quinta-feira, 17 de setembro de 2009

TERRENO DE MARINHA. TAXA DE OCUPAÇÃO. ATUALIZAÇÃO DO VALOR DO IMÓVEL.

Nos últimos anos, a União resolveu atualizar o valor dos terrenos de marinha e dos terrenos acrescidos de marinha, que se encontram sob regime de aforamento e também sob regime de ocupação. Segue uma sentença, lançada nos autos de um processo no qual um Contribuinte impugnou a fórmula adotada pela União para atualização do valor do imóvel. O pedido da respectiva ação foi acolhido parcialmente. Leia e comente.


PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2008.83.00.019544-2 – Classe 029 – Ação Ordinária
Autor: PPPPPPPPPPPPPPPNNNNNNNNNNNNN e Outro
Réu: UNIÃO FEDERAL

Registro nº ..............................................
Certifico que eu, ..........., registrei esta Sentença às fls..............
Recife, ........./........../2009.

Sentença tipo B

Ementa: - DIREITO ADMINISTRATIVO. TERRENO ACRESCIDO DE MARINHA. TAXA DE OCUPAÇÃO. FORO ANUAL. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA.
-Na atualização do valor do domínio pleno dos terrenos acrescidos de marinha não se pode tomar por parâmetro o respectivo valor de mercado, mas sim o valor histórico, fazendo incidir sobre este os respectivos índices legais de correção monetária.
-Procedência parcial.

Vistos etc.

PPPPPPPPPPPPPPPNNNNNNNNNNNNN e MMMMMMMMMXXXXXXXXXXX, qualificados na Inicial, propuseram, em 11.12.2008, a presente ação, rito ordinário, contra a UNIÃO FEDERAL. Aduziram, em síntese, que seriam proprietários do apartamento 701, Edifício Uirapuru, situado à Avenida Beira Rio, nº 666, Madalena, Recife – PE, constituído em terras em parte próprias e em parte de marinha sob o regime de ocupação, com área de 979,00 m², dos quais 665.80 m² corresponderiam à área de terreno de marinha, sendo de 0,0909090 a fração ideal correspondente ao apartamento dos Autores; que os Autores pagariam taxa de ocupação referente à fração ideal pertencente à União; que em 2006 e 2007 teria sido exigido, a título de pagamento da aludida taxa de ocupação, o valor de R$ 133,14 (cento e trinta e três mil e quatorze centavos); que, todavia, em 2008 teria sido cobrada a importância de R$ 726,23 (setecentos e vinte e seis mil e vinte e três centavos); que a Ré teria atribuído à suposta valorização do imóvel um aumento de quase 550%, ao arrepio da legislação aplicável à espécie; que estaria configurado um aumento abusivo, consideravelmente superior aos índices de correção monetária registrados para o período, esses sim permitidos para fins de atualização. Sustentaram, ainda, que teriam interposto a presente demanda perante o Juizado Especial Federal, havendo sido declarado, por sentença, a incompetência do Juizado para julgar a matéria e, como conseqüência, extinguindo o feito sido sem resolução do mérito; ainda, quanto à questão da competência, invocaram a divergência de entendimento entre o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Defenderam a ilegalidade do aumento da taxa de ocupação e que, uma vez declarada tal ilegalidade, seria devida a restituição total das importâncias supostamente pagas relativamente ao exercício de 2008, nos termos do art. 165 do Código Tributário Nacional; que estariam presentes os requisitos para a concessão de antecipação de tutela. Teceram outros comentários e requereram: a) caso o Juízo entendesse por sua incompetência para julgamento da demanda, que suscitasse, desde logo, o conflito negativo de competência, eis que eventual extinção do processo levaria à negativa de prestação jurisdicional por parte da Justiça Federal; b) a concessão de antecipação parcial dos efeitos da tutela no sentido de suspender a exigência da majoração da taxa de ocupação com base na reavaliação do imóvel, ou, ad cautelam, autorizar sua suspensão mediante realização de depósito do valor cobrado em 2007, devidamente atualizado pelo INPC, nos termos acima aduzidos no que tange aos exercícios futuros, intimando-se a Ré para o efetivo cumprimento; a citação da Ré; o julgamento antecipado da lide, ratificando-se a antecipação de tutela concedida, declarando a ilegalidade da majoração da taxa de ocupação realizada com base na reavaliação do imóvel, condenando-se a União à restituição aos Autores da quantia indevidamente recolhida a maior a título de taxa de ocupação; a condenação da União ao pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios, na proporção de 20% sobre o valor da condenação. Protestaram o de estilo e atribuíram valor à causa. Inicial instruída com instrumento de procuração e cópia de documentos, às fls. 20-34.
Custas recolhidas, à fl. 35.
Decisão fundamentada indeferindo o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, à fl. 37.
Os Autores noticiaram a interposição de agravo de instrumento no E. TRF/5ª Região, às fls. 42-66.
Despacho mantendo a decisão agravada e determinando a citação da União com urgência, à fl. 67.
Cópia de v. decisão proferida nos autos do noticiado Agravo de Instrumento, à fl. 69.
A UNIÃO apresentou Contestação, às fls. 76-98, aduzindo, as seguintes preliminares: a) necessidade de prévio esgotamento das vias administrativas; inadequação da via eleita; falta de interesse de agir; ausência dos pressupostos da carência de ação; b) ausência dos requisitos do art. 273 do CPC. No mérito aduziu, em suma, que o imóvel pertenceria à União, sendo utilizado pelo ocupante em regime de ocupação; que, ao contrário do que fora afirmado pelos Autores, tal imóvel não se submeteria ao regime enfitêutico; que no caso em exame não haveria que se falar em foro e sua imutabilidade, haja vista não existir um contrato administrativo entre a União e o ocupante. Sustentou, ainda, que as atualizações dos metros quadrados, não ocorreriam de acordo com os índices inflacionários, mas em conformidade com a avaliação técnica do terreno e não levariam em consideração os valores das benfeitorias construídas; que os foros, bem como as taxas de ocupação, seriam receitas originárias, decorrentes do aproveitamento econômico pela União de imóvel de sua propriedade, de forma idêntica às receitas que pessoas de direito privado perceberiam pela exploração de seus bens; que para os imóveis da União utilizados em regime de ocupação, a disciplina seria dada pelo art. 1º do Decreto-Lei nº 2.398, de 21.12.1987, ao prever que a taxa de ocupação seria calculada sobre o valor do domínio pleno do terreno, anualmente atualizado pelo Serviço de Patrimônio da União/SPU; que nos imóveis da União utilizados em regime de aforamento, o foro corresponderá a 0,6% do valor do domínio pleno do terreno, anualmente atualizado pela SPU, nos termos do artigo 101 do Decreto-Lei nº 9.760/46; que seria aplicado ao caso em tela a ON-GEADE nº 004/SPU, de 25.02.2003, a qual estabelece as normas técnicas e os procedimentos de avaliação, que proporcionam a aferição do valor de mercado mais provável por metro quadrado, segundo Planta Genérica de Valores – PGV; que, em observância à legislação de regência, seria possível verificar que a cobrança da taxa ou do foro seria realizada sobre a avaliação do terreno, sofrendo este as influências das valorizações imobiliárias; que, portanto, em consonância com o item 4.5 da ON – GEADE – 004, de 2003, os valores dos imóveis, calculados por metro quadrado, levariam em consideração dados de mercado, atualizados através de pesquisa mercadológica, em razão de alterações significativas no mercado imobiliário; que, por outro lado, a atualização do valor do imóvel, mediante avaliação baseada na valorização do domínio pleno, resultaria de fatores outros que não a simples desvalorização da moeda, como a sua localização, as melhorias advindas em seus arredores, entre outros fatores relevantes para se encontrar o valor de mercado atualizado do bem; que, entretanto, para se chegar a esses valores, não seria suficiente efetuar a mera atualização monetária de valores cobrados anteriormente, isso porque, esses bens, localizados em áreas nobres de uma cidade, cuja oferta de bens seria infinitamente inferior à demanda existente, teriam sofrido nos últimos anos uma enorme valorização, proporcionando aos seus ocupantes elevado benefício; que, todavia, não seria justo que os benefícios decorrentes da valorização de imóveis da União fossem auferidos apenas pelos seus ocupantes; que tais benéficos deveriam ser repartidos com a coletividade, o que ocorreria por meio do pagamento do Foro ou da Taxa de Ocupação calculada com base no valor de mercado do imóvel. Teceu outras considerações e transcreveu decisões judiciais favoráveis à sua tese. Requereu fosse inacolhida a pretensão antecipatória, e julgado improcedente in totum o pedido autoral, condenando-se os Autores ao pagamento de honorários advocatícios à razão de 20% sobre o valor atualizado da causa, custas processuais e demais cominações legais; a juntada do ofício Of. Nº 1111/DIIFI/GRPU/PE oriundo da Gerência Regional do Patrimônio da União em Pernambuco. Protestou o de estilo. Juntou cópia de documentos, às fls. 99-102.
Os Autores apresentaram Réplica à Contestação, às fls. 107-118.
Vieram os autos conclusos para sentença.

É o Relatório.
Fundamentação.


1. Preliminares

1.1. Da necessidade do prévio esgotamento das vias administrativas. Inadequação da via eleita. Falta de interesse de agir. Ausência dos pressupostos da carência da ação.

A União levanta preliminar de ausência de interesse de agir e consequente carência de ação, eis que os Autores não teriam comprovado a realização de qualquer tipo de requerimento nas vias administrativas para a solução do conflito.

Mencionada preliminar não merece acolhida, porque direito de postular em Juízo encontra-se assegurado na Constituição da República, sem qualquer condicionante(art. 5º-XXXV).

Então, a ausência de prévia postulação administrativa não caracteriza carência de ação.

Em se tratando de inadequação da via eleita, impende esclarecer que a ação ordinária é, sim, meio processual adequado, eis que os Autores não pleiteiam apenas a restituição do indébito, mas também a reavaliação do imóvel para mensuração do valor da taxa de ocupação.

Portanto, tal preliminar não merece ser acolhida.

1.2. Ausência dos requisitos do art. 273 do CPC

Resta prejudicada a análise dessa preliminar, pois o pedido de antecipação de tutela foi negado, conforme decisão exarada à fl. 37.

2. Mérito

Com relação à taxa de ocupação de terrenos acrescidos de marinha, reza o art. 1º do Decreto-lei nº 2.398, de 21.12.1987:
“Art. 1° A taxa de ocupação de terrenos da União, calculada sobre o valor do domínio pleno do terreno, anualmente atualizado pelo Serviço do Patrimônio da União (SPU), será, a partir do exercício de 1988, de:
I - 2% (dois por cento) para as ocupações já inscritas e para aquelas cuja inscrição seja requerida, ao SPU, até 30 de setembro de 1988; e (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.422, de 1988) (Vide Lei nº 11.481, de 2007)
II - 5% (cinco por cento) para as ocupações cuja inscrição seja requerida ou promovida ex officio , a partir de 1° de outubro de 1988. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.422, de 1988)
Relativamente ao foro anual decorrente de aforamento de terreno acrescido de marinha, rezava o art. 101 do Decreto-lei nº 9.760, de 05.09.1946, na sua redação originária:

“Art. 101. Os terrenos aforados pela União ficam sujeitos ao foro de 0,6%(seis décimos por cento)do valor do respectivo domínio pleno.”.
Mencionado dispositivo legal passou a ter a seguinte redação, que lhe foi dada pela Lei nº 7.450, de 1985:
“Art. 101 - Os terrenos aforados pela União ficam sujeitos ao foro de 0,6% (seis décimos por cento) do valor do respectivo domínio pleno, que será anualmente atualizado. (Redação dada pela Lei nº 7.450, de 1985)”.
Como se vê, a legislação é muito clara no sentido de que a taxa de ocupação e o foro anual referentes a terrenos acrescidos de marinha incidem sobre o valor do respectivo domínio pleno, atualizado anualmente.

A Parte Autora sustenta, invocando r. decisões judiciais, que é descabida a modificação anual do valor do domínio pleno de imóvel aforado a particular pela União, sobre o qual é calculado o valor do foro, porque invariável.

Já tive oportunidade de julgar uma ação com pedido semelhante ao ora sob análise, no processo nº 2001.83.00.15249-7, onde conclui que a Lei poderia estabelecer a correção monetária do valor do terreno submetido à enfiteuse ou ao aforamento, sem nenhum ferimento ao entendimento sacramentado no direito privado de que o foro exigido por enfiteuse ou aforamento não pode ser modificado, pois a correção monetária nada modifica, tampouco aumenta, apenas suprime a corrosão decorrente da inflação sobre o valor da moeda, trazendo o valor desta à atualidade. E ali invoquei v. julgado do C. Supremo Tribunal Federal, que ora transcrevo:

EMENTA: - Aforamento de imóvel da União. Atualização prevista pela Lei nº 7.450-85, superveniente à constituição do aforamento, ao dar nova redação ao art. 101 do Decreto-lei nº 9.760-46. Providência legítima, na medida em que se ativer aos índices da correção monetária, mas inconciliável com a garantia do ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI, da Carta de 1988 e art. 153, § 3º, da pretérita), quando venha a refletir a valorização do domínio pleno, resultante de fatores outros que não a simples desvalorização da moeda. Recurso extraordinário parcialmente provido, a fim de ser julgada, em parte, procedente a ação, para excluir, das importâncias exigidas ao enfiteuta, a parcela porventura excedente do foro inicial, monetariamente corrigido, conforme se vier a apurar, em liquidação.(RE-143856/PE - Relator(a): Min. OCTAVIO GALLOTTI Publicação: DJ DATA-02-05-97 PP-16566 - Primeira Turma). (Negritei).

