terça-feira, 7 de dezembro de 2010

EXECUÇÃO JUDICIAL DA OAB: INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

Por Francisco Alves dos Santos Jr.

Segue uma interessante decisão, em que se discute julgado do Supremo Tribunal Federal, no qual foi concluído que a Ordem dos Advogados do Brasil não tem natureza de Autarquia, mas sim de uma “Entidade Prestadora de Serviços Públicos Independente. Categoria Ímpar no Elenco das Personalidades Jurídicas Existentes no Direito Brasileiro”, o que afasta essa Entidade das pessoas arroladas no inciso I do art. 109 da Constituição da República e, consequentemente, a competência da Justiça Federal para apreciar e julgar as ações por ela propostas contra pessoas físicas, principalmente, como no presente caso, contra uma sua Associada. Invoca-se, inclusive, Conflito de Competência julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, no qual esse entendimento foi adotado.

Boa leitura.


PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª REGIÃO
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
2a. VARA FEDERAL

Processo nº0015797-20.2010.4.05.8300 Classe:98
EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL

C O N C L U S Ã O

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR.

Recife, 07/12/2010

Encarregado(a) do Setor


D E C I S Ã O


Breve Relatório

A Ordem dos Advogados do Brasil, subseção de Pernambuco, propõe esta ação de execução diversa contra o(a) Advogado(a) Dra. R M F P, qualificada na petição inicial, executando parcela(s) da contribuição social de interesse de classe, denominada de anuidade, mais multa e juros.

Fundamentação

O plenário do C. Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, no julgamento da ADI 3026-4/DF, em 08.06.2006, concluiu que a Ordem dos Advogados do Brasil/OAB não seria uma Autarquia, mas sim uma “Entidade Prestadora de Serviços Públicos Independente. Categoria Ímpar no Elenco das Personalidades Jurídicas Existentes no Direito Brasileiro.”, pelo que poderia contratar os seus Empregados sem concurso público, como exige o art. 37 da Constituição da República para todo tipo de Pessoa Jurídica de Direito Público, da administração direta ou indireta.
Nota:Conforme Ementa do Julgado relativo à ADI nº 3026-4/DF.
Disponível em ttp://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?
docTP=AC&docID=363283. Acesso em 07.12.2010.
A respeito desse julgado do C. Supremo Tribunal Federal este Magistrado teve oportunidade de escrever em livro didático a seguinte critica:“Referida r. decisão do C. Supremo Tribunal Federal, data maxima venia, vai em sentido contrário da moralização dos serviços públicos, exigida há muito tempo pela sociedade brasileira. Temo que, se prevalecer esse entendimento, nossa C. Corte findará por dispensar essa Autarquia de submeter suas contas ao Tribunal de Contas da União”(SANTOS JÚNOR, Francisco Alves dos. Finanças Públicas, Orçamento Público e Direito Financeiro”, 1ª Ed., Olinda: Livro Rápico, 2008, p. 358-359).
Mas, seguindo mencionado entendimento do Supremo Tribunal Federal, o E. Superior Tribunal de Justiça foi mais longe ainda, pois firmou o entendimento de que “as anuidades pagas à Ordem dos Advogados do Brasil não têm natureza tributária e a execução segue o rito do Código de Processo Civil, não se aplicando a execução fiscal regida pela Lei nº 6.830/80”(REsp 771.821/RS, Rel. Ministra Denise Arruda, decisão monocrática de 18.08.2006, DJ de 31.08.2006). Nessa r. decisão monocrática faz-se referência a inúmeros julgados do E. Superior Tribunal de Justiça, inclusive ao ERESP 463.258/SC, da sua 1ª Seção, relatado pela Ministra Eliana Calmon, publicado no Diário da Justiça de 29.30.2004.
Data maxima venia, nesse particular, o E. Superior Tribunal de Justiça contraria julgado do Plenário do C. Supremo Tribunal Federal do ano de 1992(RE 146.733-SP, RTJ 143/684), no qual ficou assentado que todas as contribuições, inclusive as do art. 149 da Constituição da República, teriam natureza tributária, entendimento esse que essa Suprema Corte passou a adotar, depois desse julgado, em todos os outros feitos em que o assunto foi por ele apreciado.
No entanto, mesmo que essa contribuição fosse considerada pelo E. Superior Tribunal de Justiça um tributo federal , como a OAB, segundo o Supremo Tribunal Federal, não é Autarquia Federal, não é Fundação Pública Federal e não é Empresa Pública Federal, ou seja, não tem nenhum vínculo com a União, logo, não se encontra no rol do inciso I do art. 109 da Constituição da República, porque é algo não previsto no direito positivo brasileiro, na fértil criação da maioria dos Ministros do C. Supremo Tribunal Federal, é uma “Entidade Prestadora de Serviços Públicos Independente”(ADI 3026-4/DF), não poderia ter os seus interesses apreciados e julgados pela Justiça Federal.
Pois, como se sabe, desde os seus primórdios, a Justiça Federal só pode apreciar questões federais, ou seja, nas quais haja interesse da União ou de Autarquia, Fundação e Empresa Pública Federal subordinada à União, o que, como demonstrado, não é o caso da toda poderosa Ordem dos Advogados do Brasil.
O entendimento que ora defendemos, já adotado por outros inúmeros Juízes Federais do Brasil, findou por ser coerentemente adotado pelo E. Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do Conflito de Competência nº 47.613/TO, relator para o acórdão Ministro Paulo Medina, em cuja ementa consta: “1. Inexiste entre a Ordem dos Advogados do Brasil e a Administração Pública Federal Direta vínculo de coordenação ou subordinação hierárquica e funcional”, pelo que concluiu que a ação ali examinada deveria ser apreciada e julgada pela Justiça do Estado de Tocantis(Julgado em 22.06.2005, Diário da Justiça de 22.08.2005).
Assim, temos uma Entidade que cobra um tributo da União, por delegação legal desta, mas que não se subordina à fiscalização de nenhum órgão federal, estadual, distrital ou municipal, gastando o dinheiro público que arrecada como bem entendem os seus impolutos Dirigentes, que estão acima de qualquer controle e fiscalização por obra e graça da maioria dos d. Ministros do C. Supremo Tribunal Federal.(É interessante registrar que até a Direção do Tribunal de Contas da União subordina-se ao controle desse Tribunal, bem como a Direção do Congresso Nacional e de todos os Tribunais do Brasil. Até as Sociedades de Economia Mista, que não têm sequer personalidade jurídica de direito público, também se subordinam ao controle do Ministro de Estado respectivo e do Tribunal de Contas da União-TCU). Mas, a seguir o entendimento do C. Supremo Tribunal Federal, na referida ADI 3026-DF, a Ordem dos Advogados do Brasil fica livre de qualquer fiscalização e controle. É, realmente, um caso surpreendentemente sui generis.
Nessa situação, não é esta Justiça Federal competente para esta ação, mas sim a Justiça Estadual do Estado de Pernambuco e, como se trata de problema de competência absoluta, pode este Magistrado reconhecer essa incompetência de ofício.

Conclusão

POSTO ISSO, reconheço, de ofício, a incompetência absoluta desta Justiça Federal para o presente feito, e a declino para um dos d. Magistrados da Justiça do Estado de Pernambuco, pelo que determino que, após baixa nesta Justiça Federal, sejam os autos encaminhados para o Juízo Distribuidor da mencionada Justiça Estadual, para todos os fins de direito.
P. I.
Recife, 07 de dezembro de 2010.

Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE

sábado, 27 de novembro de 2010

Breves Dados Históricos sobre os Tributos(nota 1)

