sexta-feira, 6 de março de 2015

TERRENO DE MARINHA SOB REGIME DE AFORAMENTO E DE OCUPAÇÃO. ALIENAÇÃO DO DOMÍNIO ÚTIL E DO DIREITO DE OCUPAÇÃO. RESPONSABILIDADE PELA ALTERAÇÃO NO CADASTRO PERANTE O SERVIÇO DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO - SPU.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.



Segue uma sentença que discute o problema da responsabilidade do Adquirente pelo registro da alteração no cadastro do Serviço de Patrimônio da União, no caso de aquisição de imóvel, construído sobre terreno de marinha, de propriedade da UNIÃO,  com parte sob regime de aforamento e parte sob regime de ocupação. Debate-se também a responsabilidade pelo pagamento do valor do foro anual e da taxa de ocupação, bem como do laudêmio. E ainda dois problemas processuais: 1) como deve proceder o magistrado de primeiro grau, na elaboração da sentença, quando o Tribunal esgotou parte dos pedidos, em acórdão lançado nos autos de um agravo de instrumento, via antecipação da tutela?  Veja a orientação dada pelo juiz no presente caso. 2) Também houve caso de litigância de má-fé de um dos Litisconsortes Passivos Necessários. 
 
OBS.: Pesquisa de legislação e de jurisprudência feita pela Assessora Fabíola Cavalcanti de Santana Siqueira.
 
 
 
Processo nº 0014646-19.2010.4.05.8300

Autor: I A de M Jr

Réus: União Federal e outros

 

Sentença

 

Registro nº ...........................................

Certifico que registrei esta Sentença às fls..........

Recife, ...../...../2014.

 

 

EMENTA:- ALIENAÇÃO DE DOMÍNIO ÚTIL E/OU DO DIREITO DE OCUPAÇÃO DE IMÓVEL POR PARTE DE FOREIRO E/OU OCUPANTE. IMÓVEL DO DOMÍNIO DA UNIÃO SOB AFORAMENTO E/OU SOB OCUPAÇÃO. RESPONSABILIDADE PELA ALTERAÇÃO CADASTRAL PERANTE A SPU. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DO LAUDÊMIO E DO FORO ANUAL E/OU DA TAXA DE OCUPAÇÃO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.

 

Cabe ao Foreiro/Ocupante o pagamento do laudêmio nas alienações do domínio útil de terreno da União, sob aforamento ou sob o regime de ocupação.

Cabe ao Adquirente a regularização cadastral perante o Serviço de Patrimônio da União.

Antecipação da tutela pela 2ª Turma do E. TRF/5ªR:  Esgotamento parcial dos pleitos. Cumprimento.

Litigância de má-fé de um dos Adquirentes do imóvel, ora Litisconsortes Passivos Necessários.

Procedência parcial.

 
Vistos, etc.
 

I A DE M JR propôs Ação Ordinária em face da União (AGU/PRU), objetivando a título de antecipação dos efeitos da tutela, a alteração dos registros cadastrais da Secretaria do Patrimônio da União - SPU, para que passem a constar os nomes dos Srs. MARIO CAVALCANTI DE GOUVEIA JÚNIOR (CPF nº 010.376.414-34), DANIELA CAVALCANTI DE GOUVEIA E GOUVEIA (CPF nº 594.641.354-68) e MARIO CAVALCANTI DE GOUVEIA NETO (CPF nº 832.467.204-44), na condição de atuais e efetivos ocupantes do terreno de marinha tombado sob o nº RIP Nº 2531.0103801-51, e, consequentemente, para que seja impedida a cobrança de referida taxa do ora Autor, que, segundo alega, não seria proprietário do imóvel desde  30.04.2001. Requereu, no mérito, a confirmação da tutela, declarando-se, outrossim, a ilegitimidade do Autor para figurar no polo passivo de qualquer cobrança de taxa de ocupação relativamente ao imóvel tombado sob o nº RIP Nº 2531.0103801-51, com a alteração definitiva dos registros cadastrais da Secretaria do Patrimônio da União - SPU, para que passem a constar os nomes dos mencionados ocupantes.

 

Proferida decisão interlocutória indeferindo o pedido de antecipação dos efeitos da tutela,  a parte autora interpôs recurso de agravo de instrumento em face da aludida decisão, tendo o E. TRF-5ª Região dado provimento ao recurso do Autor.

 

A União apresentou Contestação e Impugnação ao Valor da Causa – IVC.

 

J juntada aos autos cópia da decisão proferida na IVC, que foi julgada improcedente.

 

Determinado(fls. 129/129v)que o Autor promovesse a citação dos proprietários/ocupantes do imóvel, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito, na forma do Parágrafo Único do art. 47 do CPC.

 

Cumprida a diligência (fl. 131 e fl. 135), os réus foram citados (fls. 136/143).

 

MÁRIO CAVALCANTI DE GOUVEIA JÚNIOR, na qualidade de Requerido, veio aos autos (fls. 144/145) alegando, em síntese, que: a) de fato, conforme se verificava na escritura pública adquiriu em 30.04.2001, o imóvel localizado na Av. boa Viagem, nº 5450, aptº 2901, Edf. Príncipe de Marsala, Boa Viagem/PE; b) já teria tomado providências, na forma que dispõe o art. 33, § 4º, da Lei nº 9.636/98, para a transferência para seu nome, da posse do terreno de marinha junto ao órgão da Secretaria de Patrimônio da União - SPU; c) neste contexto, requeria a extinção do feito sem apreciação do mérito. (Ausentes os documentos).

 

Intimado o Autor para se manifestar da petição do demandando, este solicitou que houvesse a comprovação do suposto pedido de alteração cadastral do imóvel perante o SPU, bem como que fosse oficiado o órgão para informar se houve o referido pedido de alteração cadastral fazendo constar os nomes dos atuais ocupantes do imóvel e, caso não houvesse sido feito, que se procedesse com a correção do cadastro consonante decisão do E. TRF 5ª Região, nos autos do AGTR nº 112.828-PE, vinculado a esta ação transitado em julgado em 01.04.2012.

 

É o relatório. Decido.