A União confessa que se utilizou do valor de mercado, para fazer a atualização em questão.

Ora, como acima demonstrado, o direito positivo não autoriza essa prática, mas apenas a mera atualização monetária anual do valor do domínio pleno do terreno acrescido de marinha.

A correção monetária, para o caso ora sob análise, tem que ter seguir percentuais já sacramentados na jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, e previstos em Leis, a saber: nos meses de Jan/89 e Fev/89 nos índices de 42,72% e 10,14%, respectivamente (Resp 45382-0); IPC do IBGE até fevereiro de 1991 (Emb. Div. no Resp 48476-0; INPC até dezembro de 1991 (Lei 8.177/91); UFIR até dezembro de 1995 (Lei 8.383/91); SELIC a partir de 01/01/1997 (Lei 10.522/2002). No período de fevereiro/91 a dezembro/91, como o IPC não foi calculado nesse período, aplica-se o INPC, também do IBGE, e não será aplicado o índice TR/TRD, porque o STF já entendeu que não serve para correção monetária, devendo ser substituído pelo IPC(ou INPC).

Nessa situação, o feito procede parcialmente para afastar o valor de mercado do mencionado imóvel, devendo-se apenas atualizar monetariamente o valor nominal do domínio pleno dos terrenos acrescidos de marinha em questão, adotando-se os percentuais indicados em nota de rodapé da fundamentação, e observando-se o prazo prescricional de cinco anos((Decreto nº 20.910, de 1932, c/c art. 54 da Lei nº 9.784, de 1999 e c/c Súmula 85 do E. Superior Tribunal de Justiça), isto é, relativamente aos terrenos acrescidos de marinha aforados aos Autores e/ou por eles ocupados, a União deve tomar o valor do domínio pleno de cinco anos antes da propositura desta ação, e atualizá-los monetariamente pelos índices acima indicados, fazendo incidir sobre o valor atualizado o percentual referente à taxa de ocupação e/ou o percentual relativo ao foro anual.

Após os cálculos, a Parte Autora há de pagar os respectivos valores do período em discussão sem qualquer acréscimo, exceto as variações monetárias decorrentes da aplicação do entendimento supra, desde que o faça no prazo de 30(trinta) dias, contados da intimação para pagar, após o trânsito em julgado da respectiva decisão homologatória(aplicação analógica do § 2º do art. 63 da Lei nº 9.430, de 1996).

Conclusão

Posto isso; a) rejeito as preliminares da União; b) julgo parcialmente procedentes os pedidos desta ação e determino que a União reveja a atualização em questão, e faça a mera correção monetária do valor do domínio pleno dos terrenos acrescidos de marinha referidos nos autos, adotando a fórmula e os percentuais indicados na fundamentação supra, bem como observando a prescrição quinquenal na forma acima consignada, e que receba os valores devidos pelos Autores a título de taxa de ocupação e/ou de foro anual sobre o valor do terreno acrescido de marinha atualizados como ora determinado, sem qualquer acréscimo, desde que o pagamento seja feito após trinta dias da intimação para pagar, após o trânsito em julgado da respectiva decisão homologatória dos cálculos.

Como o feito foi procedente apenas em parte, correspondente mais ou menos à metade da pretensão inicial, cada Parte arcará com os ônus dos respectivos Patronos, ficando a Parte Autora condenada na metade das custas processuais e a União isenta da outra metade, por força de Lei e por ser a titular da receita de tais custas.

P.R.I.

Recife, 09 de setembro de 2009.

Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE
MANDADO DE SEGURANÇA: ADI CONTRA A NOVA LEI

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Registro que a respeito da nova Lei do Mandado de Segurança, Lei nº 12.016, de 2009, a Ordem dos Advogados do Brasil propôs, no último dia 14.09.2009, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, que recebeu o nº 4296-3, impugnando os seus seguintes dispositivos: § 2º do art. 1º, inciso III do art. 7º e respectivo § 2º, art. 22 e respectivo § 2º, art. 23 e art. 25.

Entre no site do STF, www.stf.jus.br, e leia a íntegra da respectiva petição inicial.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

COMPENSAÇÃO FINANCEIRA DA EXTRAÇÃO DO PETRÓLEO

COMPENSAÇÃO FINANCEIRA DA EXTRAÇÃO DO PETRÓLEO

Por Francisco Alves dos Santos Júnior.


Está em voga a compensação financeira que virá da futura exploração do pré-sal.Os três Estados, maiores produtores do Brasil, RIo de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo querem que sejam mantidas as regras atuais. O Presidente Lula apresentou projeto mudando as regras.
Segue uma sentença judicial enfrentando o assunto na atualidade, com estudo do assunto desde a Lei que criou a PETROBRÁS, passando pela atual Constituição e pela legislação atualmente em vigor.



PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
Processo nº 2006.83.00.14390-1 29 AÇÃO ORD. (PROC. COMUM ORDINÁRIO)
AUTOR: MUNICIPIO DE GRAVATA
ADVOGADO: WASHINGTON LUIS MACEDO DE AMORIM
RÉU: ANP - AGENCIA NACIONAL DE PETROLEO



Registro nº ...........................................
Certifico que eu, .................., registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2007.


Ementa: CONSTITUCIONAL. PARTICIPAÇÃO DOS ENTES FEDERADOS NO RESULTADO DA EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO OU GÁS NATURAL.

-A verba não tributária prevista no § 1º do art. 20 da Constituição da República de 1988 tem a finalidade de remunerar a UNIÃO pelo uso de produto da sua propriedade e de compensar os Estados e Municípios pelos gastos de infra-estrutura decorrentes do empreendimento exploratório.
-Não faz jus à compensação financeira em questão Municípios distantes do empreendimento e nos quais não haja estação de embarque ou desembarque dos produtos ou de reprocessamento.
-Improcedência.


SENTENÇA TIPO “A”


O MUNICIPIO DE GRAVATA propôs a presente ação ordinária em face da AGÊNCIA NACIONAL DE PETRÓLEO – ANP, visando à manutenção dos critérios de distribuição de royalties devidos pelo resultado da exploração de petróleo, xisto betuminoso e gás natural com base nas Leis nº 7.990/89 e nº 9.478/97, que vieram a ser alterados pela Portaria – ANP nº 29/2001 e Nota Técnica SPG/ANP nº 01. Afirma o Autor que possui em seu subsolo dutos de transporte de petróleo e gás natural que lhe dariam direito à compensação financeira no produto da extração do petróleo e derivados, mas o novo regramento da ANP excluiu-o do conceito de instalação de embarque, desembarque ou transporte de gás natural/petróleo. Dessa forma, nunca recebeu qualquer compensação financeira pela exploração econômica do Gasoduto de interiorização da Coopergás, parte do city gate da Petrobrás na cidade de Jaboatão dos Guararapes cujo trecho segue pela BR 232, passando pelo Município de Gravatá alcançando o Município de Caruaru. Argumenta o autor não poder mera portaria restringir-lhe a percepção de royalties sob pena de extrapolar os limites do poder regulador, devendo o ato conformar-se às vigentes disposições normativas que o contemplam com o crédito. Acosta vasta documentação (fls. 26/71).

Regularmente citada, a Agência Nacional de Petróleo apresentou resposta. Preliminarmente, suscita que os outros Municípios que já percebem royalties também devem integrar a lide tendo em conta que o valor por estes recebido será reduzido caso o postulante venha a ter o seu pedido deferido. No mérito, aduz que se encontra autorizada legalmente para, em substituição às antigas atribuições da Petrobrás, realizar o controle da distribuição dos royalties, visto que a Lei nº 9.478/97 lhe conferiu poder regulamentar da distribuição dos mesmos, sendo-lhe lídimo fixar requisitos próprios (e eventualmente novos) para definir quais municípios devem recebê-los, para isto devendo primar pela aplicação dos critérios mais técnicos e justos de pagamento. Ainda, afirma que o duto que passa pelo território do citado Município é apenas de distribuição de gás GLP (de cozinha) e gasolina natural e não de transporte do campo produtor para a Unidade de Processamento, não preenchendo os requisitos previstos na legislação para a percepção dos royalties.
Vieram-me os autos conclusos para sentença.
É o relatório. Decido.

FUNDAMENTAÇÃO

Preliminar de integração da lide dos Municípios que já percebem royaties

A Ré suscitou a preliminar em tela alegando que os Municípios do mesmo grupo de beneficiários que já percebem royalties devido à localização das jazidas e/ou gasodutos, deveriam fazer parte desse processo. A justificativa alegada é o fato de que tais entes federados, que já recebem os royalties, sofreriam redução nos valores percebidos caso o pleito autoral fosse procedente.

Não merece prosperar esta preliminar. Explico. A intervenção no processo dos Municípios recebedores dos royalties do mesmo grupo do Município de Gravatá como litisconsortes passivos ou como assistentes da ANP, sob a justificativa de que o êxito do Autor na presente demanda terá interferência nos valores que os atuais beneficiários percebem não é suficiente para ensejar a intervenção suscitada.

O interesse jurídico que confere ao terceiro o direito de integrar o feito como litisconsorte ou mesmo como assistente é aquele representado pelos reflexos jurídicos que os resultados do processo provocariam no direito deste terceiro. No caso dos autos, resta claro que o interesse dos referidos Municípios possui um caráter meramente econômico, não ensejando, portanto, a intervenção pleiteada.

Nesse sentido, o E.TRF da 4ª Região já se pronunciou:

“Acórdão Origem: TRIBUNAL - QUARTA REGIÃO
Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL Processo: 200171000402860 UF: RS Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA
Data da decisão: 10/07/2006 Documento: TRF400133523
Fonte DJU DATA: 27/09/2006 PÁGINA: 682
Relator(a) VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Decisão A TURMA, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECEU DO APELO DO AUTOR, DOS MUNICÍPIOS DE SÃO SEBASTIÃO/SP, LINHARES/ES, SÃO FRANCISCO DO SUL/SC E TRAMANDAÍ/RRS E NEGOU PROVIMENTO AO APELO DA UNIÃO E À REMESSA OFICIAL E AO APELO DA ANP.
Ementa: ADMINISTRATIVO. MUNICÍPIO DE OSÓRIO. PERCEPÇÃO DE ROYALTIES PELO ARMAZENAMENTO DE PETRÓLEO. CÁLCULOS. AGRAVO RETIDO. MUNICIPIOS QUE POSTULAM INGRESSO COMO LITISCONSORTES PASSIVOS. INTERESSE MERAMENTE ECONÔMICO. RECURSO DO AUTOR QUE NÃO SE CONHECE. IMPROVIMENTO DO RECURSO DA ANP E DA UNIÃO. INTERPRETAÇÃO DA EXPRESSÃO EMBARQUE E DESEMBARQUE DE FORMA A ALCANÇAR O DEPÓSITO - TANCAGEM.
1. O agravo retido não merece ser provido, tendo em vista que cálculos de rateio dos royalties não se constituem em objeto do presente feito, que cuida apenas da nulidade do ato adminsitrativo.
2. Não se conhece de recurso dos Municípios que postulam seu ingresso como litisconsortes passivos necessários, porquanto já inadmitido seu ingresso no pólo passivo da presente relação processual no primeiro grau de jurisdição, em decisão que corretamente não vislumbrou interesse jurídico na demanda e sim mero interesse econômico, conceitos que não se confundem.
[...]” (Grifos acrescidos)

Resta, portanto, afastada a preliminar de integração dos Municípios na lide em comento.

MÉRITO

O Município de Gravatá/PE ajuizou a presente contenda, tendo por objetivo a sua inclusão como beneficiário do pagamento mensal da compensação denominada royalties, nos termos das Leis nº 7.990/89 e nº 9.478/97, suspendendo-se os efeitos da Portaria ANP nº 29/2001 e da Nota Técnica SPG/ANP nº 01/2001.

Em análise à petição inicial, vislumbro que o pedido referente ao recebimento dos royalties toma por base, primeiramente, a dicção do art. 20, § 1º, da Constituição Federal de 1988, abaixo transcrito:

“Art. 20. São bens da União:
I – os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;
(...)
§ 1º - É assegurada, nos termos da lei, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração”.

A previsão constitucional guarda consonância com a postura de participação na exploração e de compensação em decorrência da exploração que vinha sendo adotada desde a edição da Lei nº 2.004/53, a qual, em seu art. 27, assegurava aos Estados e aos Territórios onde fizessem a lavra de petróleo e xisto betuminoso e a extração de gás, indenização correspondente a 5% (cinco por cento) sobre o valor do óleo extraído ou xisto ou do gás.

