preliminarmente, a concessão do benefício da justiça gratuita. Aduziu, em síntese, que: o Sr. ÂNGELO DE COIMBRA PINTO, em 29/10/1991, teria firmado contrato por instrumento particular de compra e venda, mútuo com obrigações e quitação, consoante espécie de adesão, figurando como cessionária e credora hipotecária a Caixa Econômica Federal, tendo como vendedora do mencionado imóvel a Construtora O M Ltda.; o contrato seria de um financiamento imobiliário para aquisição da casa própria, pactuado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação - SFH (Lei nº 4.380/64), vinculado ao Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional - PES, com prazo de financiamento em 19 anos; a Autora teria se separado do Sr. Â DE C P,  ficando cordado na separação que a Autora ficaria na posse do referido imóvel, motivo pelo qual estaria movendo a presente ação, requerendo que seja reconhecida a prescrição da dívida já que conforme a cláusula 29ª  do contrato teria ocorrido a antecipação da dívida com o seu inadimplemento, estando a Autora inadimplente desde o dia 28/02/1994; o pagamento do financiamento só teria sido realizado até a 27ª prestação, em 28/02/1994, devido a um litígio existente entre a construtora O M e a Caixa Econômica Federal, processo nº 93.0008067-9, que estaria em tramitação na 10º Vara Federal; a partir do momento em que a última parcela teria sido paga, teria ocorrido a antecipação da dívida desde o seu inadimplemento, qual seja, a 27ª prestação, contando a partir dali o prazo prescricional da dívida; a ré teria restado inerte em realizar a cobrança da dívida, ocorrendo, portanto, a prescrição quinquenal da dívida exigida pela ré. Teceu outros comentários. Requereu a concessão da tutela antecipada para suspender a execução enquanto não for julgado o mérito da presente demanda; existiria em andamento um processo para revisão contratual do contrato celebrado entre o Sr. Ângelo de Coimbra Pinto e a CEF sob o nº 0020456-77.2007.4.05.8300, contudo a revisão contratual não teria sido realizada; requer, portanto, a concessão da tutela antecipada para suspender a execução extrajudicial, a qual pretenderia promover a ré, enquanto não for realizada a revisão contratual conforme o processo de nº 0020456-77.2007.4.05.8300, já que, realizada a execução extrajudicial, o processo supracitado perderia o seu sentido de existir. Ao final, requereu: a) citação da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e da EMGEA EMPRESA GESTORA DE ATIVOS, b) que seja declarada a prescrição da dívida e dos juros na forma código civil artigo 206, § 3º, III e § 5º, I; c) procedência da Ação, com a condenação da Requerida, nas custas processuais, honorários advocatícios em 20%, e demais cominações legais, sem exceção. Protestou o de estilo. Deu valor à causa. Instruiu a Inicial com instrumento de procuração e documentos.



Decisão (ID. 4058300.2000465), na qual foi concedido os benefícios da justiça gratuita e foi indeferido o pedido de tutela provisória de urgência.



A CAIXA apresentou contestação (ID. 4058300.2106780). No mérito esclareceu que o contrato habitacional teve sua assinatura em 29.10.1991, com recursos do FGTS, com prazo de amortização de 240 meses, taxa de juros de 10,5% a.a., sem cobertura pelo FCVS e com garantia hipotecária, oportunidade na qual pugnou pela força obrigacional do contrato de mútuo firmado entre a parte Autora e o Agente Financeiro; que ao contrário do afirmado pela autora, o prazo pra reconhecimento da prescrição do dívida não tem como início da sua contagem a data da última parcela não paga e sim a data em que findaria o contrato; que o contrato possui 92 prestações em atraso, referentes ao período entre janeiro de 1994 até agosto de 2001, totalizando uma dívida de R$ 847.820,25. Ao final, pugnou pela total improcedência dos pedidos e a condenação da autora em honorários advocatícios.



A parte autora apresentou réplica (ID. 4058300.2264793), e reiterou os termos de sua petição inicial.



Vieram os autos conclusos.



É o relatório. 
Fundamento e decido.



2. Fundamentação
Alega a Autora:
"Como se sabe o Art. 206 do CC, traz previsão acerca da prescrição senão vejamos:"Art. 206. Prescreve: § 5º Em cinco anos: I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular; § 3º Em três anos: III - a pretensão para haver juros, dividendos ou quaisquer prestações acessórias, pagáveis, em períodos não maiores de um ano, com capitalização ou sem ela;[...]".Portanto, verifica-se que a dívida foi antecipada desde 28.02.1994, com o inadimplemento do pagamento o que ensejou na antecipação da dívida conforme a cláusula vigésima nona do contrato celebrado, o que enseja o pedido de prescrição por inércia do credor."
Primeiro, incide apenas a o prazo de prescrição quinquenal do inciso I do § 5º do art. 206 do Código Civil, porque o que está em discussão são as prestações, como um todo, inclusive dos juros de mora, do contrato em questão. Aqui, os juros de mora são meros acessórios do principal.
Só incidiria o prazo de prescrição trienal do inciso III do § 3º do mesmo artigo, se estivesse em cobrança apenas juros de mora, isoladamente, o que, como se vê nos autos, não é o caso.
Teria havido a prescrição quinquenal do inciso I do § 5º do art. 206 do vigente Código Civil?
Examinemos o caso.
É sabido que o termo inicial para fluência do prazo prescricional não é a data da celebração do contrato de crédito (29.10.1991), mas sim a data de vencimento da dívida e se a dívida encontra-se em prestações mensais, por anos a fio, a fluência desse prazo só se inicia após a data da última prestação.
Não importa que, por força de cláusula do contrato, haja vencimento antecipado das prestações que faltam, quando, como no caso dos autos, houver atraso em uma única prestação(Cláusula Décima Nona), que no caso ocorreu em 28.02.1994, quando a Parte Autora deixou de honrar a 27.ª (vigésima sétima) prestação.