 

2 - Fundamentação

2.1 - Natureza jurídica da taxa de ocupação e fato gerador

Consta do documento de fl. 17, que o terreno sobre o qual se construiu o imóvel em questão é de marinha, encontrando-se parte sob regime de aforamento e parte sob regime de ocupação.

A inscrição do aforamento e/ou da ocupação é ato administrativo precário e implica efetivo aproveitamento do terreno pelo Foreiro/Ocupante (Lei n. 9.636/1998, artigo 7º). O foro anual e a taxa de ocupação não têm natureza tributária (Lei n. 4.320/1964, artigo 39, § 2º). Tratam-se de receita patrimonial em virtude da utilização, por Terceiro Possuidor,  de um bem imóvel  de propriedade da União.

No regime de aforamento, o Foreiro adquire o domínio útil do imóvel. No regime de ocupação, adquire apenas o direito de ocupar. Mas em ambos o Foreiro ou o Ocupante goza da posse direta.

O efetivo aproveitamento (posse) do terreno de Marinha é que enseja a obrigação de pagar o foro anual e/ou a taxa de ocupação. Esse entendimento serve tanto para o período anterior, quanto ao posterior à Lei n. 9.636/1998, uma vez que esta acrescentou o § 4º ao artigo 3º do Decreto-Lei n. 2.398/1987, dispondo que cabe ao Adquirente requerer ao Serviço de Patrimônio da União (SPU) a alteração dos registros cadastrais.

O Decreto-lei n. 9.760/1946 estabeleceu que mesmo os ocupantes sem título são obrigados ao pagamento anual da taxa de ocupação (artigo 127). Para a cobrança, há necessidade de inscrição administrativa dos ocupantes, mediante processo administrativo específico (Lei n. 9.636/1998, artigo 7º, § 3º), o qual pode ser feito  ex officio ou a pedido do ocupante (Decreto-lei n. 9.760/1946, artigo 128). Os ocupantes devem ser notificados do cadastramento e a cobrança retroage ao início da ocupação (redação original e atual do artigo 128 do Decreto-Lei n. 9.760/1946).

2.2 Da Obrigação quanto ao Registro da Alienação do Imóvel perante a SPU

O roteiro apresentado pela União com sua contestação, consignado no documento de fls. 65-66vº, está de acordo com a Legislação que trata do assunto.  

Cabe ao Adquirente requerer à SPU a alteração do cadastro do imóvel, sob o regime de aforamento ou sob  o regime de ocupação, quando o domínio útil ou o direito de ocupar deste lhe  é alienado(§ 4º do art. 3º do Decreto-lei nº 2.398, de 1987 e § 4º do art. 33 da Lei nº 9.636, de 1998).

O valor do laudêmio há de ser pago pelo Foreiro/Ocupante(no caso, o ora Autor)[1].

Enquanto o cadastro não for alterado para o nome do Adquirente, a pedido deste, a SPU continuará cobrando o foro anual do ex-Foreiro ou a taxa de ocupação do ex-Ocupante, proprietário do domínio útil do imóvel(Foreiro) ou do direito de ocupação(Ocupante), porque é este, oficialmente, o foreiro/ocupante do imóvel.[2] Obviamente, este terá direito de regresso contra o Adquirente que não tenha regularizado o seu nome no cadastro da SPU, observada a data de alienação do  contrato de compra e venda.

No caso em tela, o saudoso e então Desembargador Federal Paulo Gadelha do E. TRF/5R, na r. decisão referida na nota de rodapé 2, antecipou a tutela, obrigando a UNIÃO, via SPU, a alterar, no seu cadastro, o registro do imóvel em questão, para o nome dos Adquirentes(v. fls. 87-88). E essa r. decisão foi mantida pela 2ª Turma desse E. Tribunal, quando do julgamento do respectivo agravo de instrumento, conforme cópia do respectivo acórdão, acostada à fl. 109-113.

Na decisão de fls. 129-129vº deste juízo, restou determinado que o Autor arrolasse no polo passivo os Adquirentes do domínio útil e/ou do direito de ocupação do imóvel em questão e promovesse a respectiva citação, decisão essa que foi acolhida nas petições de fl. 131 e 135, os quais foram regularmente citados(fls. 137, 140 e 143).

Apenas um desses Litisconsortes, MÁRIO CAVALCANTI DE GOUVEIA JÚNIOR, a título de contestação,  informou, à fl. 144-145, que já havia requerido a alteração cadastral do imóvel discutido junto ao SPU, todavia não juntou a respectiva prova.

Assim, os demais estão sob revelia, mas sem aplicação dos respectivos efeitos, como a pena de confissão, em face da regra do inciso I do art. 320 do Código de Processo Civil – CPC.   

Ora, na expressão jurídica latina, aplicada ao cotidiano forense, "allegatio et nom probatio, quasi non alleggatio", que se traduz na literalidade para o português como "alegar e não provar é quase não alegar". Em fato, a Parte Litisconsorte alegou, porém não fez prova documental nos autos de que já teria tomando providências para a alteração do cadastro administrativo do SPU, em relação ao imóvel adquirido em 30.04.2001, desta forma pouco ou em nada contribuiu para o deslinde desta demanda que se arrasta desde 27.10.2010.

Ademais, em consulta ao site da Secretaria do Patrimônio da União - SPU, na data de 27/02/2015, feita pela Assessoria deste Magistrado, constatou-se que o imóvel ainda se encontra registrado em nome do seu antigo Foreiro ou Ocupante, o ora Autor desta ação, conforme certidão de fl. 185.

Ressalta-se que tal conduta desse Litisconsorte enseja a caracterização de  Litigância de Má-fé, porque enquadrável nos incisos II, III e V do art. 17 do vigente Código de Processo Civil – CPC, além de ferir regras de comportamento processual, que buscar deter práticas atentatórias ao exercício da jurisdição,  fixadas no art. 14 do mesmo Diploma Processual.

Consta, à fl. 17, a Certidão de Registro de Imóveis, de onde se pode aferir que os ora Litisconsortes Passivos Necessários realmente adquiriram o domínio útil e os direitos de ocupação do imóvel em questão, que se encontra parte sob regime de aforamento e parte sob regime de ocupação,  e passaram a ser os respectivos Foreiros/Ocupantes.