A Lei nº 3.257/57 veio albergar a possibilidade de realização imediata do pagamento aos Municípios, fixando idêntico percentual de indenização.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, a regulamentação do seu art. 20, § 1º, coube à Lei nº 7.990/89, sendo imperioso citar o art. 7º, in verbis:

“Art. 7º Art. 7º O art. 27 e seus §§ 4º e 6º, da Lei nº 2.004, de 03 de outubro de 1953, alterada pelas Leis nºs 3.257, de 2 de setembro de 1957, 7.453, de 27 de dezembro de 1985, e 7.525, de 22 de julho de 1986, passam a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 27. A sociedade e suas subsidiárias ficam obrigadas a pagar a compensação financeira aos Estados, Distrito Federal e Municípios, correspondente a 5% (cinco por cento) sobre o valor do óleo bruto, do xisto betuminoso e do gás extraído de seus respectivos territórios, onde se fixar a lavra do petróleo ou se localizarem instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto ou de gás natural, operados pela Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRÁS, obedecidos os seguintes critérios:
I - 70% (setenta por cento) aos Estados produtores;
II - 20% (vinte por cento) aos Municípios produtores;
III - 10% (dez por cento) aos Municípios onde se localizarem instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto e/ou gás natural.
(...)
§ 4º É também devida a compensação financeira aos Estados, Distrito Federal e Municípios confrontantes, quando o óleo, o xisto betuminoso e o gás forem extraídos da plataforma continental nos mesmos 5% (cinco por cento) fixados no caput deste artigo, sendo 1,5% (um e meio por cento) aos Estados e Distrito Federal e 0,5% (meio por cento) aos Municípios onde se localizarem instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque; 1,5% (um e meio por cento) aos Municípios produtores e suas respectivas áreas geoeconômicas; 1% (um por cento) ao Ministério da Marinha, para atender aos encargos de fiscalização e proteção das atividades econômicas das referidas áreas de 0,5% (meio por cento) para constituir um fundo especial a ser distribuído entre os Estados, Territórios e Municípios.
(...)
§ 6º Os Estados, Territórios e Municípios centrais, em cujos lagos, rios, ilhas fluviais e lacustres se fizer a exploração de petróleo, xisto betuminoso ou gás, farão jus à compensação financeira prevista no caput deste artigo." – grifos nossos.

A definição de “instalação marítima ou terrestre de embarque ou desembarque de óleo bruto e/ou gás natural” capaz de dar concretude à regra da compensação financeira veio a ser dada pelo art. 19 do Decreto nº 01, de 11/01/1991. Confira-se:

“Art. 19. A compensação financeira aos Municípios onde se localizarem instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto ou gás natural será devida na forma do disposto no art. 27, inciso III e § 4º da Lei nº 2.004, de 3 de outubro de 1953, na redação dada pelo art. 7º da Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989.
Parágrafo único. Para os efeitos deste artigo, consideram-se como instalações marítimas ou terrestres de embarque ou desembarque de óleo bruto ou gás natural, as monobóias, os quadros de bóias múltiplas, os píeres de atracação, os cais acostáveis e as estações terrestres coletoras de campos produtores e de transferência de óleo bruto ou gás natural”.

Com base nessa conceituação o Município autor não teria direito à participação governamental nos royalties.

Vejamos se com as alterações da Lei nº 9.478/97, que instituiu a Agência Nacional de Petróleo - ANP e trouxe novo regramento da distribuição de royalties, o Município ora Autor passou ou não a ter direito aos royalties.

Essa nova Lei permitiu que o percentual de até 5% da produção fosse destinado conforme as regras então vigentes da Lei nº 7.990/89 e deu novo destino aos percentuais excedentes a 5%.

Na nova sistemática, a ANP foi autorizada a regular “forma e critério” para a distribuição dos excedentes de 5% devidos aos Municípios que sejam afetados pelas operações de embarque e desembarque. Confira-se o novo regramento dado pela Lei nº 9.478/97:

“Art. 47. Os royalties serão pagos mensalmente, em moeda nacional, a partir da data de início da produção comercial de cada campo, em montante correspondente a dez por cento da produção de petróleo ou gás natural.
§ 1º Tendo em conta os riscos geológicos, as expectativas de produção e outros fatores pertinentes, a ANP poderá prever, no edital de licitação correspondente, a redução do valor dos royalties estabelecido no caput deste artigo para um montante correspondente a, no mínimo, cinco por cento da produção.
§ 2º Os critérios para o cálculo do valor dos royalties serão estabelecidos por decreto do Presidente da República, em função dos preços de mercado do petróleo, gás natural ou condensado, das especificações do produto e da localização do campo.
§ 3º A queima de gás em flares, em prejuízo de sua comercialização, e a perda de produto ocorrida sob a responsabilidade do concessionário serão incluídas no volume total da produção a ser computada para cálculo dos royalties devidos.

Art. 48. A parcela do valor do royalty, previsto no contrato de concessão, que representar cinco por cento da produção, correspondente ao montante mínimo referido no § 1º do artigo anterior, será distribuída segundo os critérios estipulados pela Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989. (Vide Lei nº 10.261, de 2001).

Art. 49. A parcela do valor do royalty que exceder a cinco por cento da produção terá a seguinte distribuição: (Vide Lei nº 10.261, de 2001)
I - quando a lavra ocorrer em terra ou em lagos, rios, ilhas fluviais e lacustres:
a) cinqüenta e dois inteiros e cinco décimos por cento aos Estados onde ocorrer a produção;
b) quinze por cento aos Municípios onde ocorrer a produção;
c) sete inteiros e cinco décimos por cento aos Municípios que sejam afetados pelas operações de embarque e desembarque de petróleo e gás natural, na forma e critério estabelecidos pela ANP;
d) 25% (vinte e cinco por cento) ao Ministério da Ciência e Tecnologia, para financiar programas de amparo à pesquisa científica e ao desenvolvimento tecnológico aplicados à indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis; (Redação dada pela Lei nº 11.097, de 2005)
II - quando a lavra ocorrer na plataforma continental:
a) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento aos Estados produtores confrontantes;
b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento aos Municípios produtores confrontantes;
c) quinze por cento ao Ministério da Marinha, para atender aos encargos de fiscalização e proteção das áreas de produção;
d) sete inteiros e cinco décimos por cento aos Municípios que sejam afetados pelas operações de embarque e desembarque de petróleo e gás natural, na forma e critério estabelecidos pela ANP;
e) sete inteiros e cinco décimos por cento para constituição de um Fundo Especial, a ser distribuído entre todos os Estados, Territórios e Municípios;
f) 25% (vinte e cinco por cento) ao Ministério da Ciência e Tecnologia, para financiar programas de amparo à pesquisa científica e ao desenvolvimento tecnológico aplicados à indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis. (Redação dada pela Lei nº 11.097, de 2005)
§ 1° Do total de recursos destinados ao Ministério da Ciência e Tecnologia, serão aplicados no mínimo quarenta por cento em programas de fomento à capacitação e ao desenvolvimento científico e tecnológico nas regiões Norte e Nordeste.
§ 2° O Ministério da Ciência e Tecnologia administrará os programas de amparo à pesquisa científica e ao desenvolvimento tecnológico previstos no caput deste artigo, com o apoio técnico da ANP, no cumprimento do disposto no inciso X do art. 8º, e mediante convênios com as universidades e os centros de pesquisa do País, segundo normas a serem definidas em decreto do Presidente da República.” – (grifos nossos).

Vê-se, pois, que o pagamento dos royalties passou a ter duplo regramento:

1) 5% da produção prevista no contrato de concessão seguem os critérios de distribuição da Lei nº 7.990/89 e do Decreto nº 01/91;

2) o valor excedente deste percentual guia-se pela “forma e critério estabelecidos pela ANP”, conforme o art. 49 da Lei nº 9.478/97.

Reiterando essa divisão de competências para a distribuição dos royalties, o Decreto nº 2.705, de 03/08/1998, estatui:

“Art. 14. A parcela do valor dos royalties previstos no contrato de concessão, correspondentes ao montante mínimo de cinco por cento da produção, será distribuída na forma estabelecida na Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989.

Art. 15. A parcela do valor dos royalties previstos no contrato de concessão, que exceder ao montante mínimo de cinco por cento da produção, será distribuída na forma do disposto no art. 49 da Lei nº 9.478, de 1997.” – destacou-se.

Ao cumprir sua função reguladora, a ANP editou a Portaria nº 29/2001, que tinha a missão de definir “os critérios a serem adotados a partir de 1º de janeiro de 2002, para fins de distribuição do percentual de 7,5% (sete e meio por cento) sobre a parcela do valor dos royalties que exceder a 5% (cinco por cento) da produção de petróleo ou gás natural de cada campo, a ser efetuada aos Municípios que sejam afetados pelas operações de embarque e desembarque de petróleo ou gás natural”, de acordo com sua ementa. Significa, então, dizer que o conceito da ANP para “instalações de embarque e desembarque de petróleo ou de gás natural”, obviamente se limitando ao espectro excedente de 5%, foi dado pelo §2º do art. 2º dessa Portaria:

“Art. 2º. O percentual de 7,5% (sete e meio por cento) previsto no artigo anterior será distribuído a cada Município onde se localizar a instalação de embarque e desembarque de petróleo ou gás natural, juntamente com os Municípios pertencentes à zona de influência da instalação, na razão direta dos volumes de petróleo ou gás natural, juntamente com os Municípios pertencentes à zona de influência da instalação, na razão direta dos volumes de petróleo e gás natural, expressos em volume de petróleo equivalente, movimentados na respectiva instalação.
(...)
§2º. Para os efeitos deste artigo, consideram-se instalações de embarque e desembarque de petróleo ou de gás natural as estações terrestres coletoras de campos produtores e de transferência de petróleo ou gás natural, as monobóias, os quadros de bóias múltiplas, os quadros de âncoras, os píeres de atracação e os cais acostáveis destinados ao embarque e desembarque de petróleo ou gás natural.”

Com o objetivo de materializar a aplicação dessa Portaria foi elaborada a Nota Técnica SPG/ANP nº 01/2001, trazendo os conceitos das instalações marítimas e terrestres de embarque e desembarque de petróleo ou de gás natural para efeito de distribuição de royalties, a saber:

“As estações terrestres coletoras de campos produtores e de transferência de óleo bruto ou gás natural têm uma característica própria, qual seja a de coletar a produção de petróleo e do gás natural e transferi-los para fora da região produtora. A expressão “coletora de campos produtores” não deixa dúvida quanto à necessidade da instalação estar recebendo (coletando) hidrocarbonetos diretamente de um campo produtor (Figura 2). Estas são as funções essenciais ao enquadramento da instalação na definição legal. A instalação poderá, contudo, se prestar também a outras finalidades, a exemplo de promover a separação primária do petróleo e do gás natural e o armazenamento de tais hidrocarbonetos”. Mais adiante, trazendo o que seria importante para o enquadramento na definição legal diz: “É importante ter presente que o nome em si da instalação não importa muito, nem tampouco importa o fato dela realizar o embarque ou o desembarque de hidrocarbonetos. O que interessa para o enquadramento, (...) em se tratando de instalações terrestres, é o fato dela estar ligada diretamente a um campo produtor e realizar as funções de coletas e de transferência dos hidrocarbonetos produzido”.

Não identifico nessa Nota Técnica extensão de direito à percepção dos royalties aos Municípios por cujo território apenas passam os dutos condutores de petróleo ou de gás natural.

Se as terras, por onde passam esses dutos, são públicas, a ANP deveria ter obtido do Município ora Autor uma concessão de uso real, na forma preconizada no Decreto-lei nº. 271, de 1967, e nessa hipótese seria dispensa licitação pública(Lei nº. 8.666, de 1993, art. 17, § 2º) e, nessa hipótese, talvez até pudesse cobrar algum valor, se as terras por onde passam os dutos forem particulares, estes poderiam exigir alguma verba, porque seria caso de servidão .

Mas não a pretendida compensação financeira e/ou participação no empreendimento.

Após a Constituição da República, com o advento da Lei nº. 7.990, de 1989, a UNIÃO passou a gozar de participação no empreendimento, sendo obrigada a repassar parte para os Estados e Municípios onde funcionam os pontos de exploração ou que sejam base de estações, e estes recebem o repasse do montante arrecadado pela UNIÃO como compensação financeira, porque foram obrigados a realizar gastos de infra-estrutura como o empreendimento, tais como estradas, escolas, postos de saúde, etc.

O que não acontece com os Municípios que estão bem distantes dos empreendimentos e/ou dos pontos de estações, como o ora Autor.

Se de fato a noticiada Nota Técnica tivesse estendido para os Municípios por onde apenas passam os dutos a pretendida participação nos royalties, o que realmente não aconteceu, ainda assim não poderia subsistir porque feriria o § 1º do art. 20 da Constituição da República e os dispositivos das Leis acima referidas.

Se ocorrer algum acidente nos dutos dentro do território do Município ora Autor e, em decorrência do acidente, for esse Município obrigado a realizar alguma despesa pública extraordinária, poderá, no momento próprio, exigir a respectiva indenização, mas não beneficiar-se de uma compensação financeira por gastos que não teve.

Conclusão

Posto isto, rejeito as matérias preliminares e julgo improcedentes os pedidos da petição inicial, condenando o Município ora Autor em verba honorária, que arbitro em 10%(dez por cento) do valor da causa, atualizado a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, mais juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados da data da citação da execução do julgado, sobre o valor já monetariamente corrigido.

Sem custas, ex lege.

De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de Jurisdição.

P. R. I.

Recife, 18/06/2007.


Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal da 2ª Vara/PE

PLANO DE AULA DE MANDADO DE SEGURANÇA

PLANO DE AULA DE MANDADO DE SEGURANÇA

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


1ª AULA

1. Qual a nova Lei que trata do Mandado de Segurança?

R. Lei nº 12.016, de 07.08.2009.

1.1 – Essa nova Lei regulamenta que tipo ou que tipos de Mandado de Segurança?
Ela regulamenta os dois tipos existentes de Mandado de Segurança, a saber: o Mandado de Segurança individual(preventivo e repressivo – arts. 1º ao 20) e o Mandado de Segurança Coletivo(preventivo e repressivo – arts. 21 e 22, com aplicação subsidiária dos demais artigos).

2. Quando é que cabe o mandado de segurança individual?

R. Quando um direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data for violado, ilegalmente ou com abuso de poder, por alguma Autoridade, que exerça qualquer tipo de função(art. 1º da Lei).