Todavia, essa antecipação das prestações vincendas não modificou o marco inicial da prescrição, que continuou sendo o dia seguinte à data do vencimento da última prestação contratual
E nesse sentido firmou-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme precedentes cujas ementas transcrevo a seguir:

"ADMINISTRATIVO. CONTRATO. INADIMPLÊNCIA. ANTECIPAÇÃO DO VENCIMENTO. PRAZO DE PRESCRIÇÃO. MANUTENÇÃO DO TERMO INICIAL.

1. Trata-se de ação monitória referente ao contrato de abertura de crédito para financiamento estudantil em que a origem afastou a prescrição reconhecida pelo juízo de primeiro grau.
2. Esta Corte pacificou seu entendimento no sentido de que, mesmo diante do vencimento antecipado da dívida, subsiste inalterado o termo inicial do prazo de prescrição - no caso, o dia do vencimento da última parcela, 10.2.2008. Precedentes.
3. Note-se, ainda, que a ninguém é admitido valer-se da própria torpeza. Ora, entender em favor da antecipação do prazo em questão beneficiaria o próprio devedor que criou o óbice para o recebimento do crédito. 4. Recurso especial não provido.".
Nota 1 - Brasil. Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma. Recurso Especial(REsp) nº 1.247.168/RS, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES,  julgado em 17/05/2011, Diário Judicial Eletrônico - DJe de 30/05/2011
"PROCESSUAL. EXECUÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. VENCIMENTO ANTECIPADO. IMPROPRIEDADE.
I. O vencimento antecipado do contrato não antecipa o termo inicial da prescrição da ação de execução em favor dos inadimplentes, que deram causa à rescisão.
II. Agravo improvido."
Nota 2 - _________________________4ª Turma. Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, Agravo Regimental(AgRg) no Recurso Especial(REsp) nº 802688/RS 2005/0203397-9 - Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, julgado em  28/11/2006, publicado no Diário Judicial - DJ  de  26.02.2007 p. 604.

E esse entendimento das Turmas desse E. Tribunal continua, pois em julgado recente da sua 3ª Turma consta:
"1. A jurisprudência desta Corte de Justiça tem reiterado o entendimento de que o vencimento antecipado do contrato de financiamento imobiliário por inadimplemento do devedor não altera o termo inicial da prescrição, o qual deve ser contado do término da avença nos termos em que estipulado.
2. Agravo interno a que se nega provimento".
Nota 3 - ______________________3ª Turma. Agint nos EDcl no REsp nº 1.635.172/PR, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, julgado em 04.05.2017, Diário da Justiça Eletrônico - DJe de 18.05.2017.
Na "Planilha de Evolução do Financiamento" acostado (ID. 4058300.2102656), consta que o contrato em questão estaria atrasado desde 28.02.1994.

A data de vencimento da última parcela (240) estava prevista para o dia 29.10.2011, de tal sorte que o prazo de prescrição da dívida encerrar-se-ia em 29.10.2016 (inciso I do § 5º do art. 206 do Código Civil).

Com a propositura desta ação, em 18.05.2016, a Devedora das prestações do referido contrato, a ora Autora, findou por reconhecer a dívida, causando, assim, a interrupção da fluência do prazo de prescrição, conforme inciso VI do art. 202 do Código Civil.
Caso a ora Autora tivesse esperado por mais 5(cinco) meses e alguns dias, teria, de fato,  ocorrido a prescrição.

Conclui-se, então, que não ocorreu a alegada prescrição.
A simplicidade do caso autoriza fixar a verba honorária, à luz do § 2º do art. 85 do vigente Código de Processo Civil, qual seja, no mínimo legal de 10%(dez por cento) do valor da causa, atualizado(correção monetária e juros de mora) a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal - CJF.


3. Dispositivo


Posto isso, julgo improcedentes os pedidos desta ação e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil.