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Tributo vem do latim tributum, que significava dar, presentear.
Na época dos Romanos, inicialmente, significava exigências em bens ou serviços que as tribos vencedoras faziam das tribos vencidas. Depois, a própria sociedade passou a ser o alvo de tais exigências.
Já o termo Fisco vem de Fiscus-i, que correspondia ao cesto de junco ou de vime no qual o Coletor de impostos romano colocava o dinheiro que arrecadava. Depois, lá pelo ano 106 A. C. a 43 A. C., por metonímia, Fisco passou a ser a representação do Tesouro Público.
Os historiadores vinculam a origem dos tributos ao surgimento da figura do Estado, como forma de gerir recursos para que este defendesse sua população contra os povos inimigos.
Todavia, antes, há o registro da existência do dízimo religioso, uma Breves Dados Históricos sobre os Tributos
(nota 1)
espécie de tributo pago à divindade, na Lei Mosaica dos Hebreus, cujas raízes chegaram até nossos dias
Na Bíblia Sagrada, consta que o Faraó do Egito, depois de ouvir as previsões dos sonhos de José, segundo as quais, após sete anos de fartura, haveria sete anos de pobreza, pelo que recomendou que o dízimo fosse cobrado em dobro(o quinto dos produtos da terra), para fazer reservas necessárias aos sete futuros anos de “vacas magras”, período em que não seria possível a cobrança de impostos.(nota 2)
Mas foi na época do Império romano que o tributo foi exigido dos seus cidadãos, principalmente dos povos dominados, para os fins semelhantes a que os tributos têm na atualidade: manter a máquina do Estado em funcionamento.
No ano 168 A C., quando Roma conquistou a Macedônia, esta passou a pagar àquela tantos tributos, que os cidadãos romanos foram dispensados, internamente, do pagamento de qualquer tipo de tributo.
As sociedades antigas, próximas do mediterrâneo, tinham por principal tributo o que incidia sobre as importações. No Egito, também se tributava as grandes propriedades de terra.
Na época do Feudalismo, quando houve grande descentralização da administração pública, cada Feudo tinha seu sistema próprio de administração. Os tributos exigidos pelo Senhorio dos Servos receberam diversas roupagens: ora era parte da produção, para que pudessem se utilizar das pontes, das estradas, dos fornos e dos moinhos do Feudo; ora era a corvéia, que consistia em trabalho forçado dos servos nas terras do Feudo, por três dias na semana, sem nenhuma remuneração; ora eram as redevances, retribuições pagas em produtos ou em dinheiro, como a talha(parte da produção), banalidades(presentes obrigatórios), taxa de casamento(quando o servo casava-se com mulher de fora do Domínio do Feudo), mão-morta(tributo pela transmissão de herança), e ainda o dízimo pago à Igreja Católica.
No final do Século XIV(nota 3), com a decadência do feudalismo, começa a surgir o capitalismo e o Capitalista buscou maior segurança(nota 4), fugindo do anarquismo jurídico, inicialmente do Estado personalista, centralizado na figura do Rei, depois dos Feudos(no sentido de que cada Feudo tinha a sua Lei) e centralizou o sistema jurídico no Estado despersonalizado(final das Monarquias Absolutas, principalmente após Século XVII), neutro, composto de Órgãos, preferencialmente controlados pelo poder do dinheiro(nota 5).
No Brasil, no período denominado pré-colonial(1500-1530), Portugal limitou-se à atividade de exploração do pau-brasil, e aquele que exercia essa atividade pagava os tributos existentes em Portugal.
No período de 1530 a 1580, quando houve avanço na produção do açúcar de cana não refinado, a atividade comercial em si era muito rendosa, mas mesmo assim cobravam-se inúmeros tributos, principalmente taxas, existentes em Portugal, para manutenção da burocracia portuguesa em terras da colônia.
No período de 1580-1640, conhecido como União Ibérica, quando a coroa espanhola passou a controlar também a coroa portuguesa, o Brasil passou a ser domínio do então império espanhol. Nesse período, os holandeses ocuparam Pernambuco, e o sistema tributário nessa então província seguiu regras dos flamengos.
Entre 1640 e 1808, que passa pela restauração da coroa portuguesa até a vinda da família real para o Brasil, tivemos as seguintes etapas: 1) 1640-1700 – Portugal desliga-se da coroa espanhola(restauração portuguesa), pagando caro por isso, pois perdeu grande parte das colônias da África e da Ásia e ficou de cofres vazios. Volta-se então para o Brasil, num acirramento da colonização. Registra-se a centralização político-administrativa, com grande opressão fiscal. Os holandeses são expulsos de Pernambuco(1654), pelo que se cobrou uma taxa dos colonos para contratação de tropas mercenárias. Com a decadência da produção açucareira do Brasil(os holandeses, daqui expulsos, passaram a explorar a produção de açúcar de cana nas Antilhas e, como era de melhor qualidade, ganharam o mercado consumidor europeu), os bandeirantes portugueses iniciaram a exploração de metais e pedras preciosas(década de 80 do Séc. XVII). 2) 1700 a 1808 – Bandeirantes paulistas descobrem ouro em Minas Gerais. Portugal passa a depender da Inglaterra, dependência essa ratificada no Tratado de Methuen(1703), pelo qual Portugal obriga-se a comprar tecidos dos ingleses e estes vinhos de Portugal, com grande desvantagem comercial para este(balanço comercial negativo). Aumentou a opressão fiscal no Brasil, em face das constantes dificuldades financeiras de Portugal. Quando a arrecadação de impostos caia, aumentava-se a carga tributária, com constantes mudanças na tributação. Ignorava-se a capacidade tributária . Os impostos eram fixos, per capita. Regressivos.
Em 1750, período pombalino(Marquês de Pombal), há registro da queda na produção do ouro. Então passou a ser comum a derrama, cobrança periódica de impostos atrasados, causando preocupação nas elites da colônia e provocando os primeiros movimentos de libertação, dentre os quais destaca-se a Inconfidência Mineira, que gerou o mártir Tiradentes, Joaquim José da Silva Xavier.
No ano de 1808, a família real, fugindo do francês Napoleão Bonaparte, muda-se para a colônia Brasil. Novos impostos foram criados, para custear a estadia da família real. A nova opressão fiscal dá origem à Revolução de 1817, em Pernambuco. Primeira república dentro do Brasil, que foi massacrada em pouco tempo. Nesse período, é criado o Banco do Brasil(1808) e a Fazenda Real(1808).
No período de 1822-1831, o Brasil desvincula-se juridicamente de Portugal, dele ficando independente, mas a estrutura econômica, social e política continua a mesma. Houve poucas mudanças no campo dos tributos. As taxas alfandegárias continuaram sendo as responsáveis pela maior fonte de arrecadação. As aventuras militares, internas e externas, do Imperador, foram cobertas com o aumento da carga tributária, e com empréstimos externos.
No período das Regências, 1831-1840, D. Pedro I é vencido pela aristocracia rural brasileira e é obrigado, em 07.04.1831, a renunciar. Como D. Pedro II era menor, criou-se o Governo Regencial, até o advento da sua maioridade. Estoura no sul do País, Rio Grande do Sul(RS) e Santa Catarina(SC), a revolta farroupilha, contra o excesso de tributos que incidia sobre a carne de charque e o couro, então principais produtos dessa região.
Período de 1840-1889, II Império, sob a regência de D. Pedro II, que, com a finalidade de evitar as rebeliões do período regencial, foi coroado com apenas 15 anos de idade, quando então a aristocracia rural assumiu de uma vez por todas o poder político-econômico. Surgiu o período da grande produção do café, podendo esse período ser subdividido em: 1840 a 1870 – domínio da aristocracia rural do centro-sul. A mão de obra escrava e a exportação formavam o carro chefe da economia. Taxas alfandegárias continuaram sendo o forte da receita tributária estatal. Em 1844, criou-se a Tarifa Alves Branco, sobretaxa para produtos importados, visando proteger a produção nacional e aumentar a arrecadação do Tesouro; 1870 a 1889 – o País sentiu os efeitos da Lei Eusébio de Queirós, de 1850, que proibiu o tráfico de escravos. O dinheiro que era empregado no tráfico negreiro, foi destinado à indústria(então nascente), ao comércio e a área financeira. Há o início do processo de imigração de estrangeiros para o Brasil, para substituir a extinta mão de obra escrava. O café passa a ser a estrela da economia. Surge o trabalho assalariado. O sistema tributário adaptou-se a essa nova ordem, beneficiando as regiões mais ricas do País, na aliança entre o Exército Brasileiro e as oligarquias cafeeiras do oeste paulista.
No período de 1889-1930, os Estados-membros da recém-instalada República Federativa do Brasil tinham grande autonomia tributária, cabendo a cada um deles fixar sua política tributária. Havia grande descentralização político-administrativa.
No tempo da ditadura Vargas, 1930-1945: exatamente no ano de 1930, o Brasil estava endividado, por conta dos empréstimos obtidos pelos Estados. A moeda nacional perdeu o seu lastro. Nesse mesmo ano, tivemos a “revolução” liderada por Getúlio Vargas, que gerou uma grande centralização. Os Estados ficaram proibidos de obter empréstimos externos, exceto com autorização do governo central. Buscou-se eliminar benefícios regionais e incentivar a industrialização. As relações trabalhistas passaram a ser mediadas pelo Estado. Instituiu-se a Consolidação da Legislação Trabalhista-CLT(1943). A política tributária adquiriu um caráter nacional. Incentivou-se fiscalmente a importação de máquinas e dificultou-se a importação de produtos que o País pudesse produzir. O sistema tributário passou a ser complexo.
O crescimento industrial continuou no período da denominada República Populista(1945 a 1964). Na época de Juscelino Kubitschek, a era JK(1955-1960), do grande plano de metas, “cinqüenta anos em cinco”, houve a criação de incentivos fiscais regionais(SUDENE e SUDAM).
As forças conservadoras, temendo o crescimento dos movimentos socialistas, apoiou um golpe militar e então o Brasil caiu na escuridão político-administrativa. Instalou-se no País um violento e autoritário regime militar. Os Generais passaram a se alternar na Presidência da República, eleitos por um colégio eleitoral, controlado no congresso nacional, por uma maioria do partido político que lhe dava apoio, integrado inclusive por senadores “biônicos”, que não eram eleitos, mas sim nomeados pelo Presidente-General. Nesse período, 1964-1985, houve grande crescimento econômico e aumento da carga tributária. Foram instituídas isenções tributárias, beneficiando grandes grupos econômicos. Disseminação dos subsídios para insumos industriais e para produtos de largo consumo popular(subvenções econômicas, previstas na Lei n. 4.320, de 1964). Esse período é de grande importância para o direito tributário, porque nele foi adotado o novo sistema tributário, pela Emenda Constitucional nº 18, de 1965, que entrou em vigor em 01.01.1966, sistema esse que foi mantido na Constituição de 1967 e na Emenda Constitucional nº 1, de 1969, com pequenas alterações. A Constituição de 1988 manteve sua estrutura, nele introduzindo alguns acréscimos, que indicaremos abaixo. Nele(sistema tributária da Emenda Constitucional nº 18, de 1965)surgiu a figura do empréstimo compulsório e foi instituído o Código Tributário, Lei nº 5.172, de 25.10.1966, o qual entrou em vigor em 01.01.1967, Código esse que, posteriormente, recebeu o adjetivo “Nacional”, pelo Ato Complementar nº 36, de 13.03.1967(art. 7º), adjetivo esse que teve por finalidade demonstrar que ele seria vinculante para todas as Unidades da Federação.
O regime militar findou no ano de 1985, com o retorno ao sistema democrático, no qual foi restabelecida a escolha do Presidente da República por eleições diretas. Em 1987, foi eleita uma Constituinte, que deu ao País a Constituição de 1988, publicada em 05 de outubro daquele ano, com um sistema tributário semelhante ao da Emenda Constitucional 18, de 1965 e da Constituição de 1967, modificando apenas algumas competências tributárias, criando a Seguridade Social e permitindo a instituição das respectivas Contribuições, numa clara demonstração que o controle econômico-financeiro do País não mudou.

NOTAS
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Nota 1 – Este trabalho corresponde ao Capítulo I de um livro Autor, denominado "Direito Tributário do Brasil: Aspectos Estruturais do Sistema Tributário Brasileiro", 2ª Edição, Olinda: Livro Rápido, 2010.
Boa parte das informações do Capítulo I do mencionado livro foram extraídas de AMARAL, Fernando José et NEGREIROS, Plínio José Labriola de Campos. "História dos Tributos no Brasil". São Paulo: Edições SINAFRESP, 2000. p. 212.

Nota 2 - Tenho que esta seja a origem do denominado Orçamento Cíclico, desenvolvido pelo economista John M. Keynes. Nesse sentido, SANTOS JR, Francisco Alves dos. Finanças Públicas, Orçamento Público e Direito Financeiro. 1ª Ed. Recife: Livro Rápido, 2008. p. 79[nota de rodapé 60].

Nota 3 - Mesmo antes, no ano de 1215(Séc. XIII), os Barões e o Clero britânicos, diante de um fragilizado Rei João Sem Terra, impuseram-lhe a chamada Carta Magna Libertatum, na qual o Rei se obrigou a instituir tributos apenas depois que o Conselho Geral do Reino o autorizasse por escrito a nomear cardeais indicados pelo Papa. Aí está, segundo a unanimidade da doutrina, a origem do princípio da Legalidade tributária(maiores detalhes, v., SANTOS JÚNIOR, Francisco Alves dos. Direito Tributário do Brasil: Aspectos Estruturais do Sistema Tributário Brasileiro, 2ª Edição, Olinda: Livro Rápido, 2010, p. 64[no Capítulo III, “O princípio da legalidade – Breves Dados Históricos”].

Nota 4 - Karl Marx esclarece que o dono do capital tem pavor da insegurança jurídica, por isso busca, desesperadamente, essa segurança, como garantia da manutenção do seu patrimônio, daí ter contribuído para a formação do Estado, garantidor, em tese, dessa segurança. MARX, Karl. A Questão Judaica. 2ª Ed. São Paulo: (n/c editora),1991, p. 14.

Nota 5 – SANTOS JÚNIOR, Francisco Alves dos. Op. cit. na Nota 2 supra, p. 15-16

domingo, 7 de novembro de 2010

CONTEINERS: PRAZO PARA LIBERAÇÃO PELA RECEITA FEDERAL. A DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO ADMINISTRATIVONA RECEITA FEDERAL

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 0003381-20.2010.4.05.8300 - Classe 126 – Mandado de Segurança
Impetrante: MSC – ........
Adv.: D. de S. A. – OAB/SP ...
Impetrado: INSPETOR DA RECEITA FEDEERAL NO PORTO DE SUAPE

Registro nº ..............................................
Certifico que registrei esta Sentença no Livro às fls..............
Recife, ........./........../2010.

Sentença tipo A


EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL. PRINCÍPIOS DA CELERIDADE E RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. CONTEINERS. PRAZO PARA DEVOLUÇÃO.
- O Legislador Ordinário, em obediência aos princípios da celeridade e da razoável duração do processo, fixou prazo de 360(trezentos e sessenta)dias para o julgamento dos processos administrativos, na órbita federal.
- Concessão da segurança.



Vistos etc.