3. E quando é que cabe o mandado de segurança coletivo?
R. Quando forem contrariados, por alguma Autoridade ou Alguma das pessoas indicadas no § 1º do art. 1º da nova Lei, direitos líquidos e certos(coletivos ou individuais homogêneos)da totalidade ou de parte dos membros ou dos associados, respectivamente, de um partido político com representação no Congresso Nacional ou de uma organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1(um)ano.

3.1) O que são direitos coletivos e direitos individuais homogêneos para tal fim?
Segundo o inciso I do Parágrafo Único do art. 21 da nova Lei, coletivos são os direitos “transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica básica.”.
Segundo o inciso II desse mesmo dispositivo da nova Lei, individuais homogêneos são os direitos “decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante.”.

O Código de Proteção e Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078, de 11.09.1990, traz as seguintes definições para esses direitos:
“Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem comum.”.
Conclui-se que os interesses ou direitos difusos não foram contemplados na nova Lei do Mandado de Segurança, logo não podem ser defendidos via mandado de segurança coletivo.

4. O que vem a ser Autoridade, para figurar no pólo passivo do mandado de segurança?
Qualquer pessoa que exerça algum cargo público ou função pública com algum poder de decisão ou com poder de execução de ato de Autoridade Superior e ainda, segundo o § 1º do art. 1º da Lei “§ 1o (...) os representantes ou órgãos de partidos políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como os dirigentes de pessoas jurídicas ou as pessoas naturais no exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições.”.
Exemplos:
1) O Delegado da Receita Federal do Brasil em Recife, quando executa ato administrativo do Ministro da Fazenda, caso contrarie o direito líquido e certo de algum Contribuinte de tributos sob sua administração, poderá figurar como Autoridade Impetrada(ou Autoridade Coatora)no pólo passivo de um Mandado de Segurança que seja impetrado por esse Contribuinte.
Se forem contrariados direitos coletivos ou individuais homogêneos, caberá a impetração do mandado de segurança coletivo.
2) Se o dirigente de um partido político impede alguém, que preenche os requisitos legais e estatutários, de filiar-se ao Partido, sem qualquer justificativa, contra esse ato cabe mandado de segurança, porque todo aquele que preenche os requisitos legais e do estatuto do partido tem direito de filiar-se a qualquer partido político.
3) Se esse dirigente cancela, de forma arbitrária, a inscrição de algum filiado do partido, também contra esse ato cabe mandado de segurança, porque todo filiado de partido político tem direito líquido e certo de assim manter-se, desde que cumpra todas as obrigações partidárias.
4) Se o dirigente do INSS(Autarquia)cancela o benefício de um Segurado, sem antes notificá-lo para defesa administrativa(princípio da ampla defesa e do contraditório), contra esse ato cabe mandado de segurança, porque todos têm direito líquido e certo à ampla defesa e ao contraditório, antes da perda de qualquer direito.
5) Se o dirigente de uma Instituição de Ensino Superior praticar algum ato ilegal ou abusivo contra algum aluno, contra esse ato cabe mandado de segurança, porque referido dirigente age por delegação do Ministro da Educação.
5. Quem tem legitimidade para impetrar mandado de segurança individual?

R. Pessoa física ou jurídica que tenha direito líquido e certo violado na forma acima indicada(art. 1º da Lei).

5-1. Quem tem legitimidade para impetrar mandado de segurança coletivo?

R. O art. 21 da nova Lei do Mandado de Segurança legitimou para o pólo ativo do mandado de segurança coletivo: a) o Partido Político com representação no Congresso Nacional. Logo, basta que esse Partido tenha um parlamentar na Câmara dos Deputados ou no Senado, para legitimar-se para esse fim; b) Organização Sindical, Entidade de Classe e Associação, desde que constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1(um)ano.

5.2) O que mais devem observar esses Entes para a legitimação?
R. Pertinência temática, isto é, que suas finalidades sejam pertinentes à defesa dos interesses coletivos e/ou individuais homogêneos da coletividade que representam(final do art. 21 da nova Lei).
Exemplo: 1) um Partido Político não tem legitimidade ativa para impetrar mandado de segurança, a favor dos seus associados, contra ato do Ministro da Fazenda que tenha afastado direito líquido e certo à correção monetária de certo período, mas terá essa legitimação se um ato do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral ferir algum direito coletivo ou individual homogêneo dos seus Associados no campo político-eleitoral.
2) O Sindicato dos Petroleiros poderá impetrar mandado de segurança coletivo, a favor da categoria, quando, por exemplo, um determinado ato administrativo ferir direitos trabalhistas, líquidos e certos, dessa categoria, mas não terá essa legitimação para ato do Tribunal Regional Eleitoral que contrarie algum direito líquido e certo dos Petroleiros no campo político-eleitoral.

5-3) Esses Entes terão que receber autorização especial(específica), escrita ou verbal, de cada membro ou associado para que possam impetrar o mandado de segurança coletivo?
R. Não. A nova Lei do mandado de segurança dispensou essa autorização expressamente, no final do seu art. 21.
Logo não mais se aplica o Parágrafo único do art. 2º-A da Lei nº 9.494, de 10.07.1997, que tem a seguinte redação: “Parágrafo Único. Nas ações coletivas propostas contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas autarquias e fundações, a petição inicial deverá obrigatoriamente estar instruída com a ata da assembléia da entidade associativa que a autorizou, acompanhada da relação nominal dos seus associados e indicação dos respectivos endereços. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001)”.

5-4) A petição inicial terá que ser instruída com o rol com os nomes e endereços dos Substituídos Processuais.
R. Sim, porque, além de ser aplicável analogicamente o mencionado Parágrafo Único do art. 2º-A da Lei nº 9.494, de 1997, servirá para agilizar o processo na fase de execução, uma vez que caberá a cada Substituído a percepção de eventuais verbas decorrentes do julgado, bem como para os fins do § 1º do art. 22 da nova Lei do Mandado de Segurança, que tem a seguinte redação: “§ 1o O mandado de segurança coletivo não induz litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada não beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a desistência de seu mandado de segurança no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança coletiva.”

6. Qual o prazo para a impetração do mandado de segurança:
R – Reza o art. 23 da nova Lei do Mandado de Segurança: “Art. 23. O direito de requerer mandado de segurança extinguir-se-á decorridos 120 (cento e vinte) dias, contados da ciência, pelo interessado, do ato impugnado.”.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

OFICIAL DE JUSTIÇA ELETRÔNICO

Por Francisco Alves dos Santos Jr.


Modificações feitas no Código de Processo Civil admitem o bloqueio eletrônico de bens do devedor, para posterior penhora e continuidade mais célere da execução.
Só que regras administrativas obrigam o Juiz a realizar o bloqueio, fazendo com que perca muito tempo na frente de um computador, fazendo as vezes de oficial de justiça eletrônico.
A mão de obra do Juiz é muita cara, por se tratar de profissional qualificado e que fez concurso para julgar e não para fazer bloqueios eletrônicos. Cabe ao Juiz, sim, decidir se cabe ou não o bloqueio. Mas a concretização deste, um ato mecânico por natureza, cabe àquele que fez concurso para isso, o Oficial de Justiça.
Por isso,mandei para o CNJ, via boletim do magistrado por ele editado, a proposta que segue.
Gostaria de ouvir a opinião dos meus eventuais leitores.


"Exmºs. Senhores do CNJ.

PROPONHO QUE V. EXAS. HABILITEM OS OFICIAIS DE JUSTIÇA PARA FAZEREM O BLOQUEIO ELETRÔNICO, APÓS DECISÃO DO MAGISTRANDO AUTORIZANDO. E LOGO APÓS O BLOQUEIO, QUE O SR. OFICIAL DE JUSTIÇA FAÇA A PENHORA, PARA QUE O JUIZ EM SEGUIDA DETERMINE A INTIMAÇÃO DA PENHORA, COMO JÁ DELINEADA NO CPC.

DESSA FORMA, O JUIZ FICA MAIS LIVRE PARA COM OS SEUS REAIS AFAZERES, AO INVÉS DE FICAR FAZENDO AS VEZES DE "OFICIAL DE JUSTIÇA ELETRÔNICO", GASTANDO SUA CUSTOSA MÃO DE OBRA E PRECIOSO TEMPO COM ALGO TÃO SINGELO, QUE NÃO EXIGE RACIOCÍNIO E MERA MECANIZAÇÃO.

RESPEITOSAMENTE,

FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR, JUIZ FEDERAL, 2ª VARA, RECIFE-PE"

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

IMÓVEL TOMBADO. RESTAURAÇÃO PELO IPHAN

O Decreto-lei nº 25, de 1937, ainda em vigor, obriga o proprietário de imóvel tombado a restaurá-lo e mantê-lo em bom estado. No entanto, esse diploma legal também estabelece que, quando o proprietário não tiver recursos econômico-financeiros para a restauração, cabe ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, às expensas da União, fazê-lo, ou então desapropriar o imóvel para tal fim, ou cancelar o tombamento para que o proprietário possa usar o imóvel como bem lhe aprouver.
Segue uma sentença judicial, relativa a um caso no qual a última hipótese acontenceu, em uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal, para restauração de um imóvel tombado, localizado no bairro Recife Antigo, na cidade do Recife, capital do Estado de Pernambuco, Brasil

Por Francisco Alves dos Santos Júnior





PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Dr. Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2003.83.00.009204-7 – Classe 01 – Ação Civil Pública
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL – MPF E OUTRO (Procuradora – Luciana Marcelino Martins)
Réu: INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL – IPHAN E OUTROS



Registro nº ..............................................
Certifico que eu, ............, registrei esta Sentença às fls..............
Recife, ........./........../2008.



Sentença tipo A

EMENTA:- ADMINISTRATIVO. IMÓVEL. BEM TOMBADO. RESTAURAÇÃO.

-Quando os proprietários de imóvel tombado não têm condições financeiras para a respectiva manutenção e restauração, cabe ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN, às expensas da União, cuidar da manutenção e restauração, ou desapropriar o bem para tal fim, ou cancelar o tombamento.

-Procedência.



Vistos etc.