A SPU só pode fazer, de ofício, o primeiro cadastramento, conforme acima demonstrado.

Não pode a SPU alterar, de ofício, mencionado cadastro, quando há alienação do domínio útil e/ou dos direitos de ocupação do imóvel, cabendo ao respectivo Adquirente pedir essa alteração.

Desta forma, data maxima venia dos d. Julgadores do TRF/5ªR, no v. acórdão acima mencionado, não mereceria procedência o pedido do Autor para se declarar, com relação à União,  inexistente relação jurídica no que tange às taxas de ocupação e/ou foro com vencimento posterior a 30.04.2001 (data em que ocorreu a transmissão dos referidos direitos sobre o imóvel), referente ao imóvel situado em "terreno de marinha" cadastrado sob o RIP nº 2531.0103801-51, tampouco obrigar a União, via SPU, a fazer a alteração cadastral antes da formalização do pedido, para essa alteração, por parte dos Adquirentes, legalmente obrigados  a isso, que figuram como Litisconsortes Passivos Necessários nesta ação.

Mereceria, sim, determinar-se que os Adquirentes cumprissem essa obrigação legal, a de requerer a alteração cadastral perante a SPU. Mas isso não foi pedido pelo Autor e a 2ª Turma do E. TRF/5ªR já acolheu os pedidos de obrigar a União, via SPU, de fazer a referida alteração cadastral e de não cobrar do Autor o foro ou taxa de ocupação do imóvel em questão, a partir da data em que alienou o domínio útil ou o direito de ocupação do imóvel para os Adquirentes, situação essa que esgotou a quase totalidade dos pleitos, restando a este juízo apenas determinar o cumprimento do d. acórdão da 2ª Turma do E. TRF/5ªR e apreciar o pedido da letra “D” dos pedidos da petição inicial, qual seja, o de garantir o direito de regresso contra os Adquirentes, relativamente às parcelas que o Autor tenha pagado do mencionado foro anual e/ou da mencionada taxa de ocupação.

Não há nenhum pedido quanto ao valor do laudêmio(percentual sobre o valor do imóvel, quando alienado para outra Pessoa, sob encargo do Foreiro/Ocupante, no caso, o ora Autor), pelo que não cabe qualquer decisão a seu respeito.

A 2ª Turma do E. TRF/5ªR não condenou a UNIÃO em qualquer tipo de verba de sucumbência, de forma que esta não pode ser responsabilidade por esse tipo de verba.

No entanto, constata-se que os Litisconsortes Passivos Necessários, arrolados na petição de fl. 131, faltaram com a verdade quanto ao pedido de alteração do cadastro do imóvel perante a SPU e foram os causados da propositura desta ação, pelo que devem ser enquadrados como Litigantes de má-fé e condenados à respectiva multa e ainda nas verbas de sucumbência(custas e honorários advocatícios), tudo como previsto no art. 18 do vigente Código de Processo Civil - CPC .  Não cabe a condenação em qualquer indenização, como estabelecido nesse dispositivo de Lei,  porque não há nenhum indício de que o Autor tenha tido algum outro prejuízo material, a não ser o de ter efetuado o pagamento de algumas parcelas do foro anual ou da taxa de ocupação, cujo ressarcimento já faz parte de um dos pedidos da peça inicial.  

3 - Conclusão

Posto Isso:

a)     Preliminarmente:

a-1) decreto a revelia, sem os respectivos efeitos(art. 320, I, CPC), dos Litisconsortes Passivos Necessários MÁRIO CAVALCANTI DE GOUVEIA NETO e DANELA CAVALCANTI DE GOUVEIA;

a-2) tenho o Litisconsorte Passivo Necessário MÁRIO CAVALCANTI DE GOUVEIA JÚNIOR, arrolado à fl. 131, como litigante de má-fé, pelo que o condeno ao pagamento, a favor do Autor, de multa correspondente a 1%(hum por cento)do valor da causa, atualizado(correção monetária)a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, na forma e pelos índices do manual de cálculo do  Conselho da Justiça Federal – CJF(art. 18 do Código de Processo Civil – CPC) ;

b)     No mérito, julgo parcialmente procedentes os pedidos desta ação e:

b-1 - determino à UNIÃO que dê efetivo cumprimento ao noticiado acórdão da 2ª Turma do E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no prazo de 10(dez)dias, sob pena de pagamento de multa mensal, a favor do Autor, no valor de R$ 1.000,00(hum mil reais), sem prejuízo da responsabilização funcional, civil e criminal do Servidor e/ou Dirigente que der azo ao pagamento dessa multa;

b-3 - condeno mencionados Litisconsortes Passivos Necessários, arrolados à fl. 131, a ressarcirem o Autor de despesas que eventualmente tenha efetuado relativamente ao pagamento do foro anual e/ou da taxa de ocupação anual, referente ao imóvel em questão, após a data da respectiva aquisição por parte de tais Litisconsortes, com atualização(correção monetária e juros de mora), incidentes a partir do mês seguinte ao da realização da despesa, cálculos com base e na forma fixadas no manual de cálculos do  Conselho da Justiça Federal – CJF.

b-4 - Finalmente, condeno os Litisconsortes Passivos Necessários nas custas judiciais e em verba honorária, que arbitro, com base no § 4º do art. 20 do CPC, em R$ 6.000,00(seis mil reais), pro rata.  

 

P.R.I.

 

Recife, 05 de março de 2015

 

Francisco Alves dos Santos Jr

   Juiz Federal, 2ª Vara-PE




[1] Óbvio que, contratualmente, o Adquirente pode se responsabilizar pelo respectivo quantum. Mas, perante a União, é o Foreiro/Ocupante(o ora Autor)o responsável.
[2] E neste particular, data maxima venia, não vejo base legal para o entendimento de acórdão do E. TRF2R, invocado pelo TRF/5R em r. decisão, lançada no noticiado agravo de instrumento, cuja cópia  se encontra acostada às fls. 86-88. Mas, agora, resta cumprir o julgado do E. TRF5R.

quinta-feira, 5 de março de 2015

JUROS DE MORA, O IMPOSTO DE RENDA E O ENTENDIMENTO DA 1ª SEÇÃO DO E. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior.