Condeno a Parte Autora nas custas e em verba honorária e arbitro esta no mínimo legal, qual seja, 10%(dez por cento) do valor da causa, atualizado na forma acima indicada;  todavia, como a Autora está em gozo do benefício da denominada Justiça Gratuita,  à luz do § 3º do art. 98 do mencionado diploma processual, submeto a respectiva cobrança à condição suspensiva pelo período ali fixado.
Sentença não sujeita ao reexame necessário art. 496, inciso I, do Código de Processo Civil.


Recife,  31 de agosto de 2017. 



Francisco Alves dos Santos Junior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

mef

quarta-feira, 16 de agosto de 2017

EXECUÇÃO DE VERBA HONORÁRIA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA, FIXADA EM TITULO JUDICIAL. JUROS DE MORA. A PARTIR DA CITAÇÃO(CPC/73) OU DA INTIMAÇÃO(CPC/2015).

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O Devedor de verba honorária, incidente sobre o valor corrigido da causa, fixada em título judicial, só é constituído em mora depois que for intimado da execução, para pagamento. Se esse tipo de Devedor for a Fazenda Pública, o CPC de 1973 estabelecia que ela deveria ser citada, para os fins do seu art. 730. O NCPC, de 2015, não mais exige a citação, mas a mera intimação. Nas duas situações, os juros de mora só passam a incidir depois da citação ou da intimação, conforme seja. 

Na decisão que segue, pesquisada e minutada pela Assessora MARIA PATRICIA PESSOA DE LUNA, esse assunto é debatido de forma minudente. 

Boa leitura e deixe a sua opinião na coluna de "comentários". !


PROCESSO Nº: 0808257-09.2015.4.05.8300 - EMBARGOS À EXECUÇÃO
EMBARGANTE: MUNICÍPIO DE OLINDA.
ADVOGADO: César André Pereira Da Silva
EMBARGADO: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)


Sentença tipo A, registrada eletronicamente.



EMENTA:- EMBARGOS À EXECUÇÃO. EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. EXCESSO DE EXECUÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL.
-O termo inicial dos juros moratórios na execução de honorários advocatícios contra a Fazenda Pública, fixados com base no valor da causa,  é a data sua citação (CPC/1973) ou sua intimação (CPC/2015).
-Precedentes do STJ.
-Procedência.

Vistos, etc. 

1. Relatório


O MUNICÍPIO DE OLINDA/PE opôs, em 10/12/2015, esta Ação de Embargos à Execução de título judicial, que se processa nos autos da Execução de Cumprimento de Sentença contra a Fazenda Pública, processo nº 0017377-51.2011.4.05.8300, proposta pelo Município de Olinda/PE em face de Novas Indústrias Olinda e União, todos devidamente qualificados nos autos principais. Alega a Embargante haver excesso de execução, porque não seriam devidos os pleiteados R$ 2.642,37, mas apenas R$ 1.683,03, pelo que o excesso de execução montaria em R$ 959,34. Arguiu que o alegado excesso teria origem nos seguintes equívocos: a União teria requerido a execução do julgado atribuindo em seus cálculos, a título de juros de mora, o percentual de 57%, majorando, por conseguinte, a base de cálculo no montante de R$ 38.373,23; seria forçoso concluir pela impossibilidade de incidência de juros de mora a partir do ajuizamento da ação, como pretenderia a União; restou decidido por este Juízo que incidirão "juros de mora legais, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, contados estes da data da citação para execução desta sentença (art. 730 do código de processo civil)"; considerando que o Município de Olinda foi citado para execução do julgado em 06 /11/2015, incabível incidência de juros de mora a partir do ajuizamento da ação, que teria ocorrido em 22/09/2005. Requereu, ao final, a distribuição por dependência dos presentes embargos à execução aos autos do processo nº 0017377-51.2011.4.05.8300; a procedência dos presentes embargos à execução (CPC, art. 743, I) a fim de minorar o quantum pleiteado pela União, nos termos do Demonstrativo de Cálculos; e a condenação da Exequente/Embargado ao pagamento dos honorários advocatícios devidos na execução. Atribuiu valor à causa.

Decisão proferida em 22/02/2016  (Identificador nº 4058300.1704461), pela qual esta ação de embargos à execução foi recebida nos dois efeitos legais com referência à verba controversa e em relação à verba incontroversa foi recebida apenas no efeito devolutivo e foi possibilitado que a parte exequente requisitasse nos autos principais o respectivo pagamento.

A UNIÃO, ora Embargada, apresentou impugnação (Identificador nº 4058300.1783525), Preliminarmente, alegou que os presentes embargos não poderiam ser conhecidos em razão da ausência da juntada de quaisquer documentos comprobatórios das alegações do Município Embargante. Transcreveu ementas de decisões judiciais. Pugnou, a final, pelo não conhecimento dos presentes embargos, com espeque no art. 267, IV, c/c o parágrafo único do art. 284, todos do CPC.

Despacho determinando a remessa dos autos à Contadoria (Identificador nº 4058300.2222235) para esclarecer qual dos cálculos estaria correto.

A Contadoria devolveu os autos, informando que a divergência entre as contas estaria apenas na aplicação dos juros de mora (Identificador nº 4058300.2592623).