MSC LTDA impetrou, em 04.03.2010, o presente “Mandado de Segurança c/c Pedido de Liminar”, contra ato da UNIÃO, representada pelo INSPETOR DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL NO PORTO DE RECIFE, e EADI RECIFE, neste ato representado pelo GERENTE GERAL DO TERMINAL, aduzindo, em síntese, que dois equipamentos de transporte permaneceriam retidos desde a descarga no Porto de Suape; que as autoridades aduaneiras insistiriam em descumprir os prazos legais para início do processo de abandono e decretação do perdimento, conforme preceituado pelo Regulamento Aduaneiro, Decreto nº 6.759/2009 e legislação correlata; que a apreensão das unidades de carga seria ilegal; que as unidades estariam paradas no P orto de Suape há mais de 966 dias, sendo 483 dias cada; que, nos termos do disposto no art. 24, parágrafo único, da Lei nº 9.611/98, a unidade de carga, acessórios e equipamentos não constituiriam embalagem, sendo equipamentos destinados ao transporte de mercadorias; que a utilização de tais equipamentos para armazenagem de cargas seria indevida; que os importadores não teriam nacionalizado suas cargas, estando as cargas armazenadas nos mencionados contêineres, trazendo prejuízos diários ao transportador marítimo, eis que os contêineres seriam elementos essenciais à atividade fim do armador, o qual ficaria impedido de explorar livremente sua atividade econômica, em decorrência da retenção indevida da unidade destinada exclusivamente ao transporte de mercadorias; que o transportador marítimo não poderia sofrer as conseqüências pela inércia das autoridades aduaneiras em descumprir os prazos estabelecidos no Regulamento Aduaneiro, quanto à destinação final das cargas abandonadas; que as cargas teriam sido depositadas junto ao EADI RECIFE, onde teriam permanecido; que a manutenção das cargas no interior dos contêineres configuraria retenção indevida e atrairia para o Estado a responsabilidade de indenizar o armador, nos termos do art. 37, § 6º da Constituição da República, a partir do momento de sua inércia, relativamente ao requerimento de desunitização dos contêineres. Alegou que o terminal depositário contaria com infra-estrutura necessária à armazenagem de produtos/mercadorias em processo de despacho aduaneiro, de importação, exportação, de cargas apreendidas pelas autoridades ou em processo de perdimento, também satisfazendo a assunção de responsabilidade tributária das cargas sob sua guarda, pela apresentação do competente termo de depositário fiel; que as unidades de carga estariam sendo utilizadas indevidamente pelas Autoridades Impetradas para armazenamento de mercadorias abandonadas/a preendidas. Teceu outros comentários. Transcreveu algumas decisões judiciais. Requereu a concessão de medida liminar para determinar a imediata desunitização das cargas e a devolução dos contêineres MSCU3038198 e MSCU3425089 depositados no EADI RECIFE; a “citação” das Impetradas, para prestar os esclarecimentos; a concessão final da segurança; a ouvida do Ministério Público Federal. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com instrumento de procuração e cópia de documentos (fls. 21/84).
Comprovante de recolhimento de custas (fl. 87).
À fl. 88, restou determinado que a Impetrante esclarecesse o local onde se encontrariam os contêineres, procedendo, se fosse o caso, à emenda da Inicial.
A Impetrante informou que os contêineres teriam sido descarregados no Porto de Suape, em 27.10.2008; que, todavia, no dia 17.11.2008, as unidades teriam sido removidas para o EADI Recife, no qual encontrar-se-iam paradas (fl. 91).
À fl. 92, foi determinada a notificação da Autoridade Impetrada para prestar informações, após o que seria apreciado o pedido de concessão liminar da segurança.
A União informou que teria interesse em ingressar no feito (fl. 96).
Notificada, a Autoridade Impetrada ofertou suas informações, às fls. 98/107, argumentando que os contêineres em questão teriam sido desembarcados no Porto de Suape, em outubro de 2008, procedentes do Porto de Bilbao; que cada um deles acondicionaria 20.000 kg de cebolinhas em conserva; que, em novembro de 2008, a mercadoria teria seguido em regime de trânsito aduaneiro para o recinto alfandegado EADI-Recife, a pedido de seu importador, International Commerce Recife Ltda; que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA teria considerado referida mercadoria imprópria para o consumo; que seu importador e seu destinatário final não teriam obtido o desembaraço aduaneiro da mercadoria; que dita mercadoria teria sido objeto de aplicação da pena de perdimento em 10.11.2009, em virtude do auto de infração nº 0415100/00136/09, lavrado com fulcro no inciso IV e § 1º do art. 23, do Decreto-lei nº 1.455/1946 c/c o inciso XIX do art. 105, do Decreto-lei nº 37/1966, por constituir mercadoria estrangeira atentatória à saúde pública; que, não havendo sido possível concluir o processo de destruição da mercadoria acondicionada nos contêineres, os mesmos continuariam impossibilitados de serem devolvidos à Impetrante; que a pena de perdimento não teria alcançado os dois contêineres; que a EADI do Recife padeceria de infra-estrutura capaz de comportar o crescimento acelerado do fluxo de comércio exterior; que a destruição dos produtos de origem vegetal apodrecidos, no caso os 40.000 kg de cebolinha em conserva, fosse por meio de depósito em aterro sanitário ou por incineração, envolveria um gasto excessivo para a Administração; que seria impossível os armadores não pre verem, em termos estatísticos, os riscos naturais e inerentes à atividade desempenhada; que a praxe seria o armador satisfazer as condições necessárias à destruição da mercadoria; que a Administração não seria a causadora dos transtornos suportados pela Impetrante, mas seus clientes; que a Impetrante disporia de recursos para cooperar no processo de desunitização e destruição da carga; que a Impetrante não teria provado que a propriedade dos aludidos contêineres seria sua; que os armadores transportariam em seus navios não somente cargas acondicionadas em seus próprios contêineres, mas também contêineres de seus concorrentes; que não se poderia qualificar a retenção dos contêineres pela Administração Pública como injusta; que não existiria espaço disponível na EADI-Recife apto a receber, sem riscos para a saúde pública e o meio-ambiente, os 40.000 kg de cebolinha em conserva estragados; que, nos termos do disposto no art. 23, da Lei nº 12.0 16/2009, já teria decaído o direito de a Impetrante de requerer mandado de segurança. Fez outros comentários. Ao final, arrematou que não haveria violação a direito líquido e certo da Impetrante. Juntou cópia de documentos (fls. 108/113).
YOLANDA LOGÍSTICA ARMAZÉM, TRANSPORTES E SERVIÇOS GERAIS LTDA prestou informações, às fls. 114/115, suscitando preliminarmente sua ilegitimidade passiva ad causam, eis que não se enquadraria no conceito de autoridade coatora; que seria uma Estação Aduaneira de Interior (EADI), a qual funcionaria mediante permissão da Secretaria da Receita Federal para prestar serviços públicos de movimentação e armazenagem de mercadorias, carga geral e/ou frigorificada; que seria legitimada para receber, sob controle da Secretaria da Receita Federal, mercadorias importadas e mercadorias destinadas à exportação, assim como processar todos os serviços de despacho aduaneiro; que, por ordem da Vigilância Sanitária, ante a constatação de perecimento, as mercadorias teriam sido interditadas e a sua desova dos contêineres impossibilitada, culminando na decretação de perdimento das mercadorias; que não haveria como atribuir qualquer ilegalidade à Suplicante. Ao final, requereu sua exclusão do pólo passivo e o indeferimento da segurança. Pediu deferimento. Juntou cópia de documentos (fls. 116/154).
Na decisão de fls. 159-160, foi acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam da EADI-RECIFE, sendo a Impetrante condenada ao pagamento de verba honorária arbitrada no valor de R$ 1.500,00.
Na decisão acima referida, também restou deferida a concessão liminar da segurança.
A Impetrante noticiou a revogação da nomeação de advogados (fl. 167).
À fl. 171, a União noticiou o cumprimento da ordem judicial, requerendo a extinção do feito, nos termos do art. 267, inciso VI, do CPC, face à perda superveniente do interesse da Impetrante. Juntou cópia de documentos (fls. 172/174).
O Ministério Público Federal apresentou Parecer, às fls. 176/177, opinando no sentido de que o cumprimento da decisão que concedera a segurança liminarmente não esgotara o objeto deste mandado de segurança e por sua concessão definitiva, convalidando a decisão liminar concedida.
Às fls. 178/181, a Impetrante interpôs recurso de apelação em face da decisão de fls. 159/160.
Referido recurso de apelação não foi recebido, conforme decisão de fls. 184/184-vº.
A Impetrante pediu reconsideração da decisão de fls. 159/160, relativamente à condenação ao pagamento de honorários advocatícios em favor da EADI-RECIFE (fls. 186/187).
Vieram os autos conclusos para sentença.

É o Relatório.
Passo a decidir.

Matérias Preliminares

Condenação ao pagamento de honorários advocatícios em favor da EADI-RECIFE

Na decisão de fls. 159/160, restou acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam da AEDI-RECIFE, explorada sob permissão pela Empresa YOLANDA LOGÍSTICA ARMAZÉM, TRANSPORTES E SERVIÇOS GERAIS LTDA, havendo sido a Impetrante condenada ao pagamento de verba honorária em favor daquela.
Às fls.186/187, a Impetrante requereu a reconsideração da mencionada decisão, invocando o enunciado da Súmula nº 512 do C. STF e o art. 25 da Lei nº 12.016/2009.
Reconhecida a ilegitimidade passiva ad causam, em face do princípio da causalidade, são devidos os honorários advocatícios, em virtude de ter sido a parte ilegítima obrigada indevidamente a vir a juízo para defender-se.
Ocorre que, à luz do contido no art. 25 da Lei nº 12.016/2009, em se tratando de mandado de segurança, é incabível a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios.
Merece, portanto, ser parcialmente revogada a decisão de fls. 159/160, apenas para excluir a parte final do item “a” de sua conclusão, de modo a afastar a condenação da Impetrante ao pagamento de honorários advocatícios à AEDI-RECIFE, mantidos os demais termos da referida decisão.

Perda de Objeto

A União, na petição de fl. 171, pugnou pela extinção do processo, sem apreciação do mérito, com base no art. 267-VI do Código de Processo Civil, porque a Autoridade apontada como coatora teria cumprido a decisão concedida liminarmente, de forma que ter-se-ia esgotado o objeto deste mandamus.
A d. Procuradora da República, Dra. Mona Lisa Duarte Abdo Aziz Ismail, no r. parecer de fls. 176-177, trouxe resposta adequada a essa pretensão, demonstrando, com base em r. julgado do TRF da 2ªR(processo nº 9602045345/RJ, Classe AMS - 14998, 6ª Turma, julgado em 06.08.2002, TRF 200084858, DJU de 19.09.2002, p. 319, Relator Juiz Franca Neto)que a concessão liminar de segurança, quando cumprida pela Autoridade, não esgota o objeto do feito e não pode implicar em extinção do processo, sem resolução do mérito, porque o mérito já foi apreciado, cabendo ao juiz apenas confirmar aquela decisão.
Assim, mencionada matéria, de cunho preliminar, não merece acolhida.

Prejudicial ao exame de mérito - decadência

A Autoridade Impetrada sustentou que, nos termos do disposto no art. 23, da Lei nº 12.016/2009, já teria decaído o direito de a Impetrante manejar o presente mandado de segurança.
Neste mandamus, a Impetrante pleiteia a liberação dos contêineres MSCU 3038198 e MSCU 3425089, os quais, segundo alega, estariam sendo retidos pela Autoridade Coatora.
Pois bem.
Assim dispõe o art. 23, da Lei nº 12.016/2009, verbis:
Art. 23. O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado.
O ato apontado como coator reside na omissão da Autoridade Impetrada em liberar os contêineres referidos na Petição Inicial.
Ora, contra ato omissivo da Autoridade Coatora não corre o prazo decadencial de 120 dias, de que trata o artigo supra mencionado.
É que, em se tratando de ato omissivo da Administração, em razão de tal peculiaridade, o aludido prazo se renova diariamente, não havendo, pois, que se falar em início da contagem do prazo decadencial para a impetração do writ e, muito menos, da decadência.
Nesse sentido, observem-se os arestos abaixo colacionados:
PROCESSUAL CIVIL. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DA EXATA COMPREENSÃO DA CONTROVÉRSIA. INADMISSÃO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 284/STF. ATO OMISSIVO. NÃO OCORRÊNCIA DA DECADÊNCIA. ART. 18 DA LEI 1.533/51. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. I - A mera alusão ao malferimento de legislação federal, sem particularizar o gravame ou descompasso na sua aplicação, não enseja a abertura da via especial, a teor da Súmula 284/STJ. II - Conforme reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o prazo decadencial para impetração do mandado de segurança é de 120 (cento e vinte) dias, contados a partir da efetiva constrição ao pretenso direito líquido e certo invocado. Em se tratando de ato omissivo continuado, o praz o decadencial para se impetrar a ação mandamental se renova mês a mês, por envolver obrigação de trato sucessivo. III - Agravo interno desprovido.
(AGA 200500428018, GILSON DIPP, STJ - QUINTA TURMA, 13/03/2006) (G.N.)

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO. REFORMA AGRÁRIA. INVASÃO DE IMÓVEL. CONFLITO FUNDIÁRIO DE CARÁTER COLETIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ATO OMISSIVO. PRAZO DE IMPETRAÇÃO. 1. Em se tratando de mandado de segurança contra ato omissivo, enquanto persistir a situação jurídica omissiva haverá tempo hábil para o ajuizamento do writ, não incidindo na hipótese o prazo decadencial de 120 dias (Lei nº 1.533/51 - art. 18), dada a inocorrência do termo inicial para sua fluência. 2. O imóvel rural de domínio público ou particular objeto de esbulho possessório ou invasão motivada por conflito agrário ou fundiário de caráter coletivo não será vistoriado, avaliado ou desapropriado nos dois anos seguintes à desocupação, ou no dobro desse prazo, em caso de reincidência. (Cf. art. 2º, § 6º - Lei nº 8.629, de 15/02/93, acrescido pela MP nº 2.183 - 56, de 24/08/01.) 3. Improvimento da apelação e da remessa oficial.
(AMS 200133000189953, DESEMBARGADOR FEDERAL OLINDO MENEZES, TRF1 - TERCEIRA TURMA, 07/05/2004) (G.N.)

REVERSÃO DE PENSÃO - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO - ART. 18 DA LEI 1533/51 I - O processo foi extinto sem julgamento do mérito nos termos do art. 18 da Lei 1533/51, que determina que o direito da parte impetrar Mandado de Segurança extinguir-se-á decorridos cento e vinte dias contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado. II - O impetrante não se manteve inerte, mas aguardando o seu pedido de habilitação. III - Contra ato omissivo continuado da apelada, não corre o prazo decadencial de 120 dias, de que trata o art. 18, da ei 1533/51. IV - Apelação provida para determinar o retorno dos autos à Vara de origem, para regular prosseguimento do feito.
(AMS 199902010366444, Desembargadora Federal TANIA HEINE, TRF2 - TERCEIRA TURMA, 02/06/20 03)
Tem-se, então, que esta prejudicial não merece acolhida.