 Existem os juros que representam rendimentos, como, por exemplo, os juros de aplicações financeiras. Estes correspondem a rendimento e sofrem a incidência do imposto de renda.

Mas o valor dos juros de mora não podem sofrer incidência desse imposto, porque juros de mora não se caracterizam como renda, na formatação dada a esse instituto pelo art. 43 do Código Tributário Nacional, mas sim mera indenização pela reposição do uso ilegal do dinheiro alheio ou pelo uso desse dinheiro por prazo superior ao legal ou contratual.

Não desconheço d. julgado da 1ª Seção do E. Superior Tribunal de Justiça-STJ, Recurso Especial nº Resp 1089.720- RS(Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, julgado em 10.10.2012, publicado no DJe 28/11/2012, disponível em http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=+1089720&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=160, acesso em 05.03.2015), adotado em outros d. julgados dessa E. Corte, no qual se concluiu que os juros de mora têm a mesma sorte do principal: se este for isento do mencionado imposto, os juros de mora gozarão dessa isenção; se o principal for tributado, os juros de mora também serão. 
Data maxima venia, não comungo deste raciocínio, porque, à luz da legislação tributária, os juros destacam-se do principal e representam um ganho à parte e só podem sofrer incidência do imposto de renda se forem enquadrados como renda e nesse sentido é claríssimo o art. 43 e respectivos  parágrafos do Código Tributário Nacional, cuja Lei que o instituiu, a Lei 5.172, de 1966, tem natureza de Lei Complementar, conforme assente entendimento do Supremo Tribunal Federal - STF e da doutrina, entendimento esse hoje constitucionalizado, art. 146, III, "a", da vigente Constituição, que tem a seguinte redação:
"Art. 146. Cabe à lei complementar:
I - (...);
II - (...);
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:
  a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;".
 
Então, à luz dos mencionados art. 43 e respectivos incisos e parágrafos do Código Tributário Nacional, os juros, quando caracterizados como juros-rendimento, sofrem incidência do imposto de renda, porque se caracterizam como renda e, por isso, ocorre o fato gerador do IR. Óbvio que, caso haja isenção legal, o IR não será exigido.
 
No entanto,  caso se caracterizem como juros de mora(indenização), não sofrem incidência desse imposto, porque verba indenizatória não é renda, mas sim, como o próprio nome diz, indenização que serve, regra geral, para repor uma perda. Não ocorre o fato gerador do IR, porque, sendo verba reparadora, não gerará nenhum acréscimo ao patrimônio daquele que adquire a sua disponibilidade econômica ou jurídica.  
Não conheço nenhum jurista de direito comercial ou civil que sustente o ponto de vista no sentido de que os juros de mora não têm natureza indenizatória. 

Data maxima venia, o acima mencionado r. julgado do STJ contrariou os acima transcritos dispositivos da vigente Constituição da República(alínea "a" do inciso III  do art. 146), pois criou um novo fato gerador do IR, à margem do estabelecido no invocados art.43 e respectivos incisos e parágrafo do Código Tributário Nacional, o qual, como vimos, foi instituído por Lei que corresponde a Lei Complementar.

Também, data maxima venia, contrariou frontalmente o princípio constitucional da legalidade qualificada(inciso I do art. 150 dessa mesma Carta), qualificada porque exige Lei Complementar, cuja aprovação depende de quorum qualificado(art. 69 da mesma Carta).

Então, estamos diante de matéria constitucional, a ser resolvida pelo Supremo Tribunal Federal-STF.  
 

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

BUSCA E APREENSÃO. CONVERSÃO EM AÇÃO DE DEPÓSITO. A CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.

   Segue decisão na qual se discute a transformação da ação de busca e apreensão em ação de depósito e cobrança e da aplicação, ao caso, da Convenção Americana de Direitos Humanos, da Súmula Vinculante 25 do Supremo Tribunal Federal e da Súmula 304 do Superior Tribunal de Justiça.
 
   Boa Leitura.
 

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2ª VARA

 

Processo nº 0000836-69.2013.4.05.8300

Classe:    133 MEDIDA CAUTELAR DE BUSCA E APREENSÃO

REQUERENTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA

REQUERIDO: C A F DO N

 

C O N C L U S Ã O

 

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

 

Recife, 02/05/2014

 

 

Encarregado(a) do Setor

 

 

D E C I S Ã O

 

 

Relatório

A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL propôs esta “Ação de Busca e Apreensão” contra C A F DO N, aduzindo, em síntese, que o Requerido teria celebrado “Contrato de Abertura de Crédito-Veículos”, nº 000046082633, com o Banco Panamericano; que mencionado contrato encontrar-se-ia vinculado a uma nota promissória, estando ainda garantido por alienação fiduciária; que o crédito do mencionado contrato teria sido cedido à ora Requerente, tendo sido observadas as formalidades impostas nos arts. 288 e 290 do Código Civil; que o Requerido, desde 09.03.2012, não estaria honrando as obrigações assumidas; que, em 14/01/2013, o valor da dívida seria R$ 11.170,28; Invocou o disposto no §2º do art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69. Teceu outros comentários, e requereu: a concessão da medida liminar inaudita altera pars de busca e apreensão do veículo indicado na Inicial; a citação do Requerido para purgar a mora ou então para apresentar resposta; a procedência do pedido, com a condenação da Requerida nas verbas de sucumbência. Protestou o de estilo. Atribuiu valor à causa e juntou procuração, comprovante de recolhimento das custas processuais e documentos (fls. 05/56).

Na decisão de fl. 58 foi deferida, liminarmente, a medida de busca e apreensão da moto e determinada a expedição do respectivo mandado e a citação do Réu.

O Réu foi citado por hora certa (fl. 69) .

Expedida a Carta de Intimação nos moldes do artigo 229 do CPC (fls. 71-73), mas o Réu não apresentou o bem e por isso ele não foi apreendido.