Intimados sobre os esclarecimentos apresentados pela Contadoria, a UNIÃO atravessou petição (Identificador nº 4058300.2848365), reiterando os termos da impugnação anteriormente apresentada, e o Município Embargante silenciou.

Decisão proferida em 03/08/2017 (Identificador nº 4058300.3644245), na qual foi determinada a juntada nestes autos, via digitalização, de cópia da sentença e de todos os eventuais acórdãos que se encontram nos autos principais(físicos), para possibilitar o pronto julgamento desta ação de defesa.

Em cumprimento à decisão supra, foram juntados nestes autos eletrônicos cópia de peças extraídas dos autos principais (Processo nº 0017377-51.2011.4.05.8300), conforme certificado nestes autos (Identificador nº 4058300.3731910).

Vieram os autos conclusos.

É o Relatório, no essencial.

Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação

2.1 Preliminar de indeferimento da inicial

A União levanta a preliminar de não conhecimento destes Embargos à Execução, em razão da ausência de colação de quaisquer documentos comprobatórios das alegações do Município Embargante.

Em primeiro lugar, registro que tais documentos se encontram juntados nos autos físicos do processo principal (proc. no 0017377-51.2011.4.05.8300), aos quais estes Embargos à Execução foram distribuídos por dependência, estando referidos autos na Secretaria desta 2ª Vara, aguardando o desfecho destes Embargos.

Outrossim, verifico que estes Embargos foram remetidos à Contadoria juntamente com os autos principais, havendo aquele órgão contábil ofertado parecer, com base nos elementos constantes dos dois processos (Identificador nº 4058300.2592623).

Observo ainda que tal questão foi apreciada na decisão proferida em 03/08/2017 (Identificador nº 4058300.3644245), sendo devidamente sanada com a juntada nestes autos dos referidos documentos faltantes, conforme certificado em 07/08/2017 (Identificador nº 4058300.3731910).

 Portanto, não merece acolhida tal preliminar.

2.2 Do excesso de execução

A UNIÃO pediu, à fl. 218 dos autos principais (processo nº 0017377-51.2011.4.05.8300), a quantia de R$ 2.642,37 (valores atualizados até setembro de 2015), correspondente ao pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais.

O Município Embargante, na petição inicial, alegou que teria havido excesso de execução, por ter a União/Exequente, atribuído em seus cálculos, a título de juros de mora, o percentual de 57%, majorando, dessa forma, a base de cálculo no montante de R$ 38.373,23.

A Contadoria Judicial informou em seu parecer que a divergência entre as contas estaria apenas na aplicação dos juros de mora (Identificador nº 4058300.2592623).

Quanto a esta questão, vê-se que na sentença proferida às fls. 176-178v dos autos principais (Identificador nº 4058300.3731911), condenou-se o Município de Olinda/PE em verba honorária, arbitrada em 20% do valor da causa, atualizado a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, pelos índices de correção monetária do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal e acrescidos de juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados estes da data da citação para execução da Sentença, conforme trecho extraído da parte dispositiva da referida decisão, in verbis:

"d) Determino que, no momento processual próprio, restitua-se ao Município de Olinda-PE, ora Autor, via alvará, a quantia que depositou, conforme anunciado na petição inicial, após dedução da verba honorária abaixo fixada.
Finalmente, condeno o Município de Olinda-PE, ora Autor, em verba honorária que, considerando a complexidade do caso e o esforço e dedicação dos Patronos dos Requeridos José Joaquim Dias Fernandes e UNIÃO, arbitro em 20%(vinte por cento)do valor da causa, atualizado a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, pelos índices de correção monetária do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal e acrescidos de juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados estes da data da citação para execução desta Sentença(art. 730 do código de processo civil), mas incidentes sobre o valor já monetariamente corrigido, verba essa a ser rateada em partes iguais entre os Patronos do Requerido José Joaquim Dias Fernandes e UNIÃO, cabendo a sua cobrança mediante dedução do valor que o Município ora Réu depositou, de forma que lhe será restituído, via alvará, apenas o saldo que houver após essa dedução e, caso essa dedução não se concretize, por qualquer motivo, fica dispensada a expedição de ofício requisitórios ao Tribunal, pois a requisição será feita ao próprio Município, que depositará o valor em conta judicial vinculada a este processo, na agência 1029 da Caixa Econômica Federal-CEF, segundo § 2º do art. 3º da Resolução nº 168, de 05.12.2011,do Conselho da Justiça Federal."