Mérito

Nos presentes autos, a Impetrante pretende a desunitização das cargas e a devolução dos contêineres MSCU3038198 e MSCU3425089 depositados no EADI RECIFE, os quais, segundo alega, estariam parados no Porto de Suape há mais de 966 dias.
De outro turno, a Autoridade Impetrada sustenta que as mercadorias transportadas pela Impetrante teriam sido consideradas impróprias para o consumo pela ANVISA, motivo pelo qual teriam sido submetidas à pena de perdimento, com base no inciso IV do art. 23 e respectivo § 1º do Decreto-lei nº 1.455, de 1976 [1] c/c o inciso XIX do art. 105 do Decreto-lei nº 37, de 1966 [2]. Acrescenta, ainda, que, por não dispor de local próprio para a respectiva armazenagem, as mercadorias permaneceram armazenadas nos conteiners.
À luz dos dispositivos invocados pela própria Autoridade Impetrada, observa-se que inexiste base para punir o transportador, retendo os seus conteiners.
É que, sendo tais conteiners instrumentos de transporte, não se confundem com as mercadorias que são neles transportadas.
Ora, é sabido que a Administração Pública rege-se pelos princípios da legalidade e da restritividade, de modo que seu agente só pode fazer o que foi previsto em lei.
Assim, à míngua de base legal, a omissão da Autoridade Impetrada em proceder à desunitização e à devolução dos conteiners indicados na Petição Inicial findou por trazer prejuízos econômico-financeiros à Impetrante.
Destarte, a punição há de ser imposta ao importador, não à Impetrante.
O que não se pode permitir é que, sob a alegação de inexistir local apropriado para armazenar as mercadorias em questão, a Autoridade Impetrada retenha indefinidamente os conteiners da Impetrante.
Exsurge visível, então, a problemática da eficiência, celeridade e duração razoável do processo.
O princípio da eficiência foi constitucionalizado pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998, que deu ao art. 37 da Constituição da República a seguinte redação: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)”. Figurou como precursor dos princípios da celeridade e da duração razoável do processo, constitucionalizados, como direito individual dos brasileiros, com a Emenda 45, de 2004, que acrescentou inciso ao rol dos direitos e garantias individuais do art. 5º da Constituição da República, com a seguinte redação:
“LXXVIII. A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”.
Finalmente, a Lei nº 11.457, de 15.03.2007, que trouxe grande inovação na Administração Pública Tributária Federal, criando o que a imprensa denominou de SUPER RECEITA, buscando implementar, na prática, referidos princípios constitucionais, veiculou a seguinte regra no seu art. 24:
“Art. 24. É obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos do contribuinte.”
Ante tal situação, cabe ao Judiciário obrigar a Administração Pública a cumprir os mencionados princípios constitucionais e o referido prazo legal, de modo a que os direitos dos administrados sejam respeitados.
À vista da fundamentação supra, deve o pedido do presente mandamus ser julgado procedente e a segurança definitivamente concedida.

Conclusão:

POSTO ISSO: a) revogo a decisão de fls. 159/160 apenas na parte em que a Impetrante foi condenada a pagar verba honorária à AEDI-RECIFE; b) indefiro a preliminar de perda do objeto deste mandamus, levantada pela União, na petição de fl.171; c) rejeito a prejudicial de decadência; d) convalido a decisão de fls. 159/160, na parte em que foi concedida liminarmente a segurança e julgo procedente o pedido, tornando definitiva a segurança ali concedida.
Condeno a União a ressarcir as custas despendidas pela Impetrante, atualizadas desde a data do efetivo desembolso.
Sem honorários, ex vi art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009.
Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório (§ 1º do art. 14 da Lei nº 12.016/2009).
Dê-se ciência ao Ministério Público Federal.
P.R.I.

Recife, 05 de novembro de 2010.

Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal da 2ª Vara – PE

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

O ABONO DE PERMANÊNCIA E O IMPOSTO DE RENDA

Por Francisco Alves dos Santos Jr.

O Exmº Senhor Presidente do Superior Tribunal de Justiça - STJ,na Suspensão de Segurança-SS nº 2379, Recurso Especial-REsp.nº 1192556, suspendeu segurança que impedia a cobrança do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza sobre o valor do denominado abono de permanência, tendo alegado na sua decisão que a Primeira Seção desse Tribunal concluíra, em maio deste ano(2010), em julgado pelo rito dos recursos repetitivos (artigo 543-C do Código de Processo Civil), que esse imposto incidiria sobre referido valor, porque o abono de permanência não teria natureza indenizatória.
Esse abono é um instituto jurídico criado pela Emenda Constitucional nº 41, de 2003, pelo qual o Servidor Público que continuar na ativa, embora já tenha cumprido o tempo necessário para a aposentadoria, deixará de pagar a respectiva contribuição previdenciária, tendo, assim, indiretamente, uma majoração nos seus ganhos mensais, correspondente ao percentual dessa contribuição, que na área federal é de 11%(onze por cento).
Por outro lado, gera uma economia para os cofres públicos, pois dispensa a Fazenda Pública de contratar um novo Servidor Público.
A quase unanimidade dos Juízes Estaduais e Federais, entre os quais me incluo, bem como dos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais do Brasil, vinha entendendo que essa parcela, acrescida aos rendimentos mensais do Servidor Público, teria natureza indenizatória, porque sua finalidade seria indenizar o servidor público pelo não gozo da aposentadoria. E nessa situação, à luz do art. 43 do Código Tribunal Nacional, não sofreria incidência do imposto acima mencionado, porque não implicaria em aumento do seu patrimônio, posto que apenas faria a reposição de uma perda: o imediato gozo da aposentadoria.
Cabe lembrar que o mesmo Superior Tribunal de Justiça até já sumulou sua jurisprudência para casos semelhantes: valor recebido por licença prêmio não gozada e abono de férias de 10(dez)dias.
Como se sabe, esse imposto só incide sobre a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou de proventos de qualquer natureza que implique em aumento do patrimônio e é por isso que não incide sobre nenhum tipo de verba indenizatória, porque esse tipo de verba não aumenta o patrimônio, pois apenas repõe a este alguma perda por ele sofrida.
No entanto, como vimos acima, este não foi o entendimento do Superior Tribunal de Justiça para o valor do abono de permanência, que considerou como um mero rendimento, sem qualquer natureza indenizatória, pelo que, ao sentir dos seus d. Ministros, sobre ele incide o Imposto em questão.
Mas, como o assunto envolve direito constitucional, qual seja, o ferimento ao princípio da legalidade, segundo o qual nenhum tributo pode ser exigido ou aumentado, sem base em lei(art. 150, inciso I da Constituiçõa da República), certamente virá a ser examinado pelo Supremo Tribunal Federal, onde, esperamos, venha a ser reconhecida a não incidência do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza sobre o valor do abono de permanência, pois, data maxima venia, renda não é, mas sim mera indenização.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

EXECUÇÃO DE SENTENÇA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EMBARGOS À EXECUÇÃO. NÃO CABIMENTO

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Segue uma sentença, na qual se indefere de plano uma ação de embargos à execução de um julgado envolvendo obrigação de fazer. Analisa-se omissão na legislação que reformou o Código de Processo Civil no ano de 2006 e aponta-se uma solução, à luz do princípio constitucional da ampla defesa, indicando-se um precedente do Superior Tribunal do Justiça, tendo por relator o conhecido processualista Ministro Teori Zavascki.

Boa leitura!






PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA


Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 0006995-33.2010.4.05.8300 Classe 73 Embargos à Execução
Embargante(s): E. V. A.
Adv.:Ricardo Russel Brandão Cavalcanti, Defensor Público Federal
Embargado(a)(s):
DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT
Adv.: Paulo Antonio Pessoa Crasto, Procurador Federal.





Registro nº
Certifico que eu, ___________________, registrei esta Sentença às fls. ____________.
Recife, ____/____/20___



Sentença tipo C



Ementa: - EXECUÇÃO. DEMOLIÇÃO. OBRIGAÇÃO DE FAZER.

Como não há mais a execução autônoma da sentença que fixa obrigação de fazer, também não cabe mais a ação de embargos à execução.

Indeferimento de plano da petição inicial.

Extinção do Processo, sem resolução do mérito.



Vistos, etc.


E. V. A., por intermédio de Defensor Público Federal, interpôs à execução de sentença demolitória, que se processa nos autos da ação de demolição, processo nº 2004.83.00.0112943-4, proposta pelo DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT , esta ação de embargos à execução do julgado, onde o I. Defensor Público alega que não tem conseguido manter contacto com o ora Embargante, pelo que este deveria ser intimado pessoal; que o imóvel a ser demolido seria a casa do ora Embargante e que o direito à moradia deste e de sua família seria um direito humano, positivado como fundamental na atual Constituição da República; ante mencionada situação, urgiria fosse a ordem de demolição, lançada nos autos principais, suspensa, até que o ora Embargante visse a juízo para informar qual a situação atual do imóvel, bem como a sua e de sua família e qual o prazo necessário para que pudesse cumprir a ordem judicial; por isso requereu a suspensão da execução do julgado e intimação pessoal do Embargante, para os fins acima indicados.Deu valor à causa e p. deferimento.

É o relatório.
Passo a decidir.

Fundamentação

Esta ação de embargos à execução do julgado merece ser indeferida de plano, por impropriedade do meio processual escolhido(art. 295, inciso V, do Código de Processo Civil), com a conseqüente extinção do processo, sem resolução do mérito(art. 267, inciso I, do Código de Processo Civil).
Antes de o Código de Processo Civil ser modificado pela Lei nº 11.382, de 2006, existia a figura dos Embargos à Execução da Sentença que fixasse obrigação de fazer ou de não fazer, então prevista no inciso IV do art. 738 do referido Código. Mas, esse dispositivo foi revogado por mencionada Lei, porque deixou de existir a ação autônoma de execução nos autos principais. Agora, a Parte Executada é apenas intimada para cumprir a Sentença(art. 461 do Código de Processo Civil) .
O Legislador foi omisso, na reforma do Código de Processo Civil, quanto à forma de defesa do Executado nas execuções de sentença das obrigações de fazer e de não fazer, posto que as regras do art. 462 desse diploma dizem respeito a providências que devem ser tomadas antes da sentença.
No entanto, tendo em vista o princípio constitucional da ampla defesa(art. 5º-LV da Constituição da República) , tenho que o Executado poderá, por simples petição, nos autos principais, impugnar a execução, mediante aplicação analógica do final do § 1º do art. 475-J do referido Código.
E nesse sentido, embora não se referindo a aplicação analógica do final do § 1º do art. 475-J do Código de Processo Civil, foi o norte dado pela 1ª Turma do E. Superior Tribunal de Justiça, sob a relatoria do processualista Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, a seguir transcrito:

"PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. SENTENÇA EXECUTIVA LATO SENSU (CPC, ART. 461). EMBARGOS À EXECUÇÃO. CABIMENTO
1. A ausência de debate, na instância recorrida, sobre os dispositivos legais cuja violação se alega no recurso especial atrai, por analogia, a incidência da Súmula 282 do STF.
2. No atual regime do CPC, em se tratando de obrigações de prestação pessoal (fazer ou não fazer) ou de entrega de coisa, as sentenças correspondentes são executivas lato sensu, a significar que o seu cumprimento se opera na própria relação processual original, nos termos dos artigos 461 e 461-A do CPC. Afasta-se, nesses casos, o cabimento de ação autônoma de execução, bem como, conseqüentemente, de oposição do devedor por ação de embargos.
3. Todavia, isso não significa que o sistema processual esteja negando ao executado o direito de se defender em face de atos executivos ilegítimos, o que importaria ofensa ao princípio constitucional da ampla defesa (CF, art. 5º, LV). Ao contrário de negar o direito de defesa, o atual sistema o facilita: ocorrendo impropriedades ou excessos na prática dos atos executivos previstos no artigo 461 do CPC, a defesa do devedor se fará por simples petição, no âmbito da própria relação processual em que for determinada a medida executiva, ou pela via recursal ordinária, se for o caso.
4. Tendo o devedor ajuizado embargos à execução, ao invés de se defender por simples petição, cumpre ao juiz, atendendo aos princípios da economia processual e da instrumentalidade das formas, promover o aproveitamento desse ato, autuando, processando e decidindo o pedido como incidente, nos próprios autos. Precedente da 1ª Turma: REsp 738424/DF, relator para acórdão Ministro Teori Albino Zavascki, DJ de 20.02.2006 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido.
(RESP 200800539970, TEORI ALBINO ZAVASCKI, STJ - PRIMEIRA TURMA, 01/10/2008).".
Constato, nos autos principais, que o ora Embargante foi localizado pela Oficiala de Justiça e fez pleito semelhante ao consignado na petição inicial desta imprópria ação de embargos à execução do julgado, pelo que tenho por desnecessária a providência indicada no acima transcrito julgado do E. Superior Tribunal de Justiça, qual seja, entranhar nos autos principais a petição inicial desta ação, para ali ser apreciada.

Conclusão

Posto isso, indefiro de plano a petição inicial desta ação de embargos à execução do julgado, em face da impropriedade do meio processual escolhido(art. 295-V do Código de Processo Civil) e dou este processo por extinto, sem resolução do mérito(art. 267-I do Código de Processo Civil).
Sem custas e sem verba honorária, ex lege.
Traslade-se cópia desta sentença para os autos principais, nos quais haverá decisão quanto à impugnação já apresentada pelo ora Embargante.


P.R.I.

Recife, 28 de setembro de 2010.


Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE


OBSERVAÇÃO:

NOS AUTOS PRINCIPAIS(AÇÃO DE DEMOLIÇÃO), EM FASE DE EXECUÇÃO DA SENTENÇA, O RÉU-EXECUTADO INTERPÔS UMA PETIÇÃO DE "IMPUGNAÇÃO", QUE GEROU A SEGUINTE DECISÃO:


PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª REGIÃO
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
2a. VARA FEDERAL

Processo nº 0022943-25.2004.4.05.8300 Classe: 139 MEDIDA CAUTELAR DE INTERDIÇÃO OU DEMOLIÇÃO DE PRÉDIO

C O N C L U S Ã O

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

Recife, 09/08/2010

Encarregado(a) do Setor


D E C I S Ã O


Considerando que inúmeros imóveis de alvenaria foram construídos na mesma rua do imóvel do ora Requerido, de forma que a demolição isolado do seu imóvel não resolverá o problema da rodovia, descrito na petição inicial.
Considerando que o próprio ora Exeqüente juntou documentos nos autos, expedidos por órgãos da sua estrutura administrativa, informando que não há como fiscalizar e impedir o surgimento dessas construções e de outras que advirão.
Considerando que o Executado, ora Requerente, é pessoa de parcas posses e não tem para onde mudar-se com sua esposa e o seu filho menor.
Suspendo a determinação para expedição do mandado de demolição do imóvel do ora Réu e determino que se abra vista ao Exeqüente para manifestar-se sobre o pedido de fls. 97/97vº, bem como sobre as fotografias e documentos que a instruem.

P. I.

Recife, 29 de setembro de 2010

Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE

sábado, 25 de setembro de 2010

FINANÇAS PÚBLICAS: TRANSFERÊNCIAS VOLUNTÁRIAS

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


O texto que segue foi extraído do Livro do Autor deste trabalho, denominado “Finanças Públicas, Orçamento Público e Direito Financeiro”, Olinda: Livro Rápido, 2008, que pode ser adquirido em www.livrorapido.com, ou na Livraria Imperatriz, na cidade do Recife-PE.

A dinâmica social, não poucas vezes, faz surgir a necessidade de determinada Entidade Pública, principalmente a União, fazer transferências financeiras não obrigatórias para os Estados e para os Municípios, em decorrência de problemas financeiro-sociais que estes venham a ter no dia-a-dia da execução orçamentária. Idem dos Estados para os municípios. Então, quando isso acontece, estamos diante das denominadas Transferências Voluntárias.
Obs.1: As transferências obrigatórias são aquelas que um Ente Público é obrigado, por regra constitucional ou legal, a fazer para outro ou para outros Entes Públicos, tais como as transferências constitucionais dos artigos 157 a 159 da Constituição da República, as previstas na Lei Complementar nº 87, de 1996, na Lei nº 9.424, de 1996 e etc.
A Lei nº 4.320, de 1964, embora não se utilize da expressão Transferência Voluntária, além de não vedá-la, delineia várias situações que caracterizam essa modalidade de transferência. Por exemplo, quando trata das transferências correntes e de capital, exigindo apenas que o destinatário esclareça o destino que dará ao dinheiro que vai receber, para que o remetente faça a classificação do tipo de despesa de transferência: se o destinatário for gastar o dinheiro com despesa corrente, o remetente classificará a remessa do dinheiro como despesa corrente, da modalidade “transferência corrente”; se o destinatário for realizar despesa de capital, o remetente classificará a remessa como despesa de capital, “transferência de capital” (v. §§ 2º e 6º do art. 12 dessa Lei). O destinatário, quando recebe o respectivo valor, classifica como receita corrente ou de capital, modalidade “transferência corrente” ou “transferência de capital”, dependendo do que informou ao remetente. Quando vai gastá-lo, classifica o valor como despesa corrente ou de capital e o tipo de despesa que vai efetuar, por exemplo, se com material de consumo, despesa corrente, modalidade custeio, se com construção de um prédio, despesa de capital, modalidade investimento.
A Transferência Voluntária pode ser feita entre as pessoas jurídicas de direito público que têm competências tributárias (União, Estados, Distrito Federal e municípios), bem como entre elas e as demais pessoas jurídicas da Administração Pública. E tanto aquelas como estas podem fazer Transferências Voluntárias entre si e também para instituições privadas, aqui com limitações, como veremos a seguir.
A Lei nº 4.320, de 1964, estabelece que as Transferências Voluntárias podem caracterizar-se como subvenções sociais e também como subvenções econômicas (§ 3º do seu art. 12 e, respectivamente, arts. 16-17 e 18-19), modalidade despesa corrente ou despesa de capital. Dependerá da sua aplicação no destinatário.
A subvenção social é aquela destinada a instituição pública ou privada de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa, no campo médico e educacional (inc. I do § 3º do art. 12 c/c art. 16 da Lei nº 4.320, de 1964). A entidade, pública ou privada, para receber esse tipo de subvenção deve ser submetida à fiscalização do ente público que vai fazer a transferência e este só a concretizará se o ente destinatário tiver condição satisfatória de funcionamento, tanto no campo técnico-instrumental, como no campo contábil-financeiro, comprovando-se efetivamente sua finalidade não-lucrativa.
A subvenção econômica é utilizada nas seguintes situações: 1) para cobertura de déficits de manutenção das empresas públicas, de natureza autárquica ou não (art. 18 da Lei nº 4.320, de 1964); 2) para cobertura de diferença entre os preços de mercado e os preços de revenda, pelo governo, de gêneros alimentícios ou outros materiais (alínea “a” do parágrafo único do art. 18 da referida Lei); 3) para pagamento de bonificações a produtores, públicos ou privados, de determinados gêneros ou materiais (alínea “b” do parágrafo único do art. 18 da mesma Lei).
A subvenção econômica pode ser destinada a empresa privada que tenha finalidade lucrativa, desde que não seja para despesa de investimento que se integre no seu patrimônio (art. 21 da Lei nº 4.320, de 1964) e haja lei especial autorizando (art. 19 da Lei nº 4.320, de 1964), e, óbvio, isso só acontecerá para resolver determinado problema econômico-social, de cunho industrial, comercial, financeiro, etc.
Eis alguns exemplos de subvenções econômicas, da espécie Despesa Corrente:
a) Lei nº 9.479, de 12.08.1997 (DOU de 13.08.1997), que concede subvenção econômica a produtores de borracha natural, correspondente à diferença entre os preços de referência das borrachas nacionais (fixados pelo Poder Executivo) e os dos produtos congêneres no mercado internacional, acrescidos das despesas de nacionalização. Aqui, é visível a intenção governamental: garantir a produção da borracha natural brasileira ante a produção estrangeira como forma de combater o dumping praticado pelo produtos estrangeiros.
b) Medida Provisória nº 1.517-1, de 01.10.1996, que autoriza o Poder Executivo a conceder subvenção econômica ao preço do óleo diesel adquirido para o abastecimento de embarcações pesqueiras nacionais, limitada ao valor da diferença entre os valores pagos por embarcações pesqueiras nacionais e estrangeiras. Nesse caso, busca-se baratear os custos dos pescados nacionais e também garantir emprego no setor.
c) Medida Provisória nº 1.512-22, de 23.04.1998 (DOU nº 77, de 24.04.1998, Seção 1), no artigo 2º, dando nova redação aos artigos 1º, 2º e 3º da Lei nº 8.427/92, autoriza o Poder Executivo a conceder subvenções econômicas a produtores rurais, sob a forma de equalização de preços de produtos agropecuários ou vegetais de origem extrativa e equalização de taxas de juros e outros encargos financeiros de operações de crédito rural (inclusive quanto aos saldos devedores de empréstimos rurais).
d) O Decreto-lei nº 79, de 19.12.1966, que autoriza o Poder Executivo a conceder subvenção econômica, mediante fixação de preço mínimo básico, para determinados produtos agrícolas.
No Decreto nº 2.557, de 22.04.1998, por exemplo, o presidente da República, com base no referido Decreto-lei, fixou o preço mínimo básico de aveia para a safra do inverno de 1997 no Rio Grande do Sul (DOU nº 76, de 23.04.1998, pág. 1).
O Decreto nº 2.558, de 22.04.1998, publicado no mesmo Diário Oficial, fixou os preços mínimos básicos do algodão, feijão, mamona, mandioca (raiz, farinha, raspa, goma e polvilho doce), milho, sorgo e sementes, da safra de 1998, para as regiões Norte e Nordeste.
As subvenções também recebem o nome de auxílios (por exemplo o art. 21 da Lei nº 4.320, de 1964).

Vedações
A propósito, como já destacado acima, esse artigo 21 veda a transferência voluntária para despesa de capital (modalidade investimento) que se incorpore ao patrimônio de empresa privada de fins lucrativos, enquadrando-se nessa vedação as transferências de capital à conta de fundos especiais ou dotações sob regime excepcional de aplicação (parágrafo único desse artigo).
Além da limitação por último referida, a Constituição da República a veda para custeio de despesas com pessoal ativo, inativo e pensionista dos Estados, Distrito Federal e municípios (inc. X do seu art. 167), e a Lei Complementar nº 101, de 2000, com sua ideologia liberal e controladora da Administração Pública, trouxe outras inúmeras limitações para as Transferências Voluntárias, a saber:
a) Não pode ser feita transferência para ente que não institua todos os impostos que estejam na sua competência tributária (parágrafo único do art. 11 dessa Lei Complementar).
Obs.2: a União até hoje não instituiu o imposto sobre grandes fortunas, previsto como de sua competência no inciso VII do artigo 153 da Constituição da República. Logo, não poderá receber esse tipo de transferência. Mas, na prática, a União não recebe transferências voluntárias, apenas faz esse tipo de transferência para os outros entes públicos.
Obs.3: A respeito das implicações dessa regra legal sobre o exercício da competência tributária, v. teses de outros autores e a nossa tese no nosso “Direito Tributário do Brasil: Aspectos Estruturais do Sistema Tributário do Brasil”, 2ª Edição, Olinda: Livro Rápido, 2010, p. 16-17(aquisição em www.livrorapido.com, ou na Livraria Imperatriz, na cidade do Recife-PE).
b) O Ente Público que não tiver dotação orçamentária específica para tal fim não poderá fazer transferência voluntária (inc. I do § 1º do art. 25 da Lei Complementar nº 101, de 2000).
O Ente destinatário só poderá receber se tiver dotação orçamentária de contrapartida para a respectiva despesa (alínea “d” do inc. IV do § 1º desse mesmo art.).
Exemplo: se a União quiser fazer uma transferência de recursos no valor de cem mil reais, a favor do Município de Milagres (CE), para este comprar material escolar para sua rede pública de ensino, a União terá que ter verba para tanto prevista na sua Lei do Orçamento Anual, como também terá que exigir que o Município Milagres-CE demonstre que tem na lei do seu orçamento anual destaque de verba necessária para complementar aquele valor (essa é a contrapartida).
c) A União não pode fazer esse tipo de transferência para gastos com pessoal (ativo, inativo ou pensionista) nos Estados, Distrito Federal e Municípios, e os Estados e o Distrito Federal não poderão fazer o mesmo para os Municípios (inc. III do mesmo dispositivo da Lei Complementar nº 101, de 2000 c/c inc. X do art. 167 da Constituição da República).
Aqui o legislador complementar busca deter a expansão da folha de pagamento de pessoal, a qual também restou limitada na referida Lei Complementar.
d) O Ente destinatário não poderá receber transferência voluntária de Ente do qual seja devedor de tributos, empréstimos, financiamentos ou que não tenha prestado conta da utilização de recursos anteriormente recebidos a título desse tipo de transferência (alínea “a” do inc. IV do § 1º desse art.).
e) O Ente destinatário também terá que comprovar que está cumprindo as regras constitucionais sobre gastos mínimos com educação e saúde públicas (alínea “b” do mesmo dispositivo legal).
Esse dispositivo, quanto às despesas com educação, embora não faça referência expressa, remete o seu aplicador ao artigo 212 da Constituição da República, bem como ao artigo 60 do seu Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que tratam dos percentuais mínimos de receitas que devem ser aplicados nesse setor.
E quanto à saúde pública, remete aos parágrafos 2º e 3º do artigo 198 da mesma Carta e à Lei Complementar prevista neste último parágrafo, ainda não editada e que fixará os percentuais mínimos de determinadas receitas que obrigatoriamente terão que ser destinadas à saúde pública, Lei Complementar essa que, quando editada, será reavaliada de cinco em cinco anos. Enquanto ela não for editada, o parágrafo 4º do artigo 77 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição da República estabelece que devem ser observados os percentuais fixados no caput e nos demais parágrafos desse artigo e subsidiariamente as regras da Lei nº 8.080, de 1990, com alterações indicadas no início deste tópico, e ainda da Lei nº 8.142, de 1990.
No entanto, de forma um tanto incoerente, mas talvez tendo em vista a importância dos setores no meio social do País, sobretudo o educacional, arrolados no parágrafo 3º do artigo 25 da Lei Complementar nº 101, de 2000, abre exceções e, para tais setores, admite a transferência voluntária, mesmo que tais limites tenham sido desrespeitados.
Não poderá receber transferência voluntária o Ente público que tiver ultrapassado o limite legal da dívida consolidada e da dívida mobiliária, bem como de operações de crédito (inclusive por antecipação de receita) e ainda de inscrição em Restos a Pagar e de despesa total com pessoal (alínea “c” do inc. IV do § 1º do art. 25 da Lei Complementar nº 101, de 2000).
f) Também não pode receber transferência voluntária o Ente da Federação que não cumprir as regras do artigo 51 e respectivo parágrafo 1º da Lei Complementar nº 101, de 2000, que obriga a União a promover, até o dia 30 de junho de cada ano, a consolidação e divulgação nacional das contas do exercício anterior, por esfera de governo, e para tanto os Estados, Distrito Federal e municípios são obrigados a encaminhar à União o resultado das suas contas nos prazos ali estabelecidos.
g) Submete-se à vedação, indicada por último, o Ente da Federação que não publicar, no prazo fixado no parágrafo 2º do artigo 55 da Lei Complementar nº 101, de 2000, o Relatório de Gestão Fiscal previsto no seu artigo 54 (§ 3º do art. 55 dessa Lei).
Obs.4: O § 2º do art. 55 da Lei Complementar nº 101, de 2000, fixa prazo de 30(trinta)dias, após o encerramento do período a que corresponder, para publicação desse Relatório, com amplo acesso ao público, inclusive por meio eletrônico.