Por isso, intimada, a Caixa Econômica Federal - CAIXA requereu a conversão do feito em Ação de Depósito e o prosseguimento do feito com fulcro nos artigos 901 e ss. do CPC.

Vieram-me conclusos.

Fundamentação

 A ação de busca e apreensão de que se cuida está prevista no Decreto-lei nº 911/69 e, de acordo com o que preceitua o referido DL, no caso de o bem alienado fiduciariamente não ser localizado, faculta-se ao Credor requerer a sua conversão em ação de depósito (art. 4º do DL).

E a jurisprudência dos Tribunais evoluiu no sentido de que, caso o bem não for mais localizado, pode na ação de depósito cobrar-se o respectivo valor de mercado, pela via executiva e nesse sentido segue a ementa de r. julgado do E. Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ARTIGO 535, DO CPC. VIOLAÇÃO. INOCORRÊNCIA. PENHORA. DINHEIRO. ORDEM. ARTIGO 655, DO CPC. SÚMULAS N. 417 E 7-STJ. BUSCA E APREENSÃO. DEPÓSITO. EQUIVALENTE EM DINHEIRO. NÃO PROVIMENTO.

1. (...).

2. (...).

3. (...). 

4. "A jurisprudência da 2ª Seção do STJ consolidou-se no sentido de que em caso de desaparecimento do bem alienado fiduciariamente, é lícito ao credor, após a transformação da ação de busca e apreensão em depósito, prosseguir nos próprios autos com a cobrança da dívida representada pelo "equivalente em dinheiro" ao automóvel financiado, assim entendido o menor entre o seu valor de mercado e o débito apurado." (REsp 972.583/MG, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 18/10/2007, DJ 10/12/2007, p. 395) 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no Ag 1309620/DF, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 16/05/2013, DJe 24/05/2013)”

A Requerente indica que o valor atualizado do débito montava, em abril de 2014, na quantia de R$ 26.033,05(vinte e seis mil e trinta e três reais e cinquenta e cinco centavos), conforme memória de cálculo de fl. 78.

Não merece ser conhecido o pedido para que conste do mandado de citação a advertência do Parágrafo Único do art. 904 do código de processo civil, porque mencionada regra legal encontra-se derrogado pela Convenção Americana dos Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário e pela atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, cristalizada na sua Súmula Vinculante nº 25(“É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”).  

 

Conclusão

 

Posto ISSO:

a) preliminarmente, não conheço do pedido para que se consigne no mandado de citação a advertência do parágrafo único do artigo 904 do CPC, porque, com o advento da Convenção Americana de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário, o Supremo Tribunal Federal firmou jurisprudência, cristalizada na sua Súmula Vinculante nº 25 do STF(“É ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito”[1]), que não cabe mais a prisão civil para o Depositário Infiel.

b) defiro o pedido de conversão da presente ação de busca e apreensão em ação de depósito e, com base no art. 902 do código de processo civil,   determino que o Requerido seja citado para entregar o bem à Caixa Econômica Federal-CEF ou depositá-lo em juízo ou para consignar o  equivalente em dinheiro, no valor de R$ 26.033,05(vinte e seis mil e trinta e três reais e cinquenta e cinco centavos)e também para, querendo, contestar esta ação, observado(s) o(s) prazo(s) legal(ais).

    P. I.

 

Recife, 07 de maio de 2014

 

Francisco Alves dos Santos Júnior

  Juiz Federal, 2ª Vara-PE

 




[1] A Súmula 304 do E. Superior Tribunal de Justiça obra no sentido de que o depósito caracterizado neste feito não pode gerar prisão civil do Depositário. 

ENSINO FUNDAMENTAL. LIMITE DE IDADE. ATOS ADMINISTRATIVOS QUE FIXAM ESSE LIMITE NÃO PODEM SER ALTERADOS PELO PODER JUDICIÁRIO. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PRIMEIRA TURMA.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior




I. PRIMEIRO CASO

O juiz federal, titular da 2ª Vara Federal de Pernambuco, na Ação Civil Pública, processo nº 0013466-31.2011.4.05.8300,  a respeito do limite de idade para o início no ensino fundamental, fixado em ato administrativo de Órgão do Ministério da Educação e Cultura, negou a medida liminar, com os argumentos que seguem na sua fundamentação.


       Ação Civil Pública, processo nº 0013466-31.2011.4.05.8300:

         Autor: Ministério Público Federal

         Ré: UNIÃO


          Decisão


          Breve Relatório


            O Ministério Público Federal pretende, via medida liminar, que sejam suspensos os efeitos da Resolução nº 01, de 14.01.2010 e nº 06, de 20.10.2010, e d'outras Resoluções posteriores, com o mesmo conteúdo, editadas pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, sob o argumento principal de que mencionados atos administrativos seriam ilegais.


            A UNIÃO, intimada para os fins do art. 2º da Lei nº 8.437, de 1992, acostou a petição de fl. 29, alegando que não tivera tempo hábil para manifestar-se.


            Fundamentação


            Não encontro, prima facie, ilegalidade nas mencionadas Resoluções da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, posto que se amoldam ao art. 32 da Lei nº 9.394, de 20.12.1996, transcrito na  nota de rodapé  2 da petição inicial.


      Referidas Resoluções, data venia, não vedam o exercício do direito constitucional de acesso de crianças, com idade inferior a 6 (seis) anos, ao ensino, público ou privado, veda apenas que iniciem o ensino fundamental antes dessa idade, na forma prevista no mencionada dispositivo legal.

     

      A elaboração dessa Lei e desses atos administrativos foram, certamente, precedidos de estudos psicossociais e sociológicos, sendo, por isso, temerário suspender os efeitos de tais atos em precária decisão liminar.

     

      Conclusão

     

      Posto isso, indefiro o pedido de concessão de medida liminar e determino que se cumpra a primeira parte da decisão de fl. 27, citando a UNIÃO para, querendo, contestar, na forma e no prazo legal.

     

      Intime-se.