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ajuizou, em 04.04.2003, a presente “Ação Civil Pública com pedido de liminar”, contra HENRIQUE TRONCOSO GOMEZ, HORTÊNCIA TRONCOSO GOMEZ, ALBINO TRONCOSO GOMEZ, CÉLIA TRONCOSO GOMEZ e FRANCO TRONCOSO GOMEZ, na qualidade de Litisconsortes Passivos, aduzindo, em síntese, que, em 06.02.2003, o Instituo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN teria remetido ao Ministério Público Federal o ofício 043/2003/5ªSR/IPHAN/MinC, noticiando a existência de 27 (vinte e sete) imóveis no bairro do Recife, sendo um de propriedade dos Réus, que, em razão das péssimas condições de manutenção, estariam colocando em risco a integridade física da população; que teria sido instaurado o procedimento administrativo de nº 1.26.000.262/2003-63; que a Empresa de Urbanização do Recife – URB teria apresentado parecer técnico sobre a condição dos imóveis em questão; que, segundo referido parecer, em junho de 2001 e janeiro de 2003, teriam sido realizadas vistorias por técnicos da ERBR, DIRCON e CODECIR; que, em alguns imóveis, teria sido definida a imprescindibilidade de colocação de tapumes durante o período do Carnaval/2002, havendo sido repetido tal procedimento no Carnaval/2003; que a ENLURB teria colocado tapumes nos 27 (vinte e sete) imóveis com risco de desabamento; que alguns desses imóveis estariam com a fachada e a estrutura comprometidas, com sérios riscos de desabamento, implicando temeridade à integridade física da população; que dentre os imóveis em questão estaria o imóvel situado à Avenida Marquês de Olinda, Prédio nº 174, de propriedade dos Réus. Argumentou que teria sido deferida liminar na ação cautelar, também proposta pelo Ministério Público Federal, proibindo a retirada dos tapumes; que o imóvel em questão faria parte do conjunto arquitetônico, urbanístico e paisagístico do antigo bairro do Recife, tombado pelo IPHAN. Discorreu sobre a legitimidade do Ministério Público Federal para a propositura da presente ação. Sustentou que a proteção ao patrimônio histórico teria cunho constitucional; que caberia ao proprietário conservar seu imóvel; que os Réus não teriam procedido à restauração do imóvel, colocando em risco a integridade física da população. Teceu outros comentários. Invocou entendimento doutrinário. Requereu: a concessão de liminar para determinar que os Réus fossem obrigados a restaurar imediatamente o imóvel, adequando-o às exigências legais, mediante apresentação de projeto arquitetônico à Prefeitura Municipal do Recife – DIRCON 1ª Regional, devendo tal projeto ser submetido à aprovação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, bem como realizando as obras necessárias, após a aprovação do projeto; a citação dos Réus; a intimação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN para integrar o pólo ativo da demanda; a procedência dos pedidos, condenando os Réus na obrigação de fazer, consistente na restauração integral do imóvel situado à Rua Marquês de Olinda, nº 174, Bairro do Recife, adequando o imóvel às exigências legais, mediante apresentação de projeto arquitetônico à Prefeitura Municipal do Recife – DIRCON 1ª Regional, submetendo referido projeto ao IPHAN, assim como realizando as obras necessárias, após aprovação pelo Município e pela Autarquia Federal referida. Fez protestos de estilo. Atribuiu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com documentos (fls. 15-36).
À fl. 38, restou consignado que o pedido de concessão de medida liminar seria apreciado após prévia justificação da parte requerida. Outrossim, foi determinada a citação das partes e a publicação do Edital previsto no art. 94 do CDC.
Despacho determinando que os mandados de fls. 46 e 59 fossem desentranhados e entregues ao referido Sr. Oficial de Justiça para o devido cumprimento, nos endereços indicados no verso de tais mandados, à fl. 75.
Foi deferido o pedido formulado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN no sentido de figurar no pólo ativo da demanda, na qualidade de assistente do Ministério Público Federal. Outrossim, foi determinada a remessa dos autos ao Ministério Público Federal para falar sobre o falecimento do Réu indicado na certidão de fl. 62 (fl. 83).
Termo de Retificação de Distribuição, à fl. 85.
ALBINO TRONCOSO GOMEZ apresentou Justificação Prévia às fls. 93-95 requerendo, inicialmente, o benefício da gratuidade de justiça. Defendeu a intimação pessoal do órgão da Defensoria Pública da União e a contagem em dobro dos prazos processuais. Aduziu, em síntese, que seria titular do benefício de amparo social nº 127.554.607-0, instituído pela Lei nº 8.742/1993, o que lhe garantiria a percepção de um salário mínimo mensal, eis que seria idoso e sem meios de prover a própria manutenção e tampouco tê-la provida por sua família; que o gozo do aludido benefício seria a sua única fonte de renda, consoante extrato de declaração de IR 2002 que acostou; que a incapacidade econômica do Requerido demonstraria a sua completa impossibilidade de arcar com as despesas de manutenção e/ou reparação do imóvel em questão. Sustentou, ainda, relativamente à obrigação de comunicar o Poder Público acerca da necessidade de realização de obras no imóvel, que a norma de ordem pública nem sempre teria o alcance desejado, haja vista a ausência de instrução do Requerido, não havendo, portanto, procurado assistência técnica que lhe informasse sobre o ônus legal imposto ao proprietário de imóvel tombado. Teceu outros comentários e requereu o indeferimento da liminar, ante a comprovação dos motivos justificadores da não realização de obras de conservação e/ou reparação do imóvel tombado em referência. Petição instruída com documentos às fls. 96-102.
Decisão fundamentada indeferindo o pedido de medida liminar relativamente aos Requeridos Henrique Troncoso Gomez e Albino Troncoso Gomez; deferindo o pedido de medida liminar com relação aos Requeridos Célia Troncoso Gomez e Franco Troncoso Gomez e, quanto aos imóveis que lhes pertenceriam, foi fixado o prazo de 30 (trinta) dias para comprovação nos autos que deram início à contratação de especialistas na elaboração do projeto a ser apresentado ao órgão da Prefeitura indicado na Inicial, bem como ao IPHAN. Outrossim, foi determinado que, no prazo de 60 (sessenta) dias, apresentassem os Requeridos referido projeto àquele órgão e a esta Autarquia Federal, sob pena de pagamento de multa mensal. Ao final, foi determinado que o Ministério Público Federal tomasse as providências pertinentes em relação à Hortência Troncoso Gomez, já falecida, bem como para se manifestar acerca do posicionamento do IPHAN neste feito (fls. 107-108).
CÉLIA TRONCOSO GOMEZ apresentou “PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO DE DESPACHO”, requerendo, inicialmente, o benefício do art. 4º da Lei nº 1.060/50. Sustentou que não teria renda, tampouco receberia benefício previdenciário, vivendo a expensas de um filho, razão porque requereu a reconsideração da decisão concessiva da liminar. Pugnou, ao final, pelo chamamento à lide do IPHAN – INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRIO E ARTÍSTICO NACIONAL, bem como pela realização de audiência de conciliação (fls. 114-115). Juntou instrumento de procuração e documentos às fls. 116-121.
FRANCO TRONCOSO GOMEZ apresentou “PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO DE DESPACHO” afirmando que não teria condição financeira de arcar com os custos de contratação e elaboração de projeto, requerendo a reconsideração da decisão concessiva da liminar. Pugnou, ao final, pelo chamamento à lide do IPHAN – INSTITUTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRIO E ARTÍSTICO NACIONAL, bem como pela realização de audiência de conciliação (fls. 122-123). Juntou instrumento de procuração e documentos às fls. 124-126.
Decisão de fl. 133 suspendendo os efeitos da decisão de fls. 107-108 relativamente aos Requeridos Célia Troncoso Gomez e Franco Troncoso Gomez. Outrossim, foi deferido o pedido do Ministério Público Federal (fls. 130-132) no sentido de determinar a intimação do IPHAN para manifestação nos autos.
O IPHAN requereu a expedição de ofício à Secretaria da Receita Federal para remessa de cópia das últimas cinco declarações de imposto de renda dos Réus para fins de comprovação de sua condição financeira (fls. 137-138), o que foi deferido à fl. 150.
Documentos juntados às fls. 154-162 e 163-166.
À fl. 176, foi indeferido o pedido do IPHAN de fls. 173-174 de quebra do sigilo bancário e realização de pesquisa em cartórios de registro de imóveis para constatar eventuais propriedades dos Requeridos.
O IPHAN requereu a juntada de ofícios que comprovariam as diligências efetuadas pelo órgão no sentido de constatar a existência de bens pertencentes aos Réus (fl. 182). Juntou cópia de ofícios às fls. 183-188.
O IPHAN requereu a juntada do Ofício nº 2.530/2006, oriundo Cartório de Registro de Imóveis – 1º Ofício, pelo qual se demonstraria a existência de imóveis de propriedade dos Réus (fls. 190-197).
O Ministério Público Federal reiterou o pedido de liminar formulado na Inicial para que o IPHAN procedesse às obras de restauração necessárias (fls. 199-201).
Foi deferido em parte os pedidos de fls. 199-201 do Ministério Público Federal, reconhecendo a impossibilidade econômico-financeira de os Requeridos arcarem com a obra de recuperação e conservação do imóvel em questão, restando revogada a decisão de fl. 108 relativamente a tais Requeridos; por força do disposto no § 1º do art. 19 do Decreto-lei nº 25, de 1937, o IPHAN foi deslocado para o pólo passivo desta ação, sendo determinada a remessa dos autos à Distribuição para a retirada da aludido Autarquia do pólo ativo, autuando-a no pólo passivo do feito para, querendo, apresentar Contestação; determinando que o Ministério Público Federal indicasse a União no pólo passivo, na qualidade de litisconsorte necessário, completando a inicial relativamente a esta, com a respectiva fundamentação e pedido, requerendo a sua citação (fls. 202-203).
O Ministério Público Federal pugnou pelo recebimento do presente aditamento à inicial, para incluir a União no pólo passivo da demanda, na qualidade de litisconsorte passivo necessário, reiterando o MPF em relação a esta todos os termos da exordial, inclusive os pedidos ali deduzidos, ressaltando-se que caberia ao IPHAN a execução das obras e à União o respectivo custeio. Ao final, pugnou pela citação da União (fls. 210-211).
O IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional apresentou Contestação às fls. 215-234 argüindo preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, eis que seria parte ilegítima para arcar com quaisquer ônus decorrentes da condenação. No mérito aduziu, em suma, que seria contra senso imputar ao IPHAN os custos da reforma do imóvel em tela sem questionamento mais aprofundado sobre as condições financeiras do proprietário, haja vista que foi a própria Autarquia, por intermédio de fiscalizações por ela realizadas, que provocou o Ministério Público Federal a ajuizar a presente ação civil pública; que pela redação do Decreto-lei nº 25/1937, o Poder Público só deveria arcar com as referidas obras quando o seu proprietário não dispusesse de recursos para tanto, o que caracterizaria, portanto, uma responsabilidade subsidiária; que o dispositivo legal imporia esse dever de cuidado até mesmo àquele sem condições de realizar as reformas com os próprios recursos, estabelecendo a obrigação de comunicar ao IPHAN a necessidade de revitalização de seu bem, sob pena de pagamento de pesada multa; que o dever de zelo e manutenção do bem seria ainda maior para os proprietários cuja condição financeira determinaria a realização de reforma às suas próprias custas, já que a lei impediria que a revitalização fosse custeada pelo IPHAN nesses casos; que o imóvel em questão, a despeito de tombado, seria de propriedade particular não se afigurando razoável que o Poder Público arcasse com as despesas de uma reforma, ainda que emergencial, o que representaria significativa valorização do bem, caracterizando o enriquecimento sem causa dos proprietários. Aduziu, ainda, que seria necessária uma reflexão acerca das reais condições do IPHAN arcar com os custos das obras discutidas no presente processo, especialmente se considerando que as verbas destinadas para tanto seriam deslocadas de outras atividades realizadas pelo instituto, também protetivas ao patrimônio histórico e artístico; que a responsabilização do IPHAN no custeio das obras de reforma do imóvel em questão mostrar-se-ia juridicamente impossível. Teceu outros comentários. Requereu o acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva ad causam e, se não fosse o entendimento, pugnou pela exclusão do IPHAN do pólo passivo a fim de que figurasse na ação como amicus curiae. Pugnou, ainda, pela citação da União. Protestou o de estilo e pediu deferimento.
À fl. 235, foi determinada a citação da União, conforme requerido pelo MPF à fl. 211.
A UNIÃO apresentou Contestação às fls. 240-258, argüindo as seguintes preliminares: a) legitimidade ativa da União, pugnando pela sua inclusão no pólo ativo da demanda; b) ilegitimidade ativa ad causam do Ministério Público Federal, haja vista que direito individual, divisível e disponível não poderia ser protegido pela Ação Civil Pública, devendo ser extinto o processo sem apreciação do mérito, em face do art. 267, VI, do CPC; c) impossibilidade de alteração do pedido após a citação e contestação do Réu, requerendo a União, em observância aos artigos 264, 294 e 303 do CPC, o expurgo da adição ao pedido inicial do Autor, excluindo-a da lide. No mérito aduziu, em síntese, que a União teria exercido suas obrigações de fiscalização e acompanhamento do bem, haja vista que a própria Ação Civil Pública em apreço, de autoria do Ministério Público Federal, nasceu da provocação de ente da União (IPHAN) que, ao fiscalizar o bem, teria verificado os fatos que deram ensejo ao presente feito; que, por conseguinte, não poderia a União figurar no pólo passivo da demanda, de modo a resistir à pretensão autoral, pois a permanência da União como parte ré da ação seguiria de encontro à sua competência constitucionalmente atribuída de proteção e guarda dos bens de valor histórico e cultural, requerendo, então, o acolhimento da presente manifestação, como o deferimento do pedido de assistência litisconsorcial da União no pólo ativo da demanda, aderindo, assim, aos pedidos formulados na inicial; que os Réus da presente ação, além do imóvel objeto da lide, também seriam proprietários de outros imóveis na Cidade do Recife/PE, sendo possuidores de condições financeiras para arcar com os gastos da reforma; que o dinheiro público não poderia ser usado para aumentar o patrimônio de particulares; que condenar a União ao pagamento das despesas de obra de prédio tombado equivaleria à retirada de dinheiro do povo para engordar o patrimônio de pessoas que morariam em bairro nobre da cidade. Teceu outros comentários. Requereu o acolhimento das preliminares suscitadas e, no mérito, que fosse reconhecida a improcedência dos pedidos. Protestou o de estilo. Juntou documentos às fls. 259-271.
Determinou-se a remessa dos autos à Distribuição para inclusão da União no pólo passivo da demanda e, após, ao Ministério Público Federal (fl. 272).
Termo de Retificação de autuação, à fl. 274.
O Ministério Público Federal apresentou Réplica às Contestações às fls. 277-284.
Vieram os autos conclusos para sentença.

É o Relatório.

Passo a decidir.

Fundamentação

Matérias Preliminares

As matérias preliminares sobre a incapacidade financeira das pessoas indicadas como Rés na petição inicial e a realocação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN para o pólo passivo e inclusão da União como litisconsorte passivo necessário foram apreciadas e solucionadas na decisão de fls. 202-203, datada de 27.02.2007, que, formalmente, já transitou em julgado.

Ante os argumentos ali consignados, não merece acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam da defesa da União.

Mérito

Não há dúvida nos autos de que o imóvel em questão encontra-se realmente tombado e por isso enquadrado como bem imóvel histórico e artístico nacional, sob a proteção das regras do Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de 1937.

Com efeito, rezam os artigos 1º e 2º desse Diploma Legal:

“Art. 1º Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interêsse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico.
§ 1º Os bens a que se refere o presente artigo só serão considerados parte integrante do patrimônio histórico o artístico nacional, depois de inscritos separada ou agrupadamente num dos quatro Livros do Tombo, de que trata o art. 4º desta lei.
§ 2º Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pelo natureza ou agenciados pelo indústria humana.
Art. 2º A presente lei se aplica às coisas pertencentes às pessôas naturais, bem como às pessôas jurídicas de direito privado e de direito público interno.”. (Sic).
O art. 19 e respectivos parágrafos do mencionado Decreto-lei estabelece que, quando o bem tombado pertencer a um particular e este não tiver condições econômico-financeiras para arcar com as despesas de manutenção e restauração, cabe ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN desapropriar o imóvel para fins de manutenção e restauração, ou arcar com a manutenção e restauração, às expensas da União. E deverá tomar tais providências no prazo de 6(seis) meses. Ou então, deverá cancelar o tombamento, deixando o proprietário livro para dar ao bem o destino que lhe aprouver.

Como já dito, na Decisão de fls. 202-203, que transitou em julgado, foi reconhecida a incapacidade financeira dos proprietários, tendo o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN sido deslocado para o pólo passivo e a União foi chamada para o para o mesmo pólo, como litisconsorte passivo necessário.