Importante: Não são Consideradas Transferências Voluntárias

É importante destacar que as transferências destinadas ao Sistema Único de Saúde – SUS não se enquadram como transferências voluntárias, quer porque destas excluídas expressamente no final do artigo 25 da Lei Complementar nº 101, de 2000, quer porque, a meu sentir, são tidas por transferências obrigatórias, conforme se deflui dos parágrafos 1º e 2º do artigo 198 da Constituição da República, artigo 77 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias dessa Carta Magna e subsidiariamente dos artigos 31-32 da Lei nº 8.080, de 19.09.1990 (com alterações das Leis nº 9.836, de 1999, nº 10.424, de 2002, e nº 11.108, de 2005), e artigos 2º e 3º da Lei nº 8.142, de 28.12.1990, até que venha a lume a Lei Complementar prevista no parágrafo 3º do referido artigo 198 da Constituição da República.

sábado, 18 de setembro de 2010

TRATADOS INTERNACIONAIS: O QUE VEM A SER SUPRALEGAL OU LEI ESPECIAL?

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

A palavra supralegal, para identificar o Tratado ou a Convenção Internacional, foi utilizada pela primeira vez pelo Ministro Sepúlveda Pertence, na qualidade de relator do Habeas Corpus nº79.785/RJ, em 29.03.2000(DJU de 22.11.2002). Nesse julgado, o Plenário do Supremo Tribunal Federal negou o habeas corpus para pessoa presa por ter sido caracterizado como depositário infiel. Nessa época, o Supremo Tribunal Federal ainda entendia que a regra do inciso LXVII do art. 5º da Constituição da República(que autoriza a prisão do depositário infiel) prevalecia sobre cláusula da Convenção Americana dos Direitos Humanos, conhecida por Pacto de São José da Costa Rica, segundo a qual ninguém pode ser preso por dívida civil, com uma única exceção: inadimplência de pensão alimenícia. Ou seja, por essa Convenção Internacional, da qual o Brasil é signatário desde 1992, não se pode prender alguém por ser depositário infiel.
Só no ano de 2007, é que a palavra supralegal voltou a ser utilizada no Supremo Tribunal Federal, desta vez pelo Ministro Gilmar Mendes, no voto que lançou no julgamento do Recurso Extraordiário nº 466.343/SP, no qual o Plenário da referida Corte, sob a relatoria do Ministro Cézar Peluzo, mudou o seu posicionamento e passou a admitir que referida Convenção se sobrepunha à mencionada regra constitucional.
Nesse voto, o Ministro Gilmar Mendes adotou a tese segundo a qual a regra de Tratado ou de Convenção Internacional seria supralegal, mas estaria abaixo da Constituição e acima da Legislação interna. Neste particular, data maxima venia, há uma grande incoerência nesse voto, que foi repetido por esse Ministro, desta vez como relator, no habeas corpus nº90.172/SP, pois tanto no referido Recurso Extraordinário como neste Habeas Corpus deu-se à mencionada Convenção o mesmo status de norma constitucional, mediante aplicação do § 2º do art. 5º da Constituição da República, logo não se poderia dizer, como o disse esse Ministro, que o Tratado ou a Convenção Internacional estaria abaixo da Constituição.
Na década de cinquenta do século passado(Sec. XX), a 2ª Turma do mesmo Supremo Tribunal Federal denominara os Tratados e as Convenções Internacionais de lei especial, no voto do Ministro Relator Antonio Carlos Lafayette de Andrade, quando do julgamento da Apelação Civil nº 9.587, julgada em 21.01.1951.
Interessante notar que a Lei nº 8.212, de 24.07.91, no art. 85-A, nela acrescido pela Lei 9.876, de 26.11.1999, estabelece que as Convenções e os Tratados Internacionais, no campo da previdência social, serão recebidos no Brasil como lei especial, restando clara a influência sofrida pelo legislador daquele antigo julgado da Suprema Corte.
Supralegal ou lei especial não passam de criatividade de Ministros do Supremo Tribunal Federal e, data maxima venia, não têm nenhum conteúdo jurídico ou científico.
Por isso, propus, no meu livro "Direito Tributário do Brasil: Aspectos Estruturais do Sistema Tributário Nacional" 2ª Edição,Olinda: Livro Rápido, p. 123-124[www.livrorapido.com], ante a insuficiência das regras dos §§ 2º e 3º do art. 5º da Constituição da República, a revogação desses dois parágrafos e que seja alterado o art. 49 dessa Carta e também que se lhe acresça o art 49-A, neles incluindo regras bem claras, estabelecendo quando é que o Tratado ou a Convenção Internacional será recebido como regra constitucional, ou como regra equivalente à Lei Complemental e/ou como regra equivalente à Lei Ordinária, para que não fiquemos ao sabor da criatividade dos Ministros da nossa Suprema Corte que, como se sabe, são escolhidos por critérios políticos e não meritórios.
Inclusive, indicamos, no referido livro, um anteprojeto de PEC,com detalhadas regras a respeito do assunto, para onde remetemos os nossos eventuais leitores.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

IMPOSTO DE RENDA E A DECADÊNCIA DO DIREITO DE LANÇAR. A MULTA FISCAL E OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DO NÃO-CONFISCO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS NA DÍVIDA TRIBUTÁRIA

Segue uma Sentença na qual se discute: a) o problema do período-base do imposto de renda da pessoa física, a modificação do sistema anual para o sistema de bases correntes(mensais)e os respectivos reflexos no prazo de decadência para lançar esse tributo; b) a aplicação dos princípios da proporcionalidade e do não-confisco nas multas fiscais; e c) a capitalização dos juros da tabela SELIC.

Boa Leitura!

OBs.: O português da sentença foi revisado por Élbia Spenser, Assessora do Gabinete do Juiz da 2ª Vara Federal de Pernambuco. Essa Assessora também localizou, no site do STF, os julgados referidos no texto.




PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2006.83.00.006680-3 - Classe 29 – Ação Ordinária
Autor: J. B. L. L.
Adv.: .... - OAB/PE ...
Réu: UNIÃO
Procuradora da Fazenda Nacional


Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2010


Sentença tipo A


EMENTA:- CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO

Multa Fiscal, ante os princípios da proporcionalidade e do não-confisco, não pode ultrapassar o percentual de 30%(trinta por cento), segundo precedentes do C. Supremo Tribunal Federal.

Capitalização de juros de mora não comprovada.

Mantém-se a suspensão da exigibilidade do crédito tributário até que se finalize o seu questionamento judicial(aplicação do princípio da razoabilidade).

Procedência parcial.


Vistos etc.

J. B. L. L., pessoa física, qualificado nos autos, ajuizou, em 17.05.2006, a presente “Ação Ordinária, com pedido de liminar inaudita altera parte” contra a UNIÃO, aduzindo, em síntese, que a Receita Federal teria empreendido investigação fiscal nas movimentações financeiras e no patrimônio do Autor; que o Fisco Federal teria apontado algumas infrações, gerando o Processo Administrativo nº 10480.005244/2003-38; que teria sido apurado um débito total de R$ 322.920,78 (trezentos e vinte e dois mil, novecentos e vinte reais e setenta e oito centavos), sendo R$ 130.179,59 (cento e trinta mil, cento e setenta e nove reais e cinqüenta e nove centavos), relativos ao imposto, R$ 97.634,69 (noventa e sete mil, seiscentos e trinta e quatro reais e sessenta e nove centavos), concernentes à multa de 75%, multa isolada de R$ 3.772,50 (três mil, setecentos e setenta e dois reais e cinqüenta centavos) e R$ 91.334,00 (noventa e um mil, trezentos e trinta e quatro reais), referentes aos juros de mora; que a impugnação administrativa ofertada pelo Autor teria sido julgada improcedente; que a apuração ora questionada seria relativa ao imposto de renda pessoa física do ano calendário de 1998; que o lançamento do crédito tributário ocorrido em 27.05.2003, portanto, em período superior a 05 (cinco) anos; que a ação fiscal empreendida incluíra período atingido pela decadência; que o Fisco Federal teria aplicado multa moratória no patamar de 75%, o que afrontaria o princípio da razoabilidade; que à prestação acessória deveriam ser aplicados os mesmos requisitos constitucionalmente fixados para o tributo; que também deveria ser aplicado o princípio do não confisco para a multa; que a multa moratória no patamar de 75% teria natureza confiscatória; que referida multa deveria ser reduzida para o patamar de 20% (vinte por cento); que a União efetuaria a capitalização dos juros; que tal prática causaria um enriquecimento indevido do Fisco Federal em detrimento do contribuinte, sem a correspondente autorização legal. Teceu outros comentários. Transcreveu algumas decisões judiciais. Requereu a antecipação dos efeitos da tutela, para conceder medida liminar, inaudita altera parte, de modo a suspender a exigibilidade do crédito tributário retratado no processo Administrativo nº 10480.005244/2003-38, determinar que a União não realizasse os cálculos de juros de mora cumulativamente e capitalizável, assim como não efetuasse a aplicação de multa de 75%, mas no percentual de 20%, e, ainda, que a União se abstivesse de apontar o nome do Autor no CADIN, além de expedir CPEN nas oportunidades em que solicitada pelo Autor. Ao final, requereu: a citação da União; a procedência dos pedidos para declarar a nulidade do crédito tributário retratado pelo Processo Administrativo nº 10480.005244/2003-38; declarar a decadência do crédito tributário do Imposto de Renda Pessoa Física referente ao período ano calendário de 1998; determinar que a União não realizasse os cálculos de juros de mora cumulativamente e capitalizável; determinar que a União efetuasse a aplicação de multa de 20%; determinar que a União procedesse a um novo lançamento do débito fiscal, não apontando o nome do Autor no CADIN e expedindo CPEF enquanto não efetivado tal lançamento; a condenação da União ao pagamento das custas, honorários advocatícios e demais cominações legais. Fez protestos de estilo. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com instrumento de procuração e cópia de documentos (fls. 19/64).
Guia de recolhimento de custas (fl. 65).
À fl. 67, restou determinado que o pedido de antecipação dos efeitos da tutela seria apreciado após a manifestação da parte ré.
Citada, a União apresentou Contestação, às fls. 70/78, sustentando que a Lei nº 9.494, de 10.09.1997, teria aplicado à tutela antecipada o dispositivo constante do art. 1º da Lei nº 8.437, de 30.06.92, relativamente à proibição de liminar contra atos do Poder Público, no procedimento cautelar ou em outras ações de natureza cautelar ou preventiva; que, ainda que fosse viável a antecipação da tutela contra a Fazenda Pública, na hipótese dos autos, tal antecipação não poderia ser deferida por não se encontrarem presentes os requisitos essenciais à sua concessão. Argumentou que o Autor não teria revelado à autoridade fazendária fiscalizadora a origem dos recursos obtidos com depósitos bancários em instituições financeiras, conforme o Fisco solicitara; que o Autor não teria comprovado a origem dos depósitos, limitando-se a teorizar sobre a suposta ilegalidade da colheita de provas; que, sendo a tributação das pessoas físicas sujeita a ajuste na declaração anual independentemente de exame prévio da autoridade administrativa, o lançamento seria por homologação, devendo o prazo decadencial, na hipótese de entrega tempestiva da declaração e pagamento do imposto, ser contado a partir da ocorrência do fato gerador, o qual seria ocorreria em 31 (trinta e um) de dezembro; que, após a edição da Lei Complementar nº 105, de 10.01.2001, seria lícito ao Fisco examinar informações relativas ao contribuinte constante de documentos, livros e registros de instituições financeiras e de entidades a elas equiparadas, inclusive os referentes a contas de depósitos e de aplicações financeiras, quando houvesse procedimento de fiscalização em curso e tais exames fossem considerados indispensáveis, independentemente de autorização judicial; que seria cabível a incidência de juros de mora com base na variação da Taxa do Sistema Especial de Liquidação e Custódia para Tributos Federais-SELIC sobre o valor do imposto apurado em procedimento de ofício, os quais deveriam ser exigidos juntamente com o imposto não pago espontaneamente pelo contribuinte. Fez outros comentários. Citou algumas decisões judiciais. Ao final, requereu: o indeferimento do pedido de antecipação da tutela; a improcedência dos pedidos formulados na Inicial, condenando o Autor nos ônus da sucumbência.
Em decisão de fls. 82/84, foi concedida medida cautelar.
À fl. 91, a União noticiou a interposição de Agravo de Instrumento contra a decisão de fls. 82/84, juntando cópia do respectivo recurso (fls. 92/102).
Às fls. 109/110, cópia de decisão de Desembargador Convocado, autorizando, liminarmente, a retirada do nome do CADIN do Autor apenas com relação ao processo administrativo 10480.005244/2003-38, exarada nos autos do noticiado Agravo de Instrumento.
À fl. 123, cópia do v. acórdão prolatado pelo E. TRF/5ª Região nos autos do mencionado Agravo de Instrumento, negando provimento a esse recurso.
O Autor requereu fosse a União intimada para cumprir a decisão de fls. 82/84, sob pena de fixação de multa diária (fls. 133/135). Juntou substabelecimento e cópia de documentos (fls. 136/150).
Foi concedido o prazo de 72 (setenta e duas) horas para que a União prestar esclarecimentos a respeito do noticiado descumprimento da decisão liminar (fl. 151).
À fl. 155, a União requereu a juntada de documentos (fls. 156/158), informando, outrossim, que a Execução Fiscal (processo nº 2007.83.00.003144-1) teria sido extinta.
À fl. 164, o Autor informou que a decisão de fls. 82/84 teria sido cumprida, requerendo a realização de prova pericial, relativamente aos juros cobrados pelo Fisco Federal.
À fl. 165, foi determinado que a União apresentasse cópia da íntegra dos referidos processos administrativos.
Às fls. 173/174, a União requereu a juntada de documentos (fls. 175/587), acrescentando que, sendo complexivo, o fato gerador teria ocorrido em 31.12.1998, de forma que, pelo inciso I do art. 173 do Código Tributário Nacional, o lançamento poderia ter sido efetuado no ano de 199 e o prazo decadencial para a Fazenda Nacional concretizá-lo ter-se-ia iniciado em 01.01.2000 e que antes do esgotamento do prazo de cinco anos para a concretização do lançamento, este teria sido efetuado, com notificação do ora Autor, de forma que não se poderia falar em decadência do direito de lançar.
Em decisão de fls. 589/590, restou pronunciada a decadência do direito de lançar o imposto de renda das competências janeiro, fevereiro, março e abril de 1998, extinguindo o respectivo crédito tributário e condenando a União ao pagamento de verba honorária.
Relativamente aos períodos não atingidos pela decadência, foi determinada a realização de perícia técnica e nomeado perito.
O Autor indicou assistente técnico (fl. 592).
À fl. 594, a União noticiou a interposição de Agravo de Instrumento. Juntou cópia do referido recurso (fls. 595/603).
Às fls. 609/610, cópia de r. decisão liminar exarada nos autos do Agravo de Instrumento por Desembargador Convocado, suspendendo a decisão de fls. 589-590 deste juízo apenas quanto à verba honorária.
À fl. 610, a União formulou pedido de vista dos autos após a apresentação de quesitos da parte autora.
À fl. 611, a Secretaria deste juízo certificou que a parte autora não se manifestara sobre a decisão de fls. 589/590.
A União requereu o julgamento antecipado da lide (fl. 611-vº).
O Perito Judicial apresentou proposta de honorários (fl. 614).
O Autor discordou do valor da proposta de honorários periciais, requerendo fossem os mesmos arbitrados em valor indicado na Petição de fls. 617/618.
À fl. 623, foi homologada a proposta de honorários apresentada pelo Sr. Perito Judicial.
O Autor requereu a juntada de cópia de comprovante de pagamento de 50% dos honorários periciais (fls. 625/626).
Laudo pericial apresentado às fls. 629/635.
O Perito Judicial requereu fosse depositado o restante de seus honorários (fl. 639).
À fl. 640, o Autor requereu a juntada de cópia de comprovante de depósito (fl. 641).
O Autor requereu fossem prestados esclarecimentos acerca do Laudo Pericial (fls. 619/620).
A União requereu esclarecimentos a respeito do Laudo Pericial (fls. 622/623). Juntou cópia de documentos (fls. 624/636).
Às fls. 641/646, esclarecimentos prestados pelo Perito Judicial, acompanhados de planilhas de cálculo (fls. 647/650).
O Perito Judicial requereu a liberação do restante de seus honorários (fl. 651).
O Autor informou que teria apresentado Recurso Especial, relativamente à decisão do E. TRF/5ª Região nos autos do noticiado Agravo de Instrumento, o qual estaria pendente de apreciação quanto à sua admissibilidade(fl. 660).
Em seguida, o Autor manifestou sua parcial concordância com o laudo pericial e respectivos esclarecimentos (fls. 657/659). Juntou cópia de documentos (fl. 660/684).
À fl. 686, a União informou que não concordaria com os esclarecimentos prestados pelo Perito, reiterando suas alegações.
Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o Relatório.
Passo a decidir.