A sentença acima mencionada foi parcialmente alterada pelo E. TRF da 5ª Região, apenas quanto à minoração dos honorários advocatícios ao valor de 5% do valor da causa, cujo acórdão restou assim ementado (Identificador nº 4058300.3731911):

"Processual Civil. Ação de desapropriação de imóvel da União, pelo Município de Olinda. processo por extinto, sem resolução do mérito (art. 267, I e VI do CPC).  Honorários advocatícios fixados no patamar de 20% sobre o valor da causa. Valor exorbitante. Minoração dos honorários advocatícios, fixando-os na ordem de 5% (cinco por cento) do valor da causa. Art. 20, parágrafo 4º, do CPC. Art. 27, parágrafo 1º, do Decreto-Lei nº 3.365, alterado pela MP nº 2.183-56/2001.  Apelação parcialmente provida.
(PROCESSO: 00173775120114058300, AC579815/PE, DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE MENDONÇA CANUTO (CONVOCADO), Quarta Turma, JULGAMENTO: 26/05/2015, PUBLICAÇÃO: DJE 11/06/2015 - Página 128)"

Portanto, de acordo com o que foi relatado, a discussão suscitada nestes embargos diz respeito exclusivamente à correta aplicação dos juros de mora, à luz do título exequendo. Em outras palavras, a controvérsia diz respeito ao termo inicial da incidência dos juros de mora sobre honorários advocatícios.

Pois bem.

Conforme reiterados julgados do Col. Superior Tribunal de Justiça, o termo inicial dos juros moratórios em honorários advocatícios fixados com base no valor da causa é a data da citação do executado no processo de execução, e não a data da sentença ou a data do ajuizamento da ação:

"PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL.
1. "O termo inicial dos juros moratórios relativos aos honorários de advogado impostos sobre o valor da causa é a data da citação do executado no processo de execução", Rel. Ministro  CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO no REsp 720290/PR, , DJ 08/05/2006). Precedentes: (REsp 296.409/SP, Rel. Ministro  LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe 21/09/2009; REsp 1060155/MS, Rel. Ministro  MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA,  DJe 23/09/2008; AgRg no REsp 987726/MT, Rel.
Ministro  HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, DJ 14/12/2007) 2. In casu, maior razão assiste ao recorrente, justamente por ser a Fazenda Pública a executada, que deve observância ao regime constitucional dos precatórios, nos termos do art. 100 da Constituição Federal.
3. Os embargos de declaração são cabíveis quando houver no acórdão ou sentença, omissão, contradição ou obscuridade, nos termos do art.
535, I e II, do CPC, ou para sanar erro material.
4. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos. Deveras, consoante assente, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.
5. Recurso especial provido.
(REsp 1132350/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/11/2009, DJe 17/12/2009)"



"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DISCUSSÃO SOBRE O TERMO INICIAL DE INCIDÊNCIA DOS JUROS MORATÓRIOS NA EXECUÇÃO DE SENTENÇA PROPOSTA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA PARA A COBRANÇA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
PRETENSÃO RECURSAL EM DESCONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ.
1. A controvérsia consiste em saber quando são devidos juros moratórios na execução contra a Fazenda Pública para a cobrança de honorários advocatícios, fixados estes, na sentença exequenda, em determinado percentual sobre o valor dado à causa.
2. Afasta-se a alegada ofensa aos arts. 458, 515 e 535 do CPC, pois, ao julgar os embargos declaratórios, o Tribunal de origem não se devia pronunciar sobre os arts. 20, §§ 3º e 4º, 125, I, e 293 do CPC, e 280, 389, 395 e 407 do Código Civil. Isto porque tais dispositivos legais não são relevantes para a resolução da controvérsia dos autos, considerado o entendimento a seguir.
3. Esta Corte firmou sua jurisprudência no sentido de que, quando for executada a Fazenda Pública, só incidem juros moratórios se a verba honorária não for paga no prazo estipulado paga o pagamento do precatório ou da requisição de pequeno valor, conforme o caso. Nesse sentido: REsp 1.096.345/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 16.4.2009; REsp 1.132.350/RS, 1ª Turma, Rel. Min.
Luiz Fux, DJe de 17.12.2009; AgRg no REsp 960.026/SC, 1ª Turma, Rel.
Min. Benedito Gonçalves, DJe de 2.6.2010.
4. Mesmo que não se tratasse de execução contra a Fazenda Pública, ainda assim o recurso especial não mereceria acolhida. Ao contrário do que pretende fazer crer o recorrente, consta da sentença e do acórdão recorrido que, no título judicial exequendo, os honorários advocatícios foram fixados em 10% sobre o valor da causa, e não sobre o valor da condenação. Consideradas estas circunstâncias, o segundo precedente supracitado bem espelha o entendimento desta Corte, no sentido de que os juros moratórios não são devidos conforme calculados pelo recorrente, isto é, contados a partir do trânsito em julgado da sentença que fixou os honorários executados.
5. Recurso especial não provido.
(REsp 1141369/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/09/2010, DJe 15/10/2010)".(G.N.)