Como o próprio Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN, na via administrativa, em expediente dirigido ao Ministério Público Federal, ora Autor, cuidou de demonstrar da necessidade urgente da reforma(restauração) do imóvel em questão, não há o que se discutir quanto a este aspecto.
Neste tipo de ação, quando proposta pelo Ministério Público, ainda que procedente, não cabe a condenação da Parte Ré em verba honorária, porque referido Órgão apenas cumpre uma das suas funções institucionais, qual seja, de zelar pelo patrimônio histórico e artístico nacional. É tanto que, certamente ciente disso, a d. Procuradora da República, Dra. Luciana Marcelino Martins, que assina a petição inicial, não pediu condenação da Parte Ré em verba honorária.
Conclusão:

Posto isso, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam da defesa da União, julgo procedentes os pedidos desta ação e condeno o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional-IPHAN, no prazo fixado no § 1º do art. 19 do Decreto-lei nº 25, de 30.11.1937, sob às expensas da União, a dar início às obras de restauração do imóvel em questão, ou desapropriar mencionado imóvel para tal fim, ou então cancelar o respectivo tombamento, sendo que, caso escolha uma das duas primeiras opções, fica a União, à luz do mencionado dispositivo legal c/c o respectivo § 3º, condenada a disponibilizar, dentro do mesmo prazo, a quantia necessária para tal fim, sob pena de os responsáveis pela administração do referido Instituto e da União serem responsabilizados no campo da improbidade administrativa, funcional e criminalmente.

De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição.

Sem verba honorária, conforme fundamentação supra, e sem custas, em face de isenção legal.

Recife, 16 de maio de 2008.


Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal da 2ª Vara – PE

domingo, 30 de agosto de 2009

PLANO DE AULA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO NA RECEITA FEDERAL DO BRASIL

Por Francisco Alves dos Santos Jr.


PLANO DE AULA
PROCESSO ADMINISTRATIVO.

1ª AULA

Jurisdição Dual e Una: Breves Dados Históricos

O assunto objeto deste trabalho fica no âmbito do Direito Administrativo, que surgiu na França como uma forma de defesa encontrada pela burocracia monárquica, nos estertores da monarquia, para não se submeter ao nascente independente Poder Judiciário, após a revolução burguesa de 1789. Então essa burocracia monárquica conseguiu sua estruturação, mantendo o contencioso administrativo, vale dizer, com jurisdição dual, a administrativa e a judicial.
No Brasil, esse modelo vingou na época da nossa primeira Constituição, a de 1824, outorgada pelo então Imperador, D. Pedro I. Ensina Francisco de Queiroz Bezerra Cavalcanti("O Novo Regime Jurídico do Mandado de Segurança". São Paulo: MP Editora, 2009, p. 13)que a justificativa da época, para sua existência, era a manutenção da independência entre os Poderes e transcreve, no seu livro, as lições dos jurístas da época, a respeito dessa justificativa. Dessas lições, transcrevo, pela síntese, a de Henrique do Rego Barros: "A separação do poder judiciário e do poder administrativo, a necessidade de uma instrução especial para bem aplicar a legislação administrativa, são os principais motivos que dão lugar à existência da JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA"(no livro "Apontamentos sobre o contencioso administrativo e sobre os privilégios e prerrogativas da Administração nos contratos e transações que celebra com o Poder Público. Rio de Janeiro, Laemmert, 1874, p. 31). 
Com o advento da República, não foi mantido na Constituição de 1891. Mas, na época do regime militar, talvez pelas mesmas razões dos burocratas da monarquia francesa, foi aprovada a Emenda Constitucional nº 07, de 1977, alterando a Constituição então vigente, a de 1967, e uma das alterações foi para facultar a instituição de contencioso administrativo federal, com poder jurisdicional, no qual seriam julgadas questões referentes às relações de trabalho dos servidores com a União, suas Autarquias e Empresas Públicas Federais(art. 111).
Nessa Emenda Constitucional, também facultou-se a criação de contencioso administrativo federal e estadual, sem poder jurisdicional, para a decisão de questões fiscais, previdenciárias e de acidente do trabalho(art. 203).
Todavia, não se afastou a unidade de jurisdição, então prevista no § 4º do art. 153 daquela Constituição da República, ficando apenas estabelecido que, com relação àqueles assuntos, poder-se-ia condicionar a ida ao Judiciário após o esgotamento da via administrativa. Eis a ementa desse importante julgado do Plenário do STF(RE 631.240
"Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR. 1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo. 2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. 3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. 4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão. 5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos. 6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir. 7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. 8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais. 9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir."[1]

Mas esse sistema nunca foi implantado pelo Legislador Ordinário, certamente tendo em vista a tradição da unidade de jurisdição no Brasil.
Essa idéia, de condicionar a ida ao Judiciário, relativamente a assuntos ligados à Administração Pública, após o esgotamento da via administrativa, parece-me positiva, pois diminuiria o grande volume de casos perante o Poder Judiciário, uma vez que muitos se contentariam com a resolução que o caso receberia dos julgadores administrativos. E nesse sentido decidiu o Plenário do STF, no julgamento do RE     , relativamente a questões previdenciárias, estabelecendo que, caso a Administração não tenha decisão contrária à pretensão do Administrado, este é obrigado a esgotar a via administrativa e, só na  hipótese de negativa, quando então se estabelecerá a lide, poderá ir ao Judiciário. Caso faça antes de, nessa situação, esgotar a via administrativa, o Juiz  pode indeferir a petição inicial e dar o processo por extinto,  sem resolução do mérito,  por faltar ao Autor interesse processual de agir. 
A partir da Constituição da República de 1988, ora em vigor, a jurisdição voltou a ser una, sem previsão da possibilidade de instituir-se contencioso administrativo e criação de condição para o exercício do ius postulandi.
Esse entendimento extrai-se do inciso XXXV do art. 5º da Constituição da República, que tem a seguinte redação:
“Art. 5º - ...
XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.”.
Então, os julgados administrativos, dentro do prazo prescricional , podem ser questionados perante o Poder Judiciário, vale dizer, não transitam em julgado.
Essa regra constitucional encontra respaldo na Convenção Americana sobre Direitos Humanos ou “Pacto de São José da Costa Rica”, da qual o Brasil é signatário , cujo art. 8º, inciso I, estabelece:
“1) Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.”.
Registre-se, todavia, que existe no Brasil o processo administrativo, submetido aos princípios do contraditório e da ampla defesa, mas como opção àquele que tenha sofrido alguma lesão de direito.
Ou seja, o Administrado pode abrir mão de discutir esse direito na via administrativa e discuti-lo diretamente perante o Poder Judiciário. Vale dizer, ele não precisa primeiro esgotar a via administrativa, para somente depois ir ao Judiciário, porque o direito de postular em juízo não se encontra, no atual direito constitucional brasileiro, submetido a nenhuma condição e/ou exigência.
Todavia, sempre aconselho, principalmente na área tributária, que o Administrado discuta antes os seus direitos perante o julgador administrativo, porque na atualidade todos os Julgadores Administrativos no Brasil gozam de grande liberdade de ação e, portanto, de imparcialidade e, não poucas vezes, adotam posições mais favoráveis aos Administrados que o próprio Poder Judiciário. Por outro lado, como se trata de jurisdição graciosa, não tem muitos custos e não gera sucumbência. Outra vantagem: o processo tramita mais rapidamente, porque é mais informal e os órgãos julgadores administrativos estão menos assoberbados de trabalho que o Poder Judiciário.
Cabe também registrar que, caso o Administrado esteja discutindo algum crédito tributário na via administrativa e, concomitantemente, proponha ação judicial, tem-se que desistiu da via administrativa, segundo consta do Parágrafo Único do art. 38 da Lei nº 6.830, de 1980, que rege o processo de execução fiscal judicial no Brasil, bem como do § º 3º do art. 126 da Lei nº 8.213, de 1991, que trata dos benefícios previdenciários.
Outra característica da jurisdição administrativa é que tem cunho inquisitorial, qual seja, os julgadores poderão tomar iniciativa de investigação.
Inform que tramita no Congresso Nacional projeto de lei transferindo para a via administrativa o processo de execução fiscal até a fase da penhora, momento em que o Administrado poderá ir ao Judiciário discutir os atos até então praticados na via administrativa. As Associações de Classe dos magistrados são contrárias, mas me parece positivo, pois desafogará o Judiciário e não ferirá o princípio da jurisdição una.
Finalmente, não se pode deixar de registrar a existência do processo administrativo de execução de contrato do sistema financeiro da habitação, regido pelo ainda vigente Decreto-lei nº 70, de 1966, o qual, segundo o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, foi recepcionado pela vigente Constituição da República. Por esse processo, o BBanco, agente financeiro, na hipótese de não pagamento das prestações do financiamento do imóvel pelo referido sistema, contrata uma outra Instituição Financeira, denominada Agente Fiduciário, e este executada o contrato, observando as regras desse Decreto-lei e, obviamente, os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. O Judiciário não pode modificar o que for decidido nessa via administrativa. Poderá apenas anular determinados atos, caso as formalidades legais e as orientações principiológicas não tenham sido observadas.


Processo x Procedimento

A expressão “processo administrativo” findou por prevalecer no texto da atual Constituição da República(inciso LV do art. 5ª), ficando desprezada a expressão “procedimento administrativo”, até então sustentada por alguns, que preferiam a palavra “processo” apenas para o processo judicial.
Na verdade, em direito processual, procedimento é apenas modo, rito, forma de prática dos atos processuais e sempre existiu tanto no processo administrativo, como no processo judicial. Assim é que temos, no processo judicial, o procedimento comum, o procedimento cautelar, o procedimento voluntário,  etc. E, no processo administrativo, os procedimentos relativos ao lançamento e respectiva impugnação, os procedimentos para apreensão de mercadorias, os procedimentos para a consulta, os procedimentos para a repetição de indébito, etc.
Já em direito administrativo puro, não processual, procedimento corresponde a etapas necessárias à concretização de determinado ato, com acontece, por exemplo, no direito administrativo-tributário, com o ato de lançamento do tributo, que é precedido de procedimentos praticados ou só pelo Contribuinte e/ou pelo Contribuinte e pela Administração. Essas etapas estão previstas no art. 142 do Código Tributário Nacional-CTN e no Decreto nº 70.235, de 1972.

Súmulas Vinculantes nas vias Judicial e Administrativa

De Plácido e Silva ensina que Súmula vem do latim summula e significa resumo, epítome breve, tendo o sentido de sumário ou de índice de alguma coisa. É também o que de modo abreviadamente explica o teor ou o conteúdo integral de alguma coisa.
No campo judicial, a Súmula tem sido o resumo, concentrado em um enunciado, do entendimento sedimentado dos Tribunais, expressado em seus Acórdãos, a respeito de determinada matéria.
Durante toda a década de oitenta e noventa do século XX, houve intenso debate nos meios jurídicos do Brasil se seria ou não importante instituir-se a denominada Súmula Vinculante. A maioria dos advogados era contra, porque iria “engessar” o direito e fragilizar a força das decisões dos magistrados de primeira instância e dos Tribunais intermediários, tipo Tribunal de Justiça e Tribunais Regionais Federais. Muitos magistrados de primeira instância e desses Tribunais intermediários pensavam que iriam perder poder e passariam a ser meros carimbadores de súmulas nos processos sob sua apreciação. Mas a grande parte do meio jurídico opinava por sua instituição, como medida de eficiência do Poder Judiciário, sobretudo na sua vertente agilização da prestação jurisdicional e, também, porque daria maior concretude ao princípio da segurança jurídica. 
Outra boa parte desse contingente entendia que a súmula vinculante deveria ser editada pelo Supremo Tribunal Federal-STF e também pelo Superior Tribunal de Justiça-STJ. 
Prevaleceu parte desta corrente, a que sustentava que esse tipo de súmula deveria ficar adstrita ao Supremo Tribunal Federal-STF.

1. Súmula Vinculante Judicial

A Emenda Constitucional nº 45, de 2004, cujo Relator no Congresso Nacional foi o saudoso Senador Cunha Lima(Paraíba), também conhecido pela alcunha de "Advogado Poeta"(impetrou, certa vez, um mandado de segurança por meio de versos,  para liberar um violão que tinha sido apreendido pelo Delegado de Polícia numa serenata e o Juiz concedeu a segurança, também em versos), acrescentou o art. 103-A à Constituição da República vigente, tornando vinculante as Súmulas do Supremo Tribunal Federal-STF. A regulamentação quanto a aprovação desse tipo de Súmula e sua possível modificação(revisão) ou revogação(cancelamento) veio à luz pela Lei nº 11.417, de 2006. Há previsão, nessa Lei, de responsabilização civil, administrativa e penal dos órgãos da Administração Pública que não observarem as Súmulas Vinculantes dessa Suprema Corte. Mas, tendo em vista a liberdade de julgar dos membros do Judiciário, não há qualquer pena para juízes, desembargadores ou ministros dos Tribunais Superiores que, obviamente de forma fundamentada, não as aplique nas suas decisões. 
Essa Lei também criou mais um recurso, denominado de Reclamação, dirigido ao Supremo Tribunal Federal-STF, quando uma das suas Súmulas Vinculantes não for observada e essa possibilidade não me parece boa, porque contraria a principal intenção da criação desse tipo de Súmula, que foi desafogar a Suprema Corte do grande número de processos que a ela chega para apreciação. Ora, com essa possibilidade, a Suprema Corte poderá ser inundada de Reclamações contra decisões judiciais que não observam as suas Súmulas.
E também me parece inútil, essa Reclamação, porque as decisões definitivas de mérito do Supremo Tribunal Federal-STF, lançadas em Ação Declaratória de Constitucionalidade e em Ação Direta de Inconstitucionalidade produzem efeito erga omnes(§ 2º do art. 102 da Constituição da República), e essas decisões virão bem antes de essa Suprema Corte decidir reiteradas vezes de forma uniforme a respeito da matéria e em decorrência disso elaborar uma Súmula Vinculante, pois essa matéria será apreciada de uma única vez, numa única dessas ações. Logo, como os assuntos legais controvertidos vêm sendo apreciados, na maioria das vezes, em Ações Diretas de Inconstitucionalidades e, em alguns casos, em Ações Declaratórias de Constitucionalidade, a Súmula Vinculante não tem tanta importância como poderia ter se os acórdãos dessas ações não fossem vinculantes.
Em 5 de dezembro de 2008, o STF editou a Resolução nº 388, que regula o processamento das propostas de edição, revisão e cancelamento de súmulas no Tribunal.
A participação de interessados nos processos que pedem a edição, a revisão ou o cancelamento de Súmulas Vinculantes está prevista na Lei 11.417/06 (parágrafo 2º do artigo 3º) e na Resolução 388/08. 
A publicação dos editais, que nada mais são que os textos das propostas de Súmula Vinculante ou a própria Súmula que se pretende revisar ou cancelar, tem como objetivo assegurar essa participação.