Fundamentação.

1. Quanto à Decadência de parte da dívida

Na decisão de fls. 589/590, restou pronunciada a decadência do direito de a Fazenda Pública lançar o imposto de renda das competências janeiro, fevereiro, março e abril de 1998, extinguindo o respectivo crédito tributário e condenando a União ao pagamento de verba honorária.
Há notícia nos autos, às fls. 609-610, que mencionada decisão deste juízo de primeira instância foi modificada parcialmente, na parte relativa à condenação em verba honorária, em r. decisão liminar de Desembargador Convocado da 4ª Turma do E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região.
Outrossim, consta que referido agravo de instrumento findou por ser julgado e, no respectivo v. acórdão, mencionada decisão deste juízo foi totalmente reformada(fls. 624-636), tendo o ora Autor interposto recurso especial, conforme noticiou nos autos, à fl. 660.
Tenho que, não obstante o respeito que este Juiz dedica aos julgados do E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, não me encontro a ela jungido, até mesmo porque não seria o agravo de instrumento, data maxima venia, meio próprio para discutir a matéria ali ventilada, porque faz parte do mérito, pelo que referido recurso deveria ter sido convertido em agravo retido, para apreciação na segunda instância, juntamente com o recurso de apelação respectivo.
No referido v. Acórdão, consta que o imposto de renda de pessoa física tem período-base anual. Data maxima venia da d. Relatora do mencionado v. acórdão, o fato gerador do imposto de renda de pessoa física deixou de ser anual desde 1985, por conta da Lei nº 7.450, daquele ano, que submeteu o imposto de renda de pessoa física ao sistema de bases correntes, transformando-o em um imposto mensal, afastando-o do tipo de lançamento misto(ou por declaração) e o submetendo a lançamento por homologação.
Nesse sentido, é a lição do saudoso jurista HENRY TILBERY(estrangeiro, que se radicou em São Paulo, até a morte):
“..., o Governo promoveu preliminarmente várias alterações na sistemática do Imposto de Renda já a curto prazo a partir de dezembro de 1985 pela Lei nº 7.450/85.
...; mas desta vez foram introduzidas algumas inovações radicais como entre outros, o abandono da base do ano anterior enraizada na prática tributária e substituição pela tributação em bases correntes. Foi talvez uma das mais profundas modificações das últimas seis décadas.
Desde o Regulamento do Imposto de Renda de 1926, prevaleceu no Brasil a tributação com base do ano anterior, isto é, no caso das pessoas físicas a base de incidência do imposto eram os rendimentos correspondentes ao ano civil imediatamente anterior ao exercício financeiro.
Após uma tradição de mais do que meio século, passou a partir do dia 1º de janeiro de 1986 para a tributação em bases correntes, o que nos termos do art. 3º desta Lei significa que doravante o imposto de renda das pessoas físicas será devido à medida que os rendimentos forem auferidos, ou seja, o objeto da incidência são os rendimentos do exercício financeiro em curso-não do ano anterior.
....Ou seja, não podem vingar teses jurídicas que procuram aplicar aos rendimentos das pessoas físicas normas tributárias diversas das que vigoram no momento quando determinado rendimento for auferido.”(1)
Nesse novo sistema, deixou de existir o “ano-base”, que foi substituído por “ano-calendário” e o imposto de renda passou a incidir sobre os rendimentos mensais desse ano calendário, então, para pessoa física, desde mencionada Lei, não mais existe período anual, mas sim mensal de incidência desse imposto".(2).
Esse período mensal perdura até os dias atuais, conforme Parágrafo Único do art. 3º e art. 4º, todos da Lei nº 9.250, de 26.12.1995.
E como esse imposto passou a ser submetido ao lançamento por homologação(§ 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional), o prazo decadencial para a Fazenda Pública homologar(finalização do lançamento)inicia-se a partir da data do fato gerador, mas, quando o Contribuinte não pratica os procedimentos que lhe são próprios nesse tipo de lançamento(apura e recolhe o tributo e entrega a respectiva declaração à Fazenda Pública, declaração que continuou sendo anual, mas para mero ajuste) , a doutrina e os Tribunais firmaram o entendimento de que, nessa situação, o início da fluência do prazo de decadência desloca-e para o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, como previsto no art. 173-I do CNT , para os demais tipos de lançamento(lançamento de ofício e lançamento misto).
Por isso, data maxima venia dos d. membros da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, especialmente da sua d. Relatora, a Dra. MARGARIDA CANTARELLI, tenho que a decisão de fls. 589/590 deste juízo de primeiro grau deve ser ratificada nesta sentença.(3 - A decisão de fls. 589-590 encontra-se transcrita abaixo, na nota 3).

3. Quanto à Questão em Debate

O Autor não nega que obteve a disponibilidade jurídica e econômica dos valores em questão; alega apenas que o crédito tributário decorrente dessa renda se encontra fulminado pela decadência e, caso não acolhida a exceção de decadência, sustenta que deve ser afastada a capitalização de juros, que estaria ocorrendo, e que a multa de 75% (setenta e cinco por cento)seja reduzida para o máximo de 20%(vinte por cento). Pleiteia, ainda, que a União seja impedida de arrolar o seu nome no CADIN e também para que lhe seja fornecida certidão positiva com efeito de negativa, quando dela precisar.

3.1 Decadência

Com relação à decadência, reporto-me ao item anterior desta fundamentação, bem como à decisão de fls. 589/590 deste juízo, onde se reconheceu decadência parcial do direito de a Fazenda Pública lançar e exigir as parcelas ali indicadas do tributo em debate, decisão essa que merece ser ratificada Sentença, data maxima venia da mencionada Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região.
Com relação às parcelas que não foram fulminadas pela decadência, registro que analisarei em primeiro lugar o principal e depois os acessórios(multa, juros e correção monetária).

3.2) Principal da Dívida

O Autor não impugnou o principal da dívida tributária em debate, mas apenas os acessórios.