Depreende-se da leitura dos precedentes acima transcritos que, no regime do CPC de 1973,  inexistia mora, quanto ao título judicial executivo, anteriormente à citação da Fazenda Pública para os fins do seu art 730.
Como se sabe, o NCPC, de 2015, não exige mais citação da Fazenda Pública na execução de título judicial, mas sim mera intimação(art. 535).
Todavia, mesmo diante desse novo diploma processual, tem-se que a Fazenda Pública devedora de crédito decorrente de título judicial executivo só será constituída em mora após a intimação para pagar.
No caso, está em execução verba honorária, fixada em título judicial, da qual é titular Represente Judicial da UNIÃO e o devedor é o Município de Olinda - PE.
Assim, tenho que o Município Embargante tem razão, sendo indevida a incidência de juros moratórios desde a data da citação inicial, como pretendida pela UNIÃO na petição que deu início à execução do julgado (Identificador nº 4058300.3731913), porque tais juros só podem incidir a partir da data em que o Município executado foi citado da execução, à luz do art. 730 do CPC de 1973, ou então a partir da data da intimação da execução, se esta foi efetuada após a vigência do CPC de 2015 .

Diante de tal contexto, é de se concluir pela procedência do pedido destes Embargos, porque o valor que merece homologação corresponde ao indicado pela Embargante.

3. Dispositivo

Posto isso:

a) Rejeito a preliminar de indeferimento da inicial,  levantada pela UNIÃO.

b) Julgo procedentes os pedidos desta ação de Embargos à Execução, infirmo a memória de cálculo que a ora Embargada apresentou nos autos principais com a petição de início da execução, atualizada até setembro de 2015 (Identificador nº 4058300.3731913), e homologo a memória de cálculo que o Município de Olinda/PE, ora Embargante, apresentou na petição inicial desta ação de embargos à execução do julgado (Identificador nº 4058300.1551331),  para todos os fins de direito e dou este processo por extinto, com resolução do mérito (art. 487, I, CPC).

c) Condeno a UNIÃO, ora Embargada, em verba honorária, que, à luz do § 2º e dos incisos I e III do § 3º, ambos do art. 85 do Código de Processo Civil, arbitro no mínimo legal de 10%(dez por cento) sobre o alegado excesso de execução, correspondente ao valor da diferença entre o que a Exequente/UNIÃO pleiteou nos autos principais (R$ 2.642,37) e o valor ora homologado, apresentado pela Embargante (R$ 1.683,03), ambos atualizados até setembro de 2015, ou seja, 10% sobre R$ 959,34, que corresponde a R$ 95,94 (noventa e cinco reais e noventa e quatro centavos), que será atualizado a partir de outubro de 2015 até a data da requisição do pagamento, com correção monetária e juros de mora, na forma fixada no art. 1º-F da Lei nº 9.494, de 1997, com redação dada pela Lei nº 11.960, de 2009, observando-se em tudo o mais as recomendações do Manual de Orientações de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, bem como as regras da Resolução nº 168, de 5 de dezembro de 2011, do Conselho da Justiça Federal quanto à requisição.

Sem custas, ex lege.

Transitada em julgado, traslade-se cópia desta sentença para os autos principais (processo físico nº 0017377-51.2011.4.05.8300), onde a execução deverá ser retomada.

Registre-se. Intimem-se.

Recife, 16 de agosto de 2017.

Francisco Alves dos Santos Junior                            

Juiz Federal da 2ª Vara (PE)


(PL)

terça-feira, 15 de agosto de 2017

MAIS UM PESADELO NO SUS.




Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Segue decisão enfrentando mais um dos inúmeros pesadelos diários dos hospitais públicos brasileiros, decorrentes da má-gestão do SUS e das Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde. O medicamento está arrolado entre aqueles que devem ser fornecidos pelo SUS, mas no momento em que a Médica o solicita, para aplicação no Paciente, está em falta no dispensário hospitalar, porque a Secretaria Estadual da Saúde não repôs o estoque de acordo com a demanda. Nesse caso, o Judiciário é obrigado a conceder a tutela provisória de urgência de antecipação, liminarmente. 
Boa leitura.
PROCESSO Nº 0811977-13.2017.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: S F C
Adv.: Defensoria Pública da União - DPU
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO, Estado de Pernambuco e Hospital do Câncer
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