     

      Recife, 29.09.2011

     

      Francisco Alves dos Santos Júnior

         Juiz Federal, 2ª Vara-PE


A decisão supra, em juízo de retratação decorrente de agravo de instrumento, interposto pelo Ministério Público Federal, foi modificada pelo então Juiz Federal Substituto, Dr. Cláudio Kitner, que findou por conceder, liminarmente, a medida cautelar pleiteada.


O mesmo d. Juiz Federal Substituto julgou procedentes os pedidos, tendo o E. TRF/5ªR reformado mencionada r. sentença apenas no que se refere à abrangência territorial (de nacional para o território da jurisdição da Seção Judiciária de Pernambuco).


A UNIÃO interpôs recurso especial e também o Ministério Público Federal, que foram admitidos no Tribunal a quo.


A UNIÃO também interpôs recurso extraordinário, que não foi admitido no Tribunal a quo, pelo que houve a interposição do respectivo agravo de instrumento ao Supremo Tribunal Federal.


O Superior Tribunal de Justiça – STJ, em acórdão publicado em 19.12.2014,  findou por restabelecer a primeira decisão, aquela dada pelo juiz titular da 2ª. Vara Federal de Pernambuco e que se encontra acima transcrita.


Eis a íntegra da ementa do v. acórdão da 1ª. Turma do mencionado E. Superior Tribunal de Justiça – STJ:


RECURSO ESPECIAL Nº 1.412.704 - PE (2013/0352957-0)

RELATOR : MINISTRO SÉRGIO KUKINA

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RECORRENTE : UNIÃO

RECORRIDO : OS MESMOS


EMENTA


PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EDUCAÇÃO. INGRESSO NO PRIMEIRO ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL. CORTE ETÁRIO. RESOLUÇÕES Nº 01/2010 E Nº 06/2010 - CNE/CEB. LEGALIDADE. RECURSO ESPECIAL DA UNIÃO PROVIDO. RECURSO ESPECIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO PREJUDICADO.

1. As Resoluções nº 01/2010 e nº 06/2010, ambas emanadas da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação (CNE/CEB), ao estabelecerem corte etário para ingresso de crianças na primeira série do ensino fundamental (6 anos completos até 31 de março do correspondente ano letivo), não incorreram em contexto de ilegalidade, encontrando, ao invés, respaldo na conjugada exegese dos arts. 29 e 32 da Lei nº 9.394/96 (LDB).

2. Não é dado ao Judiciário, como pretendido na ação civil pública movida pelo Parquet , substituir-se às autoridades públicas de educação para fixar ou suprimir requisitos para o ingresso de crianças no ensino fundamental, quando os atos normativos de regência não revelem traços de ilegalidade, abusividade ou ilegitimidade.

3. Recurso especial da União provido, restando prejudicado aquele interposto pelo Ministério Público Federal.


ACÓRDÃO


Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial da União e julgar prejudicado o recurso especial do Ministério Público Federal, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Regina Helena Costa, Marga Tessler (Juíza Federal convocada do TRF 4ª Região) e Napoleão Nunes Maia Filho (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Benedito Gonçalves. Assistiu ao julgamento o Dr. LOURENÇO PAIVA GABINA, pela parte RECORRENTE: UNIÃO.

Brasília (DF), 16 de dezembro de 2014(Data do Julgamento)MINISTRO SÉRGIO KUKINA

Documento: 1375060 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJe: 19/12/2014 Página 1 de 8



II. SEGUNDO CASO 


2. O magistrado titular da 2ª Vara Federal de Pernambuco, que, na ação acima referida,  negara a medida liminarmente, em decisão mais recente,  datada e publicada em 28.11.2014, lançada nos autos de outra ação civil pública, antes, portanto, da publicação(19.12.2014)do acórdão acima referido do E. Superior Tribunal de Justiça, cuja ementa foi acima transcrita, manteve e ampliou o seu entendimento, nos termos que seguem,, verbis

Parte superior do formulário

PROCESSO Nº: 0806191-90.2014.4.05.8300 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR


D E C I S Ã O


1.Breve Relatório

 