2. Súmula Vinculante Administrativa Federal

No campo dos julgamentos administrativos federais, a possibilidade da instituição de Súmulas Vinculantes encontra-se potencialmente prevista no inciso II do art. 100 do Código Tributário Nacional-CTN(Lei nº 5.172, de 25.10.1966), o qual estabelece que são normas complementares das Leis, Tratados e Convenções Internacionais e Decretos, entre outros atos, as decisões dos Órgãos singulares ou coletivos de jurisdição administrativa a que a Lei atribua eficácia normativa.
Essa Lei prevista nesse dispositivo do Código Tributário Nacional-CTN veio à luz somente no ano de 2005, que é a Lei nº 11.196, cujo art. 113 acrescentou ao Decreto nº 70.235, de 06.03.1972, o art. 26-A, autorizando a Câmara Superior de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda – CSRF aprovar Súmula Vinculante de suas decisões reiteradas e uniformes. 
O efeito vinculante será com relação à Administração Tributária Federal e, no âmbito do processo administrativo, aos contribuintes, após regular publicação da Súmula no Diário Oficial da União(§ 3° do mencionado art. 26-A) e carreia para esse tipo de Súmula as características de generalidade, abstração, compulsoriedade, relativamente a esses órgãos, com a força hierárquica que lhe dá o noticiado art. 100 do Código Tributário Nacional-CTN, vale dizer, instrumento normativo secundário ou derivado, que não pode inovar na ordem jurídica.
A proposta para elaboração da Súmula poderá ser de iniciativa de qualquer dos Membros da referida Câmara Superior, dos Presidentes dos Conselhos de Contribuintes, do Secretário da Receita Federal ou do Procurador-Geral da Fazenda Nacional(caput do referido art. 26-A).
Mencionada Câmara Superior é composta de Turmas e, dependendo da matéria a ser objeto de Súmula, poderá ser aprovada por uma das Turmas ou pelo Pleno da referida Câmara(§ 1º do citado art. 26-A).
A Súmula será aprovada pelo Ministro de Estado da Fazenda, após obtenção de 2/3(dois terços) dos votos da Turma ou do Pleno da Câmara Superior e parecer favorável do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, depois de ouvir a Receita Federal(§ 3º do art. 26-A).
Essa Súmula poderá ser revista ou cancelada por proposta dos Presidentes e Vice-Presidentes dos Conselhos de Contribuintes, do Procurador-Geral da Fazenda Nacional ou do Secretário da Receita Federal, obedecidos os procedimentos previstos para sua aprovação(§ 4º do art. 26-A).
O § 5º do mencionado art. 26-A estabelece que os regimentos internos dos Conselhos de Contribuintes e da Câmara Superior de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda disciplinarão os procedimentos nele previstos.

3. Súmula Vinculante Administrativa Estadual e Municipal

Como essa matéria diz respeito à competência concorrente(art. 24-I da Constituição da República), o Estado e o Distrito Federal, como a União sobre ele não traçou normas gerais(§ 1º do art. 24 da Constituição da República), podem instituir nas suas Leis a figura da Súmula Vinculante. Os Muncípios também(art. 30-II da Constituição da República).
O Estado de São Paulo a instituiu bem antes da área federal, pela nº Lei nº 10.941, de 2001, da seguinte forma:
“Art. 39 – Por proposta do Diretor da Representação Fiscal ou do Presidente do Tribunal de Impostos e Taxas, acolhida pelas Câmaras Reunidas, em deliberação tomada por votos de, pelo menos, 2/3(dois terços) do número total dos juízes que a integram, a jurisprudência firmada pelo Tribunal de Impostos e Taxas será objeto de súmula, que terá caráter vinculante, no âmbito dos órgãos de julgamento de primeira e de segunda instância administrativa.§ 1º - A proposta a que alude o caput, antes de submtido à deliberação das Câmaras Reunidas, deve ser referendada pelo Coordenador da Administração Tributária.§2º - A súmula poderá ser revista ou cancelada, observado o mesmo procedimento estabelecido para a sua formulação.”.
A comparação dos diversos dispositivos dessa Lei do Estado de São Paulo é fácil concluir que foi nela que se inspirou o Legislador federal, quando editou a Lei mencionada no subtópico anterior.

Processo Administrativo Federal

A Lei nº 9.784, de 1999, traça regras gerais sobre o processo administrativo na área federal, relativamente a todo tipo de processo, entre os quais, obviamente, encontra-se o que nos interessa, o processo administrativo tributário(art. 1º).
Essa Lei, no seu penúltimo artigo fez uma importante ressalva:
“Art. 69 – Os processos administrativos específicos continuarão a reger-se por lei própria, aplicando-se-lhes apenas subsidiariamente os preceitos desta Lei.”.
Então, essa Lei geral aplica-se apenas subsidiariamente e nos processos administrativos federais, vale dizer, que envolvam interesses da União.
Sem dúvida que os princípios previstos no seu art. 2º aplicam-se subsidiariamente, porque não tratados nessas Leis específicas.

Processo Administrativo Tributário na Receita Federal do Brasil

1.Breves Dados Históricos

Na época do regime militar, sobretudo nos seus primórdios, alguns atos institucionais prevaleciam à Constituição da República, porque se tratava de um regime de exceção. Os Atos Institucionais nºs 05, de 13.12.1968 e 12, de 31.08.1969, respectivamente no § 1º do seu art. 2º e no seu art. 1º davam poderes ao Chefe do Executivo para legislar sobre processo administrativo tributário e então valendo-se desses poderes os Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica, que compunham a junta militar que ocupava o Poder Executivo, se auto-autorizaram, no art. 2º do Decreto-lei nº 822, de 05.09.1969, a traçar regras, com força de Lei, relativamente ao processo administrativo tributário, bem como ao processo de consulta, obviamente no campo tributário, verbis:
“Art. 2º O Poder Executivo regulará o processo administrativo de determinação e exigência de créditos tributários federais, penalidades, empréstimos compulsórios e o de consulta.”.
E o seu art. 3º revogou a legislação que, até então, tratava desses assuntos.
Embora a Emenda Constitucional nº 01, de 1969, tivesse revogado a possibilidade de o Poder Executivo legislar a respeito dessa matéria, porque vedou a delegação de atribuições entre os Poderes(art.6º, Parágrafo Único), no entanto, excluiu, no inciso III do seu art. 181, da apreciação do Poder Judiciário os atos, inclusive os legislativos, realizados com base em Atos Institucionais, logo persistiu a vigência do referido Decreto-lei nº 822, de 1969 e então, com base nele o Chefe do Poder Executivo, em 06 de março de 1972(já não era a junta militar, mas sim o Presidente Emílio Garrastazu Médice), editou o Decreto nº 70.235, dispondo sobre o processo administrativo fiscal e dando outras providências, Decreto esse que foi publicado no DOU de 07.03.1972 e que até hoje rege a matéria, com força de Lei, ou seja, só podendo ser alterado por Lei.
E é com base nesse Decreto nº 70.235, de 1972, que vamos estudar o processo administrativo tributário perante a Receita Federal, com aplicação subsidiária da Lei nº 9.784, de 1999, que traça regras gerais sobre o processo administrativo na área federal.
A Lei nº 11.457, de 2007, que criou a denominada Super Receita Federal, ou Receita Federal do Brasil, autoriza, no seu art. 25, a aplicação desse Decreto às contribuições antes exigidas e julgadas administrativamente pelo INSS, tendo sido, nesta parte, recentemente alterada pela Lei nº 11.941, de 2009, que acrescentou ao art. 9º do Decreto nº 70.235, de 1932, o § 6º, com a seguinte redação:
“§ 6o O disposto no caput deste artigo não se aplica às contribuições de que trata o art. 3o da Lei no 11.457, de 16 de março de 2007. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009).”

E que contribuições são essas, que não podem ser submetidas às regras do Decreto nº 70.235, de 1972?
Eis o texto do ar. 3º e respectivos parágrafos da Lei nº 11.457, de 2007:
“Art. 3o As atribuições de que trata o art. 2o desta Lei se estendem às contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos, na forma da legislação em vigor, aplicando-se em relação a essas contribuições, no que couber, as disposições desta Lei. (Vide Decreto nº 6.103, de 2007).§ 1o A retribuição pelos serviços referidos no caput deste artigo será de 3,5% (três inteiros e cinco décimos por cento) do montante arrecadado, salvo percentual diverso estabelecido em lei específica.§ 2o O disposto no caput deste artigo abrangerá exclusivamente contribuições cuja base de cálculo seja a mesma das que incidem sobre a remuneração paga, devida ou creditada a segurados do Regime Geral de Previdência Social ou instituídas sobre outras bases a título de substituição.§ 3o As contribuições de que trata o caput deste artigo sujeitam-se aos mesmos prazos, condições, sanções e privilégios daquelas referidas no art. 2o desta Lei, inclusive no que diz respeito à cobrança judicial.§ 4o A remuneração de que trata o § 1o deste artigo será creditada ao Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização - FUNDAF, instituído pelo Decreto-Lei no 1.437, de 17 de dezembro de 1975.§ 5o Durante a vigência da isenção pelo atendimento cumulativo aos requisitos constantes dos incisos I a V do caput do art. 55 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, deferida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, pela Secretaria da Receita Previdenciária ou pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, não são devidas pela entidade beneficente de assistência social as contribuições sociais previstas em lei a outras entidades ou fundos.§ 6o Equiparam-se a contribuições de terceiros, para fins desta Lei, as destinadas ao Fundo Aeroviário - FA, à Diretoria de Portos e Costas do Comando da Marinha - DPC e ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA e a do salário-educação.”
Além das contribuições exemplificadas neste § 6º, existem inúmeras outras que são arrecadadas pelo INSS e depois repassadas aos respectivos titulares e indico como exemplo as contribuições para o SEBRAE, SESC, SENAI, Fundo Nacional para Desenvolvimento da Educação, etc.
Então, seria estranho a Receita Federal do Brasil ficar encarregada de cobrar essas contribuições, pois, com exceção do FNDE, que é uma Autarquia Federal, esses outros Entes, embora recebam a receita de um tributo federal, têm natureza jurídica de direito privado . Logo, tenho por acertada a alteração veiculada pela Lei nº 11.941, de 2009, afastando essas contribuições da legitimidade da Receita Federal do Brasil e fazendo retornar a legitimidade ativa do INSS, legitimidade esta que vem sendo executada há muitos anos com sucesso.
NOTA
O processo administrativo que tenha idoso, com 60(sessenta)anos de idade ou mais, deficiente físico e portadores de certas doenças graves terão que ter tramitação prioritária, conforme art. 4º da Lei nº 12.008, de 29.07.2009, que acrescentou à Lei nº 9.784, de 29.01.1999 o art. 69-A, verbis:
“Art. 4o A Lei no 9.784, de 29 de janeiro de 1999, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 69-A:
“Art. 69-A. Terão prioridade na tramitação, em qualquer órgão ou instância, os procedimentos administrativos em que figure como parte ou interessado:I - pessoa com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos;II - pessoa portadora de deficiência, física ou mental;III – (VETADO)IV - pessoa portadora de tuberculose ativa, esclerose múltipla, neoplasia maligna, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome de imunodeficiência adquirida, ou outra doença grave, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída após o início do processo.§ 1o A pessoa interessada na obtenção do benefício, juntando prova de sua condição, deverá requerê-lo à autoridade administrativa competente, que determinará as providências a serem cumpridas.§ 2o Deferida a prioridade, os autos receberão identificação própria que evidencie o regime de tramitação prioritária.§ 3o (VETADO)§ 4o (VETADO)”.

2ª AULA

AUTO DE INFRAÇÃO E NOTIFICAÇÃO DE LANÇAMENT

Reza o art. 9º do Decreto nº 70.235, de 1972.