D E C I S Ã O
  1.  Breve Relatório

            SEVERINO FRANCISCO CORREIA, assistido pela Defensoria Pública da União, ajuizou  esta Ação Ordinária com pedido de tutela de urgência em face da União, do Estado de Pernambuco e do HOSPITAL DO CÂNCER DE PERNAMBUCO. Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita. Aduziu, em síntese, que: o autor, com 66 anos de idade, teria sido diagnosticado com Mieloma Múltiplo sintomático (CID 10: C90.0) em estágio avançado, conforme laudos e demais documentos anexos, sendo tratado no Hospital do Câncer de Pernambuco, que seria uma Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia - UNACON; teria sido submetido a diversos tratamentos, quais sejam: Protocolo quimioterápico CTD - Ciclofosfamida, Talidomida e dexametasona; em relatório médico, haveria menção de evolução após 4 ciclos da quimioterapia com piora importante e progressão da doença, além de tromboses extensas impossibilitando o uso da talidomida; atualmente, o autor estaria internado  no Hospital do Câncer na UTI desde o dia 29/06/2017 e, conforme descrição médica, apresentaria franca progressão da doença e insuficiência respiratória; a sua médica assistente, Dra. Danielle Padilha, CRM 13336, teria indicado  a utilização da medicação BORTEZOMIBE, na dose de 3,5 mg, equivalente a 4 frascos ampolas ao mês, por 8 ciclos, totalizando 32 frascos ampolas, como sendo a melhor opção para o caso do assistido; teria procurado o, Sistema Único de Saúde, para o recebimento do medicamento, mas seu fornecimento fora negado pela Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco, conforme documentos anexados (demanda com a secretaria de saúde); tal documento demosntraria a insuficiência da medicação para atender o assistido, vez que afirmam que "estamos aguardando uma nova pequena remessa desse medicamento"; desse modo, o medicamento BORTEZOMIBE estaria em falta no Hospital do Câncer há mais de 5 meses e o autor, portanto, estaria sem o tratamento adequado; segundo parecer do Setor Médico da DPU, da lavra de Dra. Raíssa Inojosa Correia - CRM-PE 14809, ''o caso do autor trata-se de situação excepcional a ensejar tratamento diferenciado, uma vez que o assistido apresentou falha de resposta a esquema terapêutico comum fornecido pelo SUS (Ciclofosfamida, Talidomida e dexametasona), evoluindo com piora importante e progressão da doença, bem como se encontra em situação de impossibilidade de utilizar outro tratamento fornecido pelo SUS, tais como alta dose de quimioterapia e transplante de medula óssea.''; o autor não possuiria condições financeiras de arcar com as despesas dessa medicação de alto custo, por ser uma pessoa de baixa renda;  conforme tabela da ANVISA, para as aquisições públicas de medicamentos (Fonte: http://portal.anvisa.gov.br) a medicação BORTEZOMIBE na apresentação de 3,5 MG PÓ LIOF INJ CT FA VD, compreenderia o valor de preço de fábrica máximo variável de acordo com o laboratório entre R$ 2.687,83 a R$ 4.135,02; considerando que o tratamento completo de 8 ciclos totaliza 32 frascos ampolas, o custo total do tratamento teria sido estimado em R$ 86.010,56 (oitenta e seis mil e dez reais e cinquenta e seis centavos). Teceu outros comentários, notadamente acerca do direito à saúde previsto na Constituição.Pugnou, ao final, pela concessão de antecipação da tutela provisória de urgência, inaudita altera parte, para determinar aos réus que forneçam ao demandante, em até 48 horas, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00, o medicamento BORTEZOMIBE, conforme prescrição médica. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.

É o relatório, no essencial.

Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação 


2.1 Benefício da Justiça Gratuita


Merece ser concedido à parte Autora o benefício da justiça gratuita, porque presentes os requisitos legais, mas com as ressalvas da legislação criminal pertinente, no sentido de que se, mais tarde, ficar comprovado que o Autor declarou falsamente ser pobre, ficará obrigado ao pagamento das custas e responderá criminalmente (art. 5º, LXXXIV da Constituição da República e art. 98 do CPC).

Outrossim, o benefício ora concedido  abrange as prerrogativas previstas no § 5º, art. 5º da Lei nº 1.060/50, porque a parte Autora é assistida por Defensor Público.


2.2. Do pedido de antecipação da tutela


2.2.1 - A característica fundamental do provimento satisfativo consiste na entrega antecipada dos efeitos da sentença de procedência a um dos integrantes da relação jurídica processual. O art. 300 do vigente Código de Processo Civil, com a redação trazida pela Lei no 13.105/2015, retrata o modelo básico da tutela de urgência.

À luz do dispositivo legal em comento, in verbis:

Art. 300.  A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
§ 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
§ 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.
§ 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.



O adiantamento promovido pela medida emergencial repousa, assim, sobre eficácias inerentes ao pedido articulado na petição inicial, ou melhor, imanentes à sentença que provavelmente o julgará procedente, no todo ou em parte.


2.2.2. Dos Programas Específicos para o tratamento do câncer


O Sistema Único de Saúde já prevê um programa específico para o tratamento do câncer, concretizado através dos Centros de Alta Complexidade em Oncologia (CACONs) e das Unidades de Assistência de Alta Complexidade (UNACONs), que se realiza por meio de cadastramento prévio e, portanto, verificação do caso clínico, encaminhamento e acompanhamento conforme evolução da doença.

Deste modo, para a obtenção de tratamento específico, indispensável a sua sujeição à política pública existente para o tratamento de câncer, estabelecida pelo Instituto Nacional de Câncer (INCA) e executada por intermédio dos CACONs, não sendo possível o fornecimento direto de medicamento para tratamento privado.

Somente com a prescrição do tratamento junto aos centros de alta complexidade vinculados ao INCA poderá o paciente postular o medicamento excepcional, não padronizado pelo SUS, e desde que reste comprovado que o tratamento público usualmente fornecido tenha se mostrado ineficaz no combate ao avanço da doença.

Assim, primeiramente, deve o paciente com câncer ser matriculado em estabelecimento de saúde habilitado na área de Oncologia pelo SUS, para receber assistência integral e integrada.