O Ministério Público Federal propôs a presente Ação Civil Pública, com pedido de antecipação de tutela em face da União Federal. Aduziu, em síntese, que: a demanda teria por escopo a condenação da União a promover a admissão no ensino infantil de crianças com idade de 4 (quatro) anos incompletos, revogando, com isso, as disposições contidas na Resolução n. 06 de 20/10/2010, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação e demais atos posteriores; fora instaurado o Inquérito Civil n. 1.26.000.03182/2013-31, a partir do recebimento do Ofício Circular n. 16/2013/1º CCR/MPF, oriundo da 1ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, a fim de deflagrar apuração sobre possível irregularidade, ante a adoção das Resoluções ns. 1 e 6/2010 do Conselho Nacional de Educação, órgão vinculado ao Ministério de Educação-MEC, consistente na fixação de critério estritamente etário para acesso aos ensinos infantil(dos dois aos cinco anos de idade) e fundamental (aos seis anos de idade); tendo em vista que já tramitaria perante a Seção Judiciária de Pernambuco a Ação Coletiva n. 0013466-31.2011.4.05.8300, ajuizada pelo MPF, com o objetivo de condenar a União à obrigação de fazer consistente em reavaliar os critérios de classificação/admissão dos alunos no primeiro ano do ensino fundamental, e que fora instaurado novo inquérito civil na PR/PE, desta feita, para apurar as condições de ingresso de alunos no ensino infantil; a referida ACP, relativa ao ensino fundamental, fora julgada procedente, tendo sido a União condenada a suspende as referidas resoluções e outras com conteúdo semelhante, permitindo a matrícula regular no ensino fundamental de crianças menores de seis anos de idade em 31 de março do ano letivo a ser cursado; a decisão seria apenas referente à educação fundamental (crianças a partir de 6 anos)  estando, portanto, em vigor, as Resolução do CNE no que tange ao ensino infantil; fora autuado notícia de fato n. 1.26.000.003301/2014-37, apensa ao inquérito civil principal; a representante teria narrado que seus filhos gêmeos tiveram suas matrícula no maternal indeferidas em pelo menos duas escolas da rede privada de ensino, porquanto fazem aniversário no mês de julho; a propositura desta ação seria específica para suspender os efeitos da Resolução n. 6/2010 do Conselho Nacional de Educação em relação ao ensino infantil;  seriam inconstitucionais as Resolução  CNE/CEB n. 01 de 14.1.2010 (já reconhecida na ACP n. 0013466-32.2011.4.05.8300) e a Resolução n. 06 de 20.10.2010, reproduzidas na Resolução Estadual CEE/PE n. 03, de 29.11.2010 eis que violaria norma constitucional específica, que determinaria a obrigatoriedade e gratuidade  da educação básica a ser iniciada aos 4 anos de idade, sem qualquer restrição de data para o ingressar no ano em que deva ocorrer a matrícula (art. 208, I da Constituição); ofenderiam comando constitucional específico, que estabelece que a educação infantil, em pré-escola, deve ser cumprida para crianças de até 5 (cinco) anos de idade; imporia tratamento desigual em relação àquelas crianças que completassem 4 (quatro) anos de idade após 31 de março e que tivessem condições de ingressar na Educação Infantil (art. 5º, caput, da Constituição), por simetria, violariam as mesmas normas constitucionais relativas às crianças que devessem cursar o ensino fundamental (iniciado aos seis anos de idade), cujo direito já fora reconhecido pelo Judiciário na ACP n. 0013466-31.2011.4.05.8300; criaria restrição não prevista em lei e contrária à expressa previsão legal de que "o ensino fundamental" seria obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola iniciando-se aos 6 anos, que teria por objetivo a formação básica do cidadão. Teceu outros comentários, notadamente quanto à competência da justiça federal para o processamento do feito; adequação da via eleita e legitimidade ativa do MPF; da inconstitucionalidade e ilegalidade da Resolução CNE/CEB 6/2010 e da normatização estadual correspondente (Resolução CEE/PE N. 03/2010); da repetência e da evasão escolar como fatores de exclusão;  da ausência de isonomia entre crianças de diferentes estados da Federação; da necessidade da análise da capacidade intelectual de cada criança (avaliação psicopedagógica); da necessidade de reconhecimento do efeito erga omnes para todo o território nacional; do cabimento do controle incidental de constitucionalidade em ação civil pública; do preenchimento dos requisitos para a concessão da tutela antecipada. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela concessão de tutela antecipada, no sentido de determinar a suspensão imediata dos efeitos da Resolução n. 06 e demais atos posteriores que reproduziram a mesma ilegalidade, editados pela Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, em todo o território nacional, para a rede pública e privada de ensino, de forma a permitir a matrícula na primeira série do ensino infantil das crianças que venham a completar quatro anos de idade no decorre do  próximo ano letivo (de janeiro a dezembro de 2015). Protestou o de estilo. Inicial instruídas com procuração e documentos.

Devidamente instada a se manifestar, para os fins do art. 2º da Lei nº 8.437, de 1992, a União aduziu em síntese: ausência dos requisitos legais para a antecipação de tutela; inexistência de comprovação de prova inequívoca; a adoção de critério da idade cronológica estaria recepcionada como legítima pela Carta da República, refletindo a opção do legislador pátrio como requisito genérico e abstrato capaz de averiguar o discernimento; seria um contrassenso considerar como ilegítimo o critério etário como marco definidor para o ingresso no ensino infantil, quando existem inúmeras situações em que o ordenamento jurídico pátrio elege a idade cronológica como requisito para a aquisição de direitos e obrigações; o requisito legal de idade mínima para ingressar no ensino infantil constituiria critério objetivo e impessoal; entendimento diverso pode render ensejo à materizalização de situações fáticas graves de inadaptação das crianças demasiadamente novas ao ingressar no ambiente de ensino fundamental;  seria imprescindível adaptação de toda a rede de ensino à nova logística de política educacional, implicando reformulação das propostas pedagógicas vigentes, na implantação de infraestrutura e na existência de recursos didáticos e pedagógicos apropriados para atendimento desta nova demanda; seria necessária a alocação de recursos financeiros vultosos do orçamentos dos Entes da Federação com a finalidade de constituírem equipes multidisciplinares. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pelo indeferimento do pedido de tutela antecipada. Protestou o de estilo.


Vieram-me os autos conclusos.


Passo a decidir.


2. Fundamentação


2.1  Tramitou nesta 2ª Vara Federal a  ACP n. 0013466-31.2011.4.05.8300, com adaptação ao caso concreto, na qual se discutiu, como bem detalhado na petição inicial, questão de idade relativa ao ensino fundamental.


Aqui, neste feito, discute-se assunto semelhante, mas relativo ao ensino infantil.


A r. sentença, da lavra do então Juiz Federal Substituto, o d. Dr. Cláudio Kitner, julgou procedentes os pedidos, tendo o E. TRF/5ªR reformado mencionada r. sentença apenas no que se refere à abrangência territorial (de nacional para o território da jurisdição da Seção Judiciária de Pernambuco).


A UNIÃO interpôs recurso especial e também o Ministério Público Federal, que foram admitidos no Tribunal a quo, ainda não julgados no Superior Tribunal de Justiça.


A UNIÃO também interpôs recurso extraordinário, que não foi admitido no Tribunal a quo, pelo que houve a interposição do respectivo agravo de instrumento ao Supremo Tribunal Federal, não havendo no site desses Tribunais nenhuma informação a respeito desse recurso.


Logo, a matéria ainda se encontra subjudice.


2.2) Naquela ação, embora da competência do Juiz Federal Substituto, diante da sua ausência, por motivos legais, despachei em primeiro lugar, e neguei a pretendida medida liminar, da seguinte forma:


"Não encontro, prima facie, ilegalidade nas mencionadas Resoluções da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, posto que se amoldam ao art. 32 da Lei nº 9.394, de 20.12.1996.

 Referidas Resoluções, data venia, não vedam o exercício do direito constitucional de acesso de crianças, com idade inferior a 6 (seis)anos, ao ensino, público ou privado; veda apenas que iniciem o ensino fundamental antes dessa idade, na forma prevista no mencionada dispositivo legal.