3.3) Multa x Princípios da Proporcionalidade e do Não-confisco

No que diz respeito à multa de 75%(setenta e cinco por cento), o Autor sustenta ser confiscatória e pugna por sua redução para 20%(vinte por cento).
É importante registrar que a União, na sua contestação de fls. 70-78, simplesmente silenciou a respeito deste tópico da petição inicial.
A respeito desse assunto, mesmo antes de o princípio do não-confisco constar do texto da Constituição da República(como se sabe, no Brasil, referido princípio só foi positivado na Constituição da República de 1988, art. 150-IV), o C. Supremo Tribunal Federal, invocando esse princípio e o da proporcionalidade ou razoabilidade, sempre cuidou de afastar multas confiscatórias.(4)
Com efeito, a 2ª Turma dessa C. Corte assim procedeu no julgamento do RE 91.707/MG, julgado em 11.09.1979, tendo por Relator o Min. Moreira Alves, Recorrente Estado de Minas Gerais x Arcanjo´s Decorações Ltda, oportunidade em que reduziu multa de 100% para 30% da Legislação do então ICM desse Estado e, nesse julgado, invocou-se o RE 81.550/MG, de 1975, onde houvera idêntica decisão.
Realmente, no RE 81.550/MG. Recorrente Estado de Minas Gerais x Recorrida: Cooperativa de Consumo dos Funcionários do Banco do Brasil. Rel. Min. Xavier de Albuquerque, julgado em 20.05.1975, a 2ª Turma do STF concluiu que seria confiscatória a multa da legislação do Estado de Minas Gerais, relativa ao então ICM, no percentual de 100%, pelo que a reduziu para 30%, percentual este que foi reputado por razoável para reparação da impontualidade do Contribuinte(RTJ 74/319-320).
Após o advento da Constituição da República de 1988, o Plenário dessa C. Corte, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 551/RJ(DJU de 14.10.2003), considerou inconstitucionais os §§ 2º e 3º do art. 57 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, sob o argumento de que feriam os princípios da proporcionalidade(razoabilidade) e do não-confisco(este então já fixado no inciso IV do art. 150 da Constituição da República de 1988). Referidos dispositivos estabeleciam, respectivamente, que o valor mínimo das multas seria correspondente a duas vezes o valor do tributo(200%, portanto) e, na hipótese de sonegação, não poderia ser inferior a cinco vezes(500%, portanto)do valor do tributo(ADI 551/RJ. Requerente: Governador do Estado do Rio de Janeiro x Requerida: Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro.Julgamento em 24.10.2002. Rel. Min. Ilmar Galvão. DJU de 14.10.2003).
O Tribunal Regional Federal da 5ª Região, de conformidade com a petição inicial, por sua 3ª Turma, em julgado de agosto de 2005, concluiu que multa de 75%(setenta e cinco por cento), tendo em vista o princípio do não-confisco, poderia ter sido reduzida para 20%(vinte por cento), “tal como disposto no art. 59 da Lei nº 8.383/91”, mantendo, todavia, a redução para 30%(trinta por cento), fixada na Sentença de primeiro grau, porque a então Impetrante não recorrera(AMS nº 83.707/PE, 3ª turma, Rel. Des. Federal Geraldo Apoliano, unânimne, DJU nº 166, Seção II, p. 389/730, de 29.08.2005). No mesmo sentido deste último julgado, ainda conforme a petição inicial, também decidiu a 4ª Turma desse mesmo E. Tribunal no julgamento da AC nº 324.498/RN(2002.84000041542), Relator Luiz Alberto Gurgel, DJ nº 200, de 18.10.2004, p. 844, e na AMS nº 79825/PE(2001.83000135839, 3ª Turma, Rel. Ridalvo Costa).
No julgado por último referido, constou que a multa prevista no art. 44, I, da Lei nº 9.430, de 1996 tem efeito confiscatório, infringindo o disposto no art. 150, IV, da Constituição da República, pelo que, à luz do art. 59 da Lei nº 8.383, de 1991, foi reduzida para 20%. Todavia, constato que esse dispositivo legal diz respeito à denominada “multa de mora”, que incide quando o Contribuinte, embora com atraso, paga o tributo espontaneamente, enquanto que, neste feito, está em debate a denominada “multa fiscal”, aquela que é aplicada pelo Auditor da Fazenda Nacional quando lavra auto de infração.
Assim, é de se ter como incompatível com os princípios da proporcionalidade e do não confisco a questionada multa de 75%(setenta e cinco por cento), devendo ser reduzida para 30%(trinta por cento), para que se enquadre nas orientações desses dois princípios.

3.4) Capitalização de Juros

O Autor alega que os juros de mora estariam sendo aplicados de forma cumulativa, gerando o que se denomina de capitalização de juros ou de anatocismo, no que estaria contrariando regras do art. 161 e respectivo § 1º do Código Tributário Nacional, bem como julgados do E. Superior Tribunal de Justiça(AGRESP n º 36370/2001-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, DJU de 18.11.2002, p. 161; e REsp 271.973/2000-RS, 2ª Turma, Rel. Minª Eliana Calmon, DJU de 06.05.2002, p. 267), e também entendimento do Tribunal Regional Federal da 5ª Região(AC nº 250.741/2001-CE, 1ª Turma, Rel. Ivan Lira, DJU de 24.04.2003, p. 402; e
AC 210.722/2000-AL, 3ª Turma, Rel Manoel Erhardt, DJU de 13.12.2002, p. 388).
A União também não impugnou diretamente esse pleito na sua contestação acima referida, tendo apenas alegado que os juros seriam os da tabela SELIC – Sistema Especial de Liquidação e de Custódia para Títulos Federais.
Ante mencionada situação, no Saneador de fls. 589-590, restou determinada a realização de perícia.
Como registrou o Sr. Perito, no seu laudo de fls. 630-631, as Partes não apresentaram quesitos e ele se limitou a informar que os juros da tabela SELIC deveriam ser aplicados sobre o valor líquido e não sobre o valor bruto.
O Autor, no pedido de esclarecimentos de fls. 619-620, pediu que o Sr. Perito esclarecesse se estaria ou não havendo anatocismo.
E o Sr. Perito, nos esclarecimentos, especificamente à fl. 643 dos autos, declarou que não haveria anatocismo.
Então, neste particular o feito não procede.

3.5) Não Inscrição do Nome do Autor no CADIN

Na decisão liminar de fls. 82-84, restou determinado que, enquanto não findasse este processo, a União deveria abster-se de inscrever o nome do Autor no CADIN, bem como de promover cobrança administrativa ou judicial do crédito tributário em debate.
Tenho que essa situação persiste, pois não seria razoável permitir a negativação do nome do Autor, bem como que venha a ser cobrado de um crédito, cuja liquidez ainda é incerta, porque a depender do trânsito em julgado do que venha a ser decidido finalisticamente neste processo.
É verdade que a União interpôs, contra referida decisão, o agravo de instrumento noticiado à fl. 91 dos autos. Mas também é verdade que o Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em decisão inicial, manteve referida decisão, conforme se vê na cópia de fls. 104 da decisão do Relator do referido E. Tribunal, tendo sido, finalisticamente, improvido, conforme cópia do respectivo Acórdão, acostada à fl. 123.

Conclusão

POSTO ISSO: a) quanto à exceção de decadência, ratifico a decisão de fls. 589-590; b) quanto ao pedido para que a União abstenha-se de inscrever o nome do Autor no CADIN e de exigir, administrativa ou judicialmente, o crédito tributário em debate, ratifico a decisão de fls. 82-84; c) quanto ao mais, julgo parcialmente procedentes os pedidos desta ação, reduzo a multa fiscal para 30%(trinta por cento)do valor do restante devido do tributo, devendo o real valor do crédito ser apurado na fase de execução, mediante aplicação do art. 475-B do Código de Processo Civil, observados os delineamentos estabelecidos nesta Sentença.
Como foi mínima a sucumbência do Autor, condeno a União a ressarci-lo das despesas referentes aos honorários periciais e às custas processuais, e, ante as regras do Parágrafo Único do art. 21 c/c o § 4º do art. 20, todos do Código de Processo Civil, a condeno em verba honorária, que arbitro em R$ 2.000,00(dois mil reais).
A verba relativa aos honorários periciais será atualizada(correção monetária e juros de mora) na forma preconizada na Lei 11.960, de 2009, atualização essa incidente a partir do mês seguinte à data do depósito.
Os honorários advocatícios também serão atualizados(correção monetária e juros)na forma preconizada na Lei por último invocada, mas a partir do mês seguinte ao da publicação desta Sentença.
Como as custas processuais têm natureza tributária, espécie taxa(segundo o C. Supremo Tribunal Federal), será atualizada, a partir da data do efetivo desembolso, pela tabela SELIC(prevalece a regra específica para tributos, consignada no § 4º do art. 39 da Lei nº 9.250, de 1995).
De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição.

P.R.I.

Recife, 09 de setembro de 2010.


Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE

NOTAS:

Nota 1 - "A Desmistificação da Tributação das Pessoas Físicas em Bases Correntes". São Paulo: co-edição da Resenha Tributária com o Instituto Brasileiro de Direito Tributário-IBDT, 1987, p. 17-20.

Nota 2 - Por isso, penso que, data maxima venia, não tem razão o grande jurista Ricardo Mariz de Oliveira quando, no seu excelente "Fundamentos do Imposto de Renda"(São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2008, p. 495)sustenta, sem fazer qualquer referência à Lei nº 7.450, de 1985, que o período de incidência do imposto de renda da pessoa física continua sendo anual. Interessante é que, com referência à pessoa jurídica, esse mesmo jurista conclui, com acerto, nas páginas 495-498 do mesmo livro, que o período-base do imposto de renda passou a ser trimestral(por força da Lei nº 9.430, de 1996). Na verdade, a Lei nº 8.383, de 1991, impôs às pessoas jurídicas o fato gerador mensal do imposto de renda(art. 38) e só posteriormente foi adotado o período trimestral.

Nota 3 - SANEADOR

1. Presentes as condições e os pressupostos processuais, partes legítimas e bem representadas, e antes de dar o processo por saneado tenho que apreciar a prejudicial de decadência, levantada na contestação.

1. 1) Inicialmente, registre-se que a partir da Lei nº 7.450, de 1985, o imposto de renda de pessoa física deixou de ser anual e passou a ser mensal, também deixou de ser submetido ao lançamento misto ou por declaração e passou a ser submetido ao lançamento por homologação.
Dessa forma, data vênia, sem razão a União, na petição de fls. 173-174, quando sustenta que o fato gerador de todo o ano calendário de 1998 teria se complementado em 31.12.1998.
Não, o fato gerador do imposto de renda do Autor completou-se mês a mês e foi a partir do último dia de cada mês que se iniciou o prazo para que a Fazenda Pública homologasse o lançamento, isto é, realizasse o lançamento(§ 4º do art. 150 c/c art. 142 do Código Tributário Nacional).
A fluência do prazo decadencial só se iniciaria no primeiro dia do exercício subseqüente àquele em que poderia ter sido efetuado(inciso I do art. 173 do Código Tributário Nacional), se tivesse havido total omissão do Contribuinte, ora Autor, a respeito do referido tributo.
Mas não foi isso que aconteceu: o ora Autora praticou o fato gerador, apurou o imposto e pagou o valor que entendia devido. Por isso, o prazo para a homologação por parte da Fazenda Pública ficou vinculado ao estabelecido no acima mencionado § 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional, ou seja, a partir de cada fato gerador, logo, do final de cada mês.
Com efeito, consta no Auto de Infração de fls. 176-188 e respectivos demonstrativos de fls. 189-200, que o Autor apresentou declaração simplificada do imposto de renda no ano de 1999(fl. 180) e teria omitido receitas dos meses de janeiro de 1998 a 31.12.1998, conforme róis de fls. 187-191.
O Auto de Infração(que é considerado lançamento revisional de ofício(RE 94.632-1/SP)foi elaborado em 08.08.2002(fl. 176).
O Autor alega na petição inicial que o Auto de Infração teria se findado em 27.05.2003, data da inscrição em dívida ativa(cfr. Fl. 07).
Na verdade, a finalização do Auto de Infração dá-se com a notificação do Contribuinte e não com a inscrição em dívida ativa.
E, segundo o C.Supremo Tribunal Federal(v. RE acima referido), após a notificação do lançamento, não mais flui prazo de decadência e o de prescrição ainda não começou, pois este só começa depois de findo o prazo para impugnação do lançamento ou, se tiver sido impugnado, após o término do respectivo processo administrativo.
As partes não informam e não consegui encontrar a data em que o ora Autor foi notificado do lançamento(auto de infração), mas, como o ora Autor informa na petição inicial que o impugnou em 25.06.2003(v. fl. 04), considerando que o prazo para impugnação era e é de 30(trinta) dias, têm-se que no mínimo a notificação deu-se em 25.05.2003.
Ora, considerando-se que a fluência do prazo de decadência da renda obtida em janeiro, fevereiro, março e abril do ano de 1998 iniciou-se sempre no primeiro dia do mês subseqüente(art. 210 do Código Tributário Nacional), tem-se que, com relação a essas competências, quando o lançamento tornou-se definitivo, com a notificação feita em 25.05.2003, o respectivo direito de lançar da Fazenda Pública já tinha sido fulminado pela decadência qüinqüenal, com a conseqüente extinção do respectivo crédito tributário(art. 156-V do Código Tributário Nacional).
2. Posto isso: 2.1) pronuncio a decadência do direito de lançar o imposto de renda das competências janeiro, fevereiro, março e abril de 1998 e, em conseqüência, dou por extinto o respectivo crédito tributário(art. 156-V, Código Tributário Nacional)relativo ao imposto de renda de tais competências, e, com relação a essa parcela do crédito tributário dou este processo por extinto, com resolução do mérito(art. 269-IV do Código de Processo Civil), condenando a União, à luz do § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil, em verba honorária, que arbitro em R$ 1000,00(hum mil reais), verba essa que será monetariamente corrida a partir do mês seguinte ao da publicação desta decisão pelos índices de correção monetária do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal e, após a citação para os fins do art. 730 do Código de Processo Civil, será acrescida de juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento), sobre o valor já corrigido; 2.2) com relação aos períodos que não foram atingidos pela decadência do direito de lançar, defiro realização de perícia técnica, para a qual nomeio como Perito Judicial o Sr. José Argemiro da Silva, com cadastro neste Juízo, que deve ser intimado para apresentar proposta de honorários, ficando facultado às Partes, desde já, apresentação de quesitos e indicação de Assistentes.
P. I.
Recife, 27.06.2008

Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE


Nota 4 - Nesse sentido, v. nosso "Direito Tributário do Brasil: Aspectos Estruturais", Volume I, 2ª Ed., Olinda: Livro Rápido, p. 277-284{Subtópico 2.10, denominado de Princípio do Não-Confisco].