No presente caso, o Autor encontra-se devidamente acompanhado no serviço de oncologia clínica do Hospital de Câncer de Pernambuco (UNACON), restando atendido tal requisito (Id. 4058300.3755110).

Sendo assim, passo a apreciar o pedido da tutela provisória de urgência indicada.


2.2.3. Do pedido de tutela de urgência


O atual sistema constitucional e legal obriga, de forma solidária, todas as Unidades da Federação a prestar serviços e a fornecer remédios e outros materiais na área de saúde a todos que compõem a população brasileira, tendo como única restrição, para fins até mesmo de organização orçamentária, que o SUS relacione os procedimentos, materiais e remédios, que podem ser fornecidos na sua área.

O objetivo desta ação é forçar o Poder Público a fornecer o medicamento BORTEZOMIBE, conforme informação constante na petição inicial, nos seguintes termos:


Em relatório médico, há menção de evolução após 4 ciclos da quimioterapia com piora importante e progressão da doença, além de tromboses extensas impossibilitando o uso da talidomida.
Atualmente, o autor encontra-se internado no Hospital do Câncer na UTI desde o dia 29/06/2017 e, conforme descrição médica, apresenta franca progressão da doença e insuficiência respiratória.
Dessa feita, a sua médica assistente, Dra. Danielle Padilha, CRM 13336, indicou a utilização da medicação BORTEZOMIBE, na dose de 3,5 mg, equivalente a 4 frascos ampolas ao mês, por 8 ciclos, totalizando 32 frascos ampolas, como sendo a melhor opção para o caso do assistido.
Assim, procurou o SUS, Sistema Único de Saúde, para o recebimento do medicamento, mas seu fornecimento foi negado pela Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco, conforme documentos anexados (demanda com a secretaria de saúde), os quais demonstram a insuficiência da medicação para atender o assistido, vez que afirmam que "estamos aguardando uma nova pequena remessa desse medicamento".



Sendo assim, da leitura da Inicial, há de se inferir que  o medicamento solicitado possui repasse pelo SUS, mas está em falta, conforme informação constante no documento intitulado " Demanda com a Secretaria de Saúde" (Id. 4058300.3755098), verbis:

Recebemos a manifestação por meio de 0800 no qual a cidadã relata que seu pai, o Sr. Severino Francisco Correia é paciente do Hospital do Câncer, onde faz tratamento oncológico. Descreve que a medicação Velcade, necessária para que ele faça tratamento de quimioterapia esta em falta porque a Secretaria Estadual de Saúde não enviou e não informam previsão para chegada.
Após análise atentamente efetuada, confirmamos que esteve efetivamente em falta o medicamento constante na presente demanda da ouvidoria de saúde, mas informamos que foi registrada uma pequena entrada deste fármaco no estoque do armazém central ALCLOG, estando, no momento a serem efetuados os procedimentos e protocolos obrigatórios para poder ser liberado mais rapidamente possível, às Farmácias de Pernambuco, pelos motivos acima mencionados. O usuário deverá comparecer na farmácia de Pernambuco da área de sua residência, para receber ou para ter conhecimento da data e da ordem de distribuição pela fila de espera, a fim de resolver a situação de pendência com a celeridade necessária.



Ora, se o medicamento foi arrolado pelo Órgão próprio do SUS, teria que estar disponível no dispensário dos Hospitais Públicos e nos estoques das Farmácias Públicas. 
Se não está, por algum problema de má-gestão, cabe ao Judiciário conceder prazo para a sua obtenção e pronto repasse para o tratamento do Paciente, observadas as regras legais e processuais acima indicadas. 
É o caso destes autos.

3. Conclusão



Posto isso:


a) defiro os benefícios da assistência judiciária gratuita, com as ressalvas constantes no item 2.1 supra.


b) defiro, também, a tutela provisória de urgência antecipatória e concedo ao Estado de Pernambuco o prazo máximo de 7(sete)dias corridos para fornecer o medicamento acima indicado para tratamento do Autor, no Hospital onde se encontra ou onde se encontrar no momento da entrega, sob pena de pagamento de multa diária, a favor do Autor, no valor de R$ 5.000,00(cinco mil reais), sem prejuízo da responsabilização administrativa, civil e criminal do Servidor e/ou Dirigente que der azo ao seu pagamento, ficando a UNIÃO obrigada a ressarcir o Estado de Pernambuco, oportunamente, caso a despesa com a aquisição do referido medicamento ultrapasse o valor que a UNIÃO é obrigada a repassar, pelo SUS, para mencionado Estado;


c) Citem-se as partes Rés, na forma e para os fins legais e intime o Estado de Pernambuco, por meio do seu Órgão próprio de representação judicial para dar efetivo cumprimento à decisão supra, com a urgência que o caso requer.


d) Observe a Secretaria as prerrogativas inerentes à Defensoria Pública da União.


Intime-se.



Recife, 15 de agosto de 2017. 


Francisco Alves dos Santos Júnior


Juiz Federal, 2ª Vara/PE