A elaboração dessa Lei e desses atos administrativos foram, certamente, precedidos de estudos psicossociais e sociológicos, sendo, por isso, temerário suspender os efeitos de tais atos em precária decisão liminar.".


Não vejo razão para, no presente caso, com relação a idênticas regras administrativas do mesmo Conselho, que tratam de regulamentar o ensino infantil, mudar, liminarmente, de opinião. 


Merece destacar que, aqui, o Ministério Público Federal alega que restaram contrariadas regras do caput do art. 208 e do seu inciso I.     


Não encontro, de plano, essa alegada contrariedade a esses dispositivos constitucionais, que têm a atual seguinte redação:


"Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009) (Vide Emenda Constitucional nº 59, de 2009)".


As impugnadas regras administrativas, data venia, amoldam-se à perfeição a essas normas da Carta Magna.


Ademais, existem estabelecimentos de ensino, públicos e privados, para acolhimento de crianças com idade inferior a 4(quatro)anos.


Data venia, não pode o Judiciário interferir no mérito de normas administrativas, que não contrariam, frontalmente, normas legais e/ou constitucionais, principalmente quando se sabe que, no presente caso, as normas administrativas ora atacadas decorrem de inúmeras reuniões e debates no âmbito dos setores educacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios. 


Data venia, o Ministério Público Federal deveria, ao invés de impugnar mencionadas normas administrativas na via judicial, procurar participar  dos debates anteriores à respectiva elaboração e publicação, visando aprimorá-las e/ou adaptá-las a sua visão educacional e, para casos isolados após a respectiva entrada em vigor,  como o caso dos gêmeos noticiado na petição inicial, buscar solução, administrativa e/ou judicial, isolada e não impugnar as normas como um todo.


Evidentemente, que os Órgãos da área de educação do País irão acompanhar a implementação de tais normas e buscarão adaptá-las de acordo com a dinâmica social, o que não pode é, repito, o Judiciário impedir, abruptamente, sem conhecimento do mérito educacional em questão, que essa dinâmica se implemente.  


Não cabe a antecipação da tutela, porque o conhecimento do mérito que deu origem às referidas normas administrativas exige instrução processual e, talvez, realização de complexa perícia, com participação de especialistas em educação infantil.


3. Conclusão


Posto isso, indefiro o pedido de antecipação da tutela.


Cite-se, na forma e para os fins legais.


Recife, data da validação da assinatura


      Francisco Alves dos Santos Júnior

         Juiz Federal, 2ª Vara-PE


  O Ministério Público Federal - MPF interpôs, contra a decisão supra, o recurso de agravo de instrumento(Processo nº 0805248-44.2014.4.05.0000)perante o E. Tribunal Regional Federal de Recurso - TRF/5ªR, 2ª Turma, tendo o respectivo Desembargador Relator, Dr. PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA, mantido referida decisão, ou seja, recebeu mencionado recurso apenas no efeito devolutivo e, para tanto, utilizou-se dos mesmos argumentos da fundamentação da decisão de primeiro grau. Eis parte do despacho do mencionado Desembargador: "Com efeito, os atos administrativos são dotados de presunção de legitimidade pelo que se presumem verdadeiras as razões de fato e de direito que lhes dão sustentação, de modo que os fundamentos do agravante não se mostram, ao menos por agora, suficientes para afastar essa presunção. Isto porque, todo ato da administração é derivado de um processo de elaboração acompanhado por profissionais habilitados, não sendo possível o afastamento do ato sem a presença de prova robusta para tal. Como bem afirmado pelo juízo de piso, 'o judiciário não pode interferir no mérito de normas administrativas, que não contrariam, frontalmente, normas legais e/ou constitucionais, principalmente quando se sabe que, no presente caso, as normas administrativas ora atacadas, decorrem de inúmeras reuniões e debates no âmbito dos setores educacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios'".(Fonte: https://pje.trf5.jus.br/pje/ConsultaPublica/DetalheProcessoConsulta...). 


FINALMENTE, EM 01.08.2018, o Plenário do STF enfrentou o assunto, idade para o ensino fundamental.

AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE - ADC Nº 17/DF
REQUERENTE: GOVERNADOR DO MATO GROSSO DO SUL
REQURIDO(A): MINISTRO DO ESTADO DA EDUCAÇÃO
RELATOR: MINISTRO EDSON FACHIN.
RELATOR PARA O ACÓRDÃO: MINISTRO ROBERTO VELOSO, AUTOR DO VOTO VENCEDOR.

-PEDE O RECONHECIMENTO DA CONSTITUCIONALIDADE DE ARTIGOS DA LEI 9394, DE 1996 – LEI DEDIRETRIZE EDUCIONAIS, QUE FIXAM IDADE MÍNIMA DE SEIS ANOS PARA INGRESSO NO ENSINO FUNDAMENTAL.
STF, PLENÁRIO, REUNIDO EM 01.08.2018

DECISÃO:  O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Ministro Roberto Barroso, que redigirá o acórdão, julgou procedente o pedido, para declarar a constitucionalidade dos dispositivos impugnados e fixar a seguinte tese de julgamento: "É constitucional a exigência de 6 (seis) anos de idade para o ingresso no ensino fundamental, cabendo ao Ministério da Educação a definição do momento em que o aluno deverá preencher o critério etário". Vencidos, em parte, os Ministros Edson Fachin (Relator), Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Dias Toffoli e Celso de Mello. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 1º.8.2018.

PUBLICADO NO DJE E NO DOU DE 08.08.2018.

OBS.:  OPOSTOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM 18.08.2018, ainda subjudice.[2]


https://mail.jfpe.jus.br/expressoMail1_2/templates/default/images/forbidden.pngNúmero do processo: 0806191-90.2014.4.05.8300
Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a:
Francisco Alves dos Santos Júnior
Data e hora da assinatura: 28/11/2014 17:16:53
Identificador: 4058300.749385

Fonte: https://pje.jfpe.jus.br/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam https://mail.jfpe.jus.br/expressoMail1_2/templates/default/images/forbidden.png
14112616572449100000000750175


[2] DISPONÍVEL EM http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2564133
ACESSO EM 08.09.2018.