“Art. 9o A exigência do crédito tributário e a aplicação de penalidade isolada serão formalizados em autos de infração ou notificações de lançamento, distintos para cada tributo ou penalidade , os quais deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito. (Redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009)§ 1o Os autos de infração e as notificações de lançamento de que trata o caput deste artigo, formalizados em relação ao mesmo sujeito passivo, podem ser objeto de um único processo, quando a comprovação dos ilícitos depender dos mesmos elementos de prova. (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005)
§ 2º Os procedimentos de que tratam este artigo e o art. 7º, serão válidos, mesmo que formalizados por servidor competente de jurisdição diversa da do domicílio tributário do sujeito passivo. (Redação dada pela Lei nº 8.748, de 1993)
§ 3º A formalização da exigência, nos termos do parágrafo anterior, previne a jurisdição e prorroga a competência da autoridade que dela primeiro conhecer. (Incluído pela Lei nº 8.748, de 1993).§ 4o O disposto no caput deste artigo aplica-se também nas hipóteses em que, constatada infração à legislação tributária, dela não resulte exigência de crédito tributário. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)§ 5o Os autos de infração e as notificações de lançamento de que trata o caput deste artigo, formalizados em decorrência de fiscalização relacionada a regime especial unificado de arrecadação de tributos, poderão conter lançamento único para todos os tributos por eles abrangidos. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)”

DO AUTO DE INFRAÇÃO

O Auto de Infração tem natureza jurídica de ato administrativo.
E só pode ser lavrado por Servidor competente, que é aquele indicado na Lei(art. 10 do referido Decreto), sob pena de nulidade.
Atualmente, o Servidor competente para lavrar auto de infração no campo tributário federal é o Auditor Fiscal da Fazenda Nacional(§§ 3º e 4ªº do art. 11 da Lei 11.457, de 2007, e arts. 8º da Lei nº 10.593, de 06.12.2002).
Se determinado Servidor, que não seja competente para lavrar o Auto de Infração, constatar a existência de determinada infração, comunicará o fato, em representação circunstanciada, a seu chefe imediato, que adotará as providências necessárias(art. 12 do referido Decreto).

NOTA

Se houver decisão judicial suspendendo a exigibilidade do crédito e o Auto de Infração já tiver sido lavrado, o respectivo processo administrativo de impugnação tramitará normalmente, mas, se o Contribuinte for vencido, enquanto perdurar o comando da decisão judicial, a Administração não poderá efetuar a cobrança, conforme consta do Parágrafo Único do art. 62 do Decreto nº 70.235, de 1972, verbis:
“Art. 62 – (...).Parágrafo único. Se a medida referir-se a matéria objeto de processo fiscal, o curso deste não será suspenso, exceto quanto aos atos executórios. (Vide Medida Provisória nº 232, de 2004)”
Mas se o Contribuinte consegue medida judicial suspensiva antes da lavratura do Auto de Infração ou da Notificação de Lançamento, o caput desse artigo 62 impede a Administração Tributária de realizar qualquer ato tendente à realização do lançamento:
“Art. 62. Durante a vigência de medida judicial que determinar a suspensão da cobrança, do tributo não será instaurado procedimento fiscal contra o sujeito passivo favorecido pela decisão, relativamente, à matéria sobre que versar a ordem de suspensão." (Vide Medida Provisória nº 232, de 2004)
Tenho que essa regra é perigosa para a Fazenda Pública Federal, pois se o processo judicial demorar por mais de cinco anos, haverá caducidade do crédito da fazenda Pública e nesse sentido já há precedente da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça-STJ(REsp nº 332.693-SP, Rel. Min. Eliana Calmon. Julgadoem 03.09.2002) . É que a decisão judicial pode suspender a exigibilidade(art. 151-IV e V do Código Tributário Nacional-CTN), nunca os atos tendentes ao lançamento, porque este é um ato privativo da Fazenda Pública, constituindo um direito potestativo desta e que, se não concretizado a tempo e modo, sofrerá decadência, com a conseqüente extinção do respectivo crédito(art.156-V do Código Tributário Nacional-CTN).

NOTA: 
Ainda nos anos oitenta/noventa do século XX, o então Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 3ª Região(São Paulo), Dr. Andrade Martins, sempre decidiu no mesmo sentido desse julgado da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça-STJ, conforme registrei na minha dissertação de mestrado escrita em 1999 e publicada em 2001, sob o título Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil, Rio de Janeiro: Renovar, estando esse assunto discutido nas páginas 216-217. Eis um trecho da página 217: “Literalmente, tem razão o Desembargador ANDRADE MARTINS, pois o Juiz, liminarmente, suspende a exigibilidade do crédito, uma vez que não pode impedir que o Administrador Tributário exerça o seu poder-dever de lançar, que se constitui em um direito potestativo da Fazenda Pública”.
A Tese de que o lançamento tributário pode se concretizar por um Auto de Infração e corresponde a um direito potestativo da Fazenda Pública foi adotada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal-STF, no ano de 1982.
REQUISITOS OBRIGATÓRIOS DO AUTO DE INFRAÇÃO
Além do requisito de que o Auto de Infração só pode ser lavrado por Servidor competente, nos incisos I ao VI do art. 10 do Decreto nº 70.235, de 1972, estão os requisitos obrigatórios do Auto de Infração:
“I - a qualificação do autuado;II - o local, a data e a hora da lavratura;III - a descrição do fato;IV - a disposição legal infringida e a penalidade aplicável;V - a determinação da exigência e a intimação para cumpri-la ou impugná-la no prazo de trinta dias;VI - a assinatura do autuante e a indicação de seu cargo ou função e o número de matrícula.”.
Note que, embora os atos e termos processuais possam ser encaminhados de forma eletrônica ou apresentados em meio magnético ou equivalente, conforme disciplinado em ato da administração tributária(Parágrafo Único do art. 2º do Decreto nº 70.235, de 1975, com redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005), não há previsão de expedição de Auto de Infração eletronicamente, possibilidade essa que veremos pode ocorrer quando se trata de Notificação.
Mas, por conta desse dispositivo legal, tenho que a intimação do Auto de Infração pode ser dirigida ao Contribuinte eletronicamente, desde que ele tenha deixado no seu cadastro na Receita Federal do Brasil o respectivo endereço e tenha como o Órgão da Administração Tributária comprovar que o Contribuinte recebeu essa intimação e nesse sentido reza o art. 23 do Decreto nº 70.235, de 1975:
“ Art. 23. Far-se-á a intimação:I – (...).II – (...).III - por meio eletrônico, com prova de recebimento, mediante: (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005)a) envio ao domicílio tributário do sujeito passivo; ou (Incluída pela Lei nº 11.196, de 2005)b) registro em meio magnético ou equivalente utilizado pelo sujeito passivo. (Incluída pela Lei nº 11.196, de 2005).”.
No entanto, não está distante o momento em que todos os atos da administração federal, embora o Auto de Infração, venham a ser praticados eletronicamente e esse norte se descortina no Parágrafo Único do art. 24 do Decreto nº 70.235, de 1975, com redação dada pela Lei nº 11.941, de 2009, ao qual abaixo, no tópico “Impugnação”, subtópico “Autoridade Preparadora”, faremos referência.
A Súmula 355 do Supremo Tribunal Federal-STF envereda por essa seara: “Súmula 355 – É válida a notificação do ato de exclusão do programa de recuperação fiscal do REFIS pelo Diário Oficial ou pela internet”.
Obviamente, essa forma de ato eletrônico tem que estar autorizado na Lei, como estava na Lei desse REFIS, tendo em vista o princípio da legalidade(art. 5º, II, da Constituição da República).

3ª AULA

Notificação de Lançamento Tributário

A Notificação de Lançamento de crédito tributário e aplicação de penalidade isolada, como consta do acima transcrito art. 9º do Decreto nº 70.235, de 1975, é também uma das formas pelas quais se inicia o processo administrativo tributário(Art. 7º desse Decreto).
Tudo que vimos acima a respeito do Auto de Infração, exceto quanto aos requisitos, aplica-se também à Notificação de Lançamento.
O mencionado Decreto estabelece, no seu art. 11, que essa notificação será expedida pelo Órgão que administra o tributo e arrola quais são os seus requisitos obrigatórios, a saber:
“I - a qualificação do notificado;II - o valor do crédito tributário e o prazo para recolhimento ou impugnação;III - a disposição legal infringida, se for o caso;IV - a assinatura do chefe do órgão expedidor ou de outro servidor autorizado e a indicação de seu cargo ou função e o número de matrícula.Parágrafo único. Prescinde de assinatura a notificação de lançamento emitida por processo eletrônico.”
Conforme acima demonstrado, o art. 23, inciso III, possibilita a intimação do Contribuinte por meio eletrônico, desde que atendidas determinadas exigências. E ali defendemos que, quanto ao Auto de Infração, é pertinente apenas sua intimação por meio eletrônico, pois o dispositivo legal que dele trata não prevê sua integral elaboração por essa via.
Mas, quanto à notificação, o ora transcrito Parágrafo Único do art. 16 indica que a própria notificação possa ser feita por meio eletrônico.

IMPUGNAÇÃO

A Impugnação instaura a fase litigiosa do processo administrativo tributário(Art. 14 do referido Decreto).
Tenho que, mutatis mutandis, o Auto de Infração ou a Notificação de Lançamento equivalem, na via administrativa, à petição inicial de execução da Fazenda Pública na via judicial, só que sem força executiva, e a Impugnação corresponde aos Embargos judiciais dessa execução, mas sem necessidade de o Impugnante garantir o juízo, tampouco se fazer representar por advogado.

Autoridade Preparadora

Extrai-se de diversos dispositivos do Decreto nº 70.235, de 1972, que, antes de ser encaminhado para Autoridade Julgadora, o processo administrativo tributário federal passa por uma Autoridade Preparadora.
O preparo do processo compete à Autoridade local do Órgão encarregado da administração do tributo(art, 24), mas, quando o ato for praticado por meio eletrônico, a administração tributária poderá atribuir o preparo do processo à unidade da administração tributária diversa da prevista no caput deste artigo, conforme Parágrafo Único desse artigo 24, incluído pela Lei nº 11.941, de 2009.
A Autoridade preparadora cuida para que também se certifique nos autos do processo administrativo se o Infrator é ou não reincidente(conforme definição da lei específica), caso essa circunstância não tenha sido declarada na formalização da exigência(art. 13 do referido Decreto).
Essa Autoridade cuidará também para que a autuação do processo administrativo seja feito à luz do estabelecido nos artigos 2º, 3º, 4º e 22 do referido Decreto, que têm a seguinte redação:
“Art. 2º Os atos e termos processuais, quando a lei não prescrever forma determinada, conterão somente o indispensável à sua finalidade, sem espaço em branco, e sem entrelinhas, rasuras ou emendas não ressalvadas.Parágrafo único. Os atos e termos processuais a que se refere o caput deste artigo poderão ser encaminhados de forma eletrônica ou apresentados em meio magnético ou equivalente, conforme disciplinado em ato da administração tributária. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)Art. 3° A autoridade local fará realizar, no prazo de trinta dias, os atos processuais que devam ser praticados em sua jurisdição, por solicitação de outra autoridade preparadora ou julgadora.Art. 4º Salvo disposição em contrário, o servidor executará os atos processuais no prazo de oito dias.Art. 22. O processo será organizado em ordem cronológica e terá suas folhas numeradas e rubricadas.”.Veremos que, na fase da execução do processo administrativo tributário, a Autoridade Preparadora também terá outras importantes atribuições."
Prazo para interposição


Reza o art. 15 do Decreto nº 70.235, de 1975, que o prazo para interposição da Impugnação do Auto de Infração ou da Notificação de Lançamento, é de 30(trinta)dias, contados da data em que for feita a respectiva intimação.
Na verdade, interpretando esse art. 15 com o art. 5º(e respectivo Parágrafo Único) do mesmo Decreto, com o art. 210(e respectivo Parágrafo Único)do Código Tributário Nacional-CTN e ainda com a Súmula 310 do Supremo Tribunal Federal-STF, chega-se à conclusão que esse prazo só se inicia no dia seguinte àquele em que o Contribuinte tiver sido intimado, e assim mesmo se nesse ‘dia seguinte’ houver expediente normal no Órgão em que tramita o processo ou deva ser praticado o ato.

Forma


O art. 15 do Decreto nº 70.235, de 1975 exige que a Impugnação seja “formalizada por escrito e instruída com os documentos em que se fundamentar”.

Local de Apresentação

O dispositivo por último citado estabelece que a Impugnação será “apresentada ao órgão preparador”.
O processo administrativo tributário relativo aos tributos sob administração da Receita Federal do Brasil, antes de ser encaminhado para a Autoridade Julgadora, passa por uma Autoridade Preparadora, que tem a importante incumbência de saneá-lo, cuidando para que se informe nos autos se o Infrator é reincidente, caso essa circunstância não tenha sido declarada no Auto de Infração ou na Notificação de Lançamento(art. 13 do Decreto nº 70.235, de 1975).

Outros Requisitos Obrigatórios da Notificação


Estes outros requisitos estão no art. 16 do Decreto nº 70.235, de 1975:
"Art. 16 - A impugnação mencionará:

I - a autoridade julgadora a quem é dirigida;
II - a qualificação do impugnante;
III - os motivos de fato e de direito em que se fundamenta, os pontos de discordância e as razões e provas que possuir; (Redação dada pela Lei nº 8.748, de 1993)
IV - as diligências, ou perícias que o impugnante pretenda sejam efetuadas, expostos os motivos que as justifiquem, com a formulação dos quesitos referentes aos exames desejados, assim como, no caso de perícia, o nome, o endereço e a qualificação profissional do seu perito. (Redação dada pela Lei nº 8.748, de 1993)
V - se a matéria impugnada foi submetida à apreciação judicial, devendo ser juntada cópia da petição. (Incluído pela Lei nº 11.196, de 2005)”.
_________________________________________________________________________
[1] Brasil. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário - RE nº 631240, Relator(a):  Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, Acórdão Eletrônico REPERCUSSÃO GERAL - Mérito, Diário Judicial Eletrônico - DJe nº 220, divulgação em 07-11-2014, publicação em 10-11-2014[1])"

Acesso em 26.03